Alexandre Pomar

Blog de Alexandre Pomar. Pintura, Fotografia, crítica, política cultural, etc.

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01/22/2021

TOM D. Thomaz de Mello por Jorge Silva

 
TOM de Jorge Silva
Entre o melhor Tom estão as pinturas murais para o Museu de Arte Popular, que lá estão ainda, inacessíveis, invisíveis, por incúria e atropelos ao bom senso mínimo. Conviria vê-las a cor, mas o livro/catálogo de Jorge Silva acabado de editar (Arranha-Céus/Abysmo) fica-se por um opaco preto-e-branco talvez vintage. Não sendo desleixo, percebe-se que é uma questão de direitos, capturados por uma entidade pública alegadamente patrimonial-cultural. Não fazem nem deixam fazer e pedem fortunas pelas imagens que são de todos. (estou a interpretar, não perguntei...)
 
Sobre Tom, ou D. Thomaz de Mello tinha anotado isto há anos (um pouco revisto agora), qd se tratou de defender o MAP:
 
Tom foi o mais fiel expositor dos Salões de Arte Moderna do SPN/SNI de António Ferro, 14 vezes de 1935 a 51, mesmo se a pintura não era o centro da sua actividade; foi sócio de António Pedro na galeria UP em 1935 e seu dono único até 36 ou 38? - aí se expôs Arpad Szenes e Vieira da Silva e Hayter em 35; fez com José de Lemos O Papagaio (35-36...); foi um dos decoradores da Exposição de 37 em Paris para o edifício de Keil do Amaral e a mesma equipa continuou nas seguintes exposições, incluindo a Exposição do Mundo Português, EMP'40, 1958 em Bruxelas e já em 66 "As Artes ao Serviço da Nação". Designer avant la lettre. 1906-1990, brasileiro chegado em 1926, auto-antologiado em "Tom, 45 Anos de Actividade", 1973, SEIT. JAF aponta-lhe "tipos populares tratados como bonecos folclóricos" e uma "imagística crítica graficamente original em 72". <Agora Jorge Silva atribui-lhe neo-realismos, o que é abuso e/ou disparate>
 
Foi Tom que dirigiu a instalação e a decoração do Museu de Arte Popular, segundo o programa museológico de Francisco Lage. Para aí também desenhou mobiliário de notáveis soluções expositivas. Na pintura mural dedicada ao Minho, que é uma das peças de excepção entre as decorações do Museu, os elementos gráficos de cunho regional dão origem a uma acumulação espalhada de símbolos em que participam também bonecos de cunho humorístico (justificando a ideia da caixa de brinquedos) e que se aparenta com formas bordadas. Não tem o sentido especulativo dos códigos de sinais de Torres García, mas recorda-o ou aproxima-se dele com uma grande eficácia decorativa.
"Minho, Caixa de Brinquedos de Portugal", pintura mural (a fresco ou a têmpera?) de Tom e Manuel Lapa, no Museu de Arte Popular, 1948. Fotografias de José Pessoa, 2008 Copyright:© IMC / MC
Tom 1: 22 Jan.
 
Ao contrário do que sugere o Jorge Silva no seu livro-catálogo sobre Tom / Thomaz de Mello isto não é neo-realismo, e se é preciso classificar estilos (em geral não é) convém ter cuidado com as atribuições e com os ismos. Folclorismo, populismo, miserabilismo, por exemplo. Neo-realismo foi outra coisa, e não é viável aplicar tal etiqueta a um fiel operacional do SPN-SNI, mesmo que o pós-guerra e a esperada vulnerabilidade do regime tenham favorecido maior atenção ao povo. Também o Almada actualizou pela mesma época o gosto déco na Gare da Rocha Conde Óbidos, atento à actualidade (e a Picasso, no seu caso).
Diz Jorge Silva: Pág. 122-125 - "O crescente neorrealismo de Tom cristaliza no seu aclamado álbum "Por terras de Portugal", 1948. "O realismo cru,... afasta Tom do decorativismo e da infantilização do "Bom Gosto" de António Ferro e confere-lhe uma aproximação ao universo literário do movimento neorrealista, que tinha, já em 1948, uma gramática visual definida por Manuel Ribeiro de Pavia". (Foto 1) É muito particular o regionalismo estilizado, o alentejanismo de Pavia, e extensa a ilustração e capas de escritores neo-realistas (com uma curiosa e original deriva africanista), mas a sua "gramática visual" não define os neo-realismos, passa a acompanhá-los, evoluindo desde as páginas do "Panorama". Aliás, chamarem a Tom "pintor da miséria" afasta-o do neo-realismo, que apesar de independente do canon idanovista era um realismo social e socialista. Não é a miséria que marca as figuras do povo neo-realista, mas a dignidade e a força.
pág 142-145 (fotos 2,3 e 4): o "tardio neorrealismo pictórico das gorduchas varinas de 1963", "Portugal Loves You", SNI. (e será certo falar de turismo de massas nessa data e atribuir a Tom "infalíveis recursos gáficos"?
pág. 170-173 (fotos 5 e 6): "em Nazaré, ...1958, continua a crueza do album anterior,... ambos tributários da estética neorrealista. O humanismo sofrido de Nazaré..." estaria então longe de "um irresponsável modernismo" dos anos 30. (Infantilizado e irresponsável também são apreciações extemporâneas)
Aproximação a, relação tributária, não significa um "crescente neo-realismo", mesmo quando se reconheça a sensibilidade a uma diferente consciência social e um novo contexto artístico, pós-1945, que veio a ditar a derrota e queda de Ferro. Tom 3: 23 Jan.
 
Tom no blog de Jorge Silva: ALMANAQUE SILVA
https://almanaquesilva.wordpress.com/?fbclid=IwAR1l0pyc6Lf09rIpHvoK0gDxmcjF6S28EPHPbPHHquty3Xa9CUWI00FsoCc
 
De facto, não existiu um "Antigo Pavilhão da Vida Popular", mas sim uma Secção da Vida Popular (constituída pelos vários Pavilhões da Vida Popular) que com as Aldeias Portuguesas integrava o Centro Regional. O Museu ocupou apenas os pavilhões principais, os vários corpos edificados a nascente, associados pela porta monumental e pelo átrio interior, que aparecem referidos em plantas e descrições da época como Pavilhões dos Transportes e Comunicações, Tecelagem e Doçaria, a Norte, e Pavilhões das Artes e Indústrias Portuguesas, a Sul. O farol ainda hoje sobrevivente estava adossado ao Pavilhão do Mar e da Terra, a poente, que nos anos 60 foi integrado num (ou substituído por um) extenso edifício anexo ao Museu onde existiram armazéns, oficinas e a Galeria Nacional de Arte Moderna (vítima de um incêndio a 20 de Agosto de 1981). Esse pavilhão ainda está registado em plantas divulgadas pela DGEM, datadas de 1980 e 1984.
 
O “projecto de museologia inovador” que aqui se refere contou com um grande investimento na concepção do mobiliário e suportes expositivos, bem como na pormenorização das carpintarias, ferragens, puxadores de ferro forjado, etc, com autoria reconhecida de Jorge Segurado. Tomaz de Mello e provavelmente Paulo Ferreira terão desenhado também equipamentos expositivos (ver Andreia Galvão, 2003, pág. 399-403). De facto, o citado “programa global modernista” compreende a realização de uma “museografia cenografada”, integrada com a arquitectura, a escultura, a pintura mural e o que chamaríamos hoje o design, que se considera o último grande trabalho da equipa de pintores-decoradores do SPN/SNI. São dimensões a ter expressamente em conta no processo de classificação do edfifício do Museu de Arte Popular.
Uma outra referência deve ser feita aos vidros gravados que se encontram nas portas de entrada do Museu (entrada redesenhada para o MAP, alterando a circulação no anterior pavilhão de 1940). Ignora-se se estes vidros preenchidos por motivos “estilizados” de inspiração popular e acertada eficácia visual datam da inauguração do Museu ou de uma alteração posterior. O seu autor é também ignorado (Tomaz de Mello? Ou já Sebastião Rodrigues, que por volta de 1948 começou a trabalhar regularmente para o SNI?)
Quanto ao Mobiliário Expositivo, a sua autoria é, na sua maior parte, de Jorge Segurado e Tomás de Mello (Tom). Inspirado nas nossas proveniências regionais, nele está patente uma arte portuguesa, simultaneamente moderna e tradicionalista. Neste contexto, encontra semelhanças com o mobiliário utilizado à época, nas pousadas criadas por Ferro, esse “mobiliário rústico português” de linhas sóbrias e simples (madeira de pinho, encerado de escuro, castanho do Minho de 1ª qualidade, pontuado por aplicações de ferro forjado).
Boneco concebido por Tom (Thomaz de Mello) envergando miniatura de traje de pescador da Póvoa de Varzim [1937]. © IMC / MC
Tom
 
 
 
 

Posted at 00:14 in 2021, Design, Porto, SNI, SNI/SPN | Permalink | Comments (0)

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01/11/2021

Galerias do Porto

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138479326_3718969888139880_2719384926180131630_nA falta de história e a falta de senso. um cartaz em que os curadores se anunciam.

 

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No Porto 2001 foi assim:  duas exposições sérias que ficaram como referência - a comparação é fatal para este novo "projecto".

Porto Anos 60/70: os Artistas e a Cidade - Serralves e Árvore - comissariado de João Fernandes e Fátima Lambert. Jan.-Abril. Cat. com 320 págs. ed. ASA

[+] de 20 grupos e episódios no Porto do século XX - Galeria do Palácio (à data da sua inauguração) - comissariado de Fátima Lambert e Laura Castro. Cat. em 2 vol. de 312 e 276 págs.

E a programação do ano contou ainda com Fernando Lanhas em Serralves e António Quadros na Árvore, mais Júlio Resende extra.-programa em Matosinhos.

Valerá a pena falar de regressão e de irresponsabilidade. E discutir como se dá livre curso ao esquerdismo manipulador de Paulo Mendes, responsável principal acompanhado por José Maia e Paula Parente Pinto (investigação de arquivo).

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Posted at 00:26 in 2001, 2021, história de Portugal, Porto, Serralves | Permalink | Comments (0)

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01/02/2021

Um calendário neo-realista (para 1954)

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(Depois vou digitalizar bem o calendário. ..)

Gostava de saber que circulação teve à época, sendo obviamente uma edição partidária para angariar fundos. Gostava de entender as condições da semi-legalidade do PC nesse tempo de grande confrontação política e activa repressão (de Norton de Matos em 1949 a Rui Luís Gomes, 1951, e Humberto Delgado em 1958), com a entrada de Portugal na Nato em 49 e a reunião do Pacto do Atlântico em Lisboa em 52. Um calendário comunista para 1954, editado por Victor Palla, ao que parece, e ele é pelo menos o autor da capa - a edição não é identificada. Participam também Maria Keil, Querubim Lapa e (outros...), comunistas, simpatizantes e compagnons de route, o núcleo duro dos neo-realistas em 1953, ano em que termina a guerra da Coreia (Julho).

Especialmente relevante é a aberta intervenção anti-colonial de António Domingues, artista de longa carreira pouco conhecida. A "marcha" ou manifestação de massas aparece também nos desenhos de Rogério Ribeiro, Cipriano Dourado e Maria Barreira (esta em versão feminista). A pomba da paz é desenhada por Pomar (lavores femininos); Alice Jorge, que assina M. Alice, em versão multi-étnica; e José Dias Coelho (os namorados).

Esta “fase” militante do movimento neo-realista vai terminar com a morte de Stalin, o relatório de Krutchov, o chamado "desvio de direita" do PC, o fim das Exposições Gerais em 1956, o início das bolsas da Gulbenkian e a sua (1ª) exposição de 1957, numa sucessão muito rápida e articulada. Também com o surgimento de uma nova geração (ou “fornada”) de artistas (que já não nascem no PC e no MUD/MND, alguns católicos, já progressistas, com o Movimento de Renovação da Arte Religiosa, de 1952 : https://www.snpcultura.org/obs_13_movimento_renovacao... ), que já são abstractos antes de ensaiaram as novas figurações continentais e a Pop nos anos 1960, que vão fazer a galeria Pórtico, o jornal Ver (René Bertholo é central) e a seguir emigrar (as bolsas...) e que ainda entram, alguns deles, nas últimas Gerais e decidem participar nas iniciativas do SNI (salões e bienal de Paris), cortando assim com a prática e a tutela da geração de 1945. 

*

O que poderia ser um calendário social-democrata, ou, vá lá, socialista? Não o consigo imaginar e certamente é impossível. E isto ajuda a pensar o lugar da figuração militante ou engagé, aqui e em geral no tempo longo, a sua possibilidade e conflitualidade, a questão das vanguardas (política e artística), e a oposição entre “abstração” e figuração nos anos 50 da Guerra Fria, com a condenação de TODA a figuração e a suposta inevitabilidade da abstracção que então se defendeu ou impunha, nomeadamente em Portugal, país muito sensível a modas por falta de formações ou tradições artísticas sólidas.

Neste caso, trata-se de um relançamento do neo-realismo numa particular conjuntura política que se caracterizou pelo que depois se chamou o "desvio sectário" do PC e pelas campanhas da paz no contexto da guerra fria e do últimos anos de Stalin, rompendo com os propósitos de unidade anti-fascista. Ao tempo da polémica interna do neo-realismo (ou da Vértice).  Interessa-me agora este calendário por incluir uma iconografia ignorada e em especial por informar sobre o contexto da Marcha (JP, 1952) e por vir preencher um vazio na história do tal neo-realismo da 1ª metade da década de 50, um tempo esquecido e mesmo apagado pelos protagonistas (por JP e Mário Dionisio, que então pessoalmente se distanciam: MD deixa o PC, que não lhe permite passar de militante a simpatizante: as cartas trocadas existem e foram divulgadas - são surpreendentes; JP continua por algum tempo e sai discretamente, e o neo-realismo é para ele uma memória dos anos iniciais, que continuava a polarizar a atenção sobre a sua obra, e de tempos difíceis).

Em 1953 JP publica um importante artigo no Comércio do Porto em que faz o balanço do neo-realismo ("sem discutir a justeza do crisma", diz) e uma auto-crítica que envolve M.D. (In Júlio Pomar, Notas para uma Arte Útil, ed. Atelier-Museu/Documenta p. 285-289):

"... alguns perigosos caminhos começaram a desenhar-se. Um lirismo, complacente, tende a substituir a agressividade dramática dos primeiris tempos. A procura de soluções foirmais começa a sobrepor-se ao vigor do conteúdo; e isto não reflecte senão um alheamento dos problemas realmente vivos. Boa parte do que pintei nos anos 1949 a 51 <o que inclui a individual de 1950> oferece tais características, e desvios de tipoo análogo marcam a obra plástica de Mário Dionísio. Desse impasse se tem estado a sair. "

É o seu último artigo na imprensa do tempo, por razões desconhecidas. Por acaso ou não, publica no mesmo ano, numa representação nacional numa revista francesa, um breve texto em absoluto discordante da ortodoxia comunista ali patente, mas retomando textos anteriores de oposição ao idanovismo de Cunhal:

"O assunto não é o conteúdo, é um pretexto, e mais nada. O conteúdo é a síntese dialéctica entre o tema e a experiência pessoal e vivida do artista. Ela manifesta-se na forma, vive nela, é exaltado por ela. Os conteúdos das minhas telas são as razões que me ajudam a viver'" (aspas do autor) E antes: "Deformação profissional: não acredito na infalibilidade do Papa. Cada dia, cada minuto, reponho o mundo em questão. O trabalho (métier) de pintor é um trabalho de pesquisas, de descobertas, de invenções: pesquisas, invenções, descobertas que nascem da vida e ela retornam. Houve um tempo em que desprezei certos assuntos? Erro meu." (Premier bilan de l'art actuel 1937-1953, Le Soleil Noir: Positions, Paris nº3-4, p. 314 - em Notas sobre uma Arte Útil p. 241).

A ideia de pretexto é problemática, parece-me (uma concessão aos abstraccioinismos?). A separação de forma e conteúdo, e do tema e da experiência, não solucionam problemas. Mas importaria mais saber se o texto francês é posterior ao português, ou se é um exercício de versatilidade que se documenta também noutras obras pintadas de 52-53, as paisagens. Aí não estamos (já?) perante a doutrinação neo-realista.

Para além da avaliação da qualidade das obras (muitas delas muito fracas, incipientes, no calendário e no seu tempo, como é "natural") existiu um apagamento do que foi uma renovação da "tendência realista" ou um breve realismo social ou socialista a suceder ao primeiro neo-realismo (1945-50), o qual vigora entre 1951 e 55, no caso de caso de JP, e que não segue o naturalismo e reaccionarismo estético de matriz soviética e tradução francesa. Para lá de se reencontrarem obras, melhores e piores (é a história e a sociologia), importa rever a história da arte desse tempo que foi escrita por protagonistas implicados (J. A. França e herdeiros, Mário Dionísio e Ernesto de Sousa, este actualmente ignorado quanto ao que escreveu antes da adesão súbita à Documenta e a Wostell), e em geral importa pensar o destino da arte, em especial da Guerra Fria até hoje, e a sua possível importância (ou desinteresse) no presente mediaticamente dominado pela sua mercantilização e museologização, em absoluto confundidas na sociedade do espectáculo.

 

 

Posted at 01:35 in 1953, Julio Pomar, Júlio Pomar, Neo-realismo | Permalink | Comments (3)

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12/30/2020

Ana Mata 2020

Como é mesmo muito bom não fez parte das escolhas dos melhores do ano. Ainda bem, para desfazer confusões. Ana Mata na Módulo, 3 anos depois (estas pinturas não se fabricam depressa).

(do facebook, um pouco revisto)


Ana mata

 

 

Gostava de tentar explicar (a mim próprio) por que isto (esta pintura) é muito interessante (ou muito boa), e rara.

É uma pintura depois da fotografia, com recurso à fotografia, não para impregnar as telas ou para copiar projecções, mas para ver o visível de outro modo, para encenar, recortar, modelar, reflectir o visto e recriar a sua luz; sem as facilidades da apropriação fotográfica e sem as rotinas do "fazer qualquer coisa que sai sempre". A fotografia ilumina (num caso há um flash sobre um corpo); a pintura ilumina a luz e a sombra da fotografia (há um pano negro que atravessa um quadro).

Não é a pintura que é mediada pela fotografia, é o olhar que se alimenta do registo fotográfico, para ver melhor, ou ver diferente, mais profundamente, demoradamente, mas com a surpresa de um primeiro relance ou com a energia de uma imagem a afirmar-se, a reconhecer-se. A pintura (a pintora) serve-se da fotografia, às vezes serve-a como modelo, de passagem, e resgata a pintura, o prazer de ver pintura, na velha confrontação com a fotografia. Trata-se de passagens, de trânsitos, entre o visto, o fotografado e o pintado, não de fronteiras, acrescentando sempre - o modo de ver, o fazer e um campo aberto de observações/interrogações, de histórias.

Alguma coisa se imobilizou (na fotografia feita/captada/organizada e na pintura a fazer-se, gesto a gesto, pincelada visível, demorada) sem se suster a velocidade do ver e do pintar, sem ser a transcrição do registo e sem se mostrar como execução de um programa, mas ele existe, programa pensado, conceptual.

A pintura é rápida, sem incertezas legíveis, mas a obra da pintora (a carreira) é lenta, escassa, e a diversidade dos formatos, do muito grande (a 1ªa foto) ao muito pequeno, do heróico ao íntimo, a diversidade dos suportes (tela, alumínio e papel) e dos meios (óleo e tinta acrílica) e dos assuntos (a figura, o retrato (também auto-retrato), as plantas - natureza viva, e a "natureza morta", uns óculos), a circulação entre a cor e sombra/grisaille, conferem a cada pintura a densidade de um encontro único e a certeza da possibilidade dispensável de muitas variantes (mas cada peça é definitiva).

Não conheço agora nada de mais surpreendente em pintura, até por se tratar da lenta maturação de um trabalho ao mesmo tempo muito reflectido e intensamente vivido (vívido) e inesperado. Conhecido de anteriores mostras sempre novo e diferente. Ganhei o ano nos seus últimos dias. Agora vou ler o pequeno livrinho em que a Ana Mata, que não conheço, reuniu "notas do atelier". Chama-se "A pintura é o visível das histórias desconhecidas", e espero não contradizer aquilo que eu procurei pensar sobre as suas pinturas a justificar a admiração.

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12/28/2020

OS RETRATOS DE JÚLIO POMAR (I)

Atelier-Museu Júlio Pomar (até 28 de Fevereiro)

destacam-se os quatro conjuntos de retratos que marcam a obra da maturidade de Pomar, nos anos 70 e 80, situados entre os períodos mais altos da sua carreira

1. O retrato está presente do início ao fim da carreira e da vida de Júlio Pomar. Pintor de figuras - e de imagens -, essa é uma prática que se pode dizer natural, espontânea, começada na infância, como acontece a todos (mas os seus cadernos foram guardados), e depois sempre continuada: as pessoas são o real mais próximo, e por isso mais acessível à observação, incluindo o auto-retrato.
A representação do visível, do visto, em especial no caso do retrato, sustenta-se da semelhança e no reconhecimento (e exige-os), para além de toda a (re)interpretação, formalização, abstractização e deformação, intencional ou não. Feito do natural (sempre com poses breves, no seu caso, ou de memória) ou documentado sobre referências fotográficas, o seu retrato nunca é naturalista (com uma excepção?) e pode ser ou não ser realista - por algum tempo de formação e afirmação foi neo-realista. As fronteiras diluem-se. O seu retrato nunca é o exercício de um género disciplinado e esteve sempre associado a reorientações da prática da pintura ou do desenho, a mudanças de "fases" - a obra de Pomar não se classifica por um estilo colectivo (depois do neo-realismo inicial) e nunca se fixou numa maneira.

Também sucede que o retrato é para Pomar, quase sempre (para lá de muito escassas encomendas), uma prática relacional que decorre da convivência, do companheirismo, da amizade, da intimidade ou da relação amorosa - e que por sua vez alimenta a relação pessoal com o “modelo”. Através de retratos e auto-retratos existe uma narrativa auto-biográfica que se constrói no tempo longo. E não será diferente, embora sem a presença física dos retratados, o gosto pela representação de escritores já ausentes por quem se interessava, e em diversos casos foram resultado de sugestões alheias, de convites para ilustração de livros. Essas são representações imaginadas, ficcionadas e integradas em situações ficcionais, sustentadas pela iconografia disponível, fotográfica ou já antes artística - o que deu depois passagem directa para as figuras de personagens literários e mitológicos, já representações inventadas ou ficcionadas (Ulisses, Adão e Eva, por exemplo). Quanto ao auto-retrato, praticado ao em sucessivas condições, e que mereceria estudo próprio, ele não surge como exercício narcísico ou este é contrariado pela irrisão, várias vezes em auto-retratos duplos e triplos, em companhia do macaco e do diabo (alter-egos) e na figura do palhaço.

Se em todas as décadas de actividade (oito décadas) os retratos estão presentes, poderão destacar-se desse continuum alguns retratos individuais, numa galeria selecta (Norton de Matos, Cardoso Pires, Soares, Claude Levi-Strauss, Camões, Marisa...), ou acompanhar séries e sequências com coerência temática ou ciclos e períodos, “fases”. Para além dos retratos iniciais, do tempo neo-realista, e dos retratos mais tardios, dos anos 2000 e do regresso a Lisboa, que são períodos de certo modo simétricos, de começo e fim, decisivamente marcados pela afinidade das relações pessoais, considero mais importantes quatro conjunto de retratos que marcam a obra da maturidade de Pomar, nos anos 70 e 80, colocados entre os períodos mais altos da sua carreira.

Vianna 1970 130 x 97 cm
Triplo Auto-Retrato 1973 116 x 89 cm

Viana, 1970 (130x97 cm) e Triplo auto-retrato, 1973 116 x 89 cm (não expostos)

 

2. O primeiro é constituído pelo ciclo de retratos dos anos 70, que já propus identificar como os seus anos Pop, pinturas de formas recortadas em cores lisas, na sequência dos ‘Banhos Turcos segundo Ingres’ e do interesse por Matisse e pelos contemporâneos Pop ingleses e norte-americanos, ou em montagem de fragmentos e insígnias dos rostos e corpos, mais ou menos dispersos num espaço plano. É um período que vai exactamente de 1970 a 1975, em que a gestualidade e o movimento anteriores se sustêm, a partir dos ‘Rugby’s’ e ‘Maios 68’, e que desde o início inclui retratos de relações pessoais de proximidade e de figuras das artes e da literatura (Eduardo Viana, três Almada’s, dois Pessoa’s, Camões) e também quatro auto-retratos.
Na actual exposição só estão presentes Almada (nº 28 do Catálogo Raisonné vol. 2) e um Ferreira de Castro (de A Selva, nº 72) mais três retratos de mulheres (Manuela, nº 65; Graça, nº 76; e Teresa, nº 113), de um conjunto que foi drasticamente reduzido, contando com mais de 70 telas. Nesta “fase” assinala-se a presença de uma modalidade rara, o retrato nu (sempre escasso quando não se trata de representar modelos profissionais). Na sucessão de ciclos de produção seguiram-se as colagens eróticas, “teatro do corpo / espaço de Eros”, mudando novamente de processos.

 

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Este ciclo de pintura foi acompanhado por uma série autónoma de retratos desenhados a lápis, paralela mas formalmente muito diversa, uma série também extensa, prolongada de 1970 a 1977 ou 78, neste caso sempre de pessoas que lhe eram próximas a vários títulos. Iniciou-se a pedido do poeta Alberto de Lacerda e prosseguiu com amigos (Manuel Torres) e amigas (Mimi Dacosta, Rucha) ou ‘companheiras’, outros pintores (João Abel Manta, Jorge Martins, Costa Pinheiro, Eduardo Luiz, o último retratado e também retratista recíproco) e escritores (Cardoso Pires), um galerista (Manuel de Brito), críticos amigos parisienses (Roger Munier, Patrick Waldberg, antigo surrealista dissidente). Foram reunidos em grande parte num álbum prefaciado por Fernando Gil (Os Retratos a Lápis dos Anos 70, ed. Imprensa Nacional, 1987) e alguns são mostrados agora no Atelier-Museu na escada entre os dois pisos.

 

Um segundo grupo de retratos pintados inclui apenas escritores, quatro poetas, e resulta de uma proposta para ilustrar um livro sobre o poema “O Corvo” de Edgar Allen Poe e as suas versões traduzidas por Baudelaire, Mallarmé e Pessoa. O projecto, sugerido em 1981 por Joaquim Vital (Editions de la Différence, Paris), à “saída” do ciclo dos ‘Tigres’, alargou-se a uma série extensa de quadros que se prolongou até 1985, com retratos individuais e retratos conjuntos de grande formato (Poe e cada um dos tradutores), e mais dois de grupo, um triplo Pessoa e os quatro poetas reunidos, ultrapassando assim em muito o propósito inicial, como foi frequente suceder, excedendo a ilustração.

O retrato literário não se separa da semelhança, embora a trate com outra liberdade, ficcional e já então de novo gestual, com a presença repetida do Corvo e uma inesperada aparição do Orangotango, acolhendo o acaso que acontece na tela, visitando representações fotográficas e anteriores retratos pintados, designadamente os Poe e Mallarmé de Manet. A série foi apresentada num álbum com texto de Jean-Michel Cluny (retratado noutra ocasião), que se chamou Le Livre des Quatro Corbeaux ou o Livro dos Quatro Corvos, na tradução para a Galeria 111, e igualmente numa caixa de serigrafias, retratos e corvos desdenhados, mas gorou-se à data uma prevista exposição em lugar destacado, dispersando-se em colecções particulares sem a visibilidade que merecia.

 

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A esta série se seguiram de imediato dois retratos autónomos de Fernando Pessoa, de 1985, e um projecto de edição ilustrada da Mensagem, onde incluiu, logo no mesmo ano, os retratos individuais de Camões (agora exposto) e D. Sebastião, e em grupo de Mário de Sá Carneiro, Santa Rita Pintor e Amadeo Souza-Cardoso (‘Lusitânia no Bairro Latino’ - na exposição do AMJP), ou Pessoa (‘Fernando Pessoa encontra D. Sebastião...’), em situações ou histórias livremente imaginadas, a par de três outras “pinturas de história”, sobre os presentes de D. Manuel ao Papa, as peregrinações de Fernão Mendes Pinto e a pregação de Santo António (“7 Histórias Portuguesas”, ed. Clássica Editora, exposição na Galeria 111, 1985). Por essa época tinha começado a ocupar-se com figuras míticas (Salomé, Leda, Actéon, o Julgamento de Paris, o Rapto de Europa) numa série de quadros ovais que foram expostos separadamente em Paris (Ellipses, Galerie Bellechasse, 1984). Vieram a ter larga sequência nas décadas seguintes, mas no final dos anos 80 as viagens do artista ao Brasil vieram outra vez substitui a ficção pela observação, nas figuras dos Mascarados e dos índios da Amazónia - regresso aos real.

*1985-Retrato de D Sebastiao com un espelho - cópiaRetrato de D Sebastião com um espelho, 1985


Entretanto, interrompendo em 1983-84 a série “O Corvo”, outro grupo de quatro poetas destinados ao revestimento em azulejo da estação Alto dos Moinhos (Lisboa) absorveu o pintor durante “um ano de desenho”. Tratou-se, por ordem cronológica, de Camões, Bocage e de novo Pessoa e Almada. Os retratos lineares em tamanho natural espontaneamente traçados e repetidos com variantes, a marcador sobre papel (quase sempre papel vegetal), acompanharam-se de motivos com que cada um se identifica (sereias e cupidos, espadachins, frades, gaivotas, arlequins e muito mais) numa extensíssima galeria de figuras que passaram a ocupar os átrios e corredores do Metro, alem de terem preenchido um dos pisos do Centre de Arte Moderna, em 1984. Couberam agora no Museu apenas dois retratos, Bocage e Pessoa, que foram acompanhados por um Becket (1987) e Dante (2006), o que é pouco - poderia ter-se feito a exposição em duas ou três partes.

 

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3. Depois de centrar a atenção nos grandes ciclos de retratos, podemos considerar outros períodos, no início e no fim do caminho, e alguns momentos ou pequenos conjuntos de obras também significativas.

 

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12/08/2020

MARCHA, 1952 (in progress)

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Nunca exposto até agora (1), e nunca referido, 'Marcha' é uma alegoria política e um retrato de grupo, onde retrospectivamente se destaca  a figura de José Dias Coelho, escultor e militante comunista que seria assassinado pela Pide em 1961. Bem reconhecível entre as figuras do jovem casal que avança em primeiro plano, ocupa um lugar central que correspondia na época à sua intervenção como artista e activista -- animava e coordenou as acções dos artistas do PCP nos primeiros anos 50 (ou já seria mesmo o respectivo “controleiro”, um controleiro não sectário, segundo J.P.). Em 1955 trocou uma carreira artística já reconhecida pela passagem à clandestinidade como responsável por uma oficina de falsificação de documentos.

A natureza política do quadro, que é de facto uma dimensão partidária, relaciona-o sem dúvida com as campanhas pela paz que o PCP promoveu nos anos de 1949-54, ao tempo da guerra da Coreia e da Guerra Fria, mobilizadas nomeadamente em acções de rua e abaixo-assinados de apoio ao "Apelo de Estocolmo" pela proibição das armas nucleares, lançado em 1950, e contra a reunião de Lisboa do Conselho do Atlântico em Fevereiro de 1952, depois da adesão portuguesa ter sido ratificada em Julho de 1949, acontecimentos que vieram dividir e alterar profundamente as dinâmicas da Oposição, antes tendencialmente unitária. Este é muito obviamente, numa pintura  clandestina (nunca divulgada, mesmo depois do 25 de Abril, por razões a interrogar), o lado comunista e pro-soviético de uma barricada semi-legal, residente num atelier e tertúlia activos num período de forte repressão policial e censória que decorreu durante e depois das candidaturas presidenciais de Norton de Matos e Rui Luís Gomes (1949 e 1951). E também na ocasião de um "desvio sectário" que conheceu grandes fracturas internas nos meios intelectuais e num PC debilitado por muitas prisões, o qual dá lugar a seguir ao chamado “desvio oportunista de direita” de 1956-59, após o relatório de Kruchov, depois “corrigido” pela fuga de Cunhal de Caxias, em 1961, na dramática pequena história ziguiezaguiante do anti-fascismo.

Se esta pintura panfletária não se considerar uma "obra prima", este não é um quadro menor, até pela coincidente ambição do assunto e do formato, e o encontro entre o manifesto e o retrato de grupo concede-lhe uma verdade, uma intensidade que é fusional com as qualidades formais que o  fazem seguramente uma das peças mais marcantes do neo-realismo, que aqui se  identifica com o realismo socialista sem concessão académica. É uma obra única na carreira do pintor (apesar de renovar o título da primeira Marcha de 1946), e é uma obra bem representativa de um tempo político e suas contingências, que, por sinal, continuou ser uma obra desconhecida - o artista nunca a procurou incluir nas suas antologias e a iconografia de Dias Coelho e do PCP nunca a recuperou.

Partindo da consideração da Marcha de 1952 é necessário tentar contrariar a desvalorização crítica das obras neo-realistas deste período (feita também pelo artista), e a partir daí rever a história habitual do movimento, dividindo-o em dois períodos diferentes, em especial quanto à obra do seu principal animador, intérprete e crítico. O segundo período, a partir de 1951 é sensível à orientação de uma ortodoxia partidária chegada de França no sentido de um realismo social de intervenção militante. Algumas obras-chave mostram-no e a Marcha é o seu emblema maior.

Depois das mostras individuais de 1950-51, em que Pomar reuniu pintores recentes e pintou outras para  ocasião - para além de apresentar cerâmicas e pequenas esculturas de barro com maior sucesso de mercado, renovadas na passagem da mostra de Lisboa para o Porto - , duas telas gémeas de 1951 mostram a continuidade da vertente que se pode dizer formalista e lírica, manifesta em Meninos no Jardim (O eixo corrido) e Vendedoras de estrelas. Mas logo se evidencia, ainda nesse ano, uma direcção que é ao mesmo tempo mais empenhada politicamente, renovando o programa realista e assumindo uma condição mais austera, trocando a fluência decorativa pela observação social e a afirmação política. É o caso das Mulheres na lota (Nazaré), ainda de 1951, depois da Marcha, a seguir de Os Carpinteiros e das duas peças maiores do Ciclo "Arroz", a que se acrescenta o retrato de Cardoso Pires, já de 1954. Só a confrontação partidária e a batalha ideológica (e crítica) de oposição aos realismos - no contexto da Guerra Fria e da oposição aos formulários naturalistas autoritários, nazis e estalinistas - veio ocultar estas obras maiores no curso da década de 50 e da carreira do pintor.

As novas condições da intervenção partidária afirmam-se com clareza na produção de uma série de gravuras dedicadas ao tema da Paz, o qual mobiliza o PC na legalidade possível.  A Mulheres Fugindo (conhecida como A Bomba Atómica) seguem-se as gravuras em que figura a pomba da paz proposta por Picasso como emblema da causa.

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A Marcha como retrato de grupo identifica sem o representar expressamente o atelier da Praça da Alegria (antigo atelier que foi de José Malhoa), alugado e chefiado pelo também escultor Vasco Pereira da Conceição, militante e recente ex-preso político, que é visto a entrar no bordo direito do quadro. Aí trabalharam também Maria Barreira, sua mulher representada pela Maternidade à direita baixa, um tema comum ao casal, e pelo menos Dias Coelho e Alice Jorge, que pouco depois iniciaria o relacionamento com Pomar. Lugar de trabalho e também de tertúlia artística e política, que alguém apontou como uma espécie de antecâmara das Exposições Gerais de Artes Plásticas (EGAPs ou Gerais, 1946-56), em cuja organização participava activamente Dias Coelho e que Pomar acompanhava assiduamente na imprensa, até um último artigo em 1953, de avaliação e redefinição do neo-realismo e também auto-crítica militante, em que trocou as publicações habituais pelo mais longínquo Comércio do Porto. Cessa então a colaboração nas revistas, sem se conhecer justificação para tal (sequelas da "polémica interna do neo-realismo", razões pessoais?) e sem ser ainda um afastamento político declarado. Em 1955 a sua pintura deixa de ser neo-realista (mas continuam na gravura as figuras do trabalho), ao cabo de dez anos de prática, e o movimento encerra-se pouco depois, numa última Geral retrospectiva quando se iniciava a era Gulbenkian.

No friso de retratos, ao lado do casal em primeiro plano, está o engenheiro Frederico Pinheiro Chagas, amigo e simpatizante, certamente encomendador e depois proprietário de sempre desta obra, e logo a sua mulher, Dina. O par alegórico dos jovens militantes de mão dada, encabeçando a Marcha, guiando o povo segundo uma tradição revolucionária que se partilha com os códigos da apologética religiosa, contou por modelos o carpinteiro Francisco Bento, saído da prisão pouco tempo antes, que frequentava o atelier e realizou mobiliário para vários camaradas, e ao lado, muito provavelmente, Zita Namora, mulher do escritor, do qual Dias Coelho realizou um busto em 1950-51, o que justificaria a sua passagem pelo atelier. Desta Zita existem fotografias do seu retrato esculpido por Pomar (uma encomenda?) e de um estudo para o quadro (imagens abaixo). De Pinheiro Chagas há também um excelente retrato desenhado. A menina à esquerda não foi identificada, ainda, mas será alguém em particular - a "presença" dos modelos retratados vem reforçar a força mobilizadora da alegoria.


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A alegoria tem como pólos simétricos a figura  da Maternidade à direita, como promessa de futuro, e o estranho personagem visto obliquamente de costas à esquerda, um (falso) profeta, um velho frade?, vendedor de ilusões, que aponta para uma cidade moderna, em construção, com guindastes, personagens hieráticos (robotizados?); ao fundo, montes áridos. De um lado, o passado e um ilusório presente, do outro a infância e o futuro. Na metade direita, por trás do friso das figuras está uma alongada parede ou casa vermelha, que toma o lugar de uma (im)possível bandeira. Talvez também se reconheça aí, mesmo em cima à direita, uma praia e um barco, amarelo e azul, que rimam ou se repetem em primeiro plano rasgando de luz o ventre e o vestido azul da mulher - e este é um elemento de composição de grande eficácia moderna.

A memória possível do atelier, o interesse pelo retrato e o contexto neo-realista devem ser evocados com detalhe para situar esta obra de excepção, bem como o seu lugar no âmbito da produção de Pomar da primeira metade da década, sinalizando a respectiva diversidade quando se aproxima o fim da sua prática neo-realista.

O atelier da Praça da Alegria, no nº 47, ao que parece, situado entre o Maxime e o Hot Club, ao lado de uma leitaria, era também frequentado por escritores: José Cardoso Pires, com os  primeiros livros e grande actividade política, que aí conheceu em 1954 a sua mulher, Edite, irmã de Vasco da Conceição, por ocasião do retrato que Pomar pintava, sendo ela retratada por Alice Jorge no ano seguinte; Orlando da Costa, que aí levou Maria Antónia Palla; Alexandre Cabral, amigo do engenheiro, e outros mais. Esses primeiros anos da década de 50 conheciam uma grande tensão ideológica, a dissidência titista e "browderista" de Piteira Santos, Mário Soares e os Lyon de Castro, associada à denúncia pelo PC do jornal Ler da Europa-América; o debate sobre estética e as fracturas no campo neo-realista, centrado no controle da Vértice; a saída de Mário Dionísio do partido em 1953 e a recusa de continuar a participar nas Gerais, a partir de 54, após a alargada participação nacional na II Bienal de São Paulo enviada pelo SNI no ano anterior. Em 1952 a SNBA esteve encerrada depois de Eduardo Malta ter sido expulso de sócio “pela provocação que encenou contra José Dias Coelho, que encabeçava esta batalha” pela renovação dos júris (2). O atelier da Praça da Alegria era um lugar "ortodoxo" sujeito à pressão do realismo socialista de informação francesa, via Arts de France (a sua "Tribune du Nouveau Réalisme" surge em 1949 e a revista desaparece em 1951), que se ia abatendo sobre a originalidade e a irreverência do primeiro neo-realismo.

Tentando estabelecer um panorama da época, os livros então ilustrados por Júlio Pomar dão um retrato das relações literárias marcadas pela cumplicidade política e pessoal: Carlos de Oliveira (retrato de 1948); Sidónio Muralha e Cardoso Pires (desenhos de 1949, 1950); Alves Redol, Raul de Carvalho e Ferreira de Castro (1949); Mário Dionísio, José Fernandes Fafe, Eugénio de Andrade, Ilse Losa, Orlando da Costa (todos com retratos desenhados para as tiragens especiais de 40 exemplares da col. Cancioneiro Geral do Centro Bibliográfico, 1950/1953); e Alexandre Cabral (1955). As grandes encomendas editoriais da Fólio (de Victor Palla e Cardoso Pires), Sul (de Castro Soromenho), Realizações Artis (de Rogério de Freitas e Leão Penedo), Bertrand, Minotauro (Urbano Tavares Rodrigues), Cor e Portugália virão depois (1957-1967).

Além da escrita e do desenho para a imprensa, da ilustração e da cerâmica, têm relevância na actividade de Pomar (afastado do ensino em 1949) as encomendas para decoração e a escultura (a pintura era pouca, ao tempo, num mercado apenas de amigos), em retratos e em peças decorativas, que se expunham nas Gerais (assinalam-se adiante com *) e foram desaparecendo ou esquecendo-se em destinos privados: retratara em escultura a sua mulher, Maria Berta, em 1949*, e também os escritores Sidónio Muralha*, 1950, e António Navarro, 1951 (Salão de Outono), obras presentes na actual exposição, igualmente Armindo Rodrigues, 1951*, ficando-se por aí as peças com qualidade moderna, não convencionais. Conhecem-se apenas mais quatro “cabeças”, duas de amigos (Ana Moura*, mulher de Rui de Moura, editor, depois Prelo) e Joaquim Barata* (fundador da Gravura) e as outras (Zita e Liliana, 1951) talvez de encomenda. À escultura só voltará com os ferros soldados do ciclo Dom Quixote, em 1960. Fez também, em 1954, os retratos pintados de Cardoso Pires e Maria Lamas (esta presa pouco antes, no regresso de Moscovo, e o retrato indicado no catálogo da VIII Geral não terá certamente sido exposto, dado o contexto repressivo) - a que se acrescentam os de Vera Azancot (tradutora, 1954*), Alice Jorge (1955), Maria José Salvador (1956, mulher de Manuel Torres, amigo, parceiro de viagens de automóvel e fundador da Gravura). É já de 1958 uma outra encomenda isolada, João Duarte, para a Companhia de Seguros Comércio e Indústria, agora no BCP, que só terá continuidade dez anos depois mas bem diferente.

Por seu lado, José Dias Coelho (n. 1923), que entrara no mesmo ano de 1942 na Escola de Lisboa, apresentou nas Gerais retratos de Rolando Sá Nogueira, 1949; M.T. (Margarida Tengarrinha), 1950; Alves Redol, 1951; M.E.C. (Maria Eugénia Cunhal), 1953; Maria Isabel Aboim Inglês, 1954, entre outros não nomeados. Realizou também os bustos de Fernando Namora e do designer Tomás de Figueiredo. Aliás, o retrato teve sempre uma forte presença nas Gerais. Aí expostos ou não, o catálogo “Um tempo e um lugar” (3)  refere ou reproduz obras de Abel Manta (Bento Caraça, 1947), Sá Nogueira (Frederico George e Jorge Vieira de c. 1949), Maria Keil (Abel Manta*, 1949), Vasco da Conceição ("cabeças" de Maria Barreira*, Sidónio Muralha* e Lopes Graça, 1950*); Victor Palla (Cardoso Pires, 1951), Mário Dionísio (Joaquim Namorado* e Eduarda D.*, 1953), Lima de Freitas (Alves Redol*, 1953, Cardoso Pires*, 1954), Alice Jorge (Edite Cardoso Pires*?, 1955), e também de.João Abel Manta, Arlindo Vicente (João Gaspar Simões, sd), José Farinha (Alves Redol, escultura s.d.), Euclides Vaz, entre outros retratos indicados sem nomes dos modelos.

 

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Armindo Rodrigues 1951 de Pomar (col. part.) e Fernando Namora,  de J. D.  Coelho 1951, bronze (col.Museu Gulbenkian)



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 Picasso, Maurice Thorez 1945 / Fougeron, retrato da mãe de Thorez, e Picasso,  Thorez, croquis 1949 (Art de France 1949) / Boris Taslitzky, A morte de Danielle Casanova

Além da permanência das práticas realistas, a disciplina do retrato era então recomendada ou imposta pelos partidos comunistas num período de maior pressão da ortodoxia (e do culto da personalidade, especialmente em França) - a pintura de história também se impunha mas foi naturalmente mais rara entre nós. Esse é um contexto que seguramente penalizou a respectiva continuidade em anos seguintes, e alguns episódios polémicos tiveram retratos por pretexto (foi famoso o caso do Stalin de Picasso, nas Lettres Françaises, à data da sua morte...), num período em que o combate aos realismos, depois das normas nazis e soviéticas, fazia parte do enfrentamento entre os blocos da Guerra Fria. Depois de Picasso, Freud e Bacon, Hockney e Kitaj, Arikha, entre os maiores, iriam a seguir prosseguir e reafirmar a centralidade do retrato na arte do século XX.

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Para o grande formato de Marcha, único ao tempo - 122 x 199 cm, têmpera sobre aglomerado - Pomar usou uma placa de madeira da mesma série de três outras tábuas que pintou para o restaurante Vera Cruz, na Avenida da Liberdade, projecto de Victor Palla e Costa Martins, com quem Pomar manteve várias colaborações (elas passaram depois para o restaurante Tarantela, no  largo da Estefânea, e dispersaram-se nos anos 90). A vocação decorativa de referência brasileira realiza-se aí com códigos de pintura mural, o que também ocorre nesta Marcha, embora esta de ambição panfletária, num figurino apologético onde a condição de retrato de grupo e a alegoria asseguram maior complexidade.

A campanha pela Paz está presente em três gravuras de 1951 que tiveram muito grande difusão e marcaram presença nas casas dos intelectuais da Oposição de feição comunista. Mulheres Fugindo, conhecida como A Bomba Atómica e A Explosão, seguida por outras onde já está presente a pomba  que em 1949 Picasso promovera da iconografia cristã a símbolo da Paz no cartaz para o Congresso de Paris. Pouco depois, em agosto de 1949, a URSS detonou a sua 1ª bomba nuclear; em março de 1950 o Comité Permanente dos Partidários da Paz lança o Apelo de Estocolmo pela proibição das armas nucleares,

PicassoPomba 1951


 

 

 

 

 

 

Outra obra que alude às campanhas da paz e certamente à Coreia é A Vida ou a Morte (conhecido também como Guerra e Paz), datada de 1953 e exposto nesse ano na VII Exp. Geral. O Massacre na Coreia, de Picasso, 1951, poderá ser uma referência reconhecível, condensando-se o grupo das mulheres numa única figura maternal e esquematizando a marcha militar até à caricatura, numa composição decorativa.

*A Vida ou a morte 380k
Picasso Coreia

 

Mas a produção militante de Pomar é acompanhada no mesmo ano da Marcha por obras de feição bem distinta e também de direcção inédita na sua produção, a paisagem, numa coincidência que reflecte a manifesta diversidade das interesses - mas nenhum destes quadros terá sido exposto no seu tempo próprio:
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NOTAS
1 reproduzido talvez pela 1ª vez no Catálogo Raisonné vol I, 2004, nº 86, o quadro nunca antes terá sido dado a conhecer e não faz parte da iconografia do PCP.

 

 

 

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12/06/2020

Júlio Pomar. Estampas: Itinerário. Inventário


Quando o convidaram a expor uma antologia das suas estampas ("Pomar - Obra Gráfica", Fórum da Maia, 1998), o autor distribuiu-as por cinco "linhas temáticas": O Povo, A Festa, Eros, Animais Sábios e Ficções. Também poderiam servir para catalogar toda a sua obra, só acrescentando os retratos, que estão agora em exposição no Atelier-Museu com o seu nome. A fórmula continuou a ser usada em reedições itinerantes da mostra, até 2003, justificada assim pelo artista: "uma tentativa de arrumação, salientando o que, ao longo dos anos e sob várias formas, foi de uma maneira ou de outra marcando a obra" (prefácio na reedição de 1999, Leiria). Uma outra arrumação posterior, proposta por Marcelin Pleynet sumariou toda a sua produção de outro modo, próximo: Identidade/Identidades (auto-retratos e retratos); Lugar/Mundo (aqui coube a paisagem e as secções Povo e Festa, muito alargadas, incluindo as pinturas sobre Maio 68); Eros; Animais de Companhia (os Sábios e outros); Fábulas Fintadas (as Ficções) – em "Pomar - Autobiografia", ed. Sintra Museu de Arte Moderna Colecção Berardo / Assírio & Alvim, 2004.



Aquele primeiro índice oferecia direcções de leitura das obras reunidas, que abrangiam cinco décadas de actividade na área da produção de múltiplos impressos (gravados ou estampados - e foram quase oito décadas no total), mas também recusava a catalogação por especificidades técnicas, gravura e serigrafia, ou mais especificadamente, quanto à gravura, pelos seus processos: linogravura, xilogravura, água tinta ou água forte, litografia e outros. Justamente, importavam mais os assuntos que as fronteiras.

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G21_Fot.Museu_Arroz II:1954Arroz II 1954, linóleo / Mono Sábio 1962, Xilogravura a cores


 2.  Lembrou Pomar no prefácio de 1999 já citado que a obra gráfica então exposta se dividia em dois períodos distintos. O primeiro ia no catálogo de 1951 a 1963 (e poderia começar antes, em 1948, com os linóleos iniciais), acrescentando que a prática da "gravura de autor" coincidia na sua quase totalidade com a participação na fundação e dinamização da GRAVURA - Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, em 1956. De facto, antes da GRAVURA já se envolvera na criação e promoção do que se chamava "gravura contemporânea", começada esta em exposições colectivas e em artigos na imprensa sobre "essa desconhecida, que é a gravura original" (1), a "estampa original"  -  dizia então que "a gravura e o mural aparecem aos artistas empenhados na conquista de um novo realismo como os dois veículos mais fecundos"  (2)
Foram anteriores à GRAVURA algumas edições com grandes tiragens que se encontravam em todas as casas da Oposição e hoje são raras: "Mulheres Fugindo" (A bomba atómica), "Menina e Pombas", "A Refeição do Menino" – então chamada "Família" –, todas elas de 1951, distribuídas nomeadamente pela SEN, Sociedade Editora Norte, no Porto, e próprias das campanhas pela Paz de um dos lados da Guerra Fria, que então se agudizava: a pomba da Paz que Picasso popularizou quando do Congresso Mundial de Paris de 1949 está presente em quatro versões. E também antecederam a GRAVURA as três figuras do ciclo "Arroz", associadas a Vila Franca de Xira, já de 1954.

No catálogo geral da sua obra gráfica, de 2015 (3), contaram-se como gravuras 116 estampas, sendo 32 anteriores à GRAVURA e 13 as respectivas edições distribuídas aos associados, até 1965, sendo os outros números recenseados edições do autor (às vezes em 5, 15 ou 30 exemplares) e alguns provas de ensaio e de trabalho, talvez sem tiragem ou ela é desconhecida. À época não se guardavam registos. A propósito, note-se que desde início a gravura apareceu também associada à ilustração e à arte do livro, incluída em edições ou tiragens especiais, que se usava lançar em fascículos: duas primeiras "Tauromaquias" eram litografias coloridas à mão, de 1950, agora expostas pela primeira vez, com uma condição alegórica que precedeu a observação directa; três litografias para o "Romance de Camilo" de Aquilino Ribeiro (1955-57); doze litografias para o "Grande Fabulário de Portugal e Brasil" (1958-1962); doze xilogravuras para "A Divina Comédia - O Purgatório" de Dante (1961-62).

Num levantamento por temas, as tauromaquias acontecem em maior número, onze, desde 1961, precedidas por três touros de 1959-60, continuando-se na longa série de pinturas, até 1964, já em Paris. As presenças do mar, da praia, pesca, lota e mercado são 14 num total que vai com grande diversidade formal desde de 1951 (Pescadores) e 1952 (Nazaré) até 1959-60 com o Sargaço, passando pela Ribeira de Lisboa (1953 e 57) e a Mulher do Mar (1956) que valeu o Prémio Gulbenkian. Na pintura abandonava o neo-realismo mas a representação das figuras do trabalho continuou a ser predominante (sem operários, existem o vidreiro, o saltimbanco, um camponês, para além do breve ciclo "Arroz"). A série da viagem às Astúrias teve quatro  números, de visita a um arcaico mundo rural, em 1957-58. São tantos como os nus de 1958-61, que não eram uma novidade; publicou e expôs outros nus desenhados desde 1948, logo com alguma polémica interna ao meio da crítica.

Dom Quixote formou uma série de 6 edições (1959-61), paralela a pinturas e esculturas, por ocasião das ilustrações para a edição Bertrand da tradução de Aquilino Ribeiro (1960), e autonomizando-se delas. Está também presente todo um bestiário, espaçadamente desde 1952, assim discriminado só em figuras isoladas, talvez em muitos casos certamente sem haver tiragens, ou desconhecidas, só pelo gosto de gravar, em geral em placas de pequeno formato: elefante, javali, dois gnus, porco-espinho, burro, peru (em 450 exemplares para oferta da GRAVURA a todos os sócios, em 1957),  depois a hiena, três símios (com o famoso mono-sábio, de que houve um quadro de 1961), galo, papagaio, além dos touros...

 

3. O segundo período iniciou-se mais de 10 anos depois da instalação em Paris, compreendendo serigrafias e litografias que foram "interpretando e divulgando algumas obras, as quais foram trabalhadas em ateliers especializados de Paris, Lisboa e Barcelona por iniciativa de vários editores" (Pomar 1999, op.cit.) A partida para Paris data de 1963, e a pintura absorveu-o por completo. As primeiras edições apareceram só em 1974: Kompass de Lisboa, ligada à 111; Éditions Art Moderne / Galerie Belechasse, de Paris; e Joaquim Vital, que com as suas Éditions de la Différence iria continuar até 2004 a ser responsável por numerosos projectos associados à ilustração, ou não.
No total, este tempo longo teve 175 edições, sem contar as extensas séries do "Catch" (a luta livre francesa, desenhos de 1965 litografados em 1978) e "Jogos de Praia/ Jeux de Plage" (Cenas de praia, Costa da Caparica, Setembro 1963-2001), com 34 e 16 folhas respectivamente. Depois do catálogo encerrado em 2015 aconteceram mais dois ou três números.

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La chambre Noire 1976, serigrafia


Destacam-se neste conjunto as edições que formam álbuns de grande formato (apresentados em pastas ou caixas), próprios do mercado internacional: "Le Livre des Quatre Corbeaux", sobre um poema de Edgar Pöe, The Raven / O Corvo, e retratos dos seus tradutores, Baudelaire, Mallarmé e Pessoa (ed. La Différence 1985); "4 Tigres", serigrafias com colagens (F. X. Lovat 1994); "Les Quatre Singes" (Différence, 1997); "Marujos & Cia / Marins et Cie", onde cruzou a Ode Marítima de Álvaro de Campos com Ulisses (Del Fiore Edition 1999). E também a série "L'Équipée de La Chasse au Snark", a partir de Lewis Carroll (Différence 1999) cujas estampas foram distribuída avulso, ou o volume "La Mémoire du Sel / Le Sel de la Mémoire", de parceria com Claude-Michel Cluny, com sete Mães Índias de um regresso à Amazónia por via de Pero Vaz de Caminha (Différence 2003; acompanhando a exposição de pinturas «Méridiennes - Mères Indiennes», Galerie Patrice Trigano 2004). E ainda alguns projectos interrompidos de Joaquim Vital: as litografias que acompanhariam as ilustrações de "Kadama Vivila", poesias eróticas, sotádicas, de Gilbert Lely, biógrafo de Sade, em 1977 (quatro em sete previstas, que agora se expõem certamente pela primeira vez e não figuraram no catálogo de 2015); mais a referida série "Catch", distribuída numa caixa original só em 2014. Em dois casos maiores, o Corvo e o Snark, a criação dos múltiplos acompanhou as séries de pinturas, de que nunca são meras reproduções, surgidas de convites para ilustrações, mas excedendo-os em muito, como acontecera décadas antes com a série sobre Quixote, motivada pela tradução de Aquilino Ribeiro (Bertrand, 1960).

A  produção foi tematicamente muito diversificada, mas podem apontar-se 16 edições de 1974 a 1979 próprias do ciclo "L'Espace d'Éros"; onze ou doze tigres, desde 1980; onze variantes dos indios do Xingu, sem contar as já referidas Mães, bem como regressos pontuais aos temas de D. Quixote, tauromaquias, corridas de cavalos, em edições originais. Foram reproduzidas e/ou reinterpretadas obras várias com datas que recuam de 1944 a 1973, que se incluiram num capítulo intitulado Anexo na edição da Obra Gráfica completa, separando-se das serigrafias iniciadas em 1974.

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serigrafias originais criadas por ocasião da  inauguração do Atelier-Museu Júlio Pomar, 2013. Burro tocando guitarra e Burro tocando guitarra (Ó fartar vilanagem)

4. Voltando a lembrar as secções e as obras escolhidas da antiga antologia, O Povo acolhia "a "produção chamada neo-realista", como escreveu Pomar, completada a propósito com uma edição comemorativa do 25 de Abril. Era uma breve síntese das figuras do trabalho - da lota e do mercado, do sargaço, mulheres quase sempre.
A Festa inclui as tauromaquias (a festa brava), de 1961-63, mas também a série dos Índios do Xingu, de 1990, acrescentada em 1998 com os banhos das crianças no rio. Informava o artista em 1999 "que [a Festa] começa a desenhar-se dentro deste período [neo-realista], marca o seu fim, e reaparece em momentos vários até à actualidade".
A terceira série, "sob o signo de Eros", data de 1974-79, ao tempo de uma nova linguagem de formas recortadas e cores planas com que construiu o seu "teatro do corpo", mas poderia começar com os nus gravados nos anos 1958-59. Eros atravessa toda a obra.
Os Animais Sábios percorrem a representação animalista, como se dizia, desde o "Touro" de 1960 aos porcos do final da década de 1990, passando por macacos de várias espécies e épocas, os corvos (os do poema de Edgar Pöe e os que acompanharam Bocage no metro do Alto dos Moinhos – Camões teve pombas e Pessoa gaivotas). E também os tigres, nascidos de um conto de Jorge Luis Borges.
Eram já exemplos do "gosto de efabular", diz o artista, gosto se acentua na série final, Ficções, que ilustra a continuada relação de Pomar com a literatura e inclui os "Retratos Imaginários", com circulação mais tardia pelos territórios dos mitos. Primeiro os D. Quixote, de 1959-60 e outra vez em 1998, depois Camões e Fernando Pessoa, Adão e Eva, Ulisses e as sereias, Hércules e o Centauro, o Snark, etc.

Toda a Obra Gráfica de Júlio Pomar foi reunida num volume com esse título, ed. Caleidoscópio 2015. Com coordenação e  texto de Mariana Pinto dos Santos e pesquisa e catalogação de Alexandre Pomar.

Serigr_blason_CR306_1MTigre azul

Blason / Brasão e Tigre azul, 
1980-2001

 

5. Porque se imprimem estampas? Os objectos e as suas designações (gravura, serigrafia, etc) prestam-se a diversos equívocos, por flutuações conceptuais e falta de fixação de terminologia específica. Estampa usa-se em espanhol e francês, print e printmaking em inglês, grafik em alemão, incluindo "as várias formas de criação artística que envolvam qualquer técnica de impressão". Gráfica Popular era nos anos 1950 o inspirador exemplo mexicano; em Espanha chamou-se Estampa Popular o grande movimento de gravadores que investiu a abertura política a partir de 1960, como uma GRAVURA da esquerda militante. A palavra gravura toma a parte pelo todo, e agora, ao contrário, chama-se por vezes serigrafia a tudo. Uns desvalorizam os múltiplos como cópias e reproduções, o que é muitas vezes errado, outros referem-se-lhes como quadros. A simultânea condição de original e de múltiplo – própria da estampa de autor, tal como da escultura em bronze, da prova fotográfica e de outras obras de arte que partem de um matriz ou de um molde, de um negativo ou ficheiro informático –, é mal entendida: o curso da ideia de reprodutibilidade técnica de Walter Benjamin, que quis com ela valorizar a fotografia e o cinema, contrariando a aura e a unicidade da obra de arte, ou a esta atribuída pela estética convencional, não ajuda. Estampa original, estampa de interpretação, de reprodução, estampa tipográfica, etc., qualificam criações e produtos diferentes no mesmo campo da multiplicação de imagens, em geral sobre papel. Também se chama gravuras às figuras incisas nas pedras de Foz Côa. E "obra gráfica" pode incluir o desenho, como ensinou o professor Hellmut Wohl na exposição "Júlio Pomar. A Comédia Humana" (CCB 2005).

Produzem-se gravuras e serigrafias, estampas, para multiplicar o acesso à criação de um artista através da edição de originais em tiragens limitadas e numeradas (prática regulada só no final do século XIX, por razões de mercado). Associam-se assim a divulgação e um coleccionismo acessível. Trata-se sempre da possibilidade de democratização da arte, de a tornar acessível a um maior número, a que no tempo neo-realista se dava um sentido político de militância, entretanto desvanecido.

Também para experimentar um outro campo de práticas, técnicas ou processos de criação, ao lado e diferentemente da pintura de cavalete ou mural, e do desenho (a lápis, pena, marcador, etc.) – e igualmente da escultura nas suas várias possibilidades, da cerâmica, do vidro, da tapeçaria e do vitral, que Pomar praticou. Talhar um bloco de madeira e rasgar uma chapa com ácido são práticas manuais (artísticas) que proporcionam resultados (imagens, traços, texturas, colorações) diversos dos do uso do pincel sobre tela, do lápis sobre o papel. É um exercício diferente, paralelo e autónomo, de experimentação e de criação, com que se pode estabelecer um diálogo com a pintura e o desenho mutuamente produtivo.

E para explorar um mercado mais acessível que o da pintura – por razões económicas, portanto, causa tantas vezes ocultada em matérias de arte. A criação da GRAVURA, para além de potenciar a divulgação de obras e de fornecer acesso colectivo a meios técnicos e aprendizagens, um atelier e uma escola, veio assegurar melhores condições de existência oficinal e material aos artistas, e no caso de Pomar veio exactamente suceder à produção de cerâmica (no Bombarral e nas Caldas da Rainha) que era, desde as primeiras mostras individuais, muito mais vendável que a pintura. Do artista-impressor ao serígrafo registou-se uma mudança marcada pela distância criativa e a intermediação técnica sujeita à facilidade da multiplicação, que acabou por fragilizar a produção e favorecer o mercado dos cromos. (A ordem das respostas não é aqui fixa.)

Captura de ecrã 2020-12-10  às 19.45.12O banho das crianças no rio Tutuari II, 1997-1999

  1. "Exposição de gravuras modernas na Associação Académica da Faculdade de Letras de Lisboa, in Vértice nº 113, Janeiro 1953, reed em Júlio Pomar, Notas sobre uma arte útil, p. 242.
  2. "Gravuras Gauchas", Vértice, nº 117 Maio 1953, op. cit. p. 259. Sobre gravura ver também "Encontro com Méndez", Vértice nº 67, Março  1949, p. 158, e "Uma grande artista alemã em Lisboa" (Greetchen Wohlwill), Arquitectura nº 45, Novembro 1952, p. 233.

Versão revista e ampliada do texto publicado no catálogo da exposição "Júlio Pomar- A obra gráfica numa coleção privada", que apresenta peçasa da colecção do galerista Paulo Nunes, no Museu do Neo-Realismo em Vila Franca de Xira (28 nov. - 23 maio 2021)

2 jan 21

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11/10/2020

o surrealismo minhoto em 2001 (memória)

Exposição do surrealismo provoca polémica

Óscar Faria / PÚBLICO
7 de Novembro de 2001

Com a presença do pintor e poeta Mário Cesariny, e com muita polémica à mistura, foi inaugurada no passado domingo, na Fundação Cupertino de Miranda (FCM), em V. N. Famalicão, a mostra "Do Surrealismo em Portugal", uma versão revista e aumentada da exposição "Surrealismo em Portugal 1934-1952", que esteve patente no Museu do Chiado (MC), em Lisboa, até ao passado dia 23 de Setembro, após ter passado pelo MEIAC [Museu Estremenho e Ibero Americano de Arte Contemporânea] . O que estava previsto era uma simples itinerância da exposição do Chiado, comissariada por Maria de Jesus Ávila e Perfecto E. Cuadrado. Mas uma série de peripécias - desde a recusa de Cesariny em que as suas obras coabitassem com as do alegado "fascista" António Pedro, até desentendimentos vários entre Maria Jesus Ávila e o director artístico da FCM, Bernardo Pinto de Almeida - levaram a que a fundação famalicense decidisse promover a sua própria mostra, comissariada apenas por Perfecto Cuadrado. Em causa está não só o alegado "progressivo afastamento do Museu do Chiado (MC), que se saldou pela não comparência de uma das comissárias da mostra, Maria de Jesus Ávila, funcionária daquele Museu lisboeta, apesar do acordo quanto à sua presença estar há muito formalmente garantido" - como se faz notar numa nota lida à imprensa por Bernardo Pinto de Almeida -, mas também a inclusão de obras de António Pedro, artista que Cesariny considera ter sido fascista até 1944 (ver caixa). Jesus Ávila responde à letra, afirmando que Cesariny é quem tem uma "atitude fascista" ao condicionar a sua presença na exposição à retirada dos trabalhos realizados por António Pedro antes deste advogar a causa dos Aliados. Pinto de Almeida diz que, a quatro dias da sua inauguração, a mostra foi deixada à responsabilidade da FCM. "A exposição que hoje vos apresentamos, reorganizada pelo nosso amigo e colaborador e também seu comissário desde o início, Perfecto Cuadrado, não será pois a mesma que se viu no MEIAC, em Badajoz, nem no Chiado". O director artístico da FCM acrescenta que "ela aparece reorganizada por nova montagem e pela presença possível de outras obras, também da nossa colecção ou de amigos próximos, que eliminam o que julgámos injustas exclusões de nomes e obras fundamentais do Surrealismo em Portugal". E conclui: "Esta é, pois, a 'nossa' exposição, a possível, com os meios de que dispunhamos, face a uma situação de surpresa que nada fizemos para desencadear".Maria de Jesus Ávila replica que a FCM "confunde a produção de uma exposição e o seu comissariado" e diz que o modo como a FCM lidou com o processo foi "o caos absoluto". A responsável pela área plástica da exposição - Perfecto Cuadrado organizou o núcleo literário - sublinha que no passado dia 29 de Outubro enviou, a pedido de Pinto de Almeida, uma carta à FCM onde reforçava a sua disponibilidade para acompanhar a montagem da mostra, fazendo também notar que o preço por esse serviço era de 300 contos, uma verba que, segundo a curadora, o director artístico não podia garantir sem o aval da administração. "Não obtive notícias até quarta-feira - dia em que já deveria estar em Famalicão -, quando foi enviada uma resposta não a mim, mas a Pedro Lapa [director do MC]", afirma a comissária, que garante ter estado sempre contactável. "Houve falta de respeito pelo meu trabalho e decidi não ir ". Recorde-se que a exposição "Surrealismo em Portugal1934-1952" foi co-produzida pelo MEIAC e pelo MC, a partir de um trabalho de pesquisa de Maria de Jesus Ávila. Esta afirma ter sempre contado com uma atitude colaborante de Cesariny e Cruzeiro Seixas, entre outros artistas, e garante que "se tivesse estado em Famalicão, nunca teria permitido que se mudasse o conteúdo da mostra"."Qual é o direito que acolhe à fundação e a Bernardo Pinto de Almeida de alterar o conteúdo de uma exposição?", interroga a comissária, frisando que o problema "não passa apenas pelo atropelamento da noção de autoria, algo gravíssimo em si, mas também pelo facto de esta ser uma outra exposição". Relativamente à versão apresentada no MC, a mostra patente na FCM propõe efectivamente uma outra visão do surrealismo em Portugal, saindo dos limites cronológicos da mostra original e incluindo quer trabalhos de artistas considerados antecessores do movimento, como Júlio e Mário Eloy, quer de autores que de alguma forma terão ido beber aos ensinamentos surrealistas: Paula Rego, António Areal, Ana Hatherly, António Quadros, Mário Botas, Raul Perez e Gonçalo Duarte.Pinto de Almeida assume as escolhas de Perfecto E. Cuadrado como suas, referindo-se a esta atitude como uma "posição ética" que cumpre a vontade do surrealismo de "permanecer vivo enquanto utopia". O director artístico da instituição famalicense não recusa a polémica, considerando-a mesmo "saudável e útil, até porque o surrealismo nunca fugiu ao combate". O também responsável pelo Centro de Estudos do Surrealismo considera "completamente arbitrária" a datação da mostra do Chiado, que entende como uma "tentativa obscurantista de encerrar o surrealismo português num espartilho que o diminui e restringe na sua acção".Por seu lado, Pedro Lapa, director do Museu do Chiado, designa como "calúnia" o facto de se afirmar que a presença de Jesus Ávila em Famalicão estava há muito formalmente garantida. "Não houve formalização nenhuma da presença dos comissários na FCM". Na opinião de Maria de Jesus Ávila, "se Bernardo Pinto de Almeida queria outra exposição, então a FCM devia ter documentado, investigado e produzido a sua mostra". Defendendo que "há um rigor histórico que teria de ser salvaguardado", desabafa: "Isto não acontece em parte nenhuma do mundo".

 2

 

Negociação com o IPM leva ao encerramento da exposição do surrealismo em Famalicão

Óscar Faria*
28 de Novembro de 2001,
 
Negociações entre o Conselho de Administração da Fundação Cupertino de Miranda (FCM), de Vila Nova de Famalicão, e o Instituto Português de Museus (IPM) levaram anteontem ao final do dia ao encerramento da exposição "Do Surrealismo em Portugal", que deveria ficar patente na instituição até 16 de Dezembro próximo. Este é o desfecho de uma situação polémica, provocada pela alteração dos conteúdos da mostra "Surrealismo em Portugal, 1934-1952", que foi co-produzida pelo Museu do Chiado, de Lisboa, e pelo Museu Estremenho e Ibero Americano de Arte Contemporânea (MEIAC), de Badajoz. Assumida por um dos comissários da exposição, Perfecto E. Cuadrado, com a solidariedade de Bernardo Pinto de Almeida, director artístico da FCM, a revisão consistiu na retirada de alguns trabalhos de António Pedro e a inclusão de obras que rompiam claramente com a datação proposta por Cuadrado e Maria de Jesus Ávila, os autores do projecto original.Segundo Raquel Henriques da Silva, directora do IPM, a decisão quanto ao encerramento da exposição foi tomada em conjunto com a instituição famalicense: "A proposta foi feita pelo Conselho de Administração da fundação, e eu concordei, pois a situação era dificilmente gerível". Na opinião da responsável do IPM, "o que se tinha passado era inaceitável do ponto de vista institucional", referindo-se à alteração da exposição que chegou a Famalicão para uma simples itinerância e viu o seu conteúdo alterado, através da retirada das obras de António Pedro, "com o argumento de que era fascista", e o aumento do período cronológico que abrangia até à contemporaneidade, com obras de artistas como Paula Rego. "A exposição foi corrigida e aumentada e isso foi proclamado publicamente", sublinha.Por seu lado, Pedro Lapa, director do Museu do Chiado, considera que a atitude da FCM é "a mais coerente, a mais digna, a única possível para salvaguardar o bom nome da instituição". Para aquele director, o fecho antecipado da mostra "era a única forma de repor o seu sentido", notando ainda que, se a FCM está interessada numa outra exposição acerca do surrealismo português, deve realizar um trabalho de investigação e apresentar depois a sua visão de uma forma fundamentada. "Em termos pessoais, lamento o incidente; Portugal tem muito a aprender acerca da forma mais correcta, deontológica e legal de funcionar com assuntos museológicos." E termina dizendo: "A exposição segue dentro de momentos em Madrid", onde será inaugurada a 8 de Janeiro, no Círculo de Belas-Artes, "e a FCM já adiantou que emprestava todas as peças da sua colecção para serem apresentadas na capital espanhola". O PÚBLICO tentou contactar a administração da FCM, que remeteu a sua resposta para a próxima semana. Por seu lado, Bernardo Pinto de Almeida refere o facto de a decisão ter sido "tomada a nível superior e, como tal, não tenho de a comentar". E adiciona: "A minha consciência está tranquila". Recorde-se que, em comunicado anterior a este desfecho da polémica, o Museu do Chiado e o MEIAC consideraram as alterações introduzidas na exposição "um ultraje" aos direitos de autor da comissária Maria de Jesus Ávila. Como resposta, Pinto de Almeida reconheceu na altura ter redigido "com precipitação" uma nota de imprensa onde, em nome pessoal, defendeu a exposição apresentada na FCM, "ligeiramente transformada relativamente às primeiras versões por um dos seus comissários, prof. Perfecto Cuadrado". Na origem da retirada das três obras de António Pedro - "Le crachat embelli" (1934), "Refoulement" (1936) e "Dança da Roda" (1936), obras que Maria de Jesus Ávila considera que são o primeiro confronto do público português com o surrealismo - está uma exigência do pintor e poeta Mário Cesariny, que recusou a convivência das suas obras com as do "fascista" António Pedro. *com Emília Monteiro e Isabel Salema
 


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10/13/2020

Cultura, culturas (depois de ler Hugues de Varine

A propósito do texto do Hugues de Varine e de reflexões que originou:
 
A cultura profissionalizou-se, e desdobrou espaço para profissões anexas e acessórias..., mas apagou muitas outras profissões que eram as das artes menores e/ou artesanatos (os fingidores, canteiros-escultores, estucadores-artistas, pintores-decoradores, marceneiros-entalhadores, etc - em muitos casos profissões recentemente em vias de recuperação muito qualificada). E estrangulou (quase) os praticantes amadores, inviabilizou as suas associações, sociedades, clubes.
A cultura abriu empregos com despudorado voluntarismo oficial, quando outros empregos se fechavam nos sectores produtivos, para artistas e animadores, comissários, guias e guardas e muitos parasitas acomodatícios, mas também para técnicos, enquanto se estrangulava o espaço da crítica e se disciplinavam investigadores - em geral, eram antes amadores ou sub-empregados com profissões paralelas. Com a deslocalização e abandono de sectores produtivos, empurraram-se inúmeros jovens para todas e quaisquer áreas artísticas, e para isso foi preciso abdicar de exigentes exames de acesso às escolas e carreiras e por consequência de exigentes actividades críticas (levando à letra ideias da anti-arte e pervertendo a tese comum e certa de que todos somos artistas, mais ou menos aptos, ou outsider's, amadores, de domingo, espontâneos, tardios etc). Fazer artistas era fazer desempregados com auto-estima (defendi essa tese num colóquio de economistas), “naturalmente" isolados e não reivindicativos, porque pode falar-se em rigor de mais ou menos sucesso, que é no essencial uma avaliação íntima, mas não de exploração.
 
O primeiro caminho está em vias de reversão, valorizando agora práticas e habilidades manuais, produções e consumos artesanais, amadores, locais. O segundo é insustentável, e a crise que se implantou com e sem covid tornou-o evidente.
Em paralelo, a divulgação cultural (a oferta do acesso às obras-primas da humanidade - as boas intenções autoritárias mais o elitismo das aristocracias sócio-culturais) e, a seguir, o desenvolvimento cultural (a economia da cultura, as indústrias culturais) deram lugar às culturas/consumos populares de todo o género, esses maioritários: o reality show, o pimba, o best-seller, a feira medieval, o parque temático, o hip-hop, os jogos virtuais, a visita turística e por aí fora, a diversão e o entretenimento, que eram componentes ou características das produções cultas e destas se separaram, mas são obviamente cultura, culturas de hoje. Vai-se ao museu em família (novos comportamentos) porque há jardim, vistas, cafeteria, e satisfaz-se a nova obrigação de sair com as crianças ao fim de semana. O consumo cultural cresceu e alargou-se, como se pretendia, mas não na direcção prevista, como consumismo. E havia razões para isso ao cabo de muitas décadas de vanguardas e algumas de queda de muros.
 
O divórcio entre os públicos constituídos pelos próprios actores-artistas e promotores, mais os respectivos estudantes e investigadores-bolseiros, e famílias ansiosas, e, por outro lado, pelos consumidores de lazeres e entretenimentos é hoje inegável e radical. A (alta) cultura é de classe, é uma classe, cada vez mais elevada ou especulativa e distanciada da "população em geral”, o não-público. Tornou-se um nicho parasita, sem espaço social reconhecível, sem credibilidade e sustentabilidade, que vive da subsidiação dos poderes públicos, à custa dos impostos de todos. O programa de Malraux, de Vilar, de Lang, de Jacques Rigaud, criticado por Fumaroli, Yves Michaud, Jean-Pierre Le Goff e tantos outros, escrutinado por Philippe Urfalino (“L’Invention de la politique culturel” - da invenção à dissolução..., 1996), para dar referências francesas e já com alguns anos, foi claramente à falência, esboroou-se, mas a sua espuma é ainda visível, às vezes feérica. Com algum escândalo, que alguns exploram como populismo crítico.
O Ípsilon (suplemento do Público) é o respectivo veículo (infra)mediático, de seita, e não por acaso divide espaço com a elite que segue o Fugas (passeios, comes e bebes) - é a tudo isto que se chamava alienação. E o Inimigo Público não os topa como alvos.
 
É possível continuar a citar, a partir do aparelho do Estado, a obrigação desse mesmo Estado (Providência) ter "uma verdadeira política cultural” ou, a partir de sobreviventes profissões e activismos, vir reclamar um "Serviço Nacional de Cultura". Mas a resposta ao presente e o futuro são outros. Aliás, não há resposta, vivem-se respostas.
Como escreveu há dias Hugues de Varine, uma grande figura da museologia e do desenvolvimento comunitário, “tudo isto é herético e provocador, e o tempo que vivemos não é favorável a que se ponham em causa certezas que, aliás, não têm mais de sessenta anos e repousam sobre afirmações de árbitros de gosto e especialistas autoproclamados que defendem os pontos de vista de uma minoria de privilegiados.
 
Ver Cultura e Pandemia
5 Out 
https://www.facebook.com/alexandre.pomar.7/posts/3459698910733647
Um texto essencial para o debate sobre a política cultural em tempos de crise e no próximo futuro - original de Hugues de Varine. Tradução minha:
A CULTURA E A PANDEMIA, 16 setembro 2020 Hugues de Varine
Hugues de Varine blog
 
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Pólo gaivotas-boavista (13 Out 2020)

Posted at 23:33 in #covidcultural, 2020, politica cultural | Permalink | Comments (0)

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10/08/2020

African.Cont o booklet em vídeo e "papel"

o video e o booklet

 

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Captura de ecrã 2020-10-08  às 17.50.57

 

Posted at 17:53 in #medinamanguel, 2008, 2020, africa.cont, cidade, CML | Permalink | Comments (0)

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10/07/2020

São Martinho das Amoreiras, 10/04

2020 10 04IMG_6722

Nirvana

Posted at 23:29 in 2020, foto, por garvão | Permalink | Comments (0)

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Folhetim #medinamanguel (3) - perguntas e respostas in progress

Não há que abrandar:
uma colecção que não se conhece, não inventariada (o que não permite uma doação ou venda); um coleccionador mitómano e mentiroso (bem apanhado a enganar pelo António Guerreiro no Ipsilon) e um muito contestado director da Biblioteca Nacional da Argentina ao tempo do Macri - "um refinado vígaro, ao que parece", escreve-me alguém bem colocado; um palácio respeitável e uma nova futura entidade da CML que seria caríssima e perdulária, anunciada irregularmente, quando estão na penúria o Arquivo Municipal e a Hemeroteca, e sem solução o MUDE; um Protocolo assinado antes de aprovado em reunião de câmara e sem passar pela Assembleia Municipal, com os PC e BE a negociar lugares e a deixar passar às escondidas, etc. Muita informação em #medinamanguel e no aqui blog.
 
Interpelações e alertas:
O Francisco Seixas da Costa já falou da colecção Manguel? E o PP? E o Eduardo Pitta? E o João Soares? E o Barreto? E o J.M. Tavares? E o Rui Tavares? E a
Raquel Varela? E o Daniel Oliveira? e os Henriques Monteiro e Raposo)? E o Luís Raposo ? E a Raquel Henriques da Silva? E a Roseta? E o Manuel Villaverde Cabral? E o Ricardo Araújo Pereira? E o Zé Neves? E a Bárbara Bulhosa (que está ligada pelo menos ao início da história). E a Carmo Afonso no Expresso? E a Ana Gomes? E o Vitor Belanciano? Etc, etc. É preciso reunir forças, agora que no PS e no PC e BE só se trata de lugares na lista para 2021
 
Raquel Henriques da Silva já comentou forte aqui no blog: este caso é "...INACREDITÁVEL E INACEITÁVEL. QUAIS OS FUNDAMENTOS DA ACEITAÇÃO DESTA BIBLIOTECA? QUEREMOS NO MÍNIMO UM PARECER TÉCNICO DA BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL".
 
Luís Raposo comentou no fb : "Desconheço quase tudo deste assunto. Mas, lendo o que tem escrito, o que escreveu o António Guerreiro, e conhecendo eu bem os tiques de provincianismo novo rico e autocrata... dou-vos todo o crédito. Torna-se imperioso ver tudo isto em pratos limpos, conhecer o inventário da coleccão e os termos do protocolo. Não compreendo como tal não foi já exigido pela oposição na CML. As explicações de barganha eleitoral que você avança não me convencem e parecem-me mais próprias do um espírito atormentado e conspirativo. Mas farei eu mesmo a a pergunta, se a ocasião surgir.
 
O Rui Costa (ex-BE, deputado à Assembleia Municipal, da EMEL) já deu um ar da sua graça.
 
Vamos antologiando
 

Posted at 20:37 in #medinamanguel, 2020, Biblioteca Manguel, cidade, CML, câmara de Lisboa | Permalink | Comments (0)

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1975 03 28 : Que Gulbenkian se discutia no Expresso? (3)

 

28 de março de 1975, um jornal na revolução, a fundação no olho do furacão. Um de três dossiers "Que Gulbenkian temos? Que Gulbenkian queremos?" no caderno Artes Letras e Ciências do Expresso, dirigido por Helena Vaz da Silva (muito antes da Revista). Páginas I a IV.
Faziam-se jornais assim, alguns guardavam, e consultam.
 
José Augusto França: Resposta (apressada) a um inquérito (apressado) - com data de 6/12/1974 (o inquérito terá sido demoradamente preparado):  "É natural que tenha alguma coisa a dizer, e até acabo de o dizer no capítulo final de uma história da arte portuguesa do século XX. E alguma coisa a propor-  e até frequentemente o tenho feito, clamando no deserto meio gulbenkiânico, meio lusitano, ou uma coisa (qual?) por via da outra..."
Fernando Azevedo: "Toda a arte de vanguarda se tem feito à margem da Fundação"
Egídio Álvaro (as exposições da G no país, as exp. no estrangeiro)
Eduardo Nery (Os grandes travões do passado: o comporomisso político e a burocracia, 15/12/74)
Fernando Calhau: algumas sugestões

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Posted at 19:37 in 1975, 2020, Expresso, Gulbenkian, Imprensa | Permalink | Comments (0)

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10/06/2020

O ESCÂNDALO MANGUEL em reunião de câmara E O PC/BE: lugares para 2021 (2)

PERGUNTAR AO RÚBEN
 
Quando o Rúben era vivo, telefonava e marcávamos um almoço, ou um breve encontro, para lhe falar de um qualquer disparate ou escandaleira em que o ministro se metia, em especial se era do PS. Lembro-me mais nitidamente do que se passou com e Museu de Arte Popular, o MAP, que uma Isabel Pires de Lima queria fazer desaparecer, deslumbrada com o Museu da Língua de São Paulo (e também se enredou com o Hermitage em Lisboa!). O Rúben fazia então um contacto com o João Oliveira, que seguia coisas da cultura antes de ser líder parlamentar, e encaminhava-se a informação e o alerta (nesse caso com algum sucesso; depois houve a longa guerra do Africa.cont...). Tratava-se de escrever no jornal e também de fazer política, em simultâneo.
 
A habilidade do Rúben para estabelecer pontes e fazer passar o PC por uma casa aberta era proverbial - achei depois que nos ía enganando a todos com esse papel de dialogante esclarecido e afável (lembro-me que como presente de aniversário me ofereceu uma vez os vários números do Revolução Popular, antes do 25 de Abril, no duplex da Estados Unidos da América (coincidência feliz), quando passara do Século para a publicidade (teria deixado o PC ou fingia?). Também dava pistas sobre as diversas "sensibilidades" no partido e sobre comprometimentos que tinha e tinham de assumir.
 
Agora o Rúben não está e ainda não consegui ter a certeza certa de que a votação do PC (parte contra e parte a favor, sem se dizer o quê, deixando passar no limite do quorum a Proposta do Protocolo sobre a Biblioteca Manguel (ou Manguela) foi ditada pela preparação de uma maioria de esquerda autárquica que sustente o Medina em 2021. Saíra da sala o João Ferreira candidato (vereador e deputado europeu, três em um num partido sem cabeças), quando também o CDS e o PSD abandonaram a sessão, por fadiga justificada, mas ficou a diligente Ana Jara a fazer o serviço (serviço sujo, parece-me). Tudo indica que é essa a chave, porque ninguém que assista à longa gravação da reunião pública (6h40 e tal), pode entender o que ali já no fim aconteceu sem debate, e aliás sem intervenções nenhumas de ninguém (sem se justificar a proponente Catarina Vaz Pinto/Guterres), tudo a correr, e está feito, passou. O caso da directora do Aljube vem à memória e percebe-se o que está a acontecer, pataca a mim pataca a a ti, corrupção democrática eleitoral (CDE, por coincidência oportuna).
 
Não é norma aceitar-se uma doação sem inventário exaustivo do que é doado; não é legítimo aceitar a criação de mais uma entidade camarária sem debater propósitos, contexto, custos, consequências, para mais num sector em que as carências e as queixas são inúmeras: Hemeroteca, Arquivo Municipal, Bibliotecas com edifícios e equipamentos mas sem aquisições regulares de livros, digitalização insuficiente, etc.
Digam-me se o PC publicou alguma coisa em site ou jornal a propósito da colecção Manguel e da instalação em Lisboa do coleccionador e companheiro? O PC explica-se ou a chave do negócio é o silêncio. Os caixotes de 40 mil livros, dizem, recusados em várias cidades ao longo de vários anos valem o quê, para quê, para quem, como?
#medinamanguel

Posted at 22:59 in #medinamanguel, 2020, Biblioteca Manguel, cidade, CML, câmara de Lisboa, politica cultural | Permalink | Comments (1)

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03/08 Iª parte "Que Gulbenkian temos? Que Gulbenkian queremos?"

III

O que pode ser uma fundação em Portugal" - H.V.S.

Uma fundação acima da política? - V.J.S.

Azeredo Perdigão

IV

Madalena Perdigão: Só se ataca o que tem merecimento / A construção do Museu - Centro Cultural obriga a F.G. a tornar-se empresa

José Blanco

Mário Vieira de Carvalho: Gradual transformação da Fundação em enpresa

V

Jorge Peixinho

VI

Ferrer Correia

Vitor Sá Machado

Joel Serrão

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Posted at 22:41 in 1975, 2020, Gulbenkian, politica cultural | Permalink | Comments (0)

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10/05/2020

Pereiro Grande 10/04

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Posted at 23:42 in 2020, foto, por garvão | Permalink | Comments (0)

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HUGUES DE VARINE: A CULTURA E A PANDEMIA


Hugues de Varine*, herético e provocador (palavras suas), oferece no seu blog a reflexão mais radical sobre o mundo da cultura, a sua economia e o seu futuro, onde vai muito para além dos efeitos da pandemia. Também poderia ter por título Cultura e democracia
 
tradução minha do texto publicado em 16 de Setembro em Le blog de hugues-interactions - Expériences personnelles et rencontres dans le domaine du patrimoine culturel et du développement: http://hugues-interactions.over-blog.com/
 
 
 
"Os profissionais da cultura, das artes e dos espectáculos estão inquietos não só quanto aos seus programas deste ano (concertos, festivais, exposições, etc.) mas sobretudo com a sua própria situação, agora e no futuro. Isto é verdade em França e, sem dúvida, em todos os países. Os media veiculam diariamente análises e declarações. Eu próprio tenho na minha família artistas que, justificadamente, se sentem ameaçados na sua carreira e nas suas perspectivas económicas a mais ou menos curto prazo.
 
Esta situação é interessante, para lá do confinamento da primavera de 2020 e dos riscos que ainda correm muitas actividades artísticas "vivas" e instituições de património. Diz-se aliás que esta pandemia pode ser considerada como uma primeira experiência que nos deveria preparar para o que nos espera inexoravelmente com o aquecimento global, já que, como é obvio, não conseguiremos realizar a "transição climática" voluntária e organizada de que toda gente fala mas que continua a ser da ordem do discurso.
 
Devemos assim, talvez,  convencermo-nos de uma realidade de que já se suspeitava durante a crise financeira de 2008: a Cultura, no sentido dos ministérios da cultura, dos profissionais das artes, do património e dos espectáculos, e dos pensadores discípulos de Malraux e tantos outros, não faz parte das actividades essenciais para a imensa maioria dos homens e mulheres de nosso tempo. Quer se trate de financiamentos, de prioridades políticas ou de informação, a cultura vem depois da saúde, do emprego, da educação. Isso não quer dizer que não tenha importância, mas não aparece à cabeça das nossas preocupações, sobretudo em caso de crise, quando as coisas vão mal.
 
As actividades ditas culturais fazem parte dos lazeres, da ocupação dos tempos livres, dos programas de visitas turísticas e outros, na condição de serem fortemente subsidiadas por fundos públicos ou pelo grande mecenato para que não custem demasiado caras ao consumidor. Mesmo as pessoas cultivadas não estão prontas para pagar o custo real dos espectáculos, das exposições, da conservação do património, que pagamos em grande parte através dos nossos impostos, pagos por todos, mesmo por aqueles que não os desejam aproveitar, e que são o maior número (o não-público).
 
A situação é séria: desde há sessenta anos, pelo menos em França, as instituições culturais multiplicaram-se ao ponto de dotar o país do estatuto da "excepção cultural" que tantas vezes é brandido como fazendo parte de um certo modelo francês. Mais grave ainda: desde há mais de quarenta anos, a cultura profissionalizou-se tanto que foram criados centenas de milhares de empregos assalariados (e não apenas de artistas) nas diferentes disciplinas artísticas e culturais e nas profissões técnicas que lhes são essenciais. E isso à custa do desaparecimento de muitas práticas amadoras de qualidade, gratuitas e ancoradas em territórios onde asseguravam a animação no quotidiano.
 
O estatuto francês dos intermitentes do espectáculo, único no mundo, socialmente generoso e economicamente absurdo, é o fruto híbrido das políticas de ajuda ao emprego face ao desemprego de massa e da recusa dos produtores e dos utilizadores a pagar o verdadeiro preço dos seus consumos culturais. Se todos os verdadeiros profissionais do mundo cultural fossem empresários e assalariados de direito comum, facturando as suas prestações pelo preço real, teríamos uma imagem verdadeira dessas profissões e da realidade dos seus públicos. Por outro lado, os profissionais limitariam talvez as suas exigências cada vez maiores e mais onerosas em termos de técnicas de construção, encenação, exposição.
 
Mas será possível mudar esta vertente cultural do Estado Providência? Não para voltar a um estado antigo que se supõe melhor, mas trabalhando com cada sector, ao nível dos territórios e especialmente com as colectividades responsáveis ​​pela vida destes territórios, para definir políticas culturais sustentáveis, distinguindo e associando as necessidades e a procura da população em sentido lato (culturas e patrimónios vivos), os profissionais e os meios da educação, da investigação, da criação e das práticas exigentes (alta cultura) e da indústria do turismo e dos lazeres (economia da cultura), para lhes fornecer respostas diferenciadas e viáveis.
Isso significaria passar de uma política da oferta dita cultural, na realidade missionária no seu vocabulário bem como nas suas práticas, em nome das crenças de um pequeno meio próximo dos círculos do poder, para uma política da procura, estreitamente ligada às práticas e à criatividade das pessoas, em todos os níveis da sociedade e de todas as idades.
 
Seria sem dúvida necessário, nessa hipótese, suprimir o ministério da cultura, ou então limitar a sua responsabilidade à gestão de algumas instituições nacionais que não poderiam caber a nenhuma colectividade de nível inferior, essencialmente instituições do património material e imaterial, como o Louvre, Versailles, a Comédie Française e a Ópera de Paris. Para tudo o resto, a regra seria a subsidiariedade e a participação activa e responsável dos públicos da cultura e dos meios interessados, ​​que deveria assegurar a sustentabilidade das artes e do património em França. Tudo isto é herético e provocador, e o tempo que vivemos não é favorável a que se ponham em causa certezas que, aliás, não têm mais de sessenta anos e que repousam em afirmações de árbitros de gosto e especialistas autoproclamados que defendem os pontos de vista de uma minoria de privilegiados.
 
hugues-interactions.over-blog.com
La culture et la pandemie
 
um 1º texto,sugerido pela pandemia e as suas consequências na economia institucional da cultura:

Patrimoine, tourisme et pandémie

http://hugues-interactions.over-blog.com/2020/05/patrimoine-tourisme-et-pandemie.html
 
 
 
* foi diretor do Conselho Internacional de Museus – ICOM, de 1965 a 1974; criador do termo ecomuseu, que  abarca as formas experimentais de museus que foram teorizadas no pensamento acerca da Nova Museologia, desenvolvida, nos anos 80, sob sua influência. De 1982 a 1984, dirigiu o Instituto Franco-Português de Lisboa, e fundou depois uma agência de consultoria de desenvolvimento local e comunitário que liderou por dez anos (1989-1999): a ASDIC. Nos dias de hoje, actua em questões de desenvolvimento cultural, social e económico, e do património, como consultor independente.
 
site:
http://www.hugues-devarine.eu/
"nouveau site qui a pour seul but de donner un accès à une partie de mes archives professionnelles Vous y trouverez plusieurs de mes livres, déjà publiés mais actuellement épuisés et quelques livres plus récents que j'ai écrits spécialement pour ce site et qui n'ont donc jamais été disponibles en librairie. J'y ai ajouté des articles introuvables ou difficiles d'accès et certains textes inédits qui m'ont paru pouvoir présenter un intérêt. Je continuerai de temps à autre à publier ici d'autres textes personnels anciens ou récents.

Tout cela concerne les trois domaines principaux qui ont été ceux de mon activité professionnelle depuis cinquante ans:

  • le développement local, sous ses différentes formes (sociale, culturelle, économique),
  • l'action communautaire et la participation démocratique aux décisions d'intérêt général,
  • le patrimoine naturel et culturel et les écomusées qui sont une des méthodes de sa gestion par et pour les citoyens.

Il n'y a rien de très scientifique ou académique dans tout cela: c'est le reflet d'une activité de terrain et des leçons que j'en ai tirées.

Ces textes sont tous librement téléchargeables, selon une procédure simple, qui vous demande seulement de vous identifier. Si vous voulez citer tel ou tel titre, ou en reproduire un extrait, veuillez en mentionner la source dans les formes habituelles."

Autor de  L’écomusée singulier et pluriel, : un témoignage sur cinquante ans de muséologie communautaire dans le monde. Paris: L’Harmattan, 2017. 304p. Muséologies, ISBN: 978-2-343-11878-9.
 
Hugues de Varine, singular e plural: memórias sobre museologias comunitárias
REFLEXÕES SOBRE UM MUSEU DE TERRITÓRIO
 
 
 

Posted at 00:29 in #covidcultural, 2020, economia da cultura, Hugues de Varine, Museus, Património, politica cultural | Permalink | Comments (0)

Tags: Cultura e pandemia, Ecomuseu, economia da cultura, Hugues de Varine

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10/04/2020

Medina e Manguel, um palacete para uma desconhecida colecção de livros (1)

 
Em que jornal podemos acompanhar a situação oferecida pela CML ao coleccionador de livros comprovadamente mitómano e mentiroso que foi bem denunciado pelo António Guerreiro (1) no Público/ Ípsilon a 18 de setembro?
Onde podemos seguir o escândalo da aprovação (ratificação, aliás) do Protocolo CML/coleccionador Manguel nos últimos minutos de uma reunião pública de Câmara (dia 30) já sem a presença da oposição — o PC é outra coisa que não oposição —, sem haver debate e sem esclarecimentos, o que foi denunciado no dia seguinte num artigo do Observador mas sem focar a aprovação do Protocolo.
 
O Expresso publicou em 12 de setembro uma entrevista cúmplice e laudatória, assinada por José Mario Silva, sem perceber o logro em que caía (2) e sem a acompanhar por um trabalho jornalístico dedicado ao projecto de instalação da colecção Manguel no Palacete Pombal e criação de uma nova entidade à margem da rede das bibliotecas e arquivos municipais, dotada de meios de excepção.
Objecto da crítica ou denúncia do AG ao que tinha publicado, o Expresso não respondeu, não averiguou, ausentou-se, não sei se envergonhado.
O Público “deu à estampa” a denúncia fundamentada do António Guerreiro sobre um passo insólito da entrevista do Expresso mas não comentou, não averiguou, não voltou ao assunto.
Note-se que José Mário Silva (Expresso) e António Guerreiro não são jornalistas, são “colaboradores”.
A revista Sábado publicou em 17 e 24 de setembro dois artigos incisivos de João Pedro George (cronista, não jornalista) mas não me consta que tenha a seguir pegado no assunto em termos jornalísticos.
 
1. Manguel entrevistado por José Mário Silva no Expresso: o exemplo Aby Warburg. 2. António Guerreiro apanha o mitómano que mente
 
Manguel 1

Manguel 1
 
 
Trata-se em princípio da doação de uma colecção de livros que não está catalogada ou inventariada, e as normas legais quanto â aceitação pública de doações exigem o inventário. Em paralelo trata-se da criação de um novo equipamento da CML a dotar de largos meios técnicos e programação com ambição internacional, com os inerentes financiamento a curto, médio e longo prazo. Nada indica que a legalidade esteja a ser cumprida, e a razão não está a ser respeitada.
 
O Observador denunciou a pouca regularidade do final da reunião pública de câmara (quando tinham decorrido mais de 6 horas de sessão) mas não deu sequência ao tema nem aliás se referiu à aprovação do Protocolo, que continuamos a desconhecer.
Que jogo se terá feito nessa sessão? Medina ausente e Catarina Vaz Pinto muda (presente?) não apresentaram e defenderam a sua proposta (nº 36 da ordem de trabalhos, proposta 599/2020) -- não era preciso nem conveniente. CDS e PSD tinham já saído da sala, em protesto contra a maratona imposta; João Ferreira do PC (vereador, deputado europeu e candidato) também saíra, mas ficou Ana Jara a cumprir o que pareceu um negócio já escrito: pediu a votação separada de três alíneas da proposta (quais?) e votou contra elas: foram aprovadas por 8 em 9 vereadores de um total de 17; depois votou a favor do restante (?). O José Sá Fernandes, ex-Bloco depois PS/Cidadãos por Lisboa/Helena Roseta, vereador verde, agitava-se levantava-se voltava, mas votou a favor. Manuel Grilo do Bloco também, pelo que percebi. O BE ainda não disse nada sobre a insólita biblioteca. Não podia ser mais óbvio que estava combinada a votação e decidida a ausência de debate - tudo indica que está em jogo a próxima lista de "maioria de esquerda", o que já se percebera no caso do Aljube. (A versão burocrática e cúmplice do Observador saíra a 12 de Setembro: https://observador.pt/.../depois-de-ter-esperado.../amp/ )
No fazcebook fui dando notícia do caso e incluí bastante informação publicada na Argentina sobre o tempo em que Alberto Manguel foi director da Biblioteca Nacional, nos anos do direitista presidente Macri - a qual me foi sendo enviada por leitores revoltados. A série de notas (a 21, 22, 23, 24, 25, 27, 29, 30 de setembro, 1 de Outubro - ver #medinamanguel ) foi bastante aplaudida e partilhada.
 
Manguel Medina - cópia
Manguel Medina - cópia
 
Neste fim de semana comprei o Expresso e o DN (uma boa ediçã0) e até o Sol (uma edição picante, em que brilha (?) o retratista do Cavaco) para tentar ver como os semanários seguiam o escândalo Medina & Manguel. Mas não descobri nada.
A indigência da imprensa não é surpresa, mas confirma-se. Não faz o seu suposto trabalho, não investiga, não esclarece, não informa, não confronta os poderes políticos com as suas arbitrariedades e/ou irregularidades. Não são comunicação social mas acomodação social, intimidação social, manipulação social.
 
 
 
(O caso da anunciada biblioteca Colecção Manguel deveria ser associado à história do Museu do Design (MUDE) que é uma entidade irregular criada pela CML sem estatuto institucional ou jurídico, falsa portanto e desde sempre, surgida de uma colecção particular vendida à Câmara por Francisco Capelo em 2002, herdada da gestão Santana Lopes e mandada instalar em 2009 pelo António Costa num prédio da CGD na Rua Augusta e num contexto pré-eleitoral. Antes esteve exposta no CCB de 1999 a 2006, e desde 2016 o prédio está em obras, paradas (algum dia reabrirá?). É um caso irresolúvel - anunciou-se a integração na EGEAC, mas não podia ser, não pode escapar como fundação, a directora não é directora e têm o coleccionador Capelo à perna.
E também poderia ser recordada, muito a propósito, a frustrada história do projecto África.cont que foi destinado ao mesmo Palacete Pombal e às respectivas Tercenas do Marquês em 2008, nos tempos áureos e loucos de Sócrates e Costa. Anunciou-se com pompa num jantar oferecido ao corpo diplomático sob a pala do Pavilhão de Portugal (tenho divulgado o "booklet" do grandioso projecto, que desaparecera da rede). Luís Amado (ele próprio coleccionador e galerista africanista) queria um museu das artes das Áfricas, mas a cúpula cultural mais contemporânea ambicionou o maior centro cultural dedicado ao continente dos negros em todo o mundo, e a possível cooperação artística ficou embargada por dez anos até à extinção formal do que já era só um assessor do gabinete da vereadora da cultura.
E o caso também deveria ser associado com proveito aos anúncios de museus sucessivamente proferidos por Fernando Medida ou só prometidos sem anúncio público.
E ainda à lógica de uma rede de galerias municipais, excessivas e de programação questionável, que há poucos anos era dirigida por alguém que acumulava o cargo com a propriedade de uma galeria privada (João Mourão - agora director de um muito grande vasto centro de arte nos Açores, Arquipélago; a acumulação de lugares público e privado continua, tendo agora atribuído a direcção da sua galeria ao companheiro). A denúncia reiterada e também pública que então fiz teve consequências, deixou a CML, mas a corrupção continua.
Tudo isto tem a ver com a vereação de Catarina Vaz Pinto que têm mantido um permanente silêncio e não é interrogada pela imprensa.)
 
As redes de cumplicidades estão por todo o lado e bem defendidas. Há medo por toda a parte e designadamente entre os jornalistas (e têm razões para ter medo)
O lobby dos livros, “amantes” de livros e seus festivais, festas e lançamentos, autógrafos e croquetes, está estranhamente calado no facebook, onde tudo agora se joga.
 
 
****
(1) . O que escreveu o AG no suplemento Ipsilon / Público de 18 Set.: "Alberto Manguel (...) teria sido, a dada altura, instigado pelo seu secretário: “Escute, professor, esta biblioteca é riquíssima, os investigadores querem visitá-la e trabalhar nela, é preciso que a torne pública”. Embora reticente, acrescenta Manguel, “Warburg aceitou por fim abrir a biblioteca ao público. Quando o faz enlouquece. E morre internado numa clínica psiquiátrica”. Nada nesta descrição corresponde à verdade: 1) A biblioteca criada por Warburg, em Hamburgo, não corresponde em nada à ideia de biblioteca como colecção de livros feita por um leitor ou um bibliófilo, e por isso é que é única e importante 2) Fritz Saxl, que foi de certo modo o seu secretário, jamais falaria a Aby Warburg naqueles termos, até porque este nunca foi professor, limitou-se a colaborar esporadicamente, através de um seminário, com a Universidade de Hamburgo; 3) a KBW tornou-se um instituto público em 1926, mas já muito antes era aberta a investigadores (por exemplo, Cassirer tinha feito lá toda a investigação para escrever A Filosofia das Formas Simbólicas); 4) Warburg não morreu quando a sua biblioteca se tornou um instituto público, mas três anos depois, em 1929; 5) Warburg não morreu numa clínica psiquiátrica, mas em casa, de um ataque cardíaco; a clínica psiquiátrica entra na sua biografia, mas num tempo anterior, de 1918 a 1924, quando esteve internado na clínica do célebre psiquiatra suíço, Ludwig Binswanger, por ter mergulhado num estado de profunda esquizofrenia que todos os médicos a quem Binswanger expôs o estado mental do seu doente (Freud foi um deles) pensaram ser irreversível.
Alberto Manguel conhece certamente muito bem a história da KBW. Mas a sua pulsão mítica de bibliómano alucinado leva-o a reivindicar uma genealogia que o engrandece, mas não é, com toda a evidência, a sua. Esta história da instalação da sua biblioteca em Lisboa está cheia de sintomas de provincianismo. (...)"
 
(2) . O que escreveu o José Mário Silva que disse o Alberto Manguel, no Expresso de 12 Set. : "O exemplo que me vem imediatamente à cabeça é o de Aby Warburg, o grande leitor-colecionador do início do século XX. Ele criou uma biblioteca particular muito importante, vastíssima, organizada segundo as suas pessoalíssimas associações de ideias. A dada altura, o secretário disse-lhe: “Escute, professor, esta biblioteca é riquíssima, os investigadores querem visitá-la e trabalhar nela, é preciso que a torne pública." Embora reticente, Warburg aceita por fim abrir a biblioteca ao público. Quando o faz, enlouquece. E morre internado numa clínica psiquiátrica." (sic, pág. 23, Expresso Revista E: Entrevista. "Esta biblioteca é a minha imortalidade partilhada")
 
Nota: As frases do Manguel não são um caso de polícia?
 

Posted at 22:37 in #medinamanguel, 2020, africa.cont, Biblioteca Manguel, cidade, CML, comunicação social, câmara de Lisboa, escândalos, Imprensa, Lisboa, Livros, Museus, Palacete Pombal, politica cultural, Tercenas | Permalink | Comments (0)

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10/03/2020

MARCHA, 1952, alegoria e retrato colectivo

Marcha, 1952. 122x199 cm, têmpera sobre aglomerado de madeira, n 86 do Cat. Raisonné. Colecção Particular
 
1952 marcha
Ao centro entre o casal está o escultor José Dias Coelho que “controlava” os artistas do PC e veio a ser assassinado pela PIDE em 1961. No bordo direito o também escultor Vasco da Conceição. A seguir, pela direita, o eng Frederico Pinheiro Chagas, amigo e provável encomendador e depois proprietario de sempre, e a sua mulher, Dina.
Central no primeiro plano está um jovem casal: o homem que está de mão dada com a mulher ( Zita? ) chamava-se Francisco Bento, era carpinteiro e pertencia ao grupo que frequentava o atelier da Praça da Alegria de Vasco da Conceiçao e Maria Barreira (já tinha antes sido do José Malhoa), segundo informou a Teresa Dias Coelho. Quem seria esta Zita de quem há um retrato desenhado e existiu um busto? Alguém referiu a Zita Namora, mas não me parece. Falta também identificar a menina à esquerda.
É uma alegoria e um retrato colectivo à maneira da "grande arte", que data de um breve momento (1952-54) de maior pressão da ortodoxia PC, o desvio de esquerda, que recomendava a prática do retrato - Júlio Pomar retratou José Cardoso Pires e Maria Lamas, em 1954.
 
Nunca foi exposto mas vai poder ser visto em breve no Atelier-Museu — e agradeço outras possíveis achegas para a identificação das figuras. (versão provisória de uma nota sobre a pintura)

Posted at 23:06 in 1952, 2020, Artistas Portugal, Atelier-Museu Júlio Pomar, Júlio Pomar, Neo-realismo, retrato | Permalink | Comments (0)

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09/27/2020

O CAM anunciado em 1981

no Diário de Notícias de 20 de Julho de 1981, em página inteira, n.n. ("Reportagem"):

"No 25º aniversário da Fundação
SEGUNDO MUSEU GULBENKIAN É DEDICADO À ARTE MODERNA"

publicado na véspera da inauguração da exposição "Antevisão do Centro de Arte Moderna", com base numa entrevista com o arq. e 1º director Joséw Sommer Ribeiro, defenindo-se aí o respectivo programa e recordando-se as vicissitudes que conheceu o seu projecto.

CAM DN 1981 IMG_6532

 

Posted at 17:17 in 1981, 2000, CAM, Gulbenkian, Museus | Permalink | Comments (0)

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EX CAM, EX PENELOPE CURTIS

I
26 Set. : "Disse que tinha ficado desapontada por não ter visto o seu contrato renovado como directora do Museu Gulbenkian. O que é que não conseguiu fazer nos últimos cinco anos?
PC - Quando temos um trabalho em que sabemos que as coisas precisam de ser mudadas, é necessário mais do que cinco anos. No início, senti que havia um desejo de mudança, mas esse desejo evaporou-se no final. Já tinha mudado o que podia mudar e depois disso era o statu quo.
Para mim, foi uma situação muito inesperada, porque sempre estive habituada a trabalhar directamente com a administração, fazer parte das reuniões e saber o que pensava. Na Gulbenkian, a administração reúne-se muito regularmente, mas à porta fechada. Não é possível, verdadeiramente, ter uma conversa sobre o que o museu pode ser.
A administração tomava decisões sem consultar o museu. No último ano, estava cada vez mais a tomar decisões sobre coisas que o afectavam, como as colecções e a programação. Isso tornou-se muito difícil para mim e muito frustrante." PÚBLICO 25 Set. #penelopecurtisnafg
 
A.P.: ...Eu não sei, eu não disse nada... São só duas perguntas ingénuas sobre o Museu Gulbenkian e Penelope Curtis. Pode ser que alguém conte mais coisas.
PERGUNTA 1: A Penelope (que tem boas razões de queixa) foi cilindrada por guerras internas da administração, ou seja, entre Teresa Gouveia, que teve o pelouro do CAM e já se reformou, e a presidente Isabel Mota, duas mulheres do PSD que não se podiam ver?
PERGUNTA 2: Que papel teve neste episódio funesto o ainda sempre presente e influente Rui Vilar e o actual Guilherme Oliveira Martins, dois políticos para todas as ocasiões?
 
*
II
25 Set.
A opacidade da Fundação Gulbenkian é beliscada com a entrevista de Penelope Curtis, directora do Museu.
No Público de hoje, 25 set. https://www.publico.pt/.../penelope-curtis-exdirectora...
 
"Acho que tivemos sucesso ao conseguir estabelecer a Colecção Moderna como um museu"; "o desafio era comunicar ao público português que isto era um museu e não uma exposição temporária".
Toda a área da cultura é agora tutelada e dirigida pelo Guilherme Oliveira Martins (ex-Centro Nacional de Cultura), depois do sector CAM ter sido dirigido pela Teresa Gouveia (tinha desviado o CAM da sua identidade como museu , exigindo "instalações" na nave central, que logo começaram mal com um episódio "in progress" Cabrita - e o Canova que o diga).  A sucessão de directores pós-Sommer Ribeiro e pré-Penelope não deu solidez à casa, tipo Molder e Isabel Carlos - se não estou a ser injusto com a Isabel...). Entretanto este universo das artes está em recuo na FG, perdeu meios, dinamismo e credibilidade a favor das vertentes da intervenção social. E em geral há razões para isso.
#omuseudaGulbenkian #exCAM #penelopecurtisnaFG
 
*
PEDRO PROENÇA, 27 Set.: "Um péssimo trabalho do ponto de vista museológico na arte moderna, e razoável na arte antiga. Um divórcio sentido com os públicos, por mais que se esforçasse. Confesso que não consigo entrar no CAM sem ter a sensação de que estamos nos anos 50, com uma montagem inapropriada, dolorosa de se ver. A personalidade é simpática mas o seu legado é catastrófico. Se isto é museologia a sério deixem-me fugir: um olhar falso, referencial, conservador e estereotipado."
 
AP, 27 Set: Discordas do que fui escrevendo e eu discordo de ti. ...Péssimo, inapropriado, catastrófico, etc... Que excesso de má vontade! E não, não me parece que a personalidade seja/fosse simpática (não tenho razão de queixa, pelo contrário, no único encontro pessoal, embora colectivo); sabe-se que o relacionamento no museu foi difícil com colaboradores... Quanto ao museu (e recomeçou a haver museu, com manifestas originalidades e revisões - compras de 1957 e 61; compras orientais, missão a Bagdad), sem ser reverencial com as "referências" habituais), fui escrevendo sucessivas notas críticas em geral com apreciações negativas, como podes ver em #penelopecurtisnafg Em vários casos eram as obras expostas que me pareciam fracas e/ou idiotas. Mas o certo é que me fez voltar repetidamente ao Museu, eu que há anos não entro em Serralves quando vou ao Porto, e pouco subo ao Chiado. Houve outro olhar, irreverente e livre, descomprometido, exploratório, interessado em conhecer e descobrir (é raríssimo que um director percorra exposições alheias).
 
*
 
19 de Dezembro de 2018  · 
Continuando a falar do Museu Gulbenkian, digo que tenho em grande consideração a exploração da colecção moderna que a directora Penelope Curtis tem vindo a fazer, subvertendo ou questionando hierarquias instaladas, propondo surpresas e interrogações. Começou por rever as aquisições da FG por efeito da Exp. de 1957, quando ela iniciou a sua programação e a Fundação começava a sua história, e agora põe em destaque a exp. levada ao Iraque em 1966, recordada em dois espaços: no piso inferior do Museu, no quadro da aventura da Gulbenkian em Bagdad - confusamente mostrada, é certo -, e no piso 2 do Museu Moderno em espaço próprio. Aqui com artistas relevantes à época e depois ± esquecidos: Nuno de Siqueira, com uma interessante paisagem abstracta em estratos sobrepostos que foi a sua imagem de marca, e Artur Bual e Luís Demée, com expressões do seu tempo (é bom rever as tendências que estiveram em voga e se julgaram definitivas). Também com uma poderosa tela de João Vieira gestualmente caligráfica. Depois no Museu, com Ângelo de Sousa e José Escada, René Bertholo e Júlio Pomar, e o influente brasileiro Waldemar da Costa (Composição em Azul, 1960) e outros. Por necessidade de representação a FG então fez compras, começou a pensar uma colecção: é uma data.
Mas aponte-se também como a Gulbenkian de hoje apaga o seu 1º presidente e criador, José de Azeredo Perdigão, não identificado na fotografia (uma legenda implica sempre nomear as pessoas representadas, quando não são anónimos elementos do povo). Aqui o anonimato é intencional ou incompetente? Seja como for, é escandaloso e põe em cheque a actual administração.
 
(Um museu ia fazendo o seu trabalho de sedimentação de memórias e conhecimentos. Foi uma política séria, independente e inédita. Interrompida por obscuras razões, que a FG devia apresentar - se pode. 26 Set.)
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8 de Dezembro de 2017  A grande reforma de Penelope Curtis. Passou a haver um museu. Com colecções permanentes rotativas. O CAM de Sommer Ribeiro e Azeredo Perdigão ganhou uma estratégia.
Ontem, 7 Dez, a directora apresentou à imprensa (de manhã) e a artistas incluídos na colecção (de tarde) o programa para 2018: a actuação como museu está definida, com rotação trimestral de algumas (bastantes) obras e também com exposições. Museu não é o mesmo que galeria (Kunstmuseum ou kunsthalle, Kunsthaus), mas é também um lugar a que se volta. #museugulbenkian
(Foto AP 2017)
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08/22/2016

A nova directora dos Museus Gulbenkian, a campanha contra

https://alexandrepomar.typepad.com/alexandre_pomar/2016/08/a-nova-directora-dos-museus-gulbenkian-a-campanha-contra.html?fbclid=IwAR0UcUAs_MpD4hNzWmB3RlNDC3N5qzQGYalV89UAbkSvbjip6puHti3VM9g
 
3 de Julho de 2016 
A nova directora dos Museus Gulbenkian 1 e 2, Penelope Curtis, vinda da Tate Britain. Há escândalo e talvez polémica (na praça?, nos corredores?), mas existem tantos outros motivos de escândalo... Ainda não vi, não tenho opinião. Sou prudente quanto aos lobbies nacionais.
fotografada diante de uma tapeçaria de Eduardo Nery (Foto Rui Gaudêncio), no Público de 6ª feira, Ipsilon.
 
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Entrevista de  Victor Pinto da Fonseca e Liz Vahia ARTECAPITAL 2017

https://www.artecapital.net/entrevista-219-penelope-curtis?fbclid=IwAR3lraVoLJCQEO1RTdigr0h8R2ZrCxYartIFYU2OLrBbUFyU6iW4IrUeSbI
 

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09/23/2020

#medinamanguel sumário

(23 Set.)
Ainda não percebi se este romance Medina - Manguel passou por reunião de câmara e assembleia municipal. E isso importa?
Mas já há vídeo, e houve tempo para o realizar: 1º a auto-promoção, depois o escândalo.
 
Já me responderam que não, não passou, nem está agendado.
1 Captura de ecrã 2020-09-21  às 22.40.24
 
(22 set.)

El escritor fue director de la Biblioteca Nacional durante el macrismo

Alberto Manguel cederá su biblioteca a la ciudad de Lisboa

Los 40 mil volúmenes que acumuló el escritor serán parte de un Centro de Estudios de la Historia de la Lectura, que él mismo dirigirá. 
Diario Página|12 - Venezuela - 15 de septiembre de 2020
 
"¿Por qué Manguel no donó sus libros a la Biblioteca Nacional, que dirigió durante parte del gobierno de Mauricio Macri, entre 2016 y 2018?
“Después de mi experiencia en la (Biblioteca) Nacional, entendí que, si bien tenemos muchos talentosos especialistas en el tema de la lectura y bibliotecarios especializados, el país no tendría el presupuesto necesario para contratarlos, ni para instalar y mantener una biblioteca como ésta. Sobre todo, en medio de esta crisis”, dijo el escritor al diario La Nación.
Los trabajadores de la BN cuestionaron las declaraciones del exdirector de la institución.
“Sabemos perfectamente los padecimientos que atraviesa hoy el mundo entero. Más aún conocemos la magra situación en la que quedó nuestro país y en particular nuestra Biblioteca luego de cuatro años de la gestión de Cambiemos, de la cual Manguel fue integrante. Recortes presupuestarios, despidos, intimidaciones laborales, cierre de la editorial y proyectos, clausura del Museo del Libro y de la Lengua, gastos superfluos, almuerzos esponsoreados, costosos viajes internacionales y una escasa presencia constituyeron la huella de su paso por la Biblioteca”, plantearon en un comunicado."
Alberto Manguel cederá su biblioteca a la ciudad de Lisboa
 
 
 
https://www.pagina12.com.ar/292021-alberto-manguel-cedera-su-biblioteca-a-la-ciudad-de-lisboa?fbclid=IwAR3M6mfJZMQ0E5kH6a4MyUWR_N8AL3HT8VOyGooxENvRvQUwInjMfAFnwpk
 
(22 Set.)
Do Palacete Pombal vai-se até às Índias.
É um dos mais incríveis lugares de Lisboa: siga-se a pé pela Travessa José António Pereira, o nome do antigo comerciante colonial, abaixo, desde a Rua das Janelas Verdes, junto ao Hotel de charme As Janelas Verdes. Nunca um qualquer jornal fez a viagem, ao que julgo saber.
O Sócrates e o Costa, então presidente da CML, queriam lá pôr o Africa.Cont, e ao fim de dez anos de delapidação de meios ficou tudo na mesma, só mais arruinado.
Agora o Menguel vai poder saltar de terraço em terraço das Janelas Verdes à 24 de Julho (para ir provar uma poncha lá baixo: Bar Number 2 - É Pra Poncha). As fotos são de Dezembro de 2008...
 
O que escreveu o José Mário Silva que disse o Alberto Manguel, no Expresso de 12 Set. :
"O exemplo que me vem imediatamente à cabeça é o de Aby Warburg, o grande leitor-colecionador do início do século XX. Ele criou uma biblioteca particular muito importante, vastíssima, organizada segundo as suas pessoalíssimas associações de ideias. A dada altura, o secretário disse-lhe: “Escute, professor, esta biblioteca é riquíssima, os investigadores querem visitá-la e trabalhar nela, é preciso que a torne pública." Embora reticente, Warburg aceita por fim abrir a biblioteca ao público. Quando o faz, enlouquece. E morre internado numa clínica psiquiátrica." (sic, pág. 23, Expresso Revista E: Entrevista. "Esta biblioteca é a minha imortalidade partilhada") Manguel 1

 
O que escreveu o AG na revista Ipsilon / Público de 18 Set.: "Alberto Manguel (...) teria sido, a dada altura, instigado pelo seu secretário: “Escute, professor, esta biblioteca é riquíssima, os investigadores querem visitá-la e trabalhar nela, é preciso que a torne pública”. Embora reticente, acrescenta Manguel, “Warburg aceitou por fim abrir a biblioteca ao público. Quando o faz enlouquece. E morre internado numa clínica psiquiátrica”. Nada nesta descrição corresponde à verdade: 1) A biblioteca criada por Warburg, em Hamburgo, não corresponde em nada à ideia de biblioteca como colecção de livros feita por um leitor ou um bibliófilo, e por isso é que é única e importante 2) Fritz Saxl, que foi de certo modo o seu secretário, jamais falaria a Aby Warburg naqueles termos, até porque este nunca foi professor, limitou-se a colaborar esporadicamente, através de um seminário, com a Universidade de Hamburgo; 3) a KBW tornou-se um instituto público em 1926, mas já muito antes era aberta a investigadores (por exemplo, Cassirer tinha feito lá toda a investigação para escrever A Filosofia das Formas Simbólicas); 4) Warburg não morreu quando a sua biblioteca se tornou um instituto público, mas três anos depois, em 1929; 5) Warburg não morreu numa clínica psiquiátrica, mas em casa, de um ataque cardíaco; a clínica psiquiátrica entra na sua biografia, mas num tempo anterior, de 1918 a 1924, quando esteve internado na clínica do célebre psiquiatra suíço, Ludwig Binswanger, por ter mergulhado num estado de profunda esquizofrenia que todos os médicos a quem Binswanger expôs o estado mental do seu doente (Freud foi um deles) pensaram ser irreversível.
Alberto Manguel conhece certamente muito bem a história da KBW. Mas a sua pulsão mítica de bibliómano alucinado leva-o a reivindicar uma genealogia que o engrandece, mas não é, com toda a evidência, a sua. Esta história da instalação da sua biblioteca em Lisboa está cheia de sintomas de provincianismo. (...)"
Captura de ecrã 2020-09-18  às 20.39.31
 
O Público publicou a crónica do Guerreiro e depois fechou-se em copas? Já não há investigação, contraditório, jornalismo?
 
Já tinha contado a mesma rábula do Warburg a La Nation:
"Siempre tengo presente lo que le ocurrió al genial Aby Warburg, ese erudito bibliófilo a quien su secretario convenció que abriera su biblioteca privada al público. El pobre Warburg se volvió loco y tuvo que ser internado en una clínica psiquiátrica. Abrir tu biblioteca personal, esa cosa tan íntima y secreta, a un público desconocido, es un poco como dejar entrar a forasteros en tu mente, dejar que otros tomen posesión de tu memoria, de tu imaginación, de tu alma. Soy consciente de que ésta donación es una maniobra peligrosa, aunque necesaria, para que mis libros vuelvan a la vida. El sacrificio, si sacrificio hay, vale la pena." La Nation 8 de setembro
 
#
Uma insólita operação mediática no Palacete Pombal, que foi biblioteca do Instituto do Restauro - Instituto José Figueiredo, por muito tempo cedido pela CML ao IPPC / IPCR / IPPAR, se as siglas estão certas.... Depois foi atribuído a uma "coisa" chamada Centro de Arte Africana Contemporânea Africa.cont, que se extinguiu demoradamente sem préstimo (2008-2017, oferecido por Sócrates ao prof. J.A. Fernandes Dias...), e a seguir foi colocado à venda (mas os compradores árabes iriam tapar ou destruir as pinturas figurativas e a ideia abortou também).
Do Palácio passa-se às Tercenas do Marquês, grandes armazéns coloniais que se encontram por utilizar (o João Soares tinha cedido um deles à ZDB, no seu início (2002?), mas vieram a pôr-se problemas de segurança).
 
Palacete e Tercenas descem das Janelas Verdes à 24 de Julho (numa festa do África.cont passava-de terraço em terraço...) e são um dos mais incríveis lugares de Lisboa: siga-se pela Travessa José António Pereira, o nome do antigo comerciante abaixo (desde a Rua das Janelas Verdes, junto ao Hotel de charme As Janelas Verdes).
 
120062847_10214685475365342_2124889829423176862_nA festa do Africa.cont, 26 Set de ?
 
Aqui já temos o filme promocional da CML:

Biblioteca de Alberto Manguel em Lisboa Câmara Municipal de Lisboa Uploaded: Friday, September 11, 2020

https://vimeo.com/456859411

Biblioteca de Alberto Manguel em Lisboa from Câmara Municipal de Lisboa on Vimeo.

 

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09/11/2020

Instituições e artistas (ampliado do facebook)

Pedro Proença... Estás esquecido ou enganado (* - 11 Set. edição revista e ampliada). A articulação entre instituições e artistas de que falas parecia natural e a contestação fazia-se em surdina, face a uma coesa rede de poderes. Quando quiserem pudemos falar da instrumentalização das representações nacionais através das relações na e com a SEC (Sarmento funcionário, Calhau atencioso, Cerveira Pinto, a LIS e seus júris em 1979 e 1981, etc); do papel para-institucional que teve a Galeria Cómicos do Luís Serpa, 1984 -, onde todos ELES expunham depois do Depois do Modernismo, 1983 - e tu também; da gestão interessada do Molder, fechando o CAM à fotografia com excepção da sua rede de contactos, por via da defesa do "quadro fotográfico" do Jean-François Chevrier, etc). Essa conjugação de poderes foi eficaz no acesso à presença internacional, em especial dos próprios, concentrando recursos e candidatos. Disse que foi eficaz mas não foi séria e o balanço NÃO é hoje positivo. Vê lá se te lembras...

(* Dizia o Pedro: "Num tempo não muito distante (não foi noutra galáxia) havia artistas que eram determinantes na definição da política cultural (artística) de um país ou na programação de grandes instituições. Não era um escândalo, e a articulação entre instituições e artistas era bem mais natural. Hoje, isso soaria a escândalo. Penso no Fernando Calhau na "divisão de artes plásticas" do MC (era assim que se chamava), ou Jorge Molder e Rui Sanches no Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian. Que excelente trabalho!")

Passou-se de um sistema voluntarista e centralizado da gestão das artes ditas plásticas (alguns artistas e algum estado), por isso eficaz, a uma situação plural, dispersa e pantanosa, efeito da descrebilização da fase anterior e do surgimento de novos dados com a mudança de década e de geração, e também mudança de contexto político. Intervieram mais agentes (privados e fundações) e mais actores (chegaram os curadores), num país sem escala. Serralves e Chiado, tal como o CAM, serviam interesses próprios e não se afirmaram como museus, que não há. Alias, a ideia de museu era ou é combatida (apesar de discursos oportunistas), porque se trata sempre de gerir o curto prazo (as actualidades), de satisfazer clientelas e de socorrer/apoiar directamente artistas - agora pela via estúpida da Colecção do Estado. (É só uma pista de reflexão; de facto falta memória, em especial no MC, impedindo a continuidade de políticas)

Mas a nota essencial sobre a articulação de instituições e artistas é a continuidade efectiva dos poderes.

À "Alternativa Zero" do Ernesto de Sousa (Galeria Nacional de Arte Moderna, Belém, Fevereiro-Março de 1977) que nasce a partir da SEC com convite e o empenho do Eduardo  Prado Coelho enquanto director-geral de Acção Cultural (em 1975-76), sucede a iniciativa pluridisciplinar "Depois do Modernismo",  em 1983, dinamizada por vários dos participantes da mostra anterior (Leonel Moura, Cerveira Pinto, Julião Sarmento, antes "discípulos de E.S.) numa actualização de referências e influências (da arte conceptual e Fluxus à Bad Painting pós-moderna, cortando assim com a "tutela" do Ernesto), em grande parte a partir da mesma SEC, e sustentando uma nova organização de poderes (** fui "adido de imprensa" do DdM).

Ao "Depois do Modernismo", que teve Luís Serpa como coordenador, sucede em 1984 a Galeria Cómicos (antes Cómicos – Espaço Intermédia), em espaço cedido pela SEC ao lado do Teatro da Cornucópia e gerida pelo mesmo Luís Serpa (depois Galeria Luís Serpa Projectos). CONTINUA

 

Bibliografia:

"Arte e Mercado em Portugal: Inquérito às Galerias e Uma Carreira de Artista" (***), Alexandre Melo,  Colecção OBS - Pesquisasa 4, Observatório das Actividades Culturais, 1999 (*** trata-se de Julião Sarmento)

"Galerias de Arte em Lisboa", coord. Maria de Lurdes Lima dos Santos e Alexandre Melo, Colecção OBS - Pesquisasa 9, Observatório das Actividades Culturais, 2001

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09/07/2020

Angola 1938 - uma leitura no Brasil

A exposição Angola 1938 referida num ensaio brasileiro de Ana Maria Maud:

"Imagens fotografadas: Fotografia Pública, possibilidades metodológicas", 2014

http://www.labhoi.uff.br/sites/default/files/relatorio_final_cnpq_anamauad.pdf

a partir da página 124 / Álbuns fotográficos como arenas da memória pública, p. 128 e seg.

"Na sequência do texto, com o objetivo de operacionalizar o conceito de fotografia pública, apresenta-­‐se um estudo de caso – a produção sobre o catálogo da Exposição de Angola de 1938 – em que se busca inventariar as imagens e suas histórias, num possível exercício de biografar objetos e imagens fotografadas."

 

"Fotografia pública, um conceito em construção

O circuito social da fotografia nos séculos XIX e XX foi caracterizado pelo advento daquilo que se denomina de fotografia pública.97A noção de fotografia pública associa-­‐se a configuração de ação do poder público, por meio da produção de registros de situações, processos e sujeitos que se associam a ação do Estado e criam a memória visual da ação do poder público. Paralelamente, busca ampliar a noção de documento visual, por entender que qualquer fotografia, ao mesmo tempo em apresenta e representa o mundo visível, por meio de uma linguagem é também o resultado de uma prática social e de uma experiência histórica. Utiliza-­‐se o termo fotografia pública para incluir dentro da análise de fotografias as dimensões de seu circuito social, quer seja definindo a dimensão do espaço público visual, quer seja pela configuração de um público que visualiza essas imagens.

Mauad, Ana Maria.“Fotografia Pública e cultura visual em perspectiva histórica” IN:Revista Brasileira de História da Mídia vol.2, n.2, jul. 2013/ dez. 2013

ver: http://www.unicentro.br/rbhm/ed04/dossie/01.pdf

http://www.labhoi.uff.br/sites/default/files/relatorio_final_cnpq_anamauad.pdf

Posted at 22:39 in 1938, Angola 1938 | Permalink | Comments (0)

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08/29/2020

Santos Rufino (1929) e Elmano da Cunha e Costa (1935-39)

Elmano Cunha e Costa, Estudos Etnográficos e bibliografia

A fotografia e a "ocupação científica das colónias"

COSTA, Elmano Cunha 
Alguns aspectos dos estudos etnográficos
In: Boletim geral das colónias. - Ano 19º, nº 220 (Outubro de 1943), p. 93-108
http://memoria-africa.ua.pt

 
"por amável solicitação do Governo Português fiz um documentário fotográfico, em colboração com o P. Carlos Estermann" 93
"a vasta colónia, ou talvez melhor, a vasta província" (93)

"a ocupação científica das colónias... é uma aspiração... e uma obrigação" (94)
"o preto... à cabeça das riquezas naturais" (94)
"a obra de atracção do negro, de protecção ao indígena..." "lapidando as suas almas ingénuas" (94)
 

 

 

 

 

 

"o preto age por interesse" 100
"a mania da fotografia" 1001

 

 "Carlos Estermann troçava um pouco da  fotografia" 102

 

 

 

 

 

 
 
 
 
Três exposições no SPN/SNI:
 
1938, 1946 e 1951 - Elmano Cunha e Costa, fotografias provenientes da chamada Missão Fotográfica a Angola (1935-1938). 
 
1938 - Exposição de Fotografias de Angola
1946 - Exposição de Etnografia Angolana
1951 - Exposição Penteados e Adornos Femininos das Indígenas de Angola
 
A exposição de 1938 inaugurou na sede do SPN a 4 de Julho, com presença de Carmona.


1. "Exposição de Fotografias de Angola pelo Dr. Elmano Cunha e Costa"  Ver Objectiva nº 15, Agosto, pág. 38*. 

2. Exposição do Mundo Português. Secção Colonial. Dir. Henrique Galvão. Colaborador fotográfico Dr Elmano Costa e Cunha, 1940 * catálogo

3. Castro Soromenho, *A Maravilhosa Viagem dos Exploradores Portrugueses, Início da publicação em fascículos, até 1948. Ilustrações e arranjo gráfico de Manuel Ribeiro de Pavia e fotografias de Elmano Cunha e Costa (ambos não creditados).
ver sobre Pavia: https://almanaquesilva.wordpress.com/2011/01/18/a-africa-negra-de-pavia/
 
 
Outras fotos reproduzidas:
1 - Provas em leilão, ver Artnet: 
http://www.artnet.de/K%C3%BCnstler/elmano-cunha+e+costa/auktionsresultate

2 - duas f. na p. 262 A.Sena, rep., diz cerca de 1945, Jovem rapariga do Huambo

3 - Arquivo Científico Tropical do IICT 
8718 negativos de película em nitrato de celulose, formato 6x6cm.1935-1939
Levantamento de grupos étnicos em Angola na década de 30, séc. XX, por Elmano Cunha e Costa para a Agência Geral do Ultramar. Retratos, usos e costumes, feitiçaria, rituais, habitação, arte. 
http://actd.iict.pt/collection/actd:AHUECC?rows=50&pager_row=1
 
através de Memória do Oriente

Outros artigos

Exposição etnográfica de Angola / Elmano Cunha e Costa. - Possui ilustrações.
In: O Mundo Português. - II série, nº 7 (1947), p. 45-51

Penteados e adornos femininos das indígenas de Angola / Elmano Cunha e Costa
In: Boletim geral das colónias.- vol. 26, nº 310.- (1951), p. 137- 141
Cota: 89|ISCSP
 
catálogos

1. Catálogo da exposição de etnografia angolana / Elmano Cunha e Costa. - Lisboa : Agência Geral das Colónias, 1946 (Lisboa : Oficina Gráfica Limitada, 1946. - fotografias - 37 p. : il. ; 22 cm. / [34] p., [6] leaves of plates : ill. ; 23 cm
 
2. CATÁLOGO da Exposição de Penteados e Adornos femininos das Indígenas de Angola / promovida pela Agência das Colónias sob o patrocínio de S. Exª o Ministro das Colónias : documentario fotográfico, carta etnográfica e legendas da autoria do Dr. Elmano Cunha e Costa.-
(Lisboa): S.N.I., 1951.-(40) p.:il.; 23cm. Ilustrado com fotografias. OU (Lisboa : Sociedade Industrial de Tipografia, 1951. - fotografia, [20] f. : il. ; 24 cm OU  [19] p., [8] leaves of plates : ill. ; 22 cm.
 
1 livro
Negros / Carlos Estermann, Elmano Cunha e Costa. - Lisboa : Livria Bertrand, [19--?] 1941. - XV + 207 páginas, [8] p., 1 est. ; 20 cm (ilustrado?)

 

 bibliografia do Elmano Costa e Cunha acrescenta-se mais um nº, localizado num 'sebo' do Brasil
 
Catálogo da Exposição de Etnografia Angolana - Promovido pela Agência Geral das Colónias. Porto, No Salão de Festas do Coliseu, 1947. Documenário fotográfico, Carta Etnográfica e legendas, da autoria do Dr. Elmano Cunha e Costa. In-8.º; de páginas inumeradas. 
 
 
É certamente uma variante portuense do catálogo de 1946 no SPN:
 
Catálogo da exposição de etnografia angolana / Elmano Cunha e Costa. - Lisboa : Agência Geral das Colónias, 1946 (Lisboa : Oficina Gráfica Limitada, 1946. - fotografias - 37 p. : il. ; 22 cm. / [34] p., [6] leaves of plates : ill. ; 23 cm
 
Aos quais se segue então um 3º catálogo, de 1951: 
 
 

 
CATÁLOGO da Exposição de Penteados e Adornos Femininos das Indígenas de Angola / promovida pela Agência das Colónias sob o patrocínio de S. Exª o Ministro das Colónias: Documentario fotográfico, carta etnográfica e legendas da autoria do Dr. Elmano Cunha e Costa.
(Lisboa): S.N.I., 1951.(40) p.:il.; 23 cm.. (Salão do SNI / Lisboa : imp. Sociedade Industrial de Tipografia, [20] f. : il. ; 24 cm OU  [19] p., [8] leaves of plates : ill. ; 22 cm)
200 nºs de catálogo. Ilustrado com 8 fotografias.

 
Penteados e adornos (rapariga do Humbe) Angola (nº 143?)
a mm foto aparece rep. na pág. 262 da História de A. Sena (s/t (jovem rapariga do Humbo), Angola c. 1945, brometo 29,9x23,6 cm, col. part.
 
escreve A.S.: E.C.C, expõe em 1946 no SNI "o trabalho que realizou durante a Missão Fotográfica a Angola. Tinha sido encarregado pelo Governo para (de) organizar o Álbum Etnográfico de Angola, em colaboração com o Pe. Carlos Estermann.", p. 261. (sublinhados a confirmar...)
#

Entretanto, a Inês Gomes, que tem estudado as exposições de fotografia colonial/ultramarina, refere que
 
O Elmano era advogado de formação e profissão. Exerceu em Moçâmedes, onde dirigiu o jornal "Sul de Angola". Volta a Portugal em 1943, ano em que tenta reingressar na Ordem dos Advogados, mas não o aceitam. Morre em 1955.
 
O artigo  "Alguns aspectos dos estudos etnográficos" (In: Boletim geral das colónias. - Ano 19º, nº 220 (Outubro de 1943), p. 93-108 ) data do seu regresso a Lisboa
 
Entretanto acrescenta-se outro título: "O Regaleira e...os seus fantamas". 

Existe na Biblioteca de Arte da Gulbenkian e também na BN:
http://www.biblartepac.gulbenkian.pt/ipac20/ipac.jsp?session=139639T8L22Q4.7070&profile=ba&source=~!fcgbga&view=subscriptionsummary&uri=full=3100024~!27051~!0&ri=1&aspect=basic_search&menu=search&ipp=20&spp=20&staffonly=&term=costa,+elmano+cunha+e+&index=.AW&uindex=&aspect=basic_search&menu=search&ri=1
 

Posted at 13:56 in 1938, 2014, Africa, Angola, Angola 1938, Elmano Cunha e Costa, Etnologia, Fotografia africana, Fotografia Moçambique, Fotografos, história antiga, Moçambique, SNI/SPN | Permalink | Comments (0)

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08/23/2020

por garvao 22-08, Taliscas, Carrascalinho, Monte dos Covões

Taliscas Taliscas 22-08

era uma fonte (2 freguesias 2, Luzianes e Santa Maria, concelho de Odemira, Luzianes-Gare

Taliscas 22-08
mobiliário, diante do Café Lourenço, Taliscas

Taliscas 22-08

Café Lourenço, o Polvo da Paula (in progress)

Carrascalinho:

Carrascalinho 22-08
Carrascalinho 22-08

os fornos


Carrascalinho 22-08
Carrascalinho forno 22-08 IMG_6276
Carrascalinho forno 22-08 IMG_6276

O Monte, Auditório

Monte 22-08 IMG_7220 - cópia

Posted at 18:31 in 2020, Covões, foto, Garvão, por garvão | Permalink | Comments (0)

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08/07/2020

Mina de São Domingos

Uma casa na Mina  de São Domingos.  A casa do Sr Miguel Costa.

Ainda existe este "monumento" da arte pública e arte outsider? Parece-me que já não - falta cuidado com o património. As fotos são de 30 março 2015 .

 

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Foto da Luisa:
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E é de lembrar o SOLAR DOS JORGES - Foto de Pedro Lobo, 30 de março de 2014 PedroLobo_140306_5742
https://alexandrepomar.typepad.com/alexandre_pomar/jorge-soares/

Posted at 20:05 in 2015, foto, Outsider | Permalink | Comments (0)

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08/06/2020

Rui Filipe no Museu do Neo-Realismo

Rui Filipe (1928-1997) não foi neo-realista, ....

Captura de ecrã 2020-08-06  às 01.44.04

Paisagem 1972 e Sem título [Floresta Africana], 1976

 

Africanos

IMG_5592
CarrocelCarrocel, estudo ou variante

Paisagem.pdf


Captura de ecrã 2020-08-06  às 01.44.04

da dir. para a esq. Menina, 1953; Natureza Morta, 1951-53; Crianças na Praia, 1953


Captura de ecrã 2020-08-06  às 01.44.04
Captura de ecrã 2020-08-06  às 01.44.04

Rui 1


... nem surrealista, nem "abstracto" e são em geral os estilos colectivos que se valorizam e divulgam. É muito mais fácil apontar um qualquer ismo, recorre-se a uma grelha sabida e cada artista é visto como a ilustração de uma versão nacional do movimento, em geral sem originalidade assinalável.

Rui Filipe é mostrado no Museu que Vila Franca de Xira dedica ao Neo-Realismo, e é uma surpresa: a sua obra é mal conhecida, em especial a das primeiras décadas (o comissariado é de Paula Loura Baptista). Por momentos a sua figuração pode aparentar-se aos realistas (Multidão, 1962, e Carrocel, 1960-61). Antes, a geometrização da paisagem é reflectida e poderosa, sem ser um mero exercício formal (Casas, 1954). Muito mais tarde algumas obras sugerem um regresso a visões africanas, nomeadamente ao all-over próprio de Malangatana. Mas desde as obras dos anos 50 (Menina, 1953; Natureza Morta, 1951-53; Crianças na Praia, 1953; ou os casarios sombrios) há uma muito constante estranheza intrigante, alucinada, ou uma dimensão talvez metafísica, única na pintura portuguesa, que se mantém nas paisagens lunares de objectos abstractos e depois nas figuras frontais e imóveis, espectrais, da sua obra tardia e mais conhecida.

Veio de Moçambique (em 1946), como se confirma pelas primeiras peças da exp., com retratos africanos que se dirão académicos (discípulo de Frederico Ayres em Lourenço Marques). Primeiras exp locais em 1944 e 46, de onde Henrique Galvao terá trazido uma beleza negra que incluiu em Outras Terras, Outras Gentes, na edição em fascículos de 1944-47. Depois foi  aluno de Domingos Rebelo e de Dórdio Gomes, no Porto (EBAP?), e principalmente de Vázquez Dias em Madrid (1948-51), um sólido e influente admirador de Cézanne, com quem "aprofundou os valores expressivos de um paisagismo mental, articulando as superfícies dos motivos numa continuidade contornada muito rítmica que o cromatismo surdo acentua", Raquel Henriques da Silva (Museu do Chiado: Arte portuguesa 1850-1950, 1994, p. 314; in Wikipedia).

Viajou e frequentou academias em Paris (La Grande Chaumière) e Londres, a Slade, colega de Cutileiro... É um itinerário original e raro no seu tempo, e a sua obra é também original, pessoal, diferente. A mostra antológica, a 1ª, prolonga-se até Outubro e aguarda-se ainda o catálogo (tornou-se norma, uma praga, falhar a divulgação de uma exp e de um artista deixando a edição para as calendas...) Dizem-me que sairá no início de Setembro, e assim a exp. terá um segundo fôlego...

Entre 1962 e 1982 trabalhou em publicidade, que foi ocupação de muitos, e em geral fatal, mas não no seu caso. Nos anos 80, em que expôs com frequência e sucesso, as suas telas manifestam uma densidade expressiva algo dramática (que tem a ver com a morte de um filho), muitas vezes ocupadas por um rosto escultural que se destaca de um também denso trabalho matérico.

São particularmente interessantes as paisagens abstractas, ou que são antes espaços ambíguos preenchidos por formas escultóricas reconhecíveis e não figurativas, e as referências africanas que surgem em alguns trabalhos onde se reconhece uma vegetação luxuriante ou um encadeado ascendente de corpos que lembra nitidamente a escultura maconde na variante ”Ujamaa”, que significa família ou união.

Negra captNegra, 1945, publicado em Outras Terras, Outras Gentes, de Henrique Galvão

Vale a pena ir ver

 

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Sobre duas estátuas : o Vieira e o Zeca Afonso (com muitas imagens)

SOBRE A ESTÁTUA DO VIEIRA
Claro que é arte (é uma representação com ambição artística e, como se vê, objecto de disputa sobre a sua recepção como arte e a sua apreciação estética) Essa é uma errada direcção de análise (respondo a quem se preocupa em determinar se a estátua do PAV é ou não é "arte", no caso o Celso Martins). E não é o consenso que a determina como arte ou não arte.
É uma obra de arte medíocre. E isto não se prova, argumenta-se em busca de um consenso critico.
“Convém dizer que a estatuária é uma forma totalmente anacrónica de pôr símbolos no espaço público, a reflexão sobre isso não é estética mas política.” (sic)
A interdição da estatuária pela crítica do tardo-modernismo formalista não é matéria de fé - é uma tese académica datada - e não contraria ou condena a aspiração comum/colectiva a colocar marcas simbólicas no espaço público. Também se condenaram a figuração e os géneros tradicionais - o retrato, nomeadamente -, condenou-se o plinto e o bronze, pôs-se em causa a escultura (não a escultura “expandida”) a favor do objecto (encontrado), da assemblage, da instalação, etc, mas isso não a tornou impossível, embora rara, e teve por efeito a multiplicação de maus escultores que satisfazem a necessidade do monumento e da estátua, da homenagem e da memória, como sucedeu com o PAV e continuará a acontecer.

Custa-me a acreditar que o último escultor capaz de fazer estátuas seja o João Cutileiro: o Sebastião de Lagos, o Camões de Cascais, a Inês de Castro de Coimbra, a Florbela (onde?), o Afonso Henriques e muitos outros, os guerreiros anónimos, as mulheres, as mulheres, as mulheres... De qq modo se foi o último, a culpa não é dele, mas das Escolas e da crítica formalista pós-França.

Há quem continue às voltas com a ideia do atestado de arte, ou certificado de arte. Isso não é matéria de certificação nem de consenso, democrático ou de 'especialistas'. Essa é uma questão nula, inexistente, o que já se sabe há muito.
O consenso procura-se quanto à avaliação crítica, à apreciação estética. E estas não se 'estabelecem' de uma vez por todas, defendem-se, argumentam-se. Para alguns efeitos legais ou oficiais e institucionais (colecções, museus, concursos, etc - ou tipo classificação de espectáculos) a avaliação pode ser delegada numa comissão (ou parlamento, até), o que não a torna avaliação definitiva ou a verdade.
Também querem certificar quem é artista e quem não é? Regressam às corporações, às academias? Ou pensam numa Ordem dos artistas? Incluem os amadores e outsiders, espontâneos, loucos? De certeza que os maus artistas terão direito à carteira profissional neo-corporativa. (14 junho)

*

Uma estátua é uma homenagem quando é erigida e inaugurada. Depois é um vestígio, uma peça do património histórico, um objecto identificado ou não, uma obra de arte ou não. Quem não consegue actuar no presente volta-se para os fantasmas do passado. Um problema efectivamente actual é a incapacidade ou impossibilidade (segundo Rosalind Krauss e discípulos) dos artistas contemporâneos conceberem monumentos e estátuas. (Para que servem hoje os escultores?) 12 junho

(coisas rápidas do facebook...)

SOBRE O ZECA AFONSO, uma nota à bruta

A propósito de monumentos e da sua dificuldade.
Por concurso faltariam candidaturas e as que aparecessem apontavam para os calhaus "abstractos". Há poucos artistas, em especial escultores, e há demasiados licenciados em escultura, ou arte em geral, que vivem acolhidos e protegidos pelas galerias institucionais - são geralmente fraquíssimos, mas preenchem as quotas oficiais. Vivem de instalações descartáveis destinadas às reservas dos museus, se couberem nos orçamentos protectores, ou que se fazem e desfazem para ocuparem à vez os grandes espaços vazios das galerias públicas, nas traseiras do restaurante do museu ou dos jardins "museológicos" onde se leva a família ao fim de semana (um progresso cultural óbvio).
Estas obras de autores ignorados, praticantes da estátua (são várias as homenagens ao Zeca Afonso, há muito tempo uma vítima...) devem servir para se verificar que a necessidade da estátua (ou retrato, ou busto - a ideia da homenagem e da marcação simbólica de lugares, a memória colectiva, a "arte pública") não se extinguiu e continua a importar a muitos, mas desapareceu o saber fazer.
A figura, a representação, a decoração, a ilustração foram condenadas no espaço social da arte pelas vanguardas do século XX e nada se lhe lhes substituiu. A "impossibilidade do monumento" fez parte da cartilha do tardo-modernismo formalista de Rosalind Krauss. As escolas trabalham com "conceitos", intenções, projectos, modelos de curricula e de candidaturas a apoios, e os professores também já não sabem do ofício. Se se perde o ofício e a tradição, a função, os artistas são também dispensáveis (mas é certo que faltam empregos e nem todos podem ser professores de coisa nenhuma). A autonomia da arte esbarrou na parede. (6 de Agosto)

 

Vieira

Foto Rui Gaudêncio ( https://www.publico.pt/2020/07/17/culturaipsilon/noticia/actas-mostram-juri-escolheu-estatua-vieira-nao-ficou-convencido-1924822 )


Vieira

Amadora: Estátua em mármore de José Afonso, de 4 metros, da autoria do escultor Francisco Simões. Inaugurada em 1991 pela Câmara Municipal da Amadora, situa-se no Parque Central cidade.

 

Grândola: escultor António Trindade, 1999:Vieira

Captura de ecrã 2020-08-07  às 16.51.59
Captura de ecrã 2020-08-07  às 16.51.59

 

 

 

 

 

 

 

 

Zeca Grandolamonumento_a_jose_afonso_nova_1_1280_2500

Monumento a José Afonso no Complexo Desportivo José Afonso | Grândola: Autor arquitecto João Videira (C.M.G.), 1987


Vieira ZecaAfonso

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Monumento a José Afonso Parque Zeca Afonso - Baixa da Banheira: Peça escultórica, implantada no Parque Municipal José Afonso, é de autoria do Mestre Lagoa Henriques, 1994. A escultura, em pedra e bronze, foi adquirida por subscrição pública,

 


Vieira

Malpica do Tejo: escultor Cristiano Ferreira, 2014 "Com a presença de largas centenas de pessoas a Junta de Freguesia de Malpica do Tejo em colaboração com a Câmara Municipal albicastrense e a Associação José Afonso organizaram e levaram a cabo, hoje dia 1 de maio, Dia do Trabalhador, o 1º Festival José Afonso que contou com a presença de inúmeros artistas, Orfeão de Castelo Branco, grupos de bombos e do sobrinho de Zeca, João Afonso." "Recorde-se que José Afonso recolheu presencialmente em Malpica do Tejo, no final da década de 60 do século passado, quatro cantigas do cancioneiro popular da Beira Baixa, “Maria Faia”, “Oh que calma vai caindo”, “Lá vai Jeremias” e “Moda do Entrudo”."  Jornal de Oleiros

 

 

 Zeca
Zeca todo

 

Belmonte, escultor Pedro Figueiredo (2020), agora com outras fotos mais correctas

 

E também:

1Zeca-Afonso-1900x1425-1
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Vhils, 2014: Escola Secundária Dr. JoséAfonso, Seixal

Odeith (https://www.facebook.com/odeithofficialpage/ ), 2016: Falagueira, Amadora. ( https://www.publico.pt/2016/10/12/p3/fotogaleria/amalia-paredes-e-zeca-os-novos-gigantes-da-amadora-386153 )

Associação José Afonso

www.aja.pt

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08/01/2020

Madeira Luís

Morreu o Madeira Luís, um grande activista cultural. Funcionário da SEC, investigador-coleccionador (os cartazes, os vidros, etc).

Não me lembro dele na Opinião, onde não era assíduo. Conheci-o a propósito do incêndio da Galeria de Arte Moderna de Belém, sobre o qual escrevi no Diário de Notícias: DN, 1981 Setembro 21 - «Salvar o cartaz depois do incêndio / Perderam-se 20 mil exemplares coleccionados por Madeira Luís"(*)

Fui-o encontrando em sessões e exposições, mas foram encontros breves (o jornalismo é inconstante). O Madeira Luís estava doente há bastante tempo. A SEC/MC também, e um dos sintomas mais evidentes é a falta de conservação e produção da sua própria memória (incúria e ocultação: é mais fácil não lembrar nada), e o Madeira Luís tinha sido um agente de longo curso - a Maria Augusta Fernandes, abaixo referido, foi insistindo na importância dessas memórias e candidatando-se a reuni-las...

 

Fotografei-o em 2013 no Museu do Neo-Realismo, no  domingo, 24 de março (e gosto muito deste retrato) Madeira luis_5543

Madeira luis_5541

Mas o segundo retrato da mesma data, tb está bem. "É ele"

A Maria Augusta Fernandes deu a notícia da morte e publicou o seu currículo:

https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxwYXJ0ZXBsYXRhZm9ybWF8Z3g6ZmMxNmFkMWY2OTRlOTdi&fbclid=IwAR2be9PeBE_6bbHpl-vbvrAntyoamPZDZGcBTNWUMwAaMQNMjH75B8LB6kA

 

(*) Também sobre o incêndio: Agosto 21 - Notícia do incêndio da Galeria de Arte Moderna de Belém, junto ao Museu de Arte Popular. "Desenhos de todo o mundo arderam na galeria de Belém" (1ª pág.)
Agosto 22 - «No rescaldo do incêndio da Galeria de Belém / Continuam a deixar arder a cultura portuguesa». Foram quase os meus inícios culturais.

 

 

 

 

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07/31/2020

Covid cultural / cultura covid: jornalismo preguiçoso e arrogante

Uma entrevista com um ministro não é uma discussão de café. Ao jornalista que fala da fome dos artistas não passa pela cabeça referir a fome de muitos outros trabalhadores e desempregados, e usa a cultura, a fome, o drink como ruído. Trata-se de tentar abocanhar - a Graça atirou-lhes um osso (o drink) e os jornalistas com o osso nos dentes dispensam-se de fazer o seu trabalho. A sra foi muito paciente.

https://expresso.pt/cultura/2020-07-31-Nenhum-jornalista-me-incomoda-a-entrevista-a-ministra-da-Cultura-na-integra?fbclid=IwAR02tlPb8UroxrZopD3ogDpsPRWDIchm9hx-KKFlwOvUxX79XJ1ZbtNU6D0

Um jornalista que faz o trabalho de casa não abocanha assim:

Questão 1: a coleccao do estado apareceu agora explicada como apoio aos artistas? (É um erro da ministra, que só vem dar razão a quem critica desde o início, desde sempre a ideia de "Colecção de Estado").

Questão 2: o trabalho intermitente dos artistas do espectáculo e o trabalho independente dos artistas em geral (mais curadores, críticos, autores, etc) como pode ser reconhecido e protegido, sem confundir-se com emprego / contrato regular e permanente, que não é?

Questão 3: ser artista ou apresentar-se como tal ou contar com um titulo de Dr Artista assegura o direito à subvenção permanente que se substitui às condições de mercado (ao reconhecimento, ao êxito, à venda de obras e espectáculos)? O anunciado estatuto do artista é um controle corporativo das actividades artísticas livres e uma funcionarização das artes?

Questão 4: o artista é alguém “fora do mercado” e privilegiado enquanto tal? Um produtor independente em auto-gestão assistida? Questão 5: escolher ser artista é escolher o risco de ser reconhecido como tal, ou não, e de viver como artista, à margem da produção oficinal ou industrial, dos serviços e da distribuição comercial, ou é o acesso a uma certificação que dá direito à subvenção? - e os pequenos artistas, os que falham, os amadores, os artistas de domingo e TODOS OS OUTROS?

(31 de Julho) versão revista

O jornalismo desonesto e oportunista: cobrir a notícia sobre a União Audiovisual com a frase solta do drink e a foto agressiva.
Um título inacreditável que se desqualifica a si mesmo e ao jornal onde se publica (o Expresso):
“Enquanto [a ministra] bebe drinks e fala de arte contemporânea, a União dá ajuda espontânea”: as rimas de quem ajuda quem passa fome "

https://expresso.pt/coronavirus/2020-07-29-Enquanto-a-ministra-bebe-drinks-e-fala-de-arte-contemporanea-a-Uniao-daajuda-espontanea-as-rimas-de-quem-ajuda-quem-passa-fome?fbclid=IwAR3T6-o_hFCE1I9KRN-96hQoAYEc7p6jbBW8U9JiNpI0JAmXEJhjyM6wV7M

Até apetece defender a Graça (depois das vezes em que critiquei as suas acções e omissões). Tem mais graça ser do contra.

(30 de Julho)

A Graça tem muito jeito para se pôr a jeito, de facto, o que até tem 'graça'. Está mal assessorada e ouve pouco as pessoas que consulta, pelo que me dizem. É obstinada, o que é um defeito e uma qualidade. É um ministério de lobies e de castas, de corporações e egos; um ministério sem memória própria, onde o trabalho de casa se faz pelo google ou não se faz. O Costa não se interessa e gosta de intrigas, divide para reinar. Artes e culturas são áreas problemáticas que servem para a ostentação nos casos de sucesso e o resto é conversa, ou um poço sem fundo de competição e desentendimentos. ( 1 Agosto)

 

 

 

 

 

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07/11/2020

A história das Oposições tutelada pelo PC

I

Está em causa a defesa e ilustração do não-salazarismo monopolista. Anti-todos excepto o aparelho próprio (e mesmo assim com as excepções convenientes): a defesa de uma versão da história que teve um pólo em Moscovo e outro no Avante. (9 Julho) #polemicadoAljube

 

II

A nomeação de Rita  Rato como directora do Museu do Aljube, depois de um concurso claramente viciado, é mesmo uma questão fracturante e há que ir ao âmago da questão. Tratou-se de uma escolha  política, por parte da actual CML de obediência PS, cujos meandros não foram ainda esclarecidos.

É mesmo por ser do PC e ter sido deputada desse partido durante 10 anos, até 2019, sem ter saído por dissidência, que a Rita Rato não tem idoneidade para dirigir o Museu do Aljube. Nem credibilidade, perfil, curriculum, como quiserem.
Não se trata de exigir credenciais académicas ou museológicas, conforme algumas críticas de eficácia lateral, mais ou menos hipócritas, mas por fundamentação política.

Quem conhece a história da oposição ao Estado Novo e ao salazarismo (e a memória vai-se esbatendo para as gerações mais recentes que a não viveram), sabe que o PC foi vítima e algoz, censurado e censor, perseguido e perseguidor, tanto face a outras tendências e movimentos oposicionistas (anarquistas, trotskistas, sociais-democratas, marxistas-leninistas-maoistas, autogestionários, liberais, etc) como face a muitos dos seus próprios dirigentes e militantes (desviantes, fraccionistas, dissidentes, críticos, e ex-militantes em geral).
O PC propõe, pratica e defende uma versão partidária da história, a sua e a do país, que tanto inclui a sua dependência perante a União Soviética e a sua repressão política, interna e externa, perante as suas organizaçoes internacionais (Komintern, 1919-1943, e Kominform, 1947-1956) e os seus estados satélites, como a ocultação e manipulação da sua história própria, bem como dos seus arquivos e documentos. O PC impõe a sua história oficial, com uma prática militante e sectária continuada através das décadas, das mudanças do mundo e das suas sucessivas derrotas. Uma história que exclui, em especial, o reconhecimento da Oposição anti-comunista, que foi tendo dificilmente direito de existência.

Tudo isto desqualifica a sra para dirigir um museu dedicado à resistência anti-fascista, que deve ilustrar a sua diversidade e as suas tensões e contradições internas, a história controversa das Oposições, que serviu ela mesma a longevidade do regime, combatendo-o e combatendo-se.
Poderia ser vereadora se existisse um pacto político PS-PC publicamente validado em eleições, poderia dirigir uma galeria ou um parque da CML, uma cantina para sem abrigo. por exemplo. Mas não pode dirigir o Museu da Resistência. (9 de Julho)

II
(resposta revista a um diligente opositor) Não se trata de uma "tese" e não está no meu horizonte meter-me em maiores pesquisas. Trata-se de uma experiência de vida, de informações e conhecimentos recolhidos ao longo dos anos, acumulando relatos, factos, leituras, testemunhos.
Lembram-se da proibição dos comunistas escreverem no jornal Ler, da Europa-América (os Lyon de Castro eram perigosos titistas), denunciado pelo PC e estrangulado pela censura, numa insondável aliança (início dos anos 50)? Lembram-se do uso discricionário ou telecomendado acusando fulano de ter "traído" na cadeia, mesmo se esse fulano não tinha sido preso? Lembram-se das denúncias veiculadas no Avante sobre activistas dissidentes? Dos saneamentos nos cine-clubes e teatros porque um tal defendia o Hitchcock e outro não alinhava com as escolhas do partido? Ou as ocultações da história oficial, o Pavel, o Fogaça, muitos outros. Os exemplos fariam uma história oculta da oposição que os historiadores oficiais nunca quiseram fazer (costumo recordar o silêncio dos historiadores de credenciais anti-fascistas sobre uma entidade que se chamou Sociedade Propaganda de Portugal através da qual parte representativa das elites nacionais asseguraram a sua pacífica transição da monarquia ao Estado Novo, passando pela República, a igreja e a maçonaria). Não vou repetir o que escrevi acima nem comparar as doses de repressão do regime e do PC, não se trata disso, mas apenas de reconhecer que os inimigos a abater não eram só os do regime, desde os velhos anarco-sindicalistas. Para o PC há uma história oficial e autorizada, e essa cartilha é que importa, é a que se trata de estabelecer no Museu do Aljube - por vezes houve uns dirigentes cordatos e hábeis a quem foi possível dialogar, estabelecer cumplicidades e abrir pistas de contactos (estou-me a lembrar do meu amigo Ruben), mas essas foram acima de tudo formas de assegurar continuidades e criar compromissos quando se impunha romper e divergir. Lembro-me bem da recusa de incluir a memória dos episódios negros nas comemorações de Outubro. (11 Julho)
 
III
Contra a unicidade antifascista não houve Alamedas. Hipótese de trabalho: o marcelismo, a Sedes, o Gabinete da Área de Sines, a LUAR e o MFA fizeram o caminho até ao 25 de Abril, e o Rumo à Vitória (o livro, não a militância PC) é só um mono académico. A questão do Aljube é essa, para abreviar. (12 Julho)
 
IV
E ninguém liga à explicação credível da presidente da EGEAc (que não devia fazer parte do júri com o director de pessoal)? “a candidata seleccionada defendeu uma visão integrada para o museu, incluindo uma proposta de programação relacionada com temáticas de liberdades contemporâneas, como as questões de género ou a inclusão social”, destacando-se nessa abordagem na segunda ronda de entrevistas." JGC, Público 8 de Julho.
Mais o ar do tempo que a história. Digo eu. Liberdades contemporâneas , questões de género e inclusão, foram acrescentadas à última hora a gosto da presidente. O compromisso partidário tem razões outras.(13-14 Julho)
 

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06/05/2020

Arte e cultura, empregos, carreiras, públicos

"Desde há anos", diz M.M. = a cultura e as artes são assim mesmo, sempre, é o seu estado ”natural” (e não há nada de natural na cultura, é tudo Artifício, artificial): “O colapso desde há anos”, colapso?! - mas a palavra fantástico é a que mais se ouve sobre artes e artistas ; são todos fantásticos.

A arte como “carreira” é a opção pelo risco e/ou o desafio da afirmação própria ou da “expressão” pessoal, com o prazer da diferença e uma vida sem rede, a aposta de fugir ao trabalho rotineiro e "alienado" - mas de facto sempre cabem poucos artistas no sistema, porque são muitos os candidatos e poucos os escolhidos (ou os apoiados, ou os que têm sucesso, em vida ou depois). A boémia e o lumpen foram as margens do sistema, no fim do século XIX, depois das corporações e academias, quando houve artistas (independentes) a mais. Uma outra explosão de artistas - agora “autónomos” - foi crescendo desde os anos 70 (ou seja, depois das guerras e das reconstruções, 1914-1955) sobre a crítica da cultura e da sociedade burguesas.

Do espaço da cultura fazem parte também os públicos: leitores, espectadores, visitantes, consumidores, fruidores, amadores (num dos sentidos de amador). Ao contrário do que muito se diz e deseja o MC não representa os artistas e técnicos da cultura, nem a sua acção, quando existe, se destina apenas ou principalmente a eles. Como o Ministério da educação cuida dos alunos e não só dos professores; o M. da saúde cuida dos doentes e não só de médicos, enfermeiros e técnicos e assistentes e gestores...
Também se esquece habitualmente, intencionalmente, incluir os amadores (noutro sentido, o 1º, talvez) no espaço da cultura e das artes. Os que praticam a música e o canto, a dança, o teatro, a pintura, a fotografia e o cinema, etc não como candidatos ao "emprego" mas à margem do emprego e da profissão, como afirmação pessoal, troca, convívio. Amadores, pintores de domingo, outsiders (e podem ser /foram os melhores. São uma componente muito vasta e importante do tecido social da cultura, dão espessura à manta de retalhos da cultura (o tal tecido) mas não têm voz e têm poucos apoios (bandas e academias, "ranchos", sociedades recreativas, teatros amadores, associações, salões locais, etc). O país tem esmagado os seus amadores, em geral excluídos dos Programas, como aconteceu em 1985 nos Estados Gerais (onde é que eu tenho as páginas apagadas?). Os amadores praticantes e os amadores consumidores são o quadro, o contexto, a base necessária dos profissionais da cultura.

A cultura é um "ecossistema", aponta M.M., onde se precisa quase sempre de suportes profissionais acessórios, laterais ou predominantes (pintor e professor ou arquitecto, ou ilustrador; fotógrafo autor e/ou repórter, impressor, publicitário, etc; actor e empregado de mesa, actor de teatro e tv e cinema, quando calha; escritor e médico ou diplomata ou jornalista; poeta, artesão, figurante, músico, agente, produtor, curador, crítico.... O meio é pequeno, mas a situação é a mesma em NY ou Londres (mais descomplexada: mesmo os grandes artistas têm duplo emprego e as grandes obras fazem-nas quando têm bolsas ou prémios ou encomendas). Deixei de parte a reflexão sobre o talento, que é uma palavra problemática e pouco usada, que certamente foi preciso descartar para criar multidões de candidatos a artistas, que uma vez "defini" numa conferência sobre economia da cultura como desempregados com auto-estima. Quando faltaram as ocupações produtivas, empurram-se os jovens para as artes, onde não fazem greves e barricadas - são individualistas e não têm patrões exploradores (anteciparam a uberizaçao do trabalho).

"No meio disto, financiado em grande medida por todos estes expedientes, está o seu emprego «a sério» que é ser artista, como um buraco negro no centro de uma galáxia. Ou seja, a cultura é uma máquina gigante que se financia e alimenta a si mesma, deixando aos artistas a tarefa de trabalharem para ganhar o dinheiro para trabalhar." (M.M.) Mas a cultura não é uma máquina, é uma floresta, uma praia, um pântano, uma parte das estatística da economia onde cabem as mais diversas coisas. Como pode ser de outro modo, mesmo sem covid? Ser estudante, licenciado, “mestre” ou mestrando, doutorado em arte não garante ser artista, quando muito, para os melhores entre quase todos, é um estágio de “criatividade em geral” com passagem a outras práticas profissionais ou amadoras, escapando talvez ao call center. Ser doutor curador teórico crítico não assegura emprego. No sector, o jovem, o novo, a novidade impera, o desgaste rápido, a entrada constante de uma nova geração que substitui em grande parte a anterior, como as apresentações anuais/semestrais das novas modas. Será uma marca mais portuguesa porque o país é sempre o primeiro a colher a informação / tendência internacional, por não ter uma informação / cultura própria sedimentada. Desde os anos 1948 pelo menos. Os produtos renovam-se, as pessoas descartam-se - algumas sempre vingam!

Arte e a cultura são universos extremamente selectivos, onde impera o concurso para o apoio público e a perspectiva do sucesso que dá acesso ao mercado. Não há arte sem mercado, seja ele privado ou publico ou ambas as coisas em simultâneo (como os museus e os teatros nacionais e municipais). Mas também inclui áreas indefinidas de existência / sobrevivência sem reconhecimento crítico e/ou institucional, em que cabem biscates e inúmeras “profissões artísticas”, mais ou menos secretas, discretas, invisíveis, laterais - as praças estão cheias de “artesanatos” e artefactos de arte ou de decoração, colecção, “luxo” inútil. A ideia de "emprego" "a sério" como artista" (sic) tem muito pouco ou nenhum sentido - salvo excepções, que aliás a si mesmo se recusarão como “emprego”: o director-encenador, alguns técnicos especialistas, alguns músicos de sucesso que são patrões de si mesmo, empresários. (isto são só pistas, não é doutrina nenhuma... O Mário Moura que me perdoe citar-lhe a escrita...) #covidcultural

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05/25/2020

discursos culturais

Comentários sobre discursos culturais:

"Urge estabelecer um estatuto profissional para o Artista!" - escreve VC (um estatuto para cada arte ou um para todos, do cinema à poesia?).
"Todos os profissionais da cultura têm de estar integrados numa Lei" (JQ) Integrar artistas é uma ameaça, uma violação, um abuso, uma prepotência.
"...é um mundo que tem profissões de investigação /concepção, ensino, criação artística, produção, educação, divulgação, economia da cultura,..." (JC) - pelo caminho não há lugar para os artistas, ou chamam-lhe conceptores? criadores? produtores?: proposta: deixar os artistas fora-da-lei e contingentar, regular, os penduras (incluindo marchands, empresários, críticos, se os houver, directores, publicitários, etc).
"Um subsídio é outra coisa" VC - é a actualização do lugar do artista na corte profana ou divina, da encomenda do mecenas, da tença.Antes a bolsa, o prémio, a aquisição.
"Separação entre profissionais e amadores, ninguém exerce uma profissão sem a aprender, desde as oficinas artísticas da Idade Média que assim é..." JQ - as oficinas e corporações medievais como modelo autoritário, anteriores às academias régias e às sociedade livres - estamos a avançar cada vez mais para trás; Quem é amador e quem é profissional: são classes estanques? há exame de passagem? devem os amadores ser interditados e/ou remetidos para as romarias, ranchos, bandas, sociedades recreativas, salões da aguarela, lojas de artesanato (os artesãos e artesãos-artistas são amadores ou profissionais?)
"O que deve prevalecer é a relação contratual, clara e estável" JQ - do artista com a sua galeria, do escritor com a sua editora (a tanto por best-seller?), do poeta com a respectiva musa, do encenador com o teatro nacional? E se a produção for um fiasco, o artista devolve o $ do contrato?.
Onde pára o risco individual, o desafio, a aventura, a indisciplina de ser artista - um lugar marginal ao trabalho burocrático ou operário, auto-gerido e livre? Ser artista e ser candidato a artista são posições opostas no mercado das artes? (e o que há mais são candidatos a artistas, e há artistas licenciados, mestrandos, doutorados, tão pouco artistas). Claro que há situações de necessário contrato estável (sujeito a termo?, a provas?)
A cultura vai perdendo a sua cultura, a tentação totalitária é grande.

Mais: "É preciso é tirar a Cultura da tutela do Governo Português (seja ela rosa, laranja ou às riscas). (DF): a cultura não está tutelada (sob a tutela) do G.P. Podem fazer cultura à vontade. A "tutela" é a administração dos serviços públicos centrais/estatais da cultura; as autarquias administram os seus serviços públicos locais. G.P. e autarquias também contratam, adquirem e subsidiam (produzem) alguma cultura, e às vezes regulamentam - só alguma cultura, a mais efémera, a mais partidária.

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05/23/2020

30 milhões para as autarquias

Se se propõe e espera a vinda dos emigrantes no verão há que assegurar a viabilidade das romarias e dos seus espectáculos populares. Quim barreiros é cultura, sem dúvida, e o Peq Saul (ainda existe?) também é cultura. As feiras medievais são cultura e dão trabalho a muita gente do espectáculo. (Já agora, o Rodrigues dos Santos - e os seus redactores amestrados - é literatura.)
A promessa de 30 milhões para as autarquias fornecerem cultura é um gesto que tem a ver com o turismo interno, com as férias dos emigrantes, e em geral com as economias locais da cultura e os seus agentes. Com a cultura popular e com as relações de poder e de economia que se jogam no país e no terreno.
As reacções elitistas que pretendem condicionar apoios de emergência à qualidade cultural (com ou sem aspas) não têm sentido. O “pessoal” está a deixar-se isolar com protestos deslocados e reivindicações erradas.
Os apoios humanitários que são necessários face à crise actual dos recursos não são - não podem ser - geridos pelos critérios selectivos dos concursos.

O pimba, o kitsch, o popular, o amador, o tradicional e o novo, o erudito, com ou sem aspas, o vanguardista são um continuum no universo (universo?, um mundinho, o sector) da cultura, e as pessoas circulam ( precisam de circular livremente) entre as várias prateleiras conceptuais; a ideia de barreiras é um preconceito elitista e um impasse social. Mas “os culturais” (desde os Estados Gerais de 1995, com o Nery e os agentes do Carrilho) fizeram tudo para destruir os sectores amador e associativo - espero ter ainda as páginas do Programa que foi preciso arrancar.

O ataque aos municípios é outro equívoco a favor do centralismo e da dependência das instâncias autoritárias (júris e concursos negociados a partir do topo, controlados pelos mesmos - fiz uma vez essa experiência). Há melhores e piores câmaras, presidentes e vereadores, mas o jogo é esse. Eleitoral, democrático (partidário ou não), livre.
Se a ministra não se vê, se o Costa se marimba para o autoconsagrado sector cultural, e quer povo e votos, sempre tacticista (o Costa é Homeostetico desde o liceu e tinha o P. Portugal como assessor a reinar), as movimentações que têm voz no Público (um jornal de militantes desencontrados ou “interseccionais”, sem direção) e no FB com vigílias pífias e abaixo-assinados variegados, têm errado os alvos e desbaratado espaço social.
Donde vieram os 30M ? De onde estavam disponíveis, certamente, pq desbloquear verbas não é fácil. Depois se verá, agora importa a urgência. #covidcultural

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05/22/2020

meio da cultura, silêncio e vertigem

A falta de discurso político e de actuação prática (de intervenção pública e resposta técnica) de Graça Fonseca está a propiciar uma vertigem muito pouco racional na área que se entende como A Cultura. Uma pequena vertigem com alguma projecção mediática, por contiguidade e cumplicidades.
Tudo se baralha, num espaço em que confluem o trabalho e o ócio; a diversão, o entretenimento, o lazer, a investigação, a formação, a criação artística e intelectual; o emprego, a vocação, a paixão, o gosto; a actividade profissional e a amadora; o espectáculo público e o consumo privado; as indústrias da cultura e as práticas artesanais ou íntimas; o artista-criador e o técnico ou funcionário; as artes todas, com a sua radical diferença de condições de exercício, do cinema à poesia, por exemplo. A amálgama impera sem exame.
As necessidades de assistência face à penúria de recursos de muitos (muitos em geral e não só na cultura) e, por outro lado e em simultâneo, as condições de produção, distribuição e consumo (acesso, participação e fruição) são coisas diferentes, e facultar abonos não é o mesmo que apoiar a cultura.
Defender e valorizar as estruturas públicas da cultura não é o mesmo que favorecer a produção das artes. (Ou melhor, corrijo, não é o mesmo que favorecer artistas e agentes culturais, face aos restantes cidadãos, trabalhadores e desempregados. As estruturas públicas favorecem a produção, como as antigas cortes e mecenas: adquirem, encomendam e programam, atribuem bolsas, prémios e subsidios. Ver abaixo)
O meio social das artes existe sobre o individualismo dos artistas e actores. É um meio fortemente hierarquizado em que a excelência e a fama coexistem com o falhanço e a obscuridade, sobre fronteiras legitimadas ou insondáveis. Um meio em que coexistem o patrocínio e a encomenda, o subsídio, o prémio e a bolsa, a dinâmica empresarial e o acto isolado, o mercado (os mercados público, corporativo ou empresarial, fundacional, comercial - e a troca) e a dádiva ou partilha; a crítica e a promoção; o luxo, o gadget e o necessário; a elite e as massas, o erudito, o “culto”, o kitsch e o popular. Um meio onde todas as fórmulas por mais contraditórias têm curso: o culto do génio e a proclamação de que todos somos artistas; tradição e vanguarda; arte e anti-arte ou cultura e anti-cultura.
O meio da cultura não parece capaz de pensar a sua identidade ou identidades. Nem a “tutela” política nem a diversidade sectorial dos seus agentes - e é essa incapacidade que o caracteriza.

Foi um artigo do Público (22.05) que me estimulou, logo de manhã cedo, mas tentei desligar do pretexto. Também não me parece acertada a campanha do “Unidos pelo...” e os episódios anteriores na área das artes plásticas e outras não ajudam nenhuma causa, embora possam vir a intimidar um “poder” hesitante e incerto.

Não vejo por que os artistas e candidatos a artistas, os mediadores e os técnicos, carenciados, não se identificam e unem com os outros desempregados, precários e invisíveis, exigindo iguais rendimentos mínimos assegurados, mesmo que temporários.

O vazio político nesta área tem favorecido a confusão, por exemplo o julgar oportuno “resolver” agora a questão de um alegado estatuto profissional dos artistas (quem se reconhece como artista e quem é reconhecido como tal, por quem?). (Os artistas querem uma tutela? Uma Ordem? E como se gerem as regras ou imposições sindicais? Como se administra a liberdade?) E a questão da intermitência na área do espectáculo.

A lógica das antigas corporações fica à espreita (quem não tem estatuto ou carteira profissional de artista não cabe na condição de artista. A funcionarizacao como ideal.

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05/20/2020

20.05.2020 Garvão

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05/14/2020

espaços de privilégios

O passado recente da cultura não se recomendava, sobre o futuro há que pensar. A cultura e a arte não são espaços de unidade ou união, pelo contrário, é a diferença que importa. E menos ainda são espaços de privilégios. A prioridade, no momento presente, é acorrer aos carenciados e excluídos em geral.

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05/02/2020

outro milhão... para se adquirirem obras de arte nas galerias

02.05.20

Houve o milhão de euros para o TV Fest, de que se lembrou a ministra e que um abaixo-assinado travou, e aparece agora, mais discretamente, outro milhão reclamado em carta aberta abaixo-assinada para se adquirirem obras de arte nas galerias: "...que o Ministério que superiormente dirige, em acordo com os demais órgãos do Estado português, disponibilize, a breve trecho e com carácter de urgência, uma verba nunca inferior a um milhão de euros para dispender em arte no corrente ano. Seriam eles destinados a adquirir obras de arte nas diversas galerias portuguesas, através de escolha observada por uma Comissão especializada, nomeada por V. Excia, e integrando representantes nacionais creditados nestas várias actividades."
Não se pode dizer que a cultura se apresente, nas actuais circunstâncias, ou antes delas, como um sector capaz de se pensar a si próprio com perspectivas de racionalidade, eficácia e equidade. E as artes visuais ou plásticas, com a atomização dos seus profissionais e amadores, estão no fim da linha, e em geral fora das movimentações de agentes culturais. A reclamação do milhão de euros não tem pés para andar, nem matéria para extenso debate, mas pode-se começar por lembrar que esta área não tem (não é capaz de ter) representação associativa, nem de galerias (já teve), nem de artistas (a SNBA não cumpre essa função).

O meio galerístico é fortemente centralizado sobre uma ideia informe de "galerias leader", as quais absorvem as compras institucionais (estatais e particulares) e também as notícias ou críticas na imprensa. São também elas, com os seus processos de cooptação e exclusão, que regem a orgânica das feiras de arte, com grande importância para esse núcleo. O mercado galerístico é, por um lado, rigidamente hierarquizado (com independência do maior ou menor sucesso comercial) e por outro lado é também um mercado desconhecido, invisível ou informal, porque a par das "galerias de ponta", e de uma segunda linha que as cerca com alguma eventual visibilidade, existe toda uma imensidade de galerias, lojas, estabelecimentos (de quadros, estampas e "cromos", de molduras, de decorações), que se distribuem discretamente pela malha urbana das capitais, cidades da "província", centros comerciais, etc. Fazem parte do mercado de arte e o volume total de negócios deste sector invisível é seguramente maior do que o primeiro, assegurando, em condições normais, a subsistência de inúmeros artistas, muitos deles "desconhecidos", e intermediários. Deixemos de fora, aqui, a consideração do mercado secundário formado pelas leiloeiras e afins, muito perturbado nos últimos tempos pela dinâmica mais selvagem das vendas pela internet.

Regressa-se à carta-aberta: "Essa verba, desde que adequadamente administrada, poderá a) salvar a produção artística do País, b) garantir a sobrevivência do mercado, galerístico e secundário, e c) as obras assim adquiridas virem a integrar acervos dos museus públicos,..."
A proposta de uma "comissão especializada" para aplicar o milhão de euros é só a transferência da discricionaridade para uma instância que representaria a hierarquia acima apontada e por via desta para um sector já de si privilegiado de galerias e artistas, que a si próprio se atribui a administração da respectiva importância ou distinção. E mais uma vez se distorceria a razão de ser e a competência dos museus públicos, fazendo-os destinatários de aquisições movidas por critérios alheios, lógicas assistencialistas e cumplicidades.

No contexto da actual crise, de desemprego e paralisação de actividades, há que pensar em rendimentos de sobrevivência (universais ou para situações de maior carência) e em abonos, subsídios ou empréstimos que assegurem a continuidade de actividades empresariais e associativas viáveis. Há que proteger as situações de precariedade e ausência de rendimentos, mas não se devem assegurar privilégios estabelecidos, sejam eles decorrentes de posições elitistas e alegados critérios de qualidade. Há que separar as medidas de protecção social, urgentes e abrangentes, e as orientações das instâncias públicas que devem preservar e desenvolver as condições de funcionamento das suas estruturas próprias (museus, bibliotecas, etc) e do tecido cultural em geral.

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04/16/2020

1945 - MISSÃO ESTÉTICA, ÉVORA

Captura de ecrã 2020-04-16  às 00.15.56

A IX Missão Estética de Évora, de 1945, decorreu num período muito especial, num pós-guerra que fez vacilar a contenção política e censória do regime, receoso de ser apeado pelos Aliados, ao mesmo tempo que animava aguerridas agitações da oposição. (A 6 de Maio noticia-se a rendição das tropas alemãs o que dá origem a grandes manifestações populares.)
As Missões decorreram entre 1937 e 1963, sob a direcção da Academia Nacional de Belas Artes, reunindo finalistas e recém-formados de Lisboa e Porto, mas parece ser esta a única edição com relevância extra-escolar, devido quer ao momento político e à vitalidade de Évora quer à particular qualidade dos participantes: em especial, Júlio Resende (já formado), Nadir Afonso e Francisco Castro Rodrigues, ambos arquitectos, António Lino Pedras, Arlindo Rocha, Maria Luisa Chicó e Júlio Pomar, além do orientador Dórdio Gomes, um pintor e professor aberto aos novos. Pomar participou em condições inéditas, porque em vez de ser finalista andava pelo 2º ano da Escola do Porto e nunca frequentara ainda uma aula de pintura (e não frequentou depois) - julgo que substituiu o seu grande amigo Fernando Lanhas, impossibilitado de participar.

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Nesse ano, a imprensa local seguiu diariamente a Missão, de 16 de Agosto (inauguração solene) ao encerramento a 30 de Setembro, e à exposição final dos trabalhos, de 2 a 4 de Outubro no ginásio do Liceu André de Gouveia - vieram depois a Lisboa, à SNBA. Na exp. de Évora foram integrados (por exigência dos participantes da Missão) os trabalhos de jovens que puderam acompanhar os artistas - Henrique Ruivo foi um deles; Lima de Freitas, filho de um fotógrafo local, assistiu aos acontecimentos.
O jornal republicano Democracia do Sul acompanhou a Missão com entrevistas aos artistas participantes (JP foi ouvido na ed. de 4 Out.: "Um inquérito sobre arte - depõe Júlio Pomar") e também a mestre Dórdio, a que se seguiu a crítica da exposição por Armando Gusmão, publicada a 7 e 9 Out.
Recorde-se, quanto ao contexto artístico de 1945 que em Maio (21-28) se apresentara em Lisboa, no Instituto Superior Técnico, a Exposição Independente, vinda do Porto, inaugurada com palestras de Victor Palla e JP que a revista Vértice publicou, e que a página Arte do diário do Porto a Tarde, coordenada por JP se publicou entre Junho e Outubro. O quadro Gadanheiro (ou Gadanha) ficou a marcar a Missão Estética de 1945 e a carreira de JP, então elogiado num artigo de Mário Dionísio publicado na Seara Nova (“O início de um grande pintor?”. Dórdio Gomes, no relatório da Missão entregue à Academia Nacional de Belas-Artes destacou que: «(…) só Júlio Pomar se não interessou pela cidade, inteiramente absorvido pelo homem e pelo drama, luta titânica com a vida e a natureza rebelde (…) É este homem sofredor e heróico, movendo-se no seu cenário próprio, que surge em todos os seus trabalhos e constitui uma outra face do Alentejo, que era preciso ir procurar fora de muros» (1).

A Missão foi acompanhada, por iniciativa dos participantes, ou de alguns deles, e com a colaboração de agentes locais, de uma série de palestras e sessões culturais, havendo notícias na imprensa à conferência de Mário Ruivo («Duas épocas e duas atitudes», a 26 Agosto), a outra de Pomar e Francisco (Castro) Rodrigues ("Tarde cultural", a 9 Set.), a mais uma presidida por Mário Ruivo em que leu poemas António Gasparinho (?), a 11 Set., e ainda uma de Mário Cesariny Vasconcelos com o título "A arte em crise" (a 23). Cesariny vinha da Escola António Arroio e foi um dos colaboradores neo-realistas da página Arte (Tarde, Porto), tal como Marcelino Vespeira - futuros surrealistas concorrentes.
Acompanharam também a Missão os diários Notícias de Évora e A Defesa, este da Igreja, que teve ocasião de manifestar sobre a exposição final "franco desagrado porque a IX Missão Estética é requintadamente apaixonada pela arte moderna”, e referiu-se assim a dois dos pintores, "...dois nomes que a ordem alfabética juntou mas a arte diametralmente separou. Resende é todo amoroso em luminosidade e em caracteres (...) J.P. é medonho nos seus óleos Sábado <Descanso>, Gadanha, Ceifeiro e Semeador, lembrando as mãos crispadas e formidáveis do primeiro luvas de «boxeur» e os rostos inspirações de Gorki. As figuras de JP reflectem grande anseio social e revolucionário, bebido mais na literatura estrangeira do que no convívio com o bom homem da terra alentejana. E no entanto estes dois artistas de mérito são da EBAP."
Mário Ruivo (1927 - 2017) que era à época estudante na Faculdade de Ciências de Lisboa - formou-se em 1950; natural de Campo Maior, fizera o liceu em Évora - conservou na sua posse e ofereceu em 2013 à Fundação Júlio Pomar (FJP) um desenho realizado por Pomar para a sua conferência referida acima, que pode designar-se "A evolução das espécies”.

1945 Gadanaheiro
1945 GadanaheiroGadanheiro óleo sobre aglomerado, 122 x 83 cm

Fotografias de Francisco Castro Rodrigues, página de um dossier relativo à IX Missão Estética de Férias. 6 provas fotográficas de 6,6 x 5 cm coladas sobre papel. Inédito até 2008. Doação do autor ao Museu do Neo-Realismo, Vila Franca de Xira.


Dos trabalhos de Júlio Pomar realizados em Évora conhecem-se Gadanheiro (col. Museu do Chiado, MNAC); Descanso (antes intitulado Ceifeiro - doado por Castro Rodrigues ao Museu do Neo-Realismo); Retrato de Camponês (Évora), col. FJP; e um fragmento de Semeador (col. particular), obra destruída pelo artista, enquanto Sábado, ou Malta (Alentejo) foi destruído acidentalmente - nos dois casos conservam-se as respectivas fotografias. Por último, um fresco transportável, Ceifa, deixado nas arrecadações do Liceu, não foi localizado.

Citado por Joana Baião em ‘Cem anos depois: a Academia Nacional de Belas-Artes. Contextos, protagonistas, ações (1932-1974)’, 2016. - https://www.academia.edu/29957248/Cem_anos_depois_a_Academia_Nacional_de_Belas-Artes._Contextos_protagonistas_a%C3%A7%C3%B5es_1932-1974_ . O Relatório de Dórdio Gomes encontra-se nos Arquivos da Administração Central 1909/1977, JNE Junta Nacional da Educação. http://arquivo-ec.sec-geral.mec.pt/details?id=25369 (não digitalizado).
Outra bibliografia sobre as Missões Estéticas em geral: Diogo Moraes Leitão Freitas da Costa, MISSÕES ESTÉTICAS DE FÉRIAS Estética, Academia e Política numa iniciativa de formação artística do Estado Novo, 2016: https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/27968/2/ULFBA_TES_977.pdf
Pedro do Amaral Xavier, Educação artística no Estado Novo: as missões estéticas de férias e a doutrinação das elites artísticas : https://www.apha.pt/wp-content/uploads/boletim4/PedroXavier.pdf.

Descanso 1945 (48 x 80 cm)Descanso, óleo e areia sobre aglomerado, 48 x 80 cm

 

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04/05/2020

03.04.2020 Garvão

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03.08.2016

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No Sr Carlos, Caracóis de São Bento. Lisboa

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02.08.2016 No Sr Abílio, as sardinhas e a salada

 

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As sardinhas do sr Abílio, a salada do Rui e ele mesmo na sua trincheira, Rua São João da Mata 64

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05/16/2019

Museus Colecção Berardo

 

Devo ficar surpreendido por a gente do mundo da arte não aparecer a pronunciar-se sobre a colecção de Arte Moderna e Contemporânea e sobre os museus onde tem sido apresentada a Colecção Berardo desde há 22 anos?
Devo espantar-me por parecer que os deputados daquela comissão nunca visitaram o Museu Colecção Berardo instalado desde 2007 no módulo III do CCB? Não sabem o que é a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea - Colecção Berardo, criada por decreto-lei de 2006, que mantém o Museu e é uma parceria entre o Estado e a Colecção (a Associação Colecçõ Berardo), em partes iguais? É um grande museu muito frequentado e com larga projecção também internacional. A colecção é única em Portugal e não parece dispensável no CCB.

De facto, a única colecção de Arte Moderna e Contemporânea internacional que se pode visitar em Portugal começou por estar sediada durante dez anos em Sintra, no antigo Casino: em 17 de Maio de 1997 inaugurou-se o Sintra Museu de Arte Moderna - Colecção Berardo, e o respectivo acordo estabelecido por Edite Estrela, então presidente da Câmara, teve uma vigência de dez anos, que não foi renovada pelo autarca de turno. Foi dirigido de 1997 a 2008 por Maria Nobre Franco, que tinha sido antes uma excelente directora da Galeria EMI -Valentim de Carvalho (1984-1995). O catálogo da Colecção Berardo no Sintra Museu fora lançado em versão inglesa em Julho de 1996 na Serpentine Gallery de Londres. No Museu exibiram-se, além da colecção, que foi sendo ampliada, algumas grandes exposições de Rui Chafes, Susana Solano, Júlio Pomar, Michael Craig-Martin e Fernando Lemos.

O Museu Colecção Berardo situado no CCB foi inaugurado em 25 de Junho de 2007 e aí se mantém. A renovação do protocolo inicial estabelecido em 2006 entre o Estado e Berardo ocorreu em 2016, com uma adenda que prolongou a sua vigência por mais seis anos (renováveis), até 2022, regulando a possibilidade de compra da Colecção por parte do Estado. Certamente perdeu-se então uma oportunidade para renegociar aspectos menos favoráveis ao Estado do acordo inicial, mas o processo conduzido pelo ministro Castro Mendes foi do conhecimento de António Costa. O Estado assegura o funcionamento do Museu mediante uma dotação que é este ano de 2,100 milhões de euros, a que acrescem as despesas do local (luz, segurança, etc) no valor de cerca de 1,300 euros, para além das receitas da bilheteira, depois de 10 anos de entrada gratuita.
Antes da criação do Museu Berardo, as obras da Colecção tinham passado em 1996 a contar com um espaço de conservação e reserva no CCB, mediante um acordo estabelecido ao tempo do ministro Carrilho (1º Governo Guterres) que tinha como contrapartida a possibilidade de se apresentarem exposições de obras da colecção no mesmo CCB. Logo no ano seguinte o CCB apresentou uma grande exposição sobre a Arte Pop organizada a partir da Colecção Berardo. Em 2000 a Colecção, que entretanto alargara o seu horizonte cronológico de 1945 até aos anos 1920, foi apresentada em dois núcleos simultâneos em Sintra e no CCB. Ia-se abrindo o caminho para a criação do Museu inaugurado só em 2007 no CCB (ao tempo do Governo Sócrates).

Recuando um pouco, pode lembrar-se que a colecção foi dada a conhecer em Fevereiro de 1995 na revista americana ARTNews, ainda sem se referir o nome de Berardo: era o “Portugal’s Mistery Man” que batia records de vários artistas (por exemplo Oldenburg, Joan Mitchell, Robert Indiana) nos leilões internacionais. Aí se falava da intenção de instalar um Museu em Portugal. Os contactos ainda informais com responsáveis institucionais tinham começado no ano anterior. O Museu Berardo em Sintra foi anunciado em primeira mão pelo expresso em Julho de 1995. A primeira exposição de obras da colecção (ainda anónima) tinha ocorrido em 1993 na Galeria Valentim de Carvalho. As primeiras compras terão começado em 1990. Todo o processo de formação da colecção era então conduzido pelo economista Francisco Capelo, associado de Berardo, até ocorrer uma ruptura entre os dois em 1999, por altura da venda do grupo de comunicação social, a Investec (Record, Máxima, 25% da SIC). "Paixão privada, ambição pública" foi o título da entrevista a Capelo publicada no Expresso em Maio de 1997, ao abrir o Museu em Sintra.
A colecção continuou, apesar de ter havido uma campanha hostil, e alargou-se depois dessa data sob a direcção directa de Berardo - foram anunciadas as compras excepcionais de duas pinturas de Francis Bacon e Robert Delaunay. Em 2003 Berardo é colocado na lista dos 100 mais poderosos do mundo da arte elaborada anualmente pela revista norte-americana Art Review, ocupando o lugar 56. Em 2007, depois da abertura do Museu em Belém, regressa à lista em 75º lugar. Além da Colecção fixada no protocolo de criação do Museu, avaliada pela Christie's em 316 milhões de euros, Berardo foi alargando a sua colecção pessoal de arte contemporânea, com naturais variações de interesse e qualidade (excelentes esculturas de Moore e Dubuffet...), além de dispor de outras colecções mais ou menos heteróclitas (Art Nouveau e Art Déco, arte africana - que a CML expôs em 2009 no Páteo da Galé: "Alma Africana" -, cerâmica histórica das Caldas, painéis de azulejo, publicidade e cartazes, budas e soldados chineses de terracota, escultura pública, plantas, etc, etc, que tem apresentado em espaços de enoturismo) - e tem anunciada a abertura no próximo verão de dois novos museus com o seu nome, em Estremoz e Lisboa/Alcântara).

A abertura e o lançamento do Museu Colecção Berardo no CCB contou com o talento do seu primeiro director, Jean-François Chougnet, um gestor cultural francês de larga carreira (de 2000 a 2006 no Parc de La Vilette, Paris). Manteve-se à frente do Museu até 2011 - depois dirigiu a Capital Cultural de Marselha e hoje dirige o grande museu desta cidade, o MUCEM. Foi um excelente director - pelo Museu passaram notáveis exposições (Pancho Guedes, Cabrita Reis, Joana Vasconcelos, "Amália. Coração Independente", "Arquivo Universal", "Teatro sem Teatro", etc), algumas em co-produção internacional.

Durante dois anos (2007 e 2008) o Estado e Berardo contribuíram com a verba de 500 mil euros cada para aquisições de novas obras atribuídas à Fundação, então feitas sob a orientação de Chougnet - era uma norma do acordo que deixou de ser cumprida. Seguiu-se durante seis anos Pedro Lapa como director do Museu (2011-2017), em anos de crise, redução de financiamento e também de fechamento da programação sobre a área da arte mais recente, com menor êxito de público. Actualmente o Museu é dirigido por Rita Lougares, aí desde sempre com funções de conservadora, verificando-se uma nova abertura dos horizontes da programação, por exemplo com as excelentes mostras “Modernismo Brasileiro na Colecção da Fundação Edson Queiroz” e a mais recente “Quel Amour”.

O Museu lá está, indispensável e gratuito ao sábado. Convém que os comentadores o conheçam.

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04/17/2019

Frescos do Cinema Batalha no Porto, 1946-48

Com projecto de arquitectura de Artur Andrade, o Cinema Batalha foi inaugurado em 29 de Maio de 1947, encontrando-se à data a pintura da parede maior, o 'hall', não concluída por o artista ter sido preso a 27 de Abril, por pertencer à Comissão Central do MUD Juvenil.
Em Setembro-Outubro, o fresco foi terminado pelo autor, já saído de Caxias, e que por essa altura realizava no Porto, na Galeria Portugália, a sua primeira exposição individual, de desenhos, alguns deles realizados na prisão (álbum "XVI Desenhos", com prefácio de Mário Dionísio, ed. dos autores, distribuição Vértice, não referida, 1948; reed. aumentada, Arte Mágica, 2004).
A edição do diário portuense «O Primeiro de Janeiro» de 28-5-1948, pág. 4, incluiu uma pequena notícia, « O Cinema Batalha é inaugurado amanhã », onde se refere que « foi decorado com motivos ligeiros de arte modernista. »

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                                      O grande fresco do 'hall' antes de concluído, ao tempo da inauguração (1947). O fresco do bar (a foto 2 é da autoria de ©Ernesto de Sousa), 1947-48

Em 1948 o governo impôs a eliminação das pinturas murais. Segundo uma carta enviada ao artista pela Empresa Neves & Pascaud, proprietária do Batalha, « uma determinação das autoridades » obrigava-a a « eliminar da decoração do seu Cinema Batalha as pinturas murais », fixando 25 de Junho como data limite para o efeito - mais de um ano depois da inauguração.

Ao que parece, tratou-se de uma retaliação do regime já no quadro da candidatura à Presidência do general Norton de Matos, sem que qualquer escândalo público ou o teor figurativo dos frescos (os festejos do São João no Porto) justificassem a ocultação. Um primeiro estudo conhecido para a pintura mural partia dos temas do Douro e do vinho. No ano seguinte, J. Pomar, cujo retrato do candidato tivera uma grande presença na campanha, foi demitido do lugar de professor de desenho do ensino técnico.

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Pormenores do 'hall', fotos ©Ernesto de Sousa, 1948
1947. Manuel de AZEVEDO, "Um escândalo artístico - Está ameaçado de destruição o painel do Cinema Batalha, do Porto", "Mundo Literário", Lisboa, nº 37, 18 de Janeiro, p. 16. (inclui 2 fotografias das obras em execução).

A realização dos murais foi encomendada e iniciada em 1946 (tinha o artista apenas 20 anos). A revista "Horizonte, Jornal de Arte", Lisboa, nº 2, de Nov., informou: “A decoração mural (11 x 6 metros) que Júlio Pomar vai realizar para o 'hall' do cinema Batalha, do Porto, da autoria do arq. Artur Andrade, foi fixada pelo preço de 30.000$00."
Outra notícia, referente a uma polémica sobre os murais, que nada tem a ver com a posterior ocultação determinada pelas «autoridades», mas sim com movimentações de artistas concorrentes e divergências críticas, foi publicada por Manuel de AZEVEDO, "Um escândalo artístico - Está ameaçado de destruição o painel do Cinema Batalha, do Porto", no "Mundo Literário", Lisboa, nº 37, 18 de Janeiro 1947, p. 16 (inclui 2 fotografias das obras em execução).

 

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1947. A Empresa do Cinema Batalha e o Arq. Artur Andrade (Empresa Forum) pedem à PIDE, em 2 de Maio, que autorize o artista, então preso em Caxias, a vir ao Porto concluir o seu trabalho antes da inauguração do Batalha.
1948. O Cinema Batalha, em 17 Junho, informa o artista da ordem de "eliminar" os frescos

Em 2005/06 foi feita uma tentativa de desocultação dos frescos, mal conduzida e sem êxito, por iniciativa da Associação dos Comerciantes do Porto. Encontraram-se apenas vestígios dos desenhos prévios (sinópias). Os frescos teriam sido mesmo eliminados com raspagem das paredes? O IPPAR viria a fiscalizar a intervenção e produziu um relatório confirmando a impossibilidade do restauro.
Em 2016, por ocasião de novo projecto de recuperação do Batalha considerou-se o uso de meios fotográficos, a partir das provas de época sobreviventes.

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2006. Intervenção na parede antes ocupada pelo fresco, por iniciativa da Associação dos Comerciantes do Porto.

 

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04/14/2019

A metade do céu

A Metade do Céu. Museu Arpad Szenes e Vieira da Silva. A 1ª qualidade é ter incomodado algumas damas mais nervosas e ter posto a crítica (?) com dificuldades de visão. Esta exposição colectiva com 61 mulheres, maioritariamente artistas, tem uma característica decisiva: é esta exposição e não outra, tem um autor e não outro (um homem, um artista, o Pedro Cabrita Reis), tem uma selecção e não outra, tem uma excelente montagem e não outra.

 

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Há que tomá-la como ela é: plural, diversa, maioritariamente com escolhas que agradam e por vezes surpreendem (fora da rotina ou do mais previsível nas carreiras individuais). Quem está, está bem, e não importa quem ficou ausente. Desde a opção por muitas pequenas obras dos 1ºs anos da Vieira, em geral ignoradas. A montagem acrescenta-se na grande galeria à apresentação habitual dos donos da casa, interrompendo-a com habilidade, desafiando-a. Há aproximações e oposições oportunas (Paula Rego e Fátima Mendonça, com Joana Rosa, Patrícia Garrido e Gabriela Albergaria; Maria José Aguiar, um "objecto" da Menez, uma natureza morta de Josefa de Óbidos e Ana Hatherly; Maria Isabel Miranda Rodrigues e Catarina Leitão; Sílvia Hestnes Ferreira e Marta Soares) e houve o acerto de colocar uma forte obra da Joana Vasconcelos à entrada. É uma exposição sem hierarquias, sem cronologia, sem vizinhanças formalistas ou ideologia historiográfica (mesmo que não seja certa a opinião do autor de que "a arte foi e será sempre avessa e imune à ideologia" (pelo contrário!). Como diz a folha de sala, "liberta de qualquer condicionalismo temático, desprovida de uma narrativa curatorial e que se quer alheia ao artifício discursivo". O Pedro Cabrita tem um grande talento para dispor objectos, os dele e os dos outros (das outras).

 

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Évora, Maria Lino e Studiolo XXI

Centro de Arte e Cultura, Fundação Eugénio de Almeida, Évora. "Studiolo XXI" (obras de Leda Catunda - desenho? porquê?). Esculturas de Maria Lino (e no fim bordados de mulheres da Beira).

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José Alberto Ferreira, director, conseguiu pôr Évora no mapa com uma programação que não repete o habitual calendário institucional, não se reduz ao cinzento DS e não segue os interesses das galerias Filomena Guerra e Cristina Soares. Não é difícil acertar e ser original, é preciso não fazer o que os outros fazem e começar por não obedecer à pequena tutela instalada.

Agora o Centro apresenta uma muito grande escolha, por parte de Fátima Lambert, de obras de "desenho e afinidades", em que estas predominam e que se alarga com uma ambição, também internacional, por Brasil, Espanha, etc, que pareceria enciclopédica se não fosse aleatória e não houvesse numerosas presenças escusadas e faltas gritantes (casos esquecidos ou sem acesso?) como João Francisco e Joana BC ou Graça Morais, que me interessam pessoalmente. Com Resende, Nadir, Cutileiro, Lourdes Castro, Escada, Lapa, Jorge Martins e Batarda, com Calapez, Nuno Gil, Catarina Leitão, Fátima Mendonça, Alice Geirinhas, Suzanne Themlitz, Isabelle Faria entre os que notei. 187 nomes (!?).

Acima estão as galerias entregues a Maria Lino (n. 1944 - activa entre Hamburgo e Feital/Trancoso) e ao seu trabalho pouco visto, do qual se impõe escultura que usa a madeira (melhor, a árvore) com uma economia austera, rude, essencial, orgânica, à maneira de Brancusi (e há uma sala final com assemblages e objectos encontrados, com humor e magia, e também algumas obras alheias). Uma multidão encheu com gosto o Centro.

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Isabel Sabino na SNBA

Isabel Sabino no salão da SNBA. Uma grande exposição, não só pelo espaço que ocupa e pela dimensão das obras mais recentes, de 2018 e 2019. "Ela" é a realidade e a dimensão ficcional, é o visível factual e a possível condição imaginária e narrativa que as pinturas e desenhos propõem, num puzzle ou convergência de sugestões figurativas que aos poucos se apercebem e se associam numa imagem de leitura interminável. E é também a possibilidade de um trânsito ao mesmo tempo culto e comunicativo (erudito e acessível) por referências a géneros, a tradições, a contextos políticos e igualmente a outros pintores marcantes - trata-se de fazer ver e ensinar a ver, por parte de uma pintora que é também professora da FBAUL. A paisagem é um lugar aberto de histórias (lugares e tempos) e de situações de pintura (processos e meios de pintura).

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Sem incluir nenhuma obra da excelente série recente "As Quatro Estações", o que é uma opção insólita e corajosa, até por ela ilustrar um importante lugar de passagem pessoal, a mostra recua a obras de tempos anteriores, desde 1989, com que se dá a ver um itinerário fragmentário e significativo.

 

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04/08/2019

Sobre Jorge Guerra 2019 + 1994 e 2000, no Expresso

Jorge Guerra no Arquivo Fotográfico de Lisboa (09-04-2019). "Saudade de Pedra" (Lisboa, 1966 - mais precisamente, de 20/12/1966 a 5/01/1967 - 100 fotografias impressas pelo autor e adquiridas pelo AF em 1998). Exposição e livro, com texto de Jorge Calado.

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Jorge Guerra com José Luís Neto (09/04/2019)

As fotografias de Jorge Guerra não foram divulgadas no seu tempo próprio, mas são um marco essencial dos anos 60 (1966), enquanto retrato da cidade no fim do regime de Salazar (seguir-se-ia ainda Caetano por mais alguns anos) e enquanto obra fotográfica - editada em livro em 1984, 1994 e 2019, agora em boas condições, sucede à Lisboa de Costa Martins e Victor Palla. Permanecendo secreta por muitos anos e discretamente divulgada (até esta exposição maior no Arquivo Fotográfico), Jorge Guerra ficou numa situação próxima - até hoje - de fotógrafo confidencial, como aos membros da tertúlia de Castello-Lopes, Sena da Silva, Carlos Calvet e Carlos Afonso Dias. Na história da fotografia em Portugal são muitos os autores secretos e alguns outros expuseram e/ou publicaram em vida mas ficaram numa espécie de limbo feito de ignorância e menosprezo, como Adelino Lyon de Castro e Maria Lamas, Artur Pastor, Augusto Cabrita, Gageiro. Ou os mais antigos Lacerda Nobre e Álvaro Colaço, Elmano da Cunha e Costa e os homens dos clubes 6x6 e Câmara.

#

1994

“Mandados Oblíquos”, Casa Fernando Pessoa
Expresso Cartaz - 9 Out.

JG 1966 col. FG

Jorge Guerra, 1966 (Col. Fundação Gulbenkian)



A. Um projecto fotográfico dos anos 60 reapresentado com extractos da «Ode Marítima» e editado num livro-catálogo. Usando a tele-objectiva e percorrendo em especial a zona ribeirinha, Jorge Guerra constrói um dos mais melancólicos retratos de Lisboa, fixando corpos e rostos por onde passa toda a inquietação dos anos da guerra e do exílio.

B. As fotografias de Jorge Guerra expõem-se associadas a extractos da «Ode Marítima», e também se editam num livro-catálogo sob o mesmo título: “Mandados Oblíquos”. Esta colagem temerária, que as imagens da Lisboa ribeirinha plenamente justificam, vem, aliás, renovar uma outra ligação poética que algumas destas mesmas fotografias já estabeleceram com a escrita de Ruy Belo e de João Miguel Fernandes Jorge num álbum quase desconhecido, “Os Poucos Poderes”, publicado pela Gulbenkian em 1984, embora planeado em 1972. Em qualquer dos casos ter-se-á tratado de assegurar assim a visibilidade de fotografias que têm, porém, em si mesmo inteira autonomia.
Realizadas em Lisboa durante a década de 60 (entre 66 e 68?) e ainda em grande parte inéditas — duas delas puderam ser vistas na exposição «Encontros com Narciso», em 1989, no CAM, e outras mais foram mostradas na Europália’91, por António Sena —, constituem mais um elo numa história só lentamente revelada e, em geral, depressa esquecida. Depois da “Lisboa…” de Victor Palla e Costa Martins, esta é uma outra viagem à procura da identidade de um país e também, através dele, de um destino pessoal, na demorada impossibilidade de uma plena existência colectiva.
É à beira rio, do Cais das Colunas ao Alto de Santa Catarina, diante da moldura aberta dos lençóis de água, mais rasgada ainda pelo uso permanente da tele-objectiva, que Jorge Guerra inquire os rostos e os corpos espectantes de uma cidade ao mesmo tempo íntima e absurda. Os anos eram então negros e os cais lugares de embarque para as Áfricas; Jorge Guerra, «cumprida» a sua guerra de Angola, voltava de Londres a uma Lisboa inabitável e assim se despedia para iniciar um longo exílio no Canadá, onde fez fotografia e cinema. <E onde dirigiu durante 15 anos, com Denise Guérin-Lajoie, a mais importante revista de fotografia do Canadá, a OVO.>
Algum «cinema novo» era vizinho deste mesmo olhar e, pela mesma época, o americano Neal Slavin (ver «Portugal 1968», edição Fotoporto 1990) traçava outro retrato implacável. Na breve história da fotografia moderna portuguesa, de que Jorge Guerra é uma das pedras definitivas (e um dos poucos que ultrapassaram a fase do amadorismo promissor), estas serão as mais pungentes imagens de nós mesmos. Mas se a melancolia domina estas imagens de gente solitária frente ao infinito, uma outra estranheza inquietante deve sentir-se perante a prolongada ocultação que as manteve até agora quase inéditas.

C. Edições e exposições com catálogo
Os Poucos Poderes, Fotografias de Jorge Guerra, Fund. Gulbenkian, 1984
Encontros com Narciso, Fotografias de Jorge Guerra, Fund. Gulbenkian, 1989.
Mandados Oblíquos, Fotografias de Jorge Guerra, Casa Fernando Pessoa, 1994
Jorge Guerra - Quarenta Anos de Fotografia, CCB 2000. (Ver entrevista de Celso Martins, Cartaz Expresso 12-02-2000)

1999


OVO Magazine, Montreal 1972-1988.

Captura de ecrã 2019-04-08  às 21.27.39

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Expresso, Cartaz (Actual) 27-11-99

O FOTÓGRAFO Jorge Guerra faz hoje, no Arquivo Fotográfico de Lisboa, uma apresentação audiovisual do «Magazine Ovo», que dirigiu durante anos em Montreal, traçando também uma breve história das revistas internacionais de fotografia. Em exposição para consulta, uma colecção completa da revista, e alguns números, hoje raros, poderão ser adquiridos.
Editado e dirigido por Denyse Gérin-Lajoie e Jorge Guerra, o «Magazine Ovo» foi uma influente revista de fotografia que se publicou a partir de 1972 em Montreal ao longo de 15 anos, tendo desempenhado um papel relevante no desenvolvimento da cultura fotográfica do Quebeque, com efeitos na dinâmica cultural e política da região.
A revista seguiu um modelo original de publicação temática e documental que viria a ser vítima de fracturas resultantes da própria expansão das práticas fotográficas, até pôr termo, em 1988, às suas actividades e encerrar a galeria que fundara, em consequência de dificuldades económicas.
O seu último número contou com a colaboração de 70 fotógrafos internacionais, de Abbas a Joel-Peter Witkin, passando por Alvarez Bravo, Avedon, Boubat, Burri, Callahan, Cartier-Bresson, Larry Clark, Roy DeCarava, Sebastião Salgado, Jerry Uelsmann, Burk Uzzle, Joan van der Koiken, etc. A revista afirmava então defender «a fotografia como um médium essencialmente democrático que oferecia um meio simples e não sofisticado de registo, comunicação e expressão», colocando-se «em contra-corrente da política do 'savoir-do-dia' e de uma pretensa vanguarda que julga fazer avançar a história da arte mudando de estilo ao sabor dos ventos».
Também fotógrafo, Jorge Guerra publicou nomeadamente «Os Pequenos Poderes» em 1984, com fotografias de finais dos anos 60 e poemas de Ruy Belo e J.M. Fernandes Jorge (ed. Gulbenkian) e expôs «Encontros com Narciso» em 1989, também na Gulbenkian.

 

 

Posted at 21:33 in Arquivo Lisboa, Fotografia portuguesa, história da fotografia, Jorge Calado, Jorge Guerra, Lisboa | Permalink | Comments (0)

Tags: Jorge Guerra, Magazine OVO

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12/22/2018

Gulbenkian Bagdad 1966

A aventura da Gulbenkian no Iraque decorreu entre 1957 e 1973 e envolveu iniciativas e orçamentos de enorme dimensão, mas era um episódio esquecido, ou oculto. Certamente por não tido o êxito esperado - os petróleos foram nacionalizados e a Gulbenkian perdeu os respectivos rendimentos, os famosos 5 % de Calouste Gulbenkian.

Entretanto, os programas cumpridos em Bagdade foram de uma excepcional ambição, com destaque para a oferta (chaves na mão) de um grande Estádio do Povo projectado por Keil do Amaral e Carlos Ramos, e para a construção de um imponente Centro de Arte Moderna, a que se acrescenta a apresentação de uma exposição de arte moderna internacional, e em especial portuguesa, que implicou uma importante operação de compras de obras que integraram a colecção da Fundação.

O tema é agora tratado numa exposição no Museu Antigo (Colecção do Fundador) e num núcleo de obras exposto no Museu Moderno

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Bagdade1966

É a + importante iniciativa da FG no capítulo da arte portuguesa entre a sua II Exposição de 1961 e a inauguração da Sede, que incluiu a "Exp. de Arte Portuguesa Contemporânea", mas é também a menos valorizada e mais desconhecida. Note-se, por exemplo, que não figura na cronologia do catálogo "50 anos de Arte Portuguesa", de 2007, nem aí é abordada.

O estudo de referência para o tema é a tese de Leonor da Conceição Silva Ribeiro e Alves de Oliveira "Fundação Calouste Gulbenkian: estratégias de apoio e internacionalização da arte portuguesa 1957-1969", FCSU-UN 2013, mas também aqui a informação é quase nula.
"Em novembro de 1966, a FCG organizou, em Bagdad, no Museu Nacional de Arte Moderna, cuja construção foi por si financiada, uma exposição de obras de arte contemporânea, integrando artistas portugueses e estrangeiros, o que constituiu a mostra mais alargada da sua coleção realizada até então (509). (Nota 509: «However, none of these exhibitions so far organised has assumed the significance attaching to that which is now being presented in Baghdad, and none of them, we would stress, has included such a large number of works from so many distinct countries and representing so many artistic tendencies». Esta exposição teve lugar no Museu Nacional de Arte Moderna do Iraque, cuja construção foi financiada pela FCG. Exhibition of works of contemporary art belonging to the Calouste Gulbenkian Foundation. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1966. (pag. 330-331)

 



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19Dez. Nota do facebook: "Continuando a falar do Museu Gulbenkian, digo que tenho em grande consideração a exploração da colecção moderna que a directora Penelope Curtis tem vindo a fazer, subvertendo ou questionando hierarquias instaladas, propondo surpresas e interrogações. Começou por rever as aquisições da FG por efeito da Exp. de 1957, quando ela iniciou a sua programação e a Fundação começava a sua história, e agora põe em destaque a exp. levada ao Iraque em 1966, recordada em dois espaços: no piso inferior do Museu, no quadro da aventura da Gulbenkian em Bagdad - confusamente mostrada, é certo -, e no piso 2 do Museu Moderno em espaço próprio. Aqui com artistas relevantes à época e depois ± esquecidos: Nuno de Siqueira, com uma interessante paisagem abstracta em estratos sobrepostos que foi a sua imagem de marca, e Artur Bual e Luís Demée, com expressões do seu tempo (é bom rever as tendências que estiveram em voga e se julgaram definitivas). Também com uma poderosa tela de João Vieira gestualmente caligráfica. Depois no Museu, com Ângelo de Sousa e José Escada, René Bertholo e Júlio Pomar, e o influente brasileiro Waldemar da Costa (Composição em Azul, 1960) e outros. Por necessidade de representação a FG então fez compras, começou a pensar uma colecção: é uma data.

Mas aponte-se também como a Gulbenkian de hoje apaga o seu 1º presidente e criador, José de Azeredo Perdigão, não identificado na fotografia (uma legenda implica sempre nomear as pessoas representadas, quando não são anónimos elementos do povo).  Aqui o anonimato é intencional ou incompetente? Seja como for, é escandaloso e põe em cheque a actual administração."

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