A falta de história e a falta de senso. um cartaz em que os curadores se anunciam.
No Porto 2001 foi assim: duas exposições sérias que ficaram como referência - a comparação é fatal para este novo "projecto".
Porto Anos 60/70: os Artistas e a Cidade - Serralves e Árvore - comissariado de João Fernandes e Fátima Lambert. Jan.-Abril. Cat. com 320 págs. ed. ASA
[+] de 20 grupos e episódios no Porto do século XX - Galeria do Palácio (à data da sua inauguração) - comissariado de Fátima Lambert e Laura Castro. Cat. em 2 vol. de 312 e 276 págs.
E a programação do ano contou ainda com Fernando Lanhas em Serralves e António Quadros na Árvore, mais Júlio Resende extra.-programa em Matosinhos.
Valerá a pena falar de regressão e de irresponsabilidade. E discutir como se dá livre curso ao esquerdismo manipulador de Paulo Mendes, responsável principal acompanhado por José Maia e Paula Parente Pinto (investigação de arquivo).
Posted at 00:26 in 2001, 2021, história de Portugal, Porto, Serralves | Permalink | Comments (0)
(Depois vou digitalizar bem o calendário. ..)
Gostava de saber que circulação teve à época, sendo obviamente uma edição partidária para angariar fundos. Gostava de entender as condições da semi-legalidade do PC nesse tempo de grande confrontação política e activa repressão (de Norton de Matos em 1949 a Rui Luís Gomes, 1951, e Humberto Delgado em 1958), com a entrada de Portugal na Nato em 49 e a reunião do Pacto do Atlântico em Lisboa em 52. Um calendário comunista para 1954, editado por Victor Palla, ao que parece, e ele é pelo menos o autor da capa - a edição não é identificada. Participam também Maria Keil, Querubim Lapa e (outros...), comunistas, simpatizantes e compagnons de route, o núcleo duro dos neo-realistas em 1953, ano em que termina a guerra da Coreia (Julho).
Especialmente relevante é a aberta intervenção anti-colonial de António Domingues, artista de longa carreira pouco conhecida. A "marcha" ou manifestação de massas aparece também nos desenhos de Rogério Ribeiro, Cipriano Dourado e Maria Barreira (esta em versão feminista). A pomba da paz é desenhada por Pomar (lavores femininos); Alice Jorge, que assina M. Alice, em versão multi-étnica; e José Dias Coelho (os namorados).
Esta “fase” militante do movimento neo-realista vai terminar com a morte de Stalin, o relatório de Krutchov, o chamado "desvio de direita" do PC, o fim das Exposições Gerais em 1956, o início das bolsas da Gulbenkian e a sua (1ª) exposição de 1957, numa sucessão muito rápida e articulada. Também com o surgimento de uma nova geração (ou “fornada”) de artistas (que já não nascem no PC e no MUD/MND, alguns católicos, já progressistas, com o Movimento de Renovação da Arte Religiosa, de 1952 : https://www.snpcultura.org/obs_13_movimento_renovacao... ), que já são abstractos antes de ensaiaram as novas figurações continentais e a Pop nos anos 1960, que vão fazer a galeria Pórtico, o jornal Ver (René Bertholo é central) e a seguir emigrar (as bolsas...) e que ainda entram, alguns deles, nas últimas Gerais e decidem participar nas iniciativas do SNI (salões e bienal de Paris), cortando assim com a prática e a tutela da geração de 1945.
*
O que poderia ser um calendário social-democrata, ou, vá lá, socialista? Não o consigo imaginar e certamente é impossível. E isto ajuda a pensar o lugar da figuração militante ou engagé, aqui e em geral no tempo longo, a sua possibilidade e conflitualidade, a questão das vanguardas (política e artística), e a oposição entre “abstração” e figuração nos anos 50 da Guerra Fria, com a condenação de TODA a figuração e a suposta inevitabilidade da abstracção que então se defendeu ou impunha, nomeadamente em Portugal, país muito sensível a modas por falta de formações ou tradições artísticas sólidas.
Neste caso, trata-se de um relançamento do neo-realismo numa particular conjuntura política que se caracterizou pelo que depois se chamou o "desvio sectário" do PC e pelas campanhas da paz no contexto da guerra fria e do últimos anos de Stalin, rompendo com os propósitos de unidade anti-fascista. Ao tempo da polémica interna do neo-realismo (ou da Vértice). Interessa-me agora este calendário por incluir uma iconografia ignorada e em especial por informar sobre o contexto da Marcha (JP, 1952) e por vir preencher um vazio na história do tal neo-realismo da 1ª metade da década de 50, um tempo esquecido e mesmo apagado pelos protagonistas (por JP e Mário Dionisio, que então pessoalmente se distanciam: MD deixa o PC, que não lhe permite passar de militante a simpatizante: as cartas trocadas existem e foram divulgadas - são surpreendentes; JP continua por algum tempo e sai discretamente, e o neo-realismo é para ele uma memória dos anos iniciais, que continuava a polarizar a atenção sobre a sua obra, e de tempos difíceis).
Em 1953 JP publica um importante artigo no Comércio do Porto em que faz o balanço do neo-realismo ("sem discutir a justeza do crisma", diz) e uma auto-crítica que envolve M.D. (In Júlio Pomar, Notas para uma Arte Útil, ed. Atelier-Museu/Documenta p. 285-289):
"... alguns perigosos caminhos começaram a desenhar-se. Um lirismo, complacente, tende a substituir a agressividade dramática dos primeiris tempos. A procura de soluções foirmais começa a sobrepor-se ao vigor do conteúdo; e isto não reflecte senão um alheamento dos problemas realmente vivos. Boa parte do que pintei nos anos 1949 a 51 <o que inclui a individual de 1950> oferece tais características, e desvios de tipoo análogo marcam a obra plástica de Mário Dionísio. Desse impasse se tem estado a sair. "
É o seu último artigo na imprensa do tempo, por razões desconhecidas. Por acaso ou não, publica no mesmo ano, numa representação nacional numa revista francesa, um breve texto em absoluto discordante da ortodoxia comunista ali patente, mas retomando textos anteriores de oposição ao idanovismo de Cunhal:
"O assunto não é o conteúdo, é um pretexto, e mais nada. O conteúdo é a síntese dialéctica entre o tema e a experiência pessoal e vivida do artista. Ela manifesta-se na forma, vive nela, é exaltado por ela. Os conteúdos das minhas telas são as razões que me ajudam a viver'" (aspas do autor) E antes: "Deformação profissional: não acredito na infalibilidade do Papa. Cada dia, cada minuto, reponho o mundo em questão. O trabalho (métier) de pintor é um trabalho de pesquisas, de descobertas, de invenções: pesquisas, invenções, descobertas que nascem da vida e ela retornam. Houve um tempo em que desprezei certos assuntos? Erro meu." (Premier bilan de l'art actuel 1937-1953, Le Soleil Noir: Positions, Paris nº3-4, p. 314 - em Notas sobre uma Arte Útil p. 241).
A ideia de pretexto é problemática, parece-me (uma concessão aos abstraccioinismos?). A separação de forma e conteúdo, e do tema e da experiência, não solucionam problemas. Mas importaria mais saber se o texto francês é posterior ao português, ou se é um exercício de versatilidade que se documenta também noutras obras pintadas de 52-53, as paisagens. Aí não estamos (já?) perante a doutrinação neo-realista.
Para além da avaliação da qualidade das obras (muitas delas muito fracas, incipientes, no calendário e no seu tempo, como é "natural") existiu um apagamento do que foi uma renovação da "tendência realista" ou um breve realismo social ou socialista a suceder ao primeiro neo-realismo (1945-50), o qual vigora entre 1951 e 55, no caso de caso de JP, e que não segue o naturalismo e reaccionarismo estético de matriz soviética e tradução francesa. Para lá de se reencontrarem obras, melhores e piores (é a história e a sociologia), importa rever a história da arte desse tempo que foi escrita por protagonistas implicados (J. A. França e herdeiros, Mário Dionísio e Ernesto de Sousa, este actualmente ignorado quanto ao que escreveu antes da adesão súbita à Documenta e a Wostell), e em geral importa pensar o destino da arte, em especial da Guerra Fria até hoje, e a sua possível importância (ou desinteresse) no presente mediaticamente dominado pela sua mercantilização e museologização, em absoluto confundidas na sociedade do espectáculo.
Posted at 01:35 in 1953, Julio Pomar, Júlio Pomar, Neo-realismo | Permalink | Comments (3)
Como é mesmo muito bom não fez parte das escolhas dos melhores do ano. Ainda bem, para desfazer confusões. Ana Mata na Módulo, 3 anos depois (estas pinturas não se fabricam depressa).
(do facebook, um pouco revisto)
Gostava de tentar explicar (a mim próprio) por que isto (esta pintura) é muito interessante (ou muito boa), e rara.
É uma pintura depois da fotografia, com recurso à fotografia, não para impregnar as telas ou para copiar projecções, mas para ver o visível de outro modo, para encenar, recortar, modelar, reflectir o visto e recriar a sua luz; sem as facilidades da apropriação fotográfica e sem as rotinas do "fazer qualquer coisa que sai sempre". A fotografia ilumina (num caso há um flash sobre um corpo); a pintura ilumina a luz e a sombra da fotografia (há um pano negro que atravessa um quadro).
Não é a pintura que é mediada pela fotografia, é o olhar que se alimenta do registo fotográfico, para ver melhor, ou ver diferente, mais profundamente, demoradamente, mas com a surpresa de um primeiro relance ou com a energia de uma imagem a afirmar-se, a reconhecer-se. A pintura (a pintora) serve-se da fotografia, às vezes serve-a como modelo, de passagem, e resgata a pintura, o prazer de ver pintura, na velha confrontação com a fotografia. Trata-se de passagens, de trânsitos, entre o visto, o fotografado e o pintado, não de fronteiras, acrescentando sempre - o modo de ver, o fazer e um campo aberto de observações/interrogações, de histórias.
Alguma coisa se imobilizou (na fotografia feita/captada/organizada e na pintura a fazer-se, gesto a gesto, pincelada visível, demorada) sem se suster a velocidade do ver e do pintar, sem ser a transcrição do registo e sem se mostrar como execução de um programa, mas ele existe, programa pensado, conceptual.
A pintura é rápida, sem incertezas legíveis, mas a obra da pintora (a carreira) é lenta, escassa, e a diversidade dos formatos, do muito grande (a 1ªa foto) ao muito pequeno, do heróico ao íntimo, a diversidade dos suportes (tela, alumínio e papel) e dos meios (óleo e tinta acrílica) e dos assuntos (a figura, o retrato (também auto-retrato), as plantas - natureza viva, e a "natureza morta", uns óculos), a circulação entre a cor e sombra/grisaille, conferem a cada pintura a densidade de um encontro único e a certeza da possibilidade dispensável de muitas variantes (mas cada peça é definitiva).
Não conheço agora nada de mais surpreendente em pintura, até por se tratar da lenta maturação de um trabalho ao mesmo tempo muito reflectido e intensamente vivido (vívido) e inesperado. Conhecido de anteriores mostras sempre novo e diferente. Ganhei o ano nos seus últimos dias. Agora vou ler o pequeno livrinho em que a Ana Mata, que não conheço, reuniu "notas do atelier". Chama-se "A pintura é o visível das histórias desconhecidas", e espero não contradizer aquilo que eu procurei pensar sobre as suas pinturas a justificar a admiração.
Posted at 03:12 in 2020, Ana Mata, Modulo | Permalink | Comments (0)
Atelier-Museu Júlio Pomar (até 28 de Fevereiro)
destacam-se os quatro conjuntos de retratos que marcam a obra da maturidade de Pomar, nos anos 70 e 80, situados entre os períodos mais altos da sua carreira
1. O retrato está presente do início ao fim da carreira e da vida de Júlio Pomar. Pintor de figuras - e de imagens -, essa é uma prática que se pode dizer natural, espontânea, começada na infância, como acontece a todos (mas os seus cadernos foram guardados), e depois sempre continuada: as pessoas são o real mais próximo, e por isso mais acessível à observação, incluindo o auto-retrato.
A representação do visível, do visto, em especial no caso do retrato, sustenta-se da semelhança e no reconhecimento (e exige-os), para além de toda a (re)interpretação, formalização, abstractização e deformação, intencional ou não. Feito do natural (sempre com poses breves, no seu caso, ou de memória) ou documentado sobre referências fotográficas, o seu retrato nunca é naturalista (com uma excepção?) e pode ser ou não ser realista - por algum tempo de formação e afirmação foi neo-realista. As fronteiras diluem-se. O seu retrato nunca é o exercício de um género disciplinado e esteve sempre associado a reorientações da prática da pintura ou do desenho, a mudanças de "fases" - a obra de Pomar não se classifica por um estilo colectivo (depois do neo-realismo inicial) e nunca se fixou numa maneira.
Também sucede que o retrato é para Pomar, quase sempre (para lá de muito escassas encomendas), uma prática relacional que decorre da convivência, do companheirismo, da amizade, da intimidade ou da relação amorosa - e que por sua vez alimenta a relação pessoal com o “modelo”. Através de retratos e auto-retratos existe uma narrativa auto-biográfica que se constrói no tempo longo. E não será diferente, embora sem a presença física dos retratados, o gosto pela representação de escritores já ausentes por quem se interessava, e em diversos casos foram resultado de sugestões alheias, de convites para ilustração de livros. Essas são representações imaginadas, ficcionadas e integradas em situações ficcionais, sustentadas pela iconografia disponível, fotográfica ou já antes artística - o que deu depois passagem directa para as figuras de personagens literários e mitológicos, já representações inventadas ou ficcionadas (Ulisses, Adão e Eva, por exemplo). Quanto ao auto-retrato, praticado ao em sucessivas condições, e que mereceria estudo próprio, ele não surge como exercício narcísico ou este é contrariado pela irrisão, várias vezes em auto-retratos duplos e triplos, em companhia do macaco e do diabo (alter-egos) e na figura do palhaço.
Se em todas as décadas de actividade (oito décadas) os retratos estão presentes, poderão destacar-se desse continuum alguns retratos individuais, numa galeria selecta (Norton de Matos, Cardoso Pires, Soares, Claude Levi-Strauss, Camões, Marisa...), ou acompanhar séries e sequências com coerência temática ou ciclos e períodos, “fases”. Para além dos retratos iniciais, do tempo neo-realista, e dos retratos mais tardios, dos anos 2000 e do regresso a Lisboa, que são períodos de certo modo simétricos, de começo e fim, decisivamente marcados pela afinidade das relações pessoais, considero mais importantes quatro conjunto de retratos que marcam a obra da maturidade de Pomar, nos anos 70 e 80, colocados entre os períodos mais altos da sua carreira.
Viana, 1970 (130x97 cm) e Triplo auto-retrato, 1973 116 x 89 cm (não expostos)
2. O primeiro é constituído pelo ciclo de retratos dos anos 70, que já propus identificar como os seus anos Pop, pinturas de formas recortadas em cores lisas, na sequência dos ‘Banhos Turcos segundo Ingres’ e do interesse por Matisse e pelos contemporâneos Pop ingleses e norte-americanos, ou em montagem de fragmentos e insígnias dos rostos e corpos, mais ou menos dispersos num espaço plano. É um período que vai exactamente de 1970 a 1975, em que a gestualidade e o movimento anteriores se sustêm, a partir dos ‘Rugby’s’ e ‘Maios 68’, e que desde o início inclui retratos de relações pessoais de proximidade e de figuras das artes e da literatura (Eduardo Viana, três Almada’s, dois Pessoa’s, Camões) e também quatro auto-retratos.
Na actual exposição só estão presentes Almada (nº 28 do Catálogo Raisonné vol. 2) e um Ferreira de Castro (de A Selva, nº 72) mais três retratos de mulheres (Manuela, nº 65; Graça, nº 76; e Teresa, nº 113), de um conjunto que foi drasticamente reduzido, contando com mais de 70 telas. Nesta “fase” assinala-se a presença de uma modalidade rara, o retrato nu (sempre escasso quando não se trata de representar modelos profissionais). Na sucessão de ciclos de produção seguiram-se as colagens eróticas, “teatro do corpo / espaço de Eros”, mudando novamente de processos.
Este ciclo de pintura foi acompanhado por uma série autónoma de retratos desenhados a lápis, paralela mas formalmente muito diversa, uma série também extensa, prolongada de 1970 a 1977 ou 78, neste caso sempre de pessoas que lhe eram próximas a vários títulos. Iniciou-se a pedido do poeta Alberto de Lacerda e prosseguiu com amigos (Manuel Torres) e amigas (Mimi Dacosta, Rucha) ou ‘companheiras’, outros pintores (João Abel Manta, Jorge Martins, Costa Pinheiro, Eduardo Luiz, o último retratado e também retratista recíproco) e escritores (Cardoso Pires), um galerista (Manuel de Brito), críticos amigos parisienses (Roger Munier, Patrick Waldberg, antigo surrealista dissidente). Foram reunidos em grande parte num álbum prefaciado por Fernando Gil (Os Retratos a Lápis dos Anos 70, ed. Imprensa Nacional, 1987) e alguns são mostrados agora no Atelier-Museu na escada entre os dois pisos.
Um segundo grupo de retratos pintados inclui apenas escritores, quatro poetas, e resulta de uma proposta para ilustrar um livro sobre o poema “O Corvo” de Edgar Allen Poe e as suas versões traduzidas por Baudelaire, Mallarmé e Pessoa. O projecto, sugerido em 1981 por Joaquim Vital (Editions de la Différence, Paris), à “saída” do ciclo dos ‘Tigres’, alargou-se a uma série extensa de quadros que se prolongou até 1985, com retratos individuais e retratos conjuntos de grande formato (Poe e cada um dos tradutores), e mais dois de grupo, um triplo Pessoa e os quatro poetas reunidos, ultrapassando assim em muito o propósito inicial, como foi frequente suceder, excedendo a ilustração.
O retrato literário não se separa da semelhança, embora a trate com outra liberdade, ficcional e já então de novo gestual, com a presença repetida do Corvo e uma inesperada aparição do Orangotango, acolhendo o acaso que acontece na tela, visitando representações fotográficas e anteriores retratos pintados, designadamente os Poe e Mallarmé de Manet. A série foi apresentada num álbum com texto de Jean-Michel Cluny (retratado noutra ocasião), que se chamou Le Livre des Quatro Corbeaux ou o Livro dos Quatro Corvos, na tradução para a Galeria 111, e igualmente numa caixa de serigrafias, retratos e corvos desdenhados, mas gorou-se à data uma prevista exposição em lugar destacado, dispersando-se em colecções particulares sem a visibilidade que merecia.
A esta série se seguiram de imediato dois retratos autónomos de Fernando Pessoa, de 1985, e um projecto de edição ilustrada da Mensagem, onde incluiu, logo no mesmo ano, os retratos individuais de Camões (agora exposto) e D. Sebastião, e em grupo de Mário de Sá Carneiro, Santa Rita Pintor e Amadeo Souza-Cardoso (‘Lusitânia no Bairro Latino’ - na exposição do AMJP), ou Pessoa (‘Fernando Pessoa encontra D. Sebastião...’), em situações ou histórias livremente imaginadas, a par de três outras “pinturas de história”, sobre os presentes de D. Manuel ao Papa, as peregrinações de Fernão Mendes Pinto e a pregação de Santo António (“7 Histórias Portuguesas”, ed. Clássica Editora, exposição na Galeria 111, 1985). Por essa época tinha começado a ocupar-se com figuras míticas (Salomé, Leda, Actéon, o Julgamento de Paris, o Rapto de Europa) numa série de quadros ovais que foram expostos separadamente em Paris (Ellipses, Galerie Bellechasse, 1984). Vieram a ter larga sequência nas décadas seguintes, mas no final dos anos 80 as viagens do artista ao Brasil vieram outra vez substitui a ficção pela observação, nas figuras dos Mascarados e dos índios da Amazónia - regresso aos real.
Retrato de D Sebastião com um espelho, 1985
Entretanto, interrompendo em 1983-84 a série “O Corvo”, outro grupo de quatro poetas destinados ao revestimento em azulejo da estação Alto dos Moinhos (Lisboa) absorveu o pintor durante “um ano de desenho”. Tratou-se, por ordem cronológica, de Camões, Bocage e de novo Pessoa e Almada. Os retratos lineares em tamanho natural espontaneamente traçados e repetidos com variantes, a marcador sobre papel (quase sempre papel vegetal), acompanharam-se de motivos com que cada um se identifica (sereias e cupidos, espadachins, frades, gaivotas, arlequins e muito mais) numa extensíssima galeria de figuras que passaram a ocupar os átrios e corredores do Metro, alem de terem preenchido um dos pisos do Centre de Arte Moderna, em 1984. Couberam agora no Museu apenas dois retratos, Bocage e Pessoa, que foram acompanhados por um Becket (1987) e Dante (2006), o que é pouco - poderia ter-se feito a exposição em duas ou três partes.
3. Depois de centrar a atenção nos grandes ciclos de retratos, podemos considerar outros períodos, no início e no fim do caminho, e alguns momentos ou pequenos conjuntos de obras também significativas.
Posted at 00:56 in 2020, Atelier-Museu Júlio Pomar, Julio Pomar, Júlio Pomar, retrato | Permalink | Comments (0)
Nunca exposto até agora (1), e nunca referido, 'Marcha' é uma alegoria política e um retrato de grupo, onde retrospectivamente se destaca a figura de José Dias Coelho, escultor e militante comunista que seria assassinado pela Pide em 1961. Bem reconhecível entre as figuras do jovem casal que avança em primeiro plano, ocupa um lugar central que correspondia na época à sua intervenção como artista e activista -- animava e coordenou as acções dos artistas do PCP nos primeiros anos 50 (ou já seria mesmo o respectivo “controleiro”, um controleiro não sectário, segundo J.P.). Em 1955 trocou uma carreira artística já reconhecida pela passagem à clandestinidade como responsável por uma oficina de falsificação de documentos.
A natureza política do quadro, que é de facto uma dimensão partidária, relaciona-o sem dúvida com as campanhas pela paz que o PCP promoveu nos anos de 1949-54, ao tempo da guerra da Coreia e da Guerra Fria, mobilizadas nomeadamente em acções de rua e abaixo-assinados de apoio ao "Apelo de Estocolmo" pela proibição das armas nucleares, lançado em 1950, e contra a reunião de Lisboa do Conselho do Atlântico em Fevereiro de 1952, depois da adesão portuguesa ter sido ratificada em Julho de 1949, acontecimentos que vieram dividir e alterar profundamente as dinâmicas da Oposição, antes tendencialmente unitária. Este é muito obviamente, numa pintura clandestina (nunca divulgada, mesmo depois do 25 de Abril, por razões a interrogar), o lado comunista e pro-soviético de uma barricada semi-legal, residente num atelier e tertúlia activos num período de forte repressão policial e censória que decorreu durante e depois das candidaturas presidenciais de Norton de Matos e Rui Luís Gomes (1949 e 1951). E também na ocasião de um "desvio sectário" que conheceu grandes fracturas internas nos meios intelectuais e num PC debilitado por muitas prisões, o qual dá lugar a seguir ao chamado “desvio oportunista de direita” de 1956-59, após o relatório de Kruchov, depois “corrigido” pela fuga de Cunhal de Caxias, em 1961, na dramática pequena história ziguiezaguiante do anti-fascismo.
Se esta pintura panfletária não se considerar uma "obra prima", este não é um quadro menor, até pela coincidente ambição do assunto e do formato, e o encontro entre o manifesto e o retrato de grupo concede-lhe uma verdade, uma intensidade que é fusional com as qualidades formais que o fazem seguramente uma das peças mais marcantes do neo-realismo, que aqui se identifica com o realismo socialista sem concessão académica. É uma obra única na carreira do pintor (apesar de renovar o título da primeira Marcha de 1946), e é uma obra bem representativa de um tempo político e suas contingências, que, por sinal, continuou ser uma obra desconhecida - o artista nunca a procurou incluir nas suas antologias e a iconografia de Dias Coelho e do PCP nunca a recuperou.
Partindo da consideração da Marcha de 1952 é necessário tentar contrariar a desvalorização crítica das obras neo-realistas deste período (feita também pelo artista), e a partir daí rever a história habitual do movimento, dividindo-o em dois períodos diferentes, em especial quanto à obra do seu principal animador, intérprete e crítico. O segundo período, a partir de 1951 é sensível à orientação de uma ortodoxia partidária chegada de França no sentido de um realismo social de intervenção militante. Algumas obras-chave mostram-no e a Marcha é o seu emblema maior.
Depois das mostras individuais de 1950-51, em que Pomar reuniu pintores recentes e pintou outras para ocasião - para além de apresentar cerâmicas e pequenas esculturas de barro com maior sucesso de mercado, renovadas na passagem da mostra de Lisboa para o Porto - , duas telas gémeas de 1951 mostram a continuidade da vertente que se pode dizer formalista e lírica, manifesta em Meninos no Jardim (O eixo corrido) e Vendedoras de estrelas. Mas logo se evidencia, ainda nesse ano, uma direcção que é ao mesmo tempo mais empenhada politicamente, renovando o programa realista e assumindo uma condição mais austera, trocando a fluência decorativa pela observação social e a afirmação política. É o caso das Mulheres na lota (Nazaré), ainda de 1951, depois da Marcha, a seguir de Os Carpinteiros e das duas peças maiores do Ciclo "Arroz", a que se acrescenta o retrato de Cardoso Pires, já de 1954. Só a confrontação partidária e a batalha ideológica (e crítica) de oposição aos realismos - no contexto da Guerra Fria e da oposição aos formulários naturalistas autoritários, nazis e estalinistas - veio ocultar estas obras maiores no curso da década de 50 e da carreira do pintor.
As novas condições da intervenção partidária afirmam-se com clareza na produção de uma série de gravuras dedicadas ao tema da Paz, o qual mobiliza o PC na legalidade possível. A Mulheres Fugindo (conhecida como A Bomba Atómica) seguem-se as gravuras em que figura a pomba da paz proposta por Picasso como emblema da causa.
A Marcha como retrato de grupo identifica sem o representar expressamente o atelier da Praça da Alegria (antigo atelier que foi de José Malhoa), alugado e chefiado pelo também escultor Vasco Pereira da Conceição, militante e recente ex-preso político, que é visto a entrar no bordo direito do quadro. Aí trabalharam também Maria Barreira, sua mulher representada pela Maternidade à direita baixa, um tema comum ao casal, e pelo menos Dias Coelho e Alice Jorge, que pouco depois iniciaria o relacionamento com Pomar. Lugar de trabalho e também de tertúlia artística e política, que alguém apontou como uma espécie de antecâmara das Exposições Gerais de Artes Plásticas (EGAPs ou Gerais, 1946-56), em cuja organização participava activamente Dias Coelho e que Pomar acompanhava assiduamente na imprensa, até um último artigo em 1953, de avaliação e redefinição do neo-realismo e também auto-crítica militante, em que trocou as publicações habituais pelo mais longínquo Comércio do Porto. Cessa então a colaboração nas revistas, sem se conhecer justificação para tal (sequelas da "polémica interna do neo-realismo", razões pessoais?) e sem ser ainda um afastamento político declarado. Em 1955 a sua pintura deixa de ser neo-realista (mas continuam na gravura as figuras do trabalho), ao cabo de dez anos de prática, e o movimento encerra-se pouco depois, numa última Geral retrospectiva quando se iniciava a era Gulbenkian.
No friso de retratos, ao lado do casal em primeiro plano, está o engenheiro Frederico Pinheiro Chagas, amigo e simpatizante, certamente encomendador e depois proprietário de sempre desta obra, e logo a sua mulher, Dina. O par alegórico dos jovens militantes de mão dada, encabeçando a Marcha, guiando o povo segundo uma tradição revolucionária que se partilha com os códigos da apologética religiosa, contou por modelos o carpinteiro Francisco Bento, saído da prisão pouco tempo antes, que frequentava o atelier e realizou mobiliário para vários camaradas, e ao lado, muito provavelmente, Zita Namora, mulher do escritor, do qual Dias Coelho realizou um busto em 1950-51, o que justificaria a sua passagem pelo atelier. Desta Zita existem fotografias do seu retrato esculpido por Pomar (uma encomenda?) e de um estudo para o quadro (imagens abaixo). De Pinheiro Chagas há também um excelente retrato desenhado. A menina à esquerda não foi identificada, ainda, mas será alguém em particular - a "presença" dos modelos retratados vem reforçar a força mobilizadora da alegoria.
A alegoria tem como pólos simétricos a figura da Maternidade à direita, como promessa de futuro, e o estranho personagem visto obliquamente de costas à esquerda, um (falso) profeta, um velho frade?, vendedor de ilusões, que aponta para uma cidade moderna, em construção, com guindastes, personagens hieráticos (robotizados?); ao fundo, montes áridos. De um lado, o passado e um ilusório presente, do outro a infância e o futuro. Na metade direita, por trás do friso das figuras está uma alongada parede ou casa vermelha, que toma o lugar de uma (im)possível bandeira. Talvez também se reconheça aí, mesmo em cima à direita, uma praia e um barco, amarelo e azul, que rimam ou se repetem em primeiro plano rasgando de luz o ventre e o vestido azul da mulher - e este é um elemento de composição de grande eficácia moderna.
A memória possível do atelier, o interesse pelo retrato e o contexto neo-realista devem ser evocados com detalhe para situar esta obra de excepção, bem como o seu lugar no âmbito da produção de Pomar da primeira metade da década, sinalizando a respectiva diversidade quando se aproxima o fim da sua prática neo-realista.
O atelier da Praça da Alegria, no nº 47, ao que parece, situado entre o Maxime e o Hot Club, ao lado de uma leitaria, era também frequentado por escritores: José Cardoso Pires, com os primeiros livros e grande actividade política, que aí conheceu em 1954 a sua mulher, Edite, irmã de Vasco da Conceição, por ocasião do retrato que Pomar pintava, sendo ela retratada por Alice Jorge no ano seguinte; Orlando da Costa, que aí levou Maria Antónia Palla; Alexandre Cabral, amigo do engenheiro, e outros mais. Esses primeiros anos da década de 50 conheciam uma grande tensão ideológica, a dissidência titista e "browderista" de Piteira Santos, Mário Soares e os Lyon de Castro, associada à denúncia pelo PC do jornal Ler da Europa-América; o debate sobre estética e as fracturas no campo neo-realista, centrado no controle da Vértice; a saída de Mário Dionísio do partido em 1953 e a recusa de continuar a participar nas Gerais, a partir de 54, após a alargada participação nacional na II Bienal de São Paulo enviada pelo SNI no ano anterior. Em 1952 a SNBA esteve encerrada depois de Eduardo Malta ter sido expulso de sócio “pela provocação que encenou contra José Dias Coelho, que encabeçava esta batalha” pela renovação dos júris (2). O atelier da Praça da Alegria era um lugar "ortodoxo" sujeito à pressão do realismo socialista de informação francesa, via Arts de France (a sua "Tribune du Nouveau Réalisme" surge em 1949 e a revista desaparece em 1951), que se ia abatendo sobre a originalidade e a irreverência do primeiro neo-realismo.
Tentando estabelecer um panorama da época, os livros então ilustrados por Júlio Pomar dão um retrato das relações literárias marcadas pela cumplicidade política e pessoal: Carlos de Oliveira (retrato de 1948); Sidónio Muralha e Cardoso Pires (desenhos de 1949, 1950); Alves Redol, Raul de Carvalho e Ferreira de Castro (1949); Mário Dionísio, José Fernandes Fafe, Eugénio de Andrade, Ilse Losa, Orlando da Costa (todos com retratos desenhados para as tiragens especiais de 40 exemplares da col. Cancioneiro Geral do Centro Bibliográfico, 1950/1953); e Alexandre Cabral (1955). As grandes encomendas editoriais da Fólio (de Victor Palla e Cardoso Pires), Sul (de Castro Soromenho), Realizações Artis (de Rogério de Freitas e Leão Penedo), Bertrand, Minotauro (Urbano Tavares Rodrigues), Cor e Portugália virão depois (1957-1967).
Além da escrita e do desenho para a imprensa, da ilustração e da cerâmica, têm relevância na actividade de Pomar (afastado do ensino em 1949) as encomendas para decoração e a escultura (a pintura era pouca, ao tempo, num mercado apenas de amigos), em retratos e em peças decorativas, que se expunham nas Gerais (assinalam-se adiante com *) e foram desaparecendo ou esquecendo-se em destinos privados: retratara em escultura a sua mulher, Maria Berta, em 1949*, e também os escritores Sidónio Muralha*, 1950, e António Navarro, 1951 (Salão de Outono), obras presentes na actual exposição, igualmente Armindo Rodrigues, 1951*, ficando-se por aí as peças com qualidade moderna, não convencionais. Conhecem-se apenas mais quatro “cabeças”, duas de amigos (Ana Moura*, mulher de Rui de Moura, editor, depois Prelo) e Joaquim Barata* (fundador da Gravura) e as outras (Zita e Liliana, 1951) talvez de encomenda. À escultura só voltará com os ferros soldados do ciclo Dom Quixote, em 1960. Fez também, em 1954, os retratos pintados de Cardoso Pires e Maria Lamas (esta presa pouco antes, no regresso de Moscovo, e o retrato indicado no catálogo da VIII Geral não terá certamente sido exposto, dado o contexto repressivo) - a que se acrescentam os de Vera Azancot (tradutora, 1954*), Alice Jorge (1955), Maria José Salvador (1956, mulher de Manuel Torres, amigo, parceiro de viagens de automóvel e fundador da Gravura). É já de 1958 uma outra encomenda isolada, João Duarte, para a Companhia de Seguros Comércio e Indústria, agora no BCP, que só terá continuidade dez anos depois mas bem diferente.
Por seu lado, José Dias Coelho (n. 1923), que entrara no mesmo ano de 1942 na Escola de Lisboa, apresentou nas Gerais retratos de Rolando Sá Nogueira, 1949; M.T. (Margarida Tengarrinha), 1950; Alves Redol, 1951; M.E.C. (Maria Eugénia Cunhal), 1953; Maria Isabel Aboim Inglês, 1954, entre outros não nomeados. Realizou também os bustos de Fernando Namora e do designer Tomás de Figueiredo. Aliás, o retrato teve sempre uma forte presença nas Gerais. Aí expostos ou não, o catálogo “Um tempo e um lugar” (3) refere ou reproduz obras de Abel Manta (Bento Caraça, 1947), Sá Nogueira (Frederico George e Jorge Vieira de c. 1949), Maria Keil (Abel Manta*, 1949), Vasco da Conceição ("cabeças" de Maria Barreira*, Sidónio Muralha* e Lopes Graça, 1950*); Victor Palla (Cardoso Pires, 1951), Mário Dionísio (Joaquim Namorado* e Eduarda D.*, 1953), Lima de Freitas (Alves Redol*, 1953, Cardoso Pires*, 1954), Alice Jorge (Edite Cardoso Pires*?, 1955), e também de.João Abel Manta, Arlindo Vicente (João Gaspar Simões, sd), José Farinha (Alves Redol, escultura s.d.), Euclides Vaz, entre outros retratos indicados sem nomes dos modelos.
Armindo Rodrigues 1951 de Pomar (col. part.) e Fernando Namora, de J. D. Coelho 1951, bronze (col.Museu Gulbenkian)
Picasso, Maurice Thorez 1945 / Fougeron, retrato da mãe de Thorez, e Picasso, Thorez, croquis 1949 (Art de France 1949) / Boris Taslitzky, A morte de Danielle Casanova
Além da permanência das práticas realistas, a disciplina do retrato era então recomendada ou imposta pelos partidos comunistas num período de maior pressão da ortodoxia (e do culto da personalidade, especialmente em França) - a pintura de história também se impunha mas foi naturalmente mais rara entre nós. Esse é um contexto que seguramente penalizou a respectiva continuidade em anos seguintes, e alguns episódios polémicos tiveram retratos por pretexto (foi famoso o caso do Stalin de Picasso, nas Lettres Françaises, à data da sua morte...), num período em que o combate aos realismos, depois das normas nazis e soviéticas, fazia parte do enfrentamento entre os blocos da Guerra Fria. Depois de Picasso, Freud e Bacon, Hockney e Kitaj, Arikha, entre os maiores, iriam a seguir prosseguir e reafirmar a centralidade do retrato na arte do século XX.
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Para o grande formato de Marcha, único ao tempo - 122 x 199 cm, têmpera sobre aglomerado - Pomar usou uma placa de madeira da mesma série de três outras tábuas que pintou para o restaurante Vera Cruz, na Avenida da Liberdade, projecto de Victor Palla e Costa Martins, com quem Pomar manteve várias colaborações (elas passaram depois para o restaurante Tarantela, no largo da Estefânea, e dispersaram-se nos anos 90). A vocação decorativa de referência brasileira realiza-se aí com códigos de pintura mural, o que também ocorre nesta Marcha, embora esta de ambição panfletária, num figurino apologético onde a condição de retrato de grupo e a alegoria asseguram maior complexidade.
A campanha pela Paz está presente em três gravuras de 1951 que tiveram muito grande difusão e marcaram presença nas casas dos intelectuais da Oposição de feição comunista. Mulheres Fugindo, conhecida como A Bomba Atómica e A Explosão, seguida por outras onde já está presente a pomba que em 1949 Picasso promovera da iconografia cristã a símbolo da Paz no cartaz para o Congresso de Paris. Pouco depois, em agosto de 1949, a URSS detonou a sua 1ª bomba nuclear; em março de 1950 o Comité Permanente dos Partidários da Paz lança o Apelo de Estocolmo pela proibição das armas nucleares,
Outra obra que alude às campanhas da paz e certamente à Coreia é A Vida ou a Morte (conhecido também como Guerra e Paz), datada de 1953 e exposto nesse ano na VII Exp. Geral. O Massacre na Coreia, de Picasso, 1951, poderá ser uma referência reconhecível, condensando-se o grupo das mulheres numa única figura maternal e esquematizando a marcha militar até à caricatura, numa composição decorativa.
Mas a produção militante de Pomar é acompanhada no mesmo ano da Marcha por obras de feição bem distinta e também de direcção inédita na sua produção, a paisagem, numa coincidência que reflecte a manifesta diversidade das interesses - mas nenhum destes quadros terá sido exposto no seu tempo próprio:
NOTAS
1 reproduzido talvez pela 1ª vez no Catálogo Raisonné vol I, 2004, nº 86, o quadro nunca antes terá sido dado a conhecer e não faz parte da iconografia do PCP.
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Quando o convidaram a expor uma antologia das suas estampas ("Pomar - Obra Gráfica", Fórum da Maia, 1998), o autor distribuiu-as por cinco "linhas temáticas": O Povo, A Festa, Eros, Animais Sábios e Ficções. Também poderiam servir para catalogar toda a sua obra, só acrescentando os retratos, que estão agora em exposição no Atelier-Museu com o seu nome. A fórmula continuou a ser usada em reedições itinerantes da mostra, até 2003, justificada assim pelo artista: "uma tentativa de arrumação, salientando o que, ao longo dos anos e sob várias formas, foi de uma maneira ou de outra marcando a obra" (prefácio na reedição de 1999, Leiria). Uma outra arrumação posterior, proposta por Marcelin Pleynet sumariou toda a sua produção de outro modo, próximo: Identidade/Identidades (auto-retratos e retratos); Lugar/Mundo (aqui coube a paisagem e as secções Povo e Festa, muito alargadas, incluindo as pinturas sobre Maio 68); Eros; Animais de Companhia (os Sábios e outros); Fábulas Fintadas (as Ficções) – em "Pomar - Autobiografia", ed. Sintra Museu de Arte Moderna Colecção Berardo / Assírio & Alvim, 2004.
Aquele primeiro índice oferecia direcções de leitura das obras reunidas, que abrangiam cinco décadas de actividade na área da produção de múltiplos impressos (gravados ou estampados - e foram quase oito décadas no total), mas também recusava a catalogação por especificidades técnicas, gravura e serigrafia, ou mais especificadamente, quanto à gravura, pelos seus processos: linogravura, xilogravura, água tinta ou água forte, litografia e outros. Justamente, importavam mais os assuntos que as fronteiras.
Arroz II 1954, linóleo / Mono Sábio 1962, Xilogravura a cores
2. Lembrou Pomar no prefácio de 1999 já citado que a obra gráfica então exposta se dividia em dois períodos distintos. O primeiro ia no catálogo de 1951 a 1963 (e poderia começar antes, em 1948, com os linóleos iniciais), acrescentando que a prática da "gravura de autor" coincidia na sua quase totalidade com a participação na fundação e dinamização da GRAVURA - Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, em 1956. De facto, antes da GRAVURA já se envolvera na criação e promoção do que se chamava "gravura contemporânea", começada esta em exposições colectivas e em artigos na imprensa sobre "essa desconhecida, que é a gravura original" (1), a "estampa original" - dizia então que "a gravura e o mural aparecem aos artistas empenhados na conquista de um novo realismo como os dois veículos mais fecundos" (2)
Foram anteriores à GRAVURA algumas edições com grandes tiragens que se encontravam em todas as casas da Oposição e hoje são raras: "Mulheres Fugindo" (A bomba atómica), "Menina e Pombas", "A Refeição do Menino" – então chamada "Família" –, todas elas de 1951, distribuídas nomeadamente pela SEN, Sociedade Editora Norte, no Porto, e próprias das campanhas pela Paz de um dos lados da Guerra Fria, que então se agudizava: a pomba da Paz que Picasso popularizou quando do Congresso Mundial de Paris de 1949 está presente em quatro versões. E também antecederam a GRAVURA as três figuras do ciclo "Arroz", associadas a Vila Franca de Xira, já de 1954.
No catálogo geral da sua obra gráfica, de 2015 (3), contaram-se como gravuras 116 estampas, sendo 32 anteriores à GRAVURA e 13 as respectivas edições distribuídas aos associados, até 1965, sendo os outros números recenseados edições do autor (às vezes em 5, 15 ou 30 exemplares) e alguns provas de ensaio e de trabalho, talvez sem tiragem ou ela é desconhecida. À época não se guardavam registos. A propósito, note-se que desde início a gravura apareceu também associada à ilustração e à arte do livro, incluída em edições ou tiragens especiais, que se usava lançar em fascículos: duas primeiras "Tauromaquias" eram litografias coloridas à mão, de 1950, agora expostas pela primeira vez, com uma condição alegórica que precedeu a observação directa; três litografias para o "Romance de Camilo" de Aquilino Ribeiro (1955-57); doze litografias para o "Grande Fabulário de Portugal e Brasil" (1958-1962); doze xilogravuras para "A Divina Comédia - O Purgatório" de Dante (1961-62).
Num levantamento por temas, as tauromaquias acontecem em maior número, onze, desde 1961, precedidas por três touros de 1959-60, continuando-se na longa série de pinturas, até 1964, já em Paris. As presenças do mar, da praia, pesca, lota e mercado são 14 num total que vai com grande diversidade formal desde de 1951 (Pescadores) e 1952 (Nazaré) até 1959-60 com o Sargaço, passando pela Ribeira de Lisboa (1953 e 57) e a Mulher do Mar (1956) que valeu o Prémio Gulbenkian. Na pintura abandonava o neo-realismo mas a representação das figuras do trabalho continuou a ser predominante (sem operários, existem o vidreiro, o saltimbanco, um camponês, para além do breve ciclo "Arroz"). A série da viagem às Astúrias teve quatro números, de visita a um arcaico mundo rural, em 1957-58. São tantos como os nus de 1958-61, que não eram uma novidade; publicou e expôs outros nus desenhados desde 1948, logo com alguma polémica interna ao meio da crítica.
Dom Quixote formou uma série de 6 edições (1959-61), paralela a pinturas e esculturas, por ocasião das ilustrações para a edição Bertrand da tradução de Aquilino Ribeiro (1960), e autonomizando-se delas. Está também presente todo um bestiário, espaçadamente desde 1952, assim discriminado só em figuras isoladas, talvez em muitos casos certamente sem haver tiragens, ou desconhecidas, só pelo gosto de gravar, em geral em placas de pequeno formato: elefante, javali, dois gnus, porco-espinho, burro, peru (em 450 exemplares para oferta da GRAVURA a todos os sócios, em 1957), depois a hiena, três símios (com o famoso mono-sábio, de que houve um quadro de 1961), galo, papagaio, além dos touros...
3. O segundo período iniciou-se mais de 10 anos depois da instalação em Paris, compreendendo serigrafias e litografias que foram "interpretando e divulgando algumas obras, as quais foram trabalhadas em ateliers especializados de Paris, Lisboa e Barcelona por iniciativa de vários editores" (Pomar 1999, op.cit.) A partida para Paris data de 1963, e a pintura absorveu-o por completo. As primeiras edições apareceram só em 1974: Kompass de Lisboa, ligada à 111; Éditions Art Moderne / Galerie Belechasse, de Paris; e Joaquim Vital, que com as suas Éditions de la Différence iria continuar até 2004 a ser responsável por numerosos projectos associados à ilustração, ou não.
No total, este tempo longo teve 175 edições, sem contar as extensas séries do "Catch" (a luta livre francesa, desenhos de 1965 litografados em 1978) e "Jogos de Praia/ Jeux de Plage" (Cenas de praia, Costa da Caparica, Setembro 1963-2001), com 34 e 16 folhas respectivamente. Depois do catálogo encerrado em 2015 aconteceram mais dois ou três números.
La chambre Noire 1976, serigrafia
Destacam-se neste conjunto as edições que formam álbuns de grande formato (apresentados em pastas ou caixas), próprios do mercado internacional: "Le Livre des Quatre Corbeaux", sobre um poema de Edgar Pöe, The Raven / O Corvo, e retratos dos seus tradutores, Baudelaire, Mallarmé e Pessoa (ed. La Différence 1985); "4 Tigres", serigrafias com colagens (F. X. Lovat 1994); "Les Quatre Singes" (Différence, 1997); "Marujos & Cia / Marins et Cie", onde cruzou a Ode Marítima de Álvaro de Campos com Ulisses (Del Fiore Edition 1999). E também a série "L'Équipée de La Chasse au Snark", a partir de Lewis Carroll (Différence 1999) cujas estampas foram distribuída avulso, ou o volume "La Mémoire du Sel / Le Sel de la Mémoire", de parceria com Claude-Michel Cluny, com sete Mães Índias de um regresso à Amazónia por via de Pero Vaz de Caminha (Différence 2003; acompanhando a exposição de pinturas «Méridiennes - Mères Indiennes», Galerie Patrice Trigano 2004). E ainda alguns projectos interrompidos de Joaquim Vital: as litografias que acompanhariam as ilustrações de "Kadama Vivila", poesias eróticas, sotádicas, de Gilbert Lely, biógrafo de Sade, em 1977 (quatro em sete previstas, que agora se expõem certamente pela primeira vez e não figuraram no catálogo de 2015); mais a referida série "Catch", distribuída numa caixa original só em 2014. Em dois casos maiores, o Corvo e o Snark, a criação dos múltiplos acompanhou as séries de pinturas, de que nunca são meras reproduções, surgidas de convites para ilustrações, mas excedendo-os em muito, como acontecera décadas antes com a série sobre Quixote, motivada pela tradução de Aquilino Ribeiro (Bertrand, 1960).
A produção foi tematicamente muito diversificada, mas podem apontar-se 16 edições de 1974 a 1979 próprias do ciclo "L'Espace d'Éros"; onze ou doze tigres, desde 1980; onze variantes dos indios do Xingu, sem contar as já referidas Mães, bem como regressos pontuais aos temas de D. Quixote, tauromaquias, corridas de cavalos, em edições originais. Foram reproduzidas e/ou reinterpretadas obras várias com datas que recuam de 1944 a 1973, que se incluiram num capítulo intitulado Anexo na edição da Obra Gráfica completa, separando-se das serigrafias iniciadas em 1974.
serigrafias originais criadas por ocasião da inauguração do Atelier-Museu Júlio Pomar, 2013. Burro tocando guitarra e Burro tocando guitarra (Ó fartar vilanagem)
4. Voltando a lembrar as secções e as obras escolhidas da antiga antologia, O Povo acolhia "a "produção chamada neo-realista", como escreveu Pomar, completada a propósito com uma edição comemorativa do 25 de Abril. Era uma breve síntese das figuras do trabalho - da lota e do mercado, do sargaço, mulheres quase sempre.
A Festa inclui as tauromaquias (a festa brava), de 1961-63, mas também a série dos Índios do Xingu, de 1990, acrescentada em 1998 com os banhos das crianças no rio. Informava o artista em 1999 "que [a Festa] começa a desenhar-se dentro deste período [neo-realista], marca o seu fim, e reaparece em momentos vários até à actualidade".
A terceira série, "sob o signo de Eros", data de 1974-79, ao tempo de uma nova linguagem de formas recortadas e cores planas com que construiu o seu "teatro do corpo", mas poderia começar com os nus gravados nos anos 1958-59. Eros atravessa toda a obra.
Os Animais Sábios percorrem a representação animalista, como se dizia, desde o "Touro" de 1960 aos porcos do final da década de 1990, passando por macacos de várias espécies e épocas, os corvos (os do poema de Edgar Pöe e os que acompanharam Bocage no metro do Alto dos Moinhos – Camões teve pombas e Pessoa gaivotas). E também os tigres, nascidos de um conto de Jorge Luis Borges.
Eram já exemplos do "gosto de efabular", diz o artista, gosto se acentua na série final, Ficções, que ilustra a continuada relação de Pomar com a literatura e inclui os "Retratos Imaginários", com circulação mais tardia pelos territórios dos mitos. Primeiro os D. Quixote, de 1959-60 e outra vez em 1998, depois Camões e Fernando Pessoa, Adão e Eva, Ulisses e as sereias, Hércules e o Centauro, o Snark, etc.
Toda a Obra Gráfica de Júlio Pomar foi reunida num volume com esse título, ed. Caleidoscópio 2015. Com coordenação e texto de Mariana Pinto dos Santos e pesquisa e catalogação de Alexandre Pomar.
Blason / Brasão e Tigre azul, 1980-2001
5. Porque se imprimem estampas? Os objectos e as suas designações (gravura, serigrafia, etc) prestam-se a diversos equívocos, por flutuações conceptuais e falta de fixação de terminologia específica. Estampa usa-se em espanhol e francês, print e printmaking em inglês, grafik em alemão, incluindo "as várias formas de criação artística que envolvam qualquer técnica de impressão". Gráfica Popular era nos anos 1950 o inspirador exemplo mexicano; em Espanha chamou-se Estampa Popular o grande movimento de gravadores que investiu a abertura política a partir de 1960, como uma GRAVURA da esquerda militante. A palavra gravura toma a parte pelo todo, e agora, ao contrário, chama-se por vezes serigrafia a tudo. Uns desvalorizam os múltiplos como cópias e reproduções, o que é muitas vezes errado, outros referem-se-lhes como quadros. A simultânea condição de original e de múltiplo – própria da estampa de autor, tal como da escultura em bronze, da prova fotográfica e de outras obras de arte que partem de um matriz ou de um molde, de um negativo ou ficheiro informático –, é mal entendida: o curso da ideia de reprodutibilidade técnica de Walter Benjamin, que quis com ela valorizar a fotografia e o cinema, contrariando a aura e a unicidade da obra de arte, ou a esta atribuída pela estética convencional, não ajuda. Estampa original, estampa de interpretação, de reprodução, estampa tipográfica, etc., qualificam criações e produtos diferentes no mesmo campo da multiplicação de imagens, em geral sobre papel. Também se chama gravuras às figuras incisas nas pedras de Foz Côa. E "obra gráfica" pode incluir o desenho, como ensinou o professor Hellmut Wohl na exposição "Júlio Pomar. A Comédia Humana" (CCB 2005).
Produzem-se gravuras e serigrafias, estampas, para multiplicar o acesso à criação de um artista através da edição de originais em tiragens limitadas e numeradas (prática regulada só no final do século XIX, por razões de mercado). Associam-se assim a divulgação e um coleccionismo acessível. Trata-se sempre da possibilidade de democratização da arte, de a tornar acessível a um maior número, a que no tempo neo-realista se dava um sentido político de militância, entretanto desvanecido.
Também para experimentar um outro campo de práticas, técnicas ou processos de criação, ao lado e diferentemente da pintura de cavalete ou mural, e do desenho (a lápis, pena, marcador, etc.) – e igualmente da escultura nas suas várias possibilidades, da cerâmica, do vidro, da tapeçaria e do vitral, que Pomar praticou. Talhar um bloco de madeira e rasgar uma chapa com ácido são práticas manuais (artísticas) que proporcionam resultados (imagens, traços, texturas, colorações) diversos dos do uso do pincel sobre tela, do lápis sobre o papel. É um exercício diferente, paralelo e autónomo, de experimentação e de criação, com que se pode estabelecer um diálogo com a pintura e o desenho mutuamente produtivo.
E para explorar um mercado mais acessível que o da pintura – por razões económicas, portanto, causa tantas vezes ocultada em matérias de arte. A criação da GRAVURA, para além de potenciar a divulgação de obras e de fornecer acesso colectivo a meios técnicos e aprendizagens, um atelier e uma escola, veio assegurar melhores condições de existência oficinal e material aos artistas, e no caso de Pomar veio exactamente suceder à produção de cerâmica (no Bombarral e nas Caldas da Rainha) que era, desde as primeiras mostras individuais, muito mais vendável que a pintura. Do artista-impressor ao serígrafo registou-se uma mudança marcada pela distância criativa e a intermediação técnica sujeita à facilidade da multiplicação, que acabou por fragilizar a produção e favorecer o mercado dos cromos. (A ordem das respostas não é aqui fixa.)
O banho das crianças no rio Tutuari II, 1997-1999
Versão revista e ampliada do texto publicado no catálogo da exposição "Júlio Pomar- A obra gráfica numa coleção privada", que apresenta peçasa da colecção do galerista Paulo Nunes, no Museu do Neo-Realismo em Vila Franca de Xira (28 nov. - 23 maio 2021)
2 jan 21
Posted at 00:41 in 2020, gravura, gráfica, JP obra gráfica, Julio Pomar, Vila Franca de Xira | Permalink | Comments (0)
2
Posted at 16:41 in 2001, cesariny, Chiado, Famalicão, MEIAC, surrealismo | Permalink | Comments (0)
Posted at 23:33 in #covidcultural, 2020, politica cultural | Permalink | Comments (0)
Posted at 17:53 in #medinamanguel, 2008, 2020, africa.cont, cidade, CML | Permalink | Comments (0)
Posted at 23:29 in 2020, foto, por garvão | Permalink | Comments (0)
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III
O que pode ser uma fundação em Portugal" - H.V.S.
Uma fundação acima da política? - V.J.S.
Azeredo Perdigão
IV
Madalena Perdigão: Só se ataca o que tem merecimento / A construção do Museu - Centro Cultural obriga a F.G. a tornar-se empresa
José Blanco
Mário Vieira de Carvalho: Gradual transformação da Fundação em enpresa
V
Jorge Peixinho
VI
Ferrer Correia
Vitor Sá Machado
Joel Serrão
Posted at 22:41 in 1975, 2020, Gulbenkian, politica cultural | Permalink | Comments (0)
Posted at 23:42 in 2020, foto, por garvão | Permalink | Comments (0)
Tout cela concerne les trois domaines principaux qui ont été ceux de mon activité professionnelle depuis cinquante ans:
Il n'y a rien de très scientifique ou académique dans tout cela: c'est le reflet d'une activité de terrain et des leçons que j'en ai tirées.
Ces textes sont tous librement téléchargeables, selon une procédure simple, qui vous demande seulement de vous identifier. Si vous voulez citer tel ou tel titre, ou en reproduire un extrait, veuillez en mentionner la source dans les formes habituelles."
Posted at 00:29 in #covidcultural, 2020, economia da cultura, Hugues de Varine, Museus, Património, politica cultural | Permalink | Comments (0)
Tags: Cultura e pandemia, Ecomuseu, economia da cultura, Hugues de Varine
Posted at 22:37 in #medinamanguel, 2020, africa.cont, Biblioteca Manguel, cidade, CML, comunicação social, câmara de Lisboa, escândalos, Imprensa, Lisboa, Livros, Museus, Palacete Pombal, politica cultural, Tercenas | Permalink | Comments (0)
Tags: Africa.cont, Alberto Manguel, Biblioteca Manguel, cidade, CML, comunicação social, Câmara de Lisboa, escândalos, Fernando Medina, Imprensa, Livros, Museu do Design, Palacete Pombal, política cultural, Tercenas do Marquês
Posted at 23:06 in 1952, 2020, Artistas Portugal, Atelier-Museu Júlio Pomar, Júlio Pomar, Neo-realismo, retrato | Permalink | Comments (0)
no Diário de Notícias de 20 de Julho de 1981, em página inteira, n.n. ("Reportagem"):
"No 25º aniversário da Fundação
SEGUNDO MUSEU GULBENKIAN É DEDICADO À ARTE MODERNA"
publicado na véspera da inauguração da exposição "Antevisão do Centro de Arte Moderna", com base numa entrevista com o arq. e 1º director Joséw Sommer Ribeiro, defenindo-se aí o respectivo programa e recordando-se as vicissitudes que conheceu o seu projecto.
Posted at 17:17 in 1981, 2000, CAM, Gulbenkian, Museus | Permalink | Comments (0)
Entrevista de Victor Pinto da Fonseca e Liz Vahia ARTECAPITAL 2017
Posted at 16:30 in 2020, CAM, Gulbenkian, Museus | Permalink | Comments (0)
Biblioteca de Alberto Manguel em Lisboa Câmara Municipal de Lisboa Uploaded: Friday, September 11, 2020
https://vimeo.com/456859411
Biblioteca de Alberto Manguel em Lisboa from Câmara Municipal de Lisboa on Vimeo.
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Pedro Proença... Estás esquecido ou enganado (* - 11 Set. edição revista e ampliada). A articulação entre instituições e artistas de que falas parecia natural e a contestação fazia-se em surdina, face a uma coesa rede de poderes. Quando quiserem pudemos falar da instrumentalização das representações nacionais através das relações na e com a SEC (Sarmento funcionário, Calhau atencioso, Cerveira Pinto, a LIS e seus júris em 1979 e 1981, etc); do papel para-institucional que teve a Galeria Cómicos do Luís Serpa, 1984 -, onde todos ELES expunham depois do Depois do Modernismo, 1983 - e tu também; da gestão interessada do Molder, fechando o CAM à fotografia com excepção da sua rede de contactos, por via da defesa do "quadro fotográfico" do Jean-François Chevrier, etc). Essa conjugação de poderes foi eficaz no acesso à presença internacional, em especial dos próprios, concentrando recursos e candidatos. Disse que foi eficaz mas não foi séria e o balanço NÃO é hoje positivo. Vê lá se te lembras...
(* Dizia o Pedro: "Num tempo não muito distante (não foi noutra galáxia) havia artistas que eram determinantes na definição da política cultural (artística) de um país ou na programação de grandes instituições. Não era um escândalo, e a articulação entre instituições e artistas era bem mais natural. Hoje, isso soaria a escândalo. Penso no Fernando Calhau na "divisão de artes plásticas" do MC (era assim que se chamava), ou Jorge Molder e Rui Sanches no Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian. Que excelente trabalho!")
Passou-se de um sistema voluntarista e centralizado da gestão das artes ditas plásticas (alguns artistas e algum estado), por isso eficaz, a uma situação plural, dispersa e pantanosa, efeito da descrebilização da fase anterior e do surgimento de novos dados com a mudança de década e de geração, e também mudança de contexto político. Intervieram mais agentes (privados e fundações) e mais actores (chegaram os curadores), num país sem escala. Serralves e Chiado, tal como o CAM, serviam interesses próprios e não se afirmaram como museus, que não há. Alias, a ideia de museu era ou é combatida (apesar de discursos oportunistas), porque se trata sempre de gerir o curto prazo (as actualidades), de satisfazer clientelas e de socorrer/apoiar directamente artistas - agora pela via estúpida da Colecção do Estado. (É só uma pista de reflexão; de facto falta memória, em especial no MC, impedindo a continuidade de políticas)
Mas a nota essencial sobre a articulação de instituições e artistas é a continuidade efectiva dos poderes.
À "Alternativa Zero" do Ernesto de Sousa (Galeria Nacional de Arte Moderna, Belém, Fevereiro-Março de 1977) que nasce a partir da SEC com convite e o empenho do Eduardo Prado Coelho enquanto director-geral de Acção Cultural (em 1975-76), sucede a iniciativa pluridisciplinar "Depois do Modernismo", em 1983, dinamizada por vários dos participantes da mostra anterior (Leonel Moura, Cerveira Pinto, Julião Sarmento, antes "discípulos de E.S.) numa actualização de referências e influências (da arte conceptual e Fluxus à Bad Painting pós-moderna, cortando assim com a "tutela" do Ernesto), em grande parte a partir da mesma SEC, e sustentando uma nova organização de poderes (** fui "adido de imprensa" do DdM).
Ao "Depois do Modernismo", que teve Luís Serpa como coordenador, sucede em 1984 a Galeria Cómicos (antes Cómicos – Espaço Intermédia), em espaço cedido pela SEC ao lado do Teatro da Cornucópia e gerida pelo mesmo Luís Serpa (depois Galeria Luís Serpa Projectos). CONTINUA
Bibliografia:
"Arte e Mercado em Portugal: Inquérito às Galerias e Uma Carreira de Artista" (***), Alexandre Melo, Colecção OBS - Pesquisasa 4, Observatório das Actividades Culturais, 1999 (*** trata-se de Julião Sarmento)
"Galerias de Arte em Lisboa", coord. Maria de Lurdes Lima dos Santos e Alexandre Melo, Colecção OBS - Pesquisasa 9, Observatório das Actividades Culturais, 2001
Posted at 16:47 in 1983, 1984, politica cultural, SEC | Permalink | Comments (0)
A exposição Angola 1938 referida num ensaio brasileiro de Ana Maria Maud:
"Imagens fotografadas: Fotografia Pública, possibilidades metodológicas", 2014
http://www.labhoi.uff.br/sites/default/files/relatorio_final_cnpq_anamauad.pdf
a partir da página 124 / Álbuns fotográficos como arenas da memória pública, p. 128 e seg.
"Na sequência do texto, com o objetivo de operacionalizar o conceito de fotografia pública, apresenta-‐se um estudo de caso – a produção sobre o catálogo da Exposição de Angola de 1938 – em que se busca inventariar as imagens e suas histórias, num possível exercício de biografar objetos e imagens fotografadas."
"Fotografia pública, um conceito em construção
O circuito social da fotografia nos séculos XIX e XX foi caracterizado pelo advento daquilo que se denomina de fotografia pública.97A noção de fotografia pública associa-‐se a configuração de ação do poder público, por meio da produção de registros de situações, processos e sujeitos que se associam a ação do Estado e criam a memória visual da ação do poder público. Paralelamente, busca ampliar a noção de documento visual, por entender que qualquer fotografia, ao mesmo tempo em apresenta e representa o mundo visível, por meio de uma linguagem é também o resultado de uma prática social e de uma experiência histórica. Utiliza-‐se o termo fotografia pública para incluir dentro da análise de fotografias as dimensões de seu circuito social, quer seja definindo a dimensão do espaço público visual, quer seja pela configuração de um público que visualiza essas imagens.
Mauad, Ana Maria.“Fotografia Pública e cultura visual em perspectiva histórica” IN:Revista Brasileira de História da Mídia vol.2, n.2, jul. 2013/ dez. 2013
ver: http://www.unicentro.br/rbhm/ed04/dossie/01.pdf
http://www.labhoi.uff.br/sites/default/files/relatorio_final_cnpq_anamauad.pdf
Posted at 22:39 in 1938, Angola 1938 | Permalink | Comments (0)
Elmano Cunha e Costa, Estudos Etnográficos e bibliografia
A fotografia e a "ocupação científica das colónias"
"Carlos Estermann troçava um pouco da fotografia" 102
Outros artigos
Posted at 13:56 in 1938, 2014, Africa, Angola, Angola 1938, Elmano Cunha e Costa, Etnologia, Fotografia africana, Fotografia Moçambique, Fotografos, história antiga, Moçambique, SNI/SPN | Permalink | Comments (0)
Posted at 18:31 in 2020, Covões, foto, Garvão, por garvão | Permalink | Comments (0)
Uma casa na Mina de São Domingos. A casa do Sr Miguel Costa.
Ainda existe este "monumento" da arte pública e arte outsider? Parece-me que já não - falta cuidado com o património. As fotos são de 30 março 2015 .
E é de lembrar o SOLAR DOS JORGES - Foto de Pedro Lobo, 30 de março de 2014
https://alexandrepomar.typepad.com/alexandre_pomar/jorge-soares/
Posted at 20:05 in 2015, foto, Outsider | Permalink | Comments (0)
Rui Filipe (1928-1997) não foi neo-realista, ....
Paisagem 1972 e Sem título [Floresta Africana], 1976
da dir. para a esq. Menina, 1953; Natureza Morta, 1951-53; Crianças na Praia, 1953
... nem surrealista, nem "abstracto" e são em geral os estilos colectivos que se valorizam e divulgam. É muito mais fácil apontar um qualquer ismo, recorre-se a uma grelha sabida e cada artista é visto como a ilustração de uma versão nacional do movimento, em geral sem originalidade assinalável.
Rui Filipe é mostrado no Museu que Vila Franca de Xira dedica ao Neo-Realismo, e é uma surpresa: a sua obra é mal conhecida, em especial a das primeiras décadas (o comissariado é de Paula Loura Baptista). Por momentos a sua figuração pode aparentar-se aos realistas (Multidão, 1962, e Carrocel, 1960-61). Antes, a geometrização da paisagem é reflectida e poderosa, sem ser um mero exercício formal (Casas, 1954). Muito mais tarde algumas obras sugerem um regresso a visões africanas, nomeadamente ao all-over próprio de Malangatana. Mas desde as obras dos anos 50 (Menina, 1953; Natureza Morta, 1951-53; Crianças na Praia, 1953; ou os casarios sombrios) há uma muito constante estranheza intrigante, alucinada, ou uma dimensão talvez metafísica, única na pintura portuguesa, que se mantém nas paisagens lunares de objectos abstractos e depois nas figuras frontais e imóveis, espectrais, da sua obra tardia e mais conhecida.
Veio de Moçambique (em 1946), como se confirma pelas primeiras peças da exp., com retratos africanos que se dirão académicos (discípulo de Frederico Ayres em Lourenço Marques). Primeiras exp locais em 1944 e 46, de onde Henrique Galvao terá trazido uma beleza negra que incluiu em Outras Terras, Outras Gentes, na edição em fascículos de 1944-47. Depois foi aluno de Domingos Rebelo e de Dórdio Gomes, no Porto (EBAP?), e principalmente de Vázquez Dias em Madrid (1948-51), um sólido e influente admirador de Cézanne, com quem "aprofundou os valores expressivos de um paisagismo mental, articulando as superfícies dos motivos numa continuidade contornada muito rítmica que o cromatismo surdo acentua", Raquel Henriques da Silva (Museu do Chiado: Arte portuguesa 1850-1950, 1994, p. 314; in Wikipedia).
Viajou e frequentou academias em Paris (La Grande Chaumière) e Londres, a Slade, colega de Cutileiro... É um itinerário original e raro no seu tempo, e a sua obra é também original, pessoal, diferente. A mostra antológica, a 1ª, prolonga-se até Outubro e aguarda-se ainda o catálogo (tornou-se norma, uma praga, falhar a divulgação de uma exp e de um artista deixando a edição para as calendas...) Dizem-me que sairá no início de Setembro, e assim a exp. terá um segundo fôlego...
Entre 1962 e 1982 trabalhou em publicidade, que foi ocupação de muitos, e em geral fatal, mas não no seu caso. Nos anos 80, em que expôs com frequência e sucesso, as suas telas manifestam uma densidade expressiva algo dramática (que tem a ver com a morte de um filho), muitas vezes ocupadas por um rosto escultural que se destaca de um também denso trabalho matérico.
São particularmente interessantes as paisagens abstractas, ou que são antes espaços ambíguos preenchidos por formas escultóricas reconhecíveis e não figurativas, e as referências africanas que surgem em alguns trabalhos onde se reconhece uma vegetação luxuriante ou um encadeado ascendente de corpos que lembra nitidamente a escultura maconde na variante ”Ujamaa”, que significa família ou união.
Negra, 1945, publicado em Outras Terras, Outras Gentes, de Henrique Galvão
Vale a pena ir ver
Posted at 13:16 in 2020, Artistas Portugal, Neo-realismo, Vila Franca de Xira | Permalink | Comments (0)
SOBRE A ESTÁTUA DO VIEIRA
Claro que é arte (é uma representação com ambição artística e, como se vê, objecto de disputa sobre a sua recepção como arte e a sua apreciação estética) Essa é uma errada direcção de análise (respondo a quem se preocupa em determinar se a estátua do PAV é ou não é "arte", no caso o Celso Martins). E não é o consenso que a determina como arte ou não arte.
É uma obra de arte medíocre. E isto não se prova, argumenta-se em busca de um consenso critico.
“Convém dizer que a estatuária é uma forma totalmente anacrónica de pôr símbolos no espaço público, a reflexão sobre isso não é estética mas política.” (sic)
A interdição da estatuária pela crítica do tardo-modernismo formalista não é matéria de fé - é uma tese académica datada - e não contraria ou condena a aspiração comum/colectiva a colocar marcas simbólicas no espaço público. Também se condenaram a figuração e os géneros tradicionais - o retrato, nomeadamente -, condenou-se o plinto e o bronze, pôs-se em causa a escultura (não a escultura “expandida”) a favor do objecto (encontrado), da assemblage, da instalação, etc, mas isso não a tornou impossível, embora rara, e teve por efeito a multiplicação de maus escultores que satisfazem a necessidade do monumento e da estátua, da homenagem e da memória, como sucedeu com o PAV e continuará a acontecer.
Custa-me a acreditar que o último escultor capaz de fazer estátuas seja o João Cutileiro: o Sebastião de Lagos, o Camões de Cascais, a Inês de Castro de Coimbra, a Florbela (onde?), o Afonso Henriques e muitos outros, os guerreiros anónimos, as mulheres, as mulheres, as mulheres... De qq modo se foi o último, a culpa não é dele, mas das Escolas e da crítica formalista pós-França.
Há quem continue às voltas com a ideia do atestado de arte, ou certificado de arte. Isso não é matéria de certificação nem de consenso, democrático ou de 'especialistas'. Essa é uma questão nula, inexistente, o que já se sabe há muito.
O consenso procura-se quanto à avaliação crítica, à apreciação estética. E estas não se 'estabelecem' de uma vez por todas, defendem-se, argumentam-se. Para alguns efeitos legais ou oficiais e institucionais (colecções, museus, concursos, etc - ou tipo classificação de espectáculos) a avaliação pode ser delegada numa comissão (ou parlamento, até), o que não a torna avaliação definitiva ou a verdade.
Também querem certificar quem é artista e quem não é? Regressam às corporações, às academias? Ou pensam numa Ordem dos artistas? Incluem os amadores e outsiders, espontâneos, loucos? De certeza que os maus artistas terão direito à carteira profissional neo-corporativa. (14 junho)
*
Uma estátua é uma homenagem quando é erigida e inaugurada. Depois é um vestígio, uma peça do património histórico, um objecto identificado ou não, uma obra de arte ou não. Quem não consegue actuar no presente volta-se para os fantasmas do passado. Um problema efectivamente actual é a incapacidade ou impossibilidade (segundo Rosalind Krauss e discípulos) dos artistas contemporâneos conceberem monumentos e estátuas. (Para que servem hoje os escultores?) 12 junho
(coisas rápidas do facebook...)
SOBRE O ZECA AFONSO, uma nota à bruta
A propósito de monumentos e da sua dificuldade.
Por concurso faltariam candidaturas e as que aparecessem apontavam para os calhaus "abstractos". Há poucos artistas, em especial escultores, e há demasiados licenciados em escultura, ou arte em geral, que vivem acolhidos e protegidos pelas galerias institucionais - são geralmente fraquíssimos, mas preenchem as quotas oficiais. Vivem de instalações descartáveis destinadas às reservas dos museus, se couberem nos orçamentos protectores, ou que se fazem e desfazem para ocuparem à vez os grandes espaços vazios das galerias públicas, nas traseiras do restaurante do museu ou dos jardins "museológicos" onde se leva a família ao fim de semana (um progresso cultural óbvio).
Estas obras de autores ignorados, praticantes da estátua (são várias as homenagens ao Zeca Afonso, há muito tempo uma vítima...) devem servir para se verificar que a necessidade da estátua (ou retrato, ou busto - a ideia da homenagem e da marcação simbólica de lugares, a memória colectiva, a "arte pública") não se extinguiu e continua a importar a muitos, mas desapareceu o saber fazer.
A figura, a representação, a decoração, a ilustração foram condenadas no espaço social da arte pelas vanguardas do século XX e nada se lhe lhes substituiu. A "impossibilidade do monumento" fez parte da cartilha do tardo-modernismo formalista de Rosalind Krauss. As escolas trabalham com "conceitos", intenções, projectos, modelos de curricula e de candidaturas a apoios, e os professores também já não sabem do ofício. Se se perde o ofício e a tradição, a função, os artistas são também dispensáveis (mas é certo que faltam empregos e nem todos podem ser professores de coisa nenhuma). A autonomia da arte esbarrou na parede. (6 de Agosto)
Amadora: Estátua em mármore de José Afonso, de 4 metros, da autoria do escultor Francisco Simões. Inaugurada em 1991 pela Câmara Municipal da Amadora, situa-se no Parque Central cidade.
Grândola: escultor António Trindade, 1999:
Monumento a José Afonso no Complexo Desportivo José Afonso | Grândola: Autor arquitecto João Videira (C.M.G.), 1987
Monumento a José Afonso Parque Zeca Afonso - Baixa da Banheira: Peça escultórica, implantada no Parque Municipal José Afonso, é de autoria do Mestre Lagoa Henriques, 1994. A escultura, em pedra e bronze, foi adquirida por subscrição pública,
Malpica do Tejo: escultor Cristiano Ferreira, 2014 "Com a presença de largas centenas de pessoas a Junta de Freguesia de Malpica do Tejo em colaboração com a Câmara Municipal albicastrense e a Associação José Afonso organizaram e levaram a cabo, hoje dia 1 de maio, Dia do Trabalhador, o 1º Festival José Afonso que contou com a presença de inúmeros artistas, Orfeão de Castelo Branco, grupos de bombos e do sobrinho de Zeca, João Afonso." "Recorde-se que José Afonso recolheu presencialmente em Malpica do Tejo, no final da década de 60 do século passado, quatro cantigas do cancioneiro popular da Beira Baixa, “Maria Faia”, “Oh que calma vai caindo”, “Lá vai Jeremias” e “Moda do Entrudo”." Jornal de Oleiros
Belmonte, escultor Pedro Figueiredo (2020), agora com outras fotos mais correctas
E também:
Vhils, 2014: Escola Secundária Dr. JoséAfonso, Seixal
Odeith (https://www.facebook.com/odeithofficialpage/ ), 2016: Falagueira, Amadora. ( https://www.publico.pt/2016/10/12/p3/fotogaleria/amalia-paredes-e-zeca-os-novos-gigantes-da-amadora-386153 )
Associação José Afonso
www.aja.pt
Posted at 11:08 in 2020, covidcultural, Escultura, Estátua, Polemica | Permalink | Comments (0)
Morreu o Madeira Luís, um grande activista cultural. Funcionário da SEC, investigador-coleccionador (os cartazes, os vidros, etc).
Não me lembro dele na Opinião, onde não era assíduo. Conheci-o a propósito do incêndio da Galeria de Arte Moderna de Belém, sobre o qual escrevi no Diário de Notícias: DN, 1981 Setembro 21 - «Salvar o cartaz depois do incêndio / Perderam-se 20 mil exemplares coleccionados por Madeira Luís"(*)
Fui-o encontrando em sessões e exposições, mas foram encontros breves (o jornalismo é inconstante). O Madeira Luís estava doente há bastante tempo. A SEC/MC também, e um dos sintomas mais evidentes é a falta de conservação e produção da sua própria memória (incúria e ocultação: é mais fácil não lembrar nada), e o Madeira Luís tinha sido um agente de longo curso - a Maria Augusta Fernandes, abaixo referido, foi insistindo na importância dessas memórias e candidatando-se a reuni-las...
Fotografei-o em 2013 no Museu do Neo-Realismo, no domingo, 24 de março (e gosto muito deste retrato)
Mas o segundo retrato da mesma data, tb está bem. "É ele"
A Maria Augusta Fernandes deu a notícia da morte e publicou o seu currículo:
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxwYXJ0ZXBsYXRhZm9ybWF8Z3g6ZmMxNmFkMWY2OTRlOTdi&fbclid=IwAR2be9PeBE_6bbHpl-vbvrAntyoamPZDZGcBTNWUMwAaMQNMjH75B8LB6kA
(*) Também sobre o incêndio: Agosto 21 - Notícia do incêndio da Galeria de Arte Moderna de Belém, junto ao Museu de Arte Popular. "Desenhos de todo o mundo arderam na galeria de Belém" (1ª pág.)
Agosto 22 - «No rescaldo do incêndio da Galeria de Belém / Continuam a deixar arder a cultura portuguesa». Foram quase os meus inícios culturais.
Posted at 23:56 in 2020, cartaz, SEC | Permalink | Comments (0)
Uma entrevista com um ministro não é uma discussão de café. Ao jornalista que fala da fome dos artistas não passa pela cabeça referir a fome de muitos outros trabalhadores e desempregados, e usa a cultura, a fome, o drink como ruído. Trata-se de tentar abocanhar - a Graça atirou-lhes um osso (o drink) e os jornalistas com o osso nos dentes dispensam-se de fazer o seu trabalho. A sra foi muito paciente.
https://expresso.pt/cultura/2020-07-31-Nenhum-jornalista-me-incomoda-a-entrevista-a-ministra-da-Cultura-na-integra?fbclid=IwAR02tlPb8UroxrZopD3ogDpsPRWDIchm9hx-KKFlwOvUxX79XJ1ZbtNU6D0
Um jornalista que faz o trabalho de casa não abocanha assim:
Questão 1: a coleccao do estado apareceu agora explicada como apoio aos artistas? (É um erro da ministra, que só vem dar razão a quem critica desde o início, desde sempre a ideia de "Colecção de Estado").
Questão 2: o trabalho intermitente dos artistas do espectáculo e o trabalho independente dos artistas em geral (mais curadores, críticos, autores, etc) como pode ser reconhecido e protegido, sem confundir-se com emprego / contrato regular e permanente, que não é?
Questão 3: ser artista ou apresentar-se como tal ou contar com um titulo de Dr Artista assegura o direito à subvenção permanente que se substitui às condições de mercado (ao reconhecimento, ao êxito, à venda de obras e espectáculos)? O anunciado estatuto do artista é um controle corporativo das actividades artísticas livres e uma funcionarização das artes?
Questão 4: o artista é alguém “fora do mercado” e privilegiado enquanto tal? Um produtor independente em auto-gestão assistida? Questão 5: escolher ser artista é escolher o risco de ser reconhecido como tal, ou não, e de viver como artista, à margem da produção oficinal ou industrial, dos serviços e da distribuição comercial, ou é o acesso a uma certificação que dá direito à subvenção? - e os pequenos artistas, os que falham, os amadores, os artistas de domingo e TODOS OS OUTROS?
(31 de Julho) versão revista
O jornalismo desonesto e oportunista: cobrir a notícia sobre a União Audiovisual com a frase solta do drink e a foto agressiva.
Um título inacreditável que se desqualifica a si mesmo e ao jornal onde se publica (o Expresso):
“Enquanto [a ministra] bebe drinks e fala de arte contemporânea, a União dá ajuda espontânea”: as rimas de quem ajuda quem passa fome "
https://expresso.pt/coronavirus/2020-07-29-Enquanto-a-ministra-bebe-drinks-e-fala-de-arte-contemporanea-a-Uniao-daajuda-espontanea-as-rimas-de-quem-ajuda-quem-passa-fome?fbclid=IwAR3T6-o_hFCE1I9KRN-96hQoAYEc7p6jbBW8U9JiNpI0JAmXEJhjyM6wV7M
Até apetece defender a Graça (depois das vezes em que critiquei as suas acções e omissões). Tem mais graça ser do contra.
(30 de Julho)
A Graça tem muito jeito para se pôr a jeito, de facto, o que até tem 'graça'. Está mal assessorada e ouve pouco as pessoas que consulta, pelo que me dizem. É obstinada, o que é um defeito e uma qualidade. É um ministério de lobies e de castas, de corporações e egos; um ministério sem memória própria, onde o trabalho de casa se faz pelo google ou não se faz. O Costa não se interessa e gosta de intrigas, divide para reinar. Artes e culturas são áreas problemáticas que servem para a ostentação nos casos de sucesso e o resto é conversa, ou um poço sem fundo de competição e desentendimentos. ( 1 Agosto)
Posted at 23:08 in 2020, covidcultural, politica cultural | Permalink | Comments (0)
I
Está em causa a defesa e ilustração do não-salazarismo monopolista. Anti-todos excepto o aparelho próprio (e mesmo assim com as excepções convenientes): a defesa de uma versão da história que teve um pólo em Moscovo e outro no Avante. (9 Julho) #polemicadoAljube
II
A nomeação de Rita Rato como directora do Museu do Aljube, depois de um concurso claramente viciado, é mesmo uma questão fracturante e há que ir ao âmago da questão. Tratou-se de uma escolha política, por parte da actual CML de obediência PS, cujos meandros não foram ainda esclarecidos.
É mesmo por ser do PC e ter sido deputada desse partido durante 10 anos, até 2019, sem ter saído por dissidência, que a Rita Rato não tem idoneidade para dirigir o Museu do Aljube. Nem credibilidade, perfil, curriculum, como quiserem.
Não se trata de exigir credenciais académicas ou museológicas, conforme algumas críticas de eficácia lateral, mais ou menos hipócritas, mas por fundamentação política.
Quem conhece a história da oposição ao Estado Novo e ao salazarismo (e a memória vai-se esbatendo para as gerações mais recentes que a não viveram), sabe que o PC foi vítima e algoz, censurado e censor, perseguido e perseguidor, tanto face a outras tendências e movimentos oposicionistas (anarquistas, trotskistas, sociais-democratas, marxistas-leninistas-maoistas, autogestionários, liberais, etc) como face a muitos dos seus próprios dirigentes e militantes (desviantes, fraccionistas, dissidentes, críticos, e ex-militantes em geral).
O PC propõe, pratica e defende uma versão partidária da história, a sua e a do país, que tanto inclui a sua dependência perante a União Soviética e a sua repressão política, interna e externa, perante as suas organizaçoes internacionais (Komintern, 1919-1943, e Kominform, 1947-1956) e os seus estados satélites, como a ocultação e manipulação da sua história própria, bem como dos seus arquivos e documentos. O PC impõe a sua história oficial, com uma prática militante e sectária continuada através das décadas, das mudanças do mundo e das suas sucessivas derrotas. Uma história que exclui, em especial, o reconhecimento da Oposição anti-comunista, que foi tendo dificilmente direito de existência.
Tudo isto desqualifica a sra para dirigir um museu dedicado à resistência anti-fascista, que deve ilustrar a sua diversidade e as suas tensões e contradições internas, a história controversa das Oposições, que serviu ela mesma a longevidade do regime, combatendo-o e combatendo-se.
Poderia ser vereadora se existisse um pacto político PS-PC publicamente validado em eleições, poderia dirigir uma galeria ou um parque da CML, uma cantina para sem abrigo. por exemplo. Mas não pode dirigir o Museu da Resistência. (9 de Julho)
II
(resposta revista a um diligente opositor) Não se trata de uma "tese" e não está no meu horizonte meter-me em maiores pesquisas. Trata-se de uma experiência de vida, de informações e conhecimentos recolhidos ao longo dos anos, acumulando relatos, factos, leituras, testemunhos.
Lembram-se da proibição dos comunistas escreverem no jornal Ler, da Europa-América (os Lyon de Castro eram perigosos titistas), denunciado pelo PC e estrangulado pela censura, numa insondável aliança (início dos anos 50)? Lembram-se do uso discricionário ou telecomendado acusando fulano de ter "traído" na cadeia, mesmo se esse fulano não tinha sido preso? Lembram-se das denúncias veiculadas no Avante sobre activistas dissidentes? Dos saneamentos nos cine-clubes e teatros porque um tal defendia o Hitchcock e outro não alinhava com as escolhas do partido? Ou as ocultações da história oficial, o Pavel, o Fogaça, muitos outros. Os exemplos fariam uma história oculta da oposição que os historiadores oficiais nunca quiseram fazer (costumo recordar o silêncio dos historiadores de credenciais anti-fascistas sobre uma entidade que se chamou Sociedade Propaganda de Portugal através da qual parte representativa das elites nacionais asseguraram a sua pacífica transição da monarquia ao Estado Novo, passando pela República, a igreja e a maçonaria). Não vou repetir o que escrevi acima nem comparar as doses de repressão do regime e do PC, não se trata disso, mas apenas de reconhecer que os inimigos a abater não eram só os do regime, desde os velhos anarco-sindicalistas. Para o PC há uma história oficial e autorizada, e essa cartilha é que importa, é a que se trata de estabelecer no Museu do Aljube - por vezes houve uns dirigentes cordatos e hábeis a quem foi possível dialogar, estabelecer cumplicidades e abrir pistas de contactos (estou-me a lembrar do meu amigo Ruben), mas essas foram acima de tudo formas de assegurar continuidades e criar compromissos quando se impunha romper e divergir. Lembro-me bem da recusa de incluir a memória dos episódios negros nas comemorações de Outubro. (11 Julho)
III
Contra a unicidade antifascista não houve Alamedas. Hipótese de trabalho: o marcelismo, a Sedes, o Gabinete da Área de Sines, a LUAR e o MFA fizeram o caminho até ao 25 de Abril, e o Rumo à Vitória (o livro, não a militância PC) é só um mono académico. A questão do Aljube é essa, para abreviar. (12 Julho)
IV
E ninguém liga à explicação credível da presidente da EGEAc (que não devia fazer parte do júri com o director de pessoal)? “a candidata seleccionada defendeu uma visão integrada para o museu, incluindo uma proposta de programação relacionada com temáticas de liberdades contemporâneas, como as questões de género ou a inclusão social”, destacando-se nessa abordagem na segunda ronda de entrevistas." JGC, Público 8 de Julho.
Mais o ar do tempo que a história. Digo eu. Liberdades contemporâneas , questões de género e inclusão, foram acrescentadas à última hora a gosto da presidente. O compromisso partidário tem razões outras.(13-14 Julho)
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Posted at 23:07 in 2020, Aljube | Permalink | Comments (0)
"Desde há anos", diz M.M. = a cultura e as artes são assim mesmo, sempre, é o seu estado ”natural” (e não há nada de natural na cultura, é tudo Artifício, artificial): “O colapso desde há anos”, colapso?! - mas a palavra fantástico é a que mais se ouve sobre artes e artistas ; são todos fantásticos.
A arte como “carreira” é a opção pelo risco e/ou o desafio da afirmação própria ou da “expressão” pessoal, com o prazer da diferença e uma vida sem rede, a aposta de fugir ao trabalho rotineiro e "alienado" - mas de facto sempre cabem poucos artistas no sistema, porque são muitos os candidatos e poucos os escolhidos (ou os apoiados, ou os que têm sucesso, em vida ou depois). A boémia e o lumpen foram as margens do sistema, no fim do século XIX, depois das corporações e academias, quando houve artistas (independentes) a mais. Uma outra explosão de artistas - agora “autónomos” - foi crescendo desde os anos 70 (ou seja, depois das guerras e das reconstruções, 1914-1955) sobre a crítica da cultura e da sociedade burguesas.
Do espaço da cultura fazem parte também os públicos: leitores, espectadores, visitantes, consumidores, fruidores, amadores (num dos sentidos de amador). Ao contrário do que muito se diz e deseja o MC não representa os artistas e técnicos da cultura, nem a sua acção, quando existe, se destina apenas ou principalmente a eles. Como o Ministério da educação cuida dos alunos e não só dos professores; o M. da saúde cuida dos doentes e não só de médicos, enfermeiros e técnicos e assistentes e gestores...
Também se esquece habitualmente, intencionalmente, incluir os amadores (noutro sentido, o 1º, talvez) no espaço da cultura e das artes. Os que praticam a música e o canto, a dança, o teatro, a pintura, a fotografia e o cinema, etc não como candidatos ao "emprego" mas à margem do emprego e da profissão, como afirmação pessoal, troca, convívio. Amadores, pintores de domingo, outsiders (e podem ser /foram os melhores. São uma componente muito vasta e importante do tecido social da cultura, dão espessura à manta de retalhos da cultura (o tal tecido) mas não têm voz e têm poucos apoios (bandas e academias, "ranchos", sociedades recreativas, teatros amadores, associações, salões locais, etc). O país tem esmagado os seus amadores, em geral excluídos dos Programas, como aconteceu em 1985 nos Estados Gerais (onde é que eu tenho as páginas apagadas?). Os amadores praticantes e os amadores consumidores são o quadro, o contexto, a base necessária dos profissionais da cultura.
A cultura é um "ecossistema", aponta M.M., onde se precisa quase sempre de suportes profissionais acessórios, laterais ou predominantes (pintor e professor ou arquitecto, ou ilustrador; fotógrafo autor e/ou repórter, impressor, publicitário, etc; actor e empregado de mesa, actor de teatro e tv e cinema, quando calha; escritor e médico ou diplomata ou jornalista; poeta, artesão, figurante, músico, agente, produtor, curador, crítico.... O meio é pequeno, mas a situação é a mesma em NY ou Londres (mais descomplexada: mesmo os grandes artistas têm duplo emprego e as grandes obras fazem-nas quando têm bolsas ou prémios ou encomendas). Deixei de parte a reflexão sobre o talento, que é uma palavra problemática e pouco usada, que certamente foi preciso descartar para criar multidões de candidatos a artistas, que uma vez "defini" numa conferência sobre economia da cultura como desempregados com auto-estima. Quando faltaram as ocupações produtivas, empurram-se os jovens para as artes, onde não fazem greves e barricadas - são individualistas e não têm patrões exploradores (anteciparam a uberizaçao do trabalho).
"No meio disto, financiado em grande medida por todos estes expedientes, está o seu emprego «a sério» que é ser artista, como um buraco negro no centro de uma galáxia. Ou seja, a cultura é uma máquina gigante que se financia e alimenta a si mesma, deixando aos artistas a tarefa de trabalharem para ganhar o dinheiro para trabalhar." (M.M.) Mas a cultura não é uma máquina, é uma floresta, uma praia, um pântano, uma parte das estatística da economia onde cabem as mais diversas coisas. Como pode ser de outro modo, mesmo sem covid? Ser estudante, licenciado, “mestre” ou mestrando, doutorado em arte não garante ser artista, quando muito, para os melhores entre quase todos, é um estágio de “criatividade em geral” com passagem a outras práticas profissionais ou amadoras, escapando talvez ao call center. Ser doutor curador teórico crítico não assegura emprego. No sector, o jovem, o novo, a novidade impera, o desgaste rápido, a entrada constante de uma nova geração que substitui em grande parte a anterior, como as apresentações anuais/semestrais das novas modas. Será uma marca mais portuguesa porque o país é sempre o primeiro a colher a informação / tendência internacional, por não ter uma informação / cultura própria sedimentada. Desde os anos 1948 pelo menos. Os produtos renovam-se, as pessoas descartam-se - algumas sempre vingam!
Arte e a cultura são universos extremamente selectivos, onde impera o concurso para o apoio público e a perspectiva do sucesso que dá acesso ao mercado. Não há arte sem mercado, seja ele privado ou publico ou ambas as coisas em simultâneo (como os museus e os teatros nacionais e municipais). Mas também inclui áreas indefinidas de existência / sobrevivência sem reconhecimento crítico e/ou institucional, em que cabem biscates e inúmeras “profissões artísticas”, mais ou menos secretas, discretas, invisíveis, laterais - as praças estão cheias de “artesanatos” e artefactos de arte ou de decoração, colecção, “luxo” inútil. A ideia de "emprego" "a sério" como artista" (sic) tem muito pouco ou nenhum sentido - salvo excepções, que aliás a si mesmo se recusarão como “emprego”: o director-encenador, alguns técnicos especialistas, alguns músicos de sucesso que são patrões de si mesmo, empresários. (isto são só pistas, não é doutrina nenhuma... O Mário Moura que me perdoe citar-lhe a escrita...) #covidcultural
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Comentários sobre discursos culturais:
"Urge estabelecer um estatuto profissional para o Artista!" - escreve VC (um estatuto para cada arte ou um para todos, do cinema à poesia?).
"Todos os profissionais da cultura têm de estar integrados numa Lei" (JQ) Integrar artistas é uma ameaça, uma violação, um abuso, uma prepotência.
"...é um mundo que tem profissões de investigação /concepção, ensino, criação artística, produção, educação, divulgação, economia da cultura,..." (JC) - pelo caminho não há lugar para os artistas, ou chamam-lhe conceptores? criadores? produtores?: proposta: deixar os artistas fora-da-lei e contingentar, regular, os penduras (incluindo marchands, empresários, críticos, se os houver, directores, publicitários, etc).
"Um subsídio é outra coisa" VC - é a actualização do lugar do artista na corte profana ou divina, da encomenda do mecenas, da tença.Antes a bolsa, o prémio, a aquisição.
"Separação entre profissionais e amadores, ninguém exerce uma profissão sem a aprender, desde as oficinas artísticas da Idade Média que assim é..." JQ - as oficinas e corporações medievais como modelo autoritário, anteriores às academias régias e às sociedade livres - estamos a avançar cada vez mais para trás; Quem é amador e quem é profissional: são classes estanques? há exame de passagem? devem os amadores ser interditados e/ou remetidos para as romarias, ranchos, bandas, sociedades recreativas, salões da aguarela, lojas de artesanato (os artesãos e artesãos-artistas são amadores ou profissionais?)
"O que deve prevalecer é a relação contratual, clara e estável" JQ - do artista com a sua galeria, do escritor com a sua editora (a tanto por best-seller?), do poeta com a respectiva musa, do encenador com o teatro nacional? E se a produção for um fiasco, o artista devolve o $ do contrato?.
Onde pára o risco individual, o desafio, a aventura, a indisciplina de ser artista - um lugar marginal ao trabalho burocrático ou operário, auto-gerido e livre? Ser artista e ser candidato a artista são posições opostas no mercado das artes? (e o que há mais são candidatos a artistas, e há artistas licenciados, mestrandos, doutorados, tão pouco artistas). Claro que há situações de necessário contrato estável (sujeito a termo?, a provas?)
A cultura vai perdendo a sua cultura, a tentação totalitária é grande.
Mais: "É preciso é tirar a Cultura da tutela do Governo Português (seja ela rosa, laranja ou às riscas). (DF): a cultura não está tutelada (sob a tutela) do G.P. Podem fazer cultura à vontade. A "tutela" é a administração dos serviços públicos centrais/estatais da cultura; as autarquias administram os seus serviços públicos locais. G.P. e autarquias também contratam, adquirem e subsidiam (produzem) alguma cultura, e às vezes regulamentam - só alguma cultura, a mais efémera, a mais partidária.
Posted at 15:10 in #covidcultural, 2020 | Permalink | Comments (0)
Se se propõe e espera a vinda dos emigrantes no verão há que assegurar a viabilidade das romarias e dos seus espectáculos populares. Quim barreiros é cultura, sem dúvida, e o Peq Saul (ainda existe?) também é cultura. As feiras medievais são cultura e dão trabalho a muita gente do espectáculo. (Já agora, o Rodrigues dos Santos - e os seus redactores amestrados - é literatura.)
A promessa de 30 milhões para as autarquias fornecerem cultura é um gesto que tem a ver com o turismo interno, com as férias dos emigrantes, e em geral com as economias locais da cultura e os seus agentes. Com a cultura popular e com as relações de poder e de economia que se jogam no país e no terreno.
As reacções elitistas que pretendem condicionar apoios de emergência à qualidade cultural (com ou sem aspas) não têm sentido. O “pessoal” está a deixar-se isolar com protestos deslocados e reivindicações erradas.
Os apoios humanitários que são necessários face à crise actual dos recursos não são - não podem ser - geridos pelos critérios selectivos dos concursos.
O pimba, o kitsch, o popular, o amador, o tradicional e o novo, o erudito, com ou sem aspas, o vanguardista são um continuum no universo (universo?, um mundinho, o sector) da cultura, e as pessoas circulam ( precisam de circular livremente) entre as várias prateleiras conceptuais; a ideia de barreiras é um preconceito elitista e um impasse social. Mas “os culturais” (desde os Estados Gerais de 1995, com o Nery e os agentes do Carrilho) fizeram tudo para destruir os sectores amador e associativo - espero ter ainda as páginas do Programa que foi preciso arrancar.
O ataque aos municípios é outro equívoco a favor do centralismo e da dependência das instâncias autoritárias (júris e concursos negociados a partir do topo, controlados pelos mesmos - fiz uma vez essa experiência). Há melhores e piores câmaras, presidentes e vereadores, mas o jogo é esse. Eleitoral, democrático (partidário ou não), livre.
Se a ministra não se vê, se o Costa se marimba para o autoconsagrado sector cultural, e quer povo e votos, sempre tacticista (o Costa é Homeostetico desde o liceu e tinha o P. Portugal como assessor a reinar), as movimentações que têm voz no Público (um jornal de militantes desencontrados ou “interseccionais”, sem direção) e no FB com vigílias pífias e abaixo-assinados variegados, têm errado os alvos e desbaratado espaço social.
Donde vieram os 30M ? De onde estavam disponíveis, certamente, pq desbloquear verbas não é fácil. Depois se verá, agora importa a urgência. #covidcultural
Posted at 15:07 in #covidcultural, 2020 | Permalink | Comments (0)
A falta de discurso político e de actuação prática (de intervenção pública e resposta técnica) de Graça Fonseca está a propiciar uma vertigem muito pouco racional na área que se entende como A Cultura. Uma pequena vertigem com alguma projecção mediática, por contiguidade e cumplicidades.
Tudo se baralha, num espaço em que confluem o trabalho e o ócio; a diversão, o entretenimento, o lazer, a investigação, a formação, a criação artística e intelectual; o emprego, a vocação, a paixão, o gosto; a actividade profissional e a amadora; o espectáculo público e o consumo privado; as indústrias da cultura e as práticas artesanais ou íntimas; o artista-criador e o técnico ou funcionário; as artes todas, com a sua radical diferença de condições de exercício, do cinema à poesia, por exemplo. A amálgama impera sem exame.
As necessidades de assistência face à penúria de recursos de muitos (muitos em geral e não só na cultura) e, por outro lado e em simultâneo, as condições de produção, distribuição e consumo (acesso, participação e fruição) são coisas diferentes, e facultar abonos não é o mesmo que apoiar a cultura.
Defender e valorizar as estruturas públicas da cultura não é o mesmo que favorecer a produção das artes. (Ou melhor, corrijo, não é o mesmo que favorecer artistas e agentes culturais, face aos restantes cidadãos, trabalhadores e desempregados. As estruturas públicas favorecem a produção, como as antigas cortes e mecenas: adquirem, encomendam e programam, atribuem bolsas, prémios e subsidios. Ver abaixo)
O meio social das artes existe sobre o individualismo dos artistas e actores. É um meio fortemente hierarquizado em que a excelência e a fama coexistem com o falhanço e a obscuridade, sobre fronteiras legitimadas ou insondáveis. Um meio em que coexistem o patrocínio e a encomenda, o subsídio, o prémio e a bolsa, a dinâmica empresarial e o acto isolado, o mercado (os mercados público, corporativo ou empresarial, fundacional, comercial - e a troca) e a dádiva ou partilha; a crítica e a promoção; o luxo, o gadget e o necessário; a elite e as massas, o erudito, o “culto”, o kitsch e o popular. Um meio onde todas as fórmulas por mais contraditórias têm curso: o culto do génio e a proclamação de que todos somos artistas; tradição e vanguarda; arte e anti-arte ou cultura e anti-cultura.
O meio da cultura não parece capaz de pensar a sua identidade ou identidades. Nem a “tutela” política nem a diversidade sectorial dos seus agentes - e é essa incapacidade que o caracteriza.
Foi um artigo do Público (22.05) que me estimulou, logo de manhã cedo, mas tentei desligar do pretexto. Também não me parece acertada a campanha do “Unidos pelo...” e os episódios anteriores na área das artes plásticas e outras não ajudam nenhuma causa, embora possam vir a intimidar um “poder” hesitante e incerto.
Não vejo por que os artistas e candidatos a artistas, os mediadores e os técnicos, carenciados, não se identificam e unem com os outros desempregados, precários e invisíveis, exigindo iguais rendimentos mínimos assegurados, mesmo que temporários.
O vazio político nesta área tem favorecido a confusão, por exemplo o julgar oportuno “resolver” agora a questão de um alegado estatuto profissional dos artistas (quem se reconhece como artista e quem é reconhecido como tal, por quem?). (Os artistas querem uma tutela? Uma Ordem? E como se gerem as regras ou imposições sindicais? Como se administra a liberdade?) E a questão da intermitência na área do espectáculo.
A lógica das antigas corporações fica à espreita (quem não tem estatuto ou carteira profissional de artista não cabe na condição de artista. A funcionarizacao como ideal.
Posted at 15:02 in #covidcultural, 2020 | Permalink | Comments (0)
O passado recente da cultura não se recomendava, sobre o futuro há que pensar. A cultura e a arte não são espaços de unidade ou união, pelo contrário, é a diferença que importa. E menos ainda são espaços de privilégios. A prioridade, no momento presente, é acorrer aos carenciados e excluídos em geral.
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02.05.20
Houve o milhão de euros para o TV Fest, de que se lembrou a ministra e que um abaixo-assinado travou, e aparece agora, mais discretamente, outro milhão reclamado em carta aberta abaixo-assinada para se adquirirem obras de arte nas galerias: "...que o Ministério que superiormente dirige, em acordo com os demais órgãos do Estado português, disponibilize, a breve trecho e com carácter de urgência, uma verba nunca inferior a um milhão de euros para dispender em arte no corrente ano. Seriam eles destinados a adquirir obras de arte nas diversas galerias portuguesas, através de escolha observada por uma Comissão especializada, nomeada por V. Excia, e integrando representantes nacionais creditados nestas várias actividades."
Não se pode dizer que a cultura se apresente, nas actuais circunstâncias, ou antes delas, como um sector capaz de se pensar a si próprio com perspectivas de racionalidade, eficácia e equidade. E as artes visuais ou plásticas, com a atomização dos seus profissionais e amadores, estão no fim da linha, e em geral fora das movimentações de agentes culturais. A reclamação do milhão de euros não tem pés para andar, nem matéria para extenso debate, mas pode-se começar por lembrar que esta área não tem (não é capaz de ter) representação associativa, nem de galerias (já teve), nem de artistas (a SNBA não cumpre essa função).
O meio galerístico é fortemente centralizado sobre uma ideia informe de "galerias leader", as quais absorvem as compras institucionais (estatais e particulares) e também as notícias ou críticas na imprensa. São também elas, com os seus processos de cooptação e exclusão, que regem a orgânica das feiras de arte, com grande importância para esse núcleo. O mercado galerístico é, por um lado, rigidamente hierarquizado (com independência do maior ou menor sucesso comercial) e por outro lado é também um mercado desconhecido, invisível ou informal, porque a par das "galerias de ponta", e de uma segunda linha que as cerca com alguma eventual visibilidade, existe toda uma imensidade de galerias, lojas, estabelecimentos (de quadros, estampas e "cromos", de molduras, de decorações), que se distribuem discretamente pela malha urbana das capitais, cidades da "província", centros comerciais, etc. Fazem parte do mercado de arte e o volume total de negócios deste sector invisível é seguramente maior do que o primeiro, assegurando, em condições normais, a subsistência de inúmeros artistas, muitos deles "desconhecidos", e intermediários. Deixemos de fora, aqui, a consideração do mercado secundário formado pelas leiloeiras e afins, muito perturbado nos últimos tempos pela dinâmica mais selvagem das vendas pela internet.
Regressa-se à carta-aberta: "Essa verba, desde que adequadamente administrada, poderá a) salvar a produção artística do País, b) garantir a sobrevivência do mercado, galerístico e secundário, e c) as obras assim adquiridas virem a integrar acervos dos museus públicos,..."
A proposta de uma "comissão especializada" para aplicar o milhão de euros é só a transferência da discricionaridade para uma instância que representaria a hierarquia acima apontada e por via desta para um sector já de si privilegiado de galerias e artistas, que a si próprio se atribui a administração da respectiva importância ou distinção. E mais uma vez se distorceria a razão de ser e a competência dos museus públicos, fazendo-os destinatários de aquisições movidas por critérios alheios, lógicas assistencialistas e cumplicidades.
No contexto da actual crise, de desemprego e paralisação de actividades, há que pensar em rendimentos de sobrevivência (universais ou para situações de maior carência) e em abonos, subsídios ou empréstimos que assegurem a continuidade de actividades empresariais e associativas viáveis. Há que proteger as situações de precariedade e ausência de rendimentos, mas não se devem assegurar privilégios estabelecidos, sejam eles decorrentes de posições elitistas e alegados critérios de qualidade. Há que separar as medidas de protecção social, urgentes e abrangentes, e as orientações das instâncias públicas que devem preservar e desenvolver as condições de funcionamento das suas estruturas próprias (museus, bibliotecas, etc) e do tecido cultural em geral.
A IX Missão Estética de Évora, de 1945, decorreu num período muito especial, num pós-guerra que fez vacilar a contenção política e censória do regime, receoso de ser apeado pelos Aliados, ao mesmo tempo que animava aguerridas agitações da oposição. (A 6 de Maio noticia-se a rendição das tropas alemãs o que dá origem a grandes manifestações populares.)
As Missões decorreram entre 1937 e 1963, sob a direcção da Academia Nacional de Belas Artes, reunindo finalistas e recém-formados de Lisboa e Porto, mas parece ser esta a única edição com relevância extra-escolar, devido quer ao momento político e à vitalidade de Évora quer à particular qualidade dos participantes: em especial, Júlio Resende (já formado), Nadir Afonso e Francisco Castro Rodrigues, ambos arquitectos, António Lino Pedras, Arlindo Rocha, Maria Luisa Chicó e Júlio Pomar, além do orientador Dórdio Gomes, um pintor e professor aberto aos novos. Pomar participou em condições inéditas, porque em vez de ser finalista andava pelo 2º ano da Escola do Porto e nunca frequentara ainda uma aula de pintura (e não frequentou depois) - julgo que substituiu o seu grande amigo Fernando Lanhas, impossibilitado de participar.
Nesse ano, a imprensa local seguiu diariamente a Missão, de 16 de Agosto (inauguração solene) ao encerramento a 30 de Setembro, e à exposição final dos trabalhos, de 2 a 4 de Outubro no ginásio do Liceu André de Gouveia - vieram depois a Lisboa, à SNBA. Na exp. de Évora foram integrados (por exigência dos participantes da Missão) os trabalhos de jovens que puderam acompanhar os artistas - Henrique Ruivo foi um deles; Lima de Freitas, filho de um fotógrafo local, assistiu aos acontecimentos.
O jornal republicano Democracia do Sul acompanhou a Missão com entrevistas aos artistas participantes (JP foi ouvido na ed. de 4 Out.: "Um inquérito sobre arte - depõe Júlio Pomar") e também a mestre Dórdio, a que se seguiu a crítica da exposição por Armando Gusmão, publicada a 7 e 9 Out.
Recorde-se, quanto ao contexto artístico de 1945 que em Maio (21-28) se apresentara em Lisboa, no Instituto Superior Técnico, a Exposição Independente, vinda do Porto, inaugurada com palestras de Victor Palla e JP que a revista Vértice publicou, e que a página Arte do diário do Porto a Tarde, coordenada por JP se publicou entre Junho e Outubro. O quadro Gadanheiro (ou Gadanha) ficou a marcar a Missão Estética de 1945 e a carreira de JP, então elogiado num artigo de Mário Dionísio publicado na Seara Nova (“O início de um grande pintor?”. Dórdio Gomes, no relatório da Missão entregue à Academia Nacional de Belas-Artes destacou que: «(…) só Júlio Pomar se não interessou pela cidade, inteiramente absorvido pelo homem e pelo drama, luta titânica com a vida e a natureza rebelde (…) É este homem sofredor e heróico, movendo-se no seu cenário próprio, que surge em todos os seus trabalhos e constitui uma outra face do Alentejo, que era preciso ir procurar fora de muros» (1).
A Missão foi acompanhada, por iniciativa dos participantes, ou de alguns deles, e com a colaboração de agentes locais, de uma série de palestras e sessões culturais, havendo notícias na imprensa à conferência de Mário Ruivo («Duas épocas e duas atitudes», a 26 Agosto), a outra de Pomar e Francisco (Castro) Rodrigues ("Tarde cultural", a 9 Set.), a mais uma presidida por Mário Ruivo em que leu poemas António Gasparinho (?), a 11 Set., e ainda uma de Mário Cesariny Vasconcelos com o título "A arte em crise" (a 23). Cesariny vinha da Escola António Arroio e foi um dos colaboradores neo-realistas da página Arte (Tarde, Porto), tal como Marcelino Vespeira - futuros surrealistas concorrentes.
Acompanharam também a Missão os diários Notícias de Évora e A Defesa, este da Igreja, que teve ocasião de manifestar sobre a exposição final "franco desagrado porque a IX Missão Estética é requintadamente apaixonada pela arte moderna”, e referiu-se assim a dois dos pintores, "...dois nomes que a ordem alfabética juntou mas a arte diametralmente separou. Resende é todo amoroso em luminosidade e em caracteres (...) J.P. é medonho nos seus óleos Sábado <Descanso>, Gadanha, Ceifeiro e Semeador, lembrando as mãos crispadas e formidáveis do primeiro luvas de «boxeur» e os rostos inspirações de Gorki. As figuras de JP reflectem grande anseio social e revolucionário, bebido mais na literatura estrangeira do que no convívio com o bom homem da terra alentejana. E no entanto estes dois artistas de mérito são da EBAP."
Mário Ruivo (1927 - 2017) que era à época estudante na Faculdade de Ciências de Lisboa - formou-se em 1950; natural de Campo Maior, fizera o liceu em Évora - conservou na sua posse e ofereceu em 2013 à Fundação Júlio Pomar (FJP) um desenho realizado por Pomar para a sua conferência referida acima, que pode designar-se "A evolução das espécies”.
Gadanheiro óleo sobre aglomerado, 122 x 83 cm
Dos trabalhos de Júlio Pomar realizados em Évora conhecem-se Gadanheiro (col. Museu do Chiado, MNAC); Descanso (antes intitulado Ceifeiro - doado por Castro Rodrigues ao Museu do Neo-Realismo); Retrato de Camponês (Évora), col. FJP; e um fragmento de Semeador (col. particular), obra destruída pelo artista, enquanto Sábado, ou Malta (Alentejo) foi destruído acidentalmente - nos dois casos conservam-se as respectivas fotografias. Por último, um fresco transportável, Ceifa, deixado nas arrecadações do Liceu, não foi localizado.
Citado por Joana Baião em ‘Cem anos depois: a Academia Nacional de Belas-Artes. Contextos, protagonistas, ações (1932-1974)’, 2016. - https://www.academia.edu/29957248/Cem_anos_depois_a_Academia_Nacional_de_Belas-Artes._Contextos_protagonistas_a%C3%A7%C3%B5es_1932-1974_ . O Relatório de Dórdio Gomes encontra-se nos Arquivos da Administração Central 1909/1977, JNE Junta Nacional da Educação. http://arquivo-ec.sec-geral.mec.pt/details?id=25369 (não digitalizado).
Outra bibliografia sobre as Missões Estéticas em geral: Diogo Moraes Leitão Freitas da Costa, MISSÕES ESTÉTICAS DE FÉRIAS Estética, Academia e Política numa iniciativa de formação artística do Estado Novo, 2016: https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/27968/2/ULFBA_TES_977.pdf
Pedro do Amaral Xavier, Educação artística no Estado Novo: as missões estéticas de férias e a doutrinação das elites artísticas : https://www.apha.pt/wp-content/uploads/boletim4/PedroXavier.pdf.
Descanso, óleo e areia sobre aglomerado, 48 x 80 cm
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Devo ficar surpreendido por a gente do mundo da arte não aparecer a pronunciar-se sobre a colecção de Arte Moderna e Contemporânea e sobre os museus onde tem sido apresentada a Colecção Berardo desde há 22 anos?
Devo espantar-me por parecer que os deputados daquela comissão nunca visitaram o Museu Colecção Berardo instalado desde 2007 no módulo III do CCB? Não sabem o que é a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea - Colecção Berardo, criada por decreto-lei de 2006, que mantém o Museu e é uma parceria entre o Estado e a Colecção (a Associação Colecçõ Berardo), em partes iguais? É um grande museu muito frequentado e com larga projecção também internacional. A colecção é única em Portugal e não parece dispensável no CCB.
De facto, a única colecção de Arte Moderna e Contemporânea internacional que se pode visitar em Portugal começou por estar sediada durante dez anos em Sintra, no antigo Casino: em 17 de Maio de 1997 inaugurou-se o Sintra Museu de Arte Moderna - Colecção Berardo, e o respectivo acordo estabelecido por Edite Estrela, então presidente da Câmara, teve uma vigência de dez anos, que não foi renovada pelo autarca de turno. Foi dirigido de 1997 a 2008 por Maria Nobre Franco, que tinha sido antes uma excelente directora da Galeria EMI -Valentim de Carvalho (1984-1995). O catálogo da Colecção Berardo no Sintra Museu fora lançado em versão inglesa em Julho de 1996 na Serpentine Gallery de Londres. No Museu exibiram-se, além da colecção, que foi sendo ampliada, algumas grandes exposições de Rui Chafes, Susana Solano, Júlio Pomar, Michael Craig-Martin e Fernando Lemos.
O Museu Colecção Berardo situado no CCB foi inaugurado em 25 de Junho de 2007 e aí se mantém. A renovação do protocolo inicial estabelecido em 2006 entre o Estado e Berardo ocorreu em 2016, com uma adenda que prolongou a sua vigência por mais seis anos (renováveis), até 2022, regulando a possibilidade de compra da Colecção por parte do Estado. Certamente perdeu-se então uma oportunidade para renegociar aspectos menos favoráveis ao Estado do acordo inicial, mas o processo conduzido pelo ministro Castro Mendes foi do conhecimento de António Costa. O Estado assegura o funcionamento do Museu mediante uma dotação que é este ano de 2,100 milhões de euros, a que acrescem as despesas do local (luz, segurança, etc) no valor de cerca de 1,300 euros, para além das receitas da bilheteira, depois de 10 anos de entrada gratuita.
Antes da criação do Museu Berardo, as obras da Colecção tinham passado em 1996 a contar com um espaço de conservação e reserva no CCB, mediante um acordo estabelecido ao tempo do ministro Carrilho (1º Governo Guterres) que tinha como contrapartida a possibilidade de se apresentarem exposições de obras da colecção no mesmo CCB. Logo no ano seguinte o CCB apresentou uma grande exposição sobre a Arte Pop organizada a partir da Colecção Berardo. Em 2000 a Colecção, que entretanto alargara o seu horizonte cronológico de 1945 até aos anos 1920, foi apresentada em dois núcleos simultâneos em Sintra e no CCB. Ia-se abrindo o caminho para a criação do Museu inaugurado só em 2007 no CCB (ao tempo do Governo Sócrates).
Recuando um pouco, pode lembrar-se que a colecção foi dada a conhecer em Fevereiro de 1995 na revista americana ARTNews, ainda sem se referir o nome de Berardo: era o “Portugal’s Mistery Man” que batia records de vários artistas (por exemplo Oldenburg, Joan Mitchell, Robert Indiana) nos leilões internacionais. Aí se falava da intenção de instalar um Museu em Portugal. Os contactos ainda informais com responsáveis institucionais tinham começado no ano anterior. O Museu Berardo em Sintra foi anunciado em primeira mão pelo expresso em Julho de 1995. A primeira exposição de obras da colecção (ainda anónima) tinha ocorrido em 1993 na Galeria Valentim de Carvalho. As primeiras compras terão começado em 1990. Todo o processo de formação da colecção era então conduzido pelo economista Francisco Capelo, associado de Berardo, até ocorrer uma ruptura entre os dois em 1999, por altura da venda do grupo de comunicação social, a Investec (Record, Máxima, 25% da SIC). "Paixão privada, ambição pública" foi o título da entrevista a Capelo publicada no Expresso em Maio de 1997, ao abrir o Museu em Sintra.
A colecção continuou, apesar de ter havido uma campanha hostil, e alargou-se depois dessa data sob a direcção directa de Berardo - foram anunciadas as compras excepcionais de duas pinturas de Francis Bacon e Robert Delaunay. Em 2003 Berardo é colocado na lista dos 100 mais poderosos do mundo da arte elaborada anualmente pela revista norte-americana Art Review, ocupando o lugar 56. Em 2007, depois da abertura do Museu em Belém, regressa à lista em 75º lugar. Além da Colecção fixada no protocolo de criação do Museu, avaliada pela Christie's em 316 milhões de euros, Berardo foi alargando a sua colecção pessoal de arte contemporânea, com naturais variações de interesse e qualidade (excelentes esculturas de Moore e Dubuffet...), além de dispor de outras colecções mais ou menos heteróclitas (Art Nouveau e Art Déco, arte africana - que a CML expôs em 2009 no Páteo da Galé: "Alma Africana" -, cerâmica histórica das Caldas, painéis de azulejo, publicidade e cartazes, budas e soldados chineses de terracota, escultura pública, plantas, etc, etc, que tem apresentado em espaços de enoturismo) - e tem anunciada a abertura no próximo verão de dois novos museus com o seu nome, em Estremoz e Lisboa/Alcântara).
A abertura e o lançamento do Museu Colecção Berardo no CCB contou com o talento do seu primeiro director, Jean-François Chougnet, um gestor cultural francês de larga carreira (de 2000 a 2006 no Parc de La Vilette, Paris). Manteve-se à frente do Museu até 2011 - depois dirigiu a Capital Cultural de Marselha e hoje dirige o grande museu desta cidade, o MUCEM. Foi um excelente director - pelo Museu passaram notáveis exposições (Pancho Guedes, Cabrita Reis, Joana Vasconcelos, "Amália. Coração Independente", "Arquivo Universal", "Teatro sem Teatro", etc), algumas em co-produção internacional.
Durante dois anos (2007 e 2008) o Estado e Berardo contribuíram com a verba de 500 mil euros cada para aquisições de novas obras atribuídas à Fundação, então feitas sob a orientação de Chougnet - era uma norma do acordo que deixou de ser cumprida. Seguiu-se durante seis anos Pedro Lapa como director do Museu (2011-2017), em anos de crise, redução de financiamento e também de fechamento da programação sobre a área da arte mais recente, com menor êxito de público. Actualmente o Museu é dirigido por Rita Lougares, aí desde sempre com funções de conservadora, verificando-se uma nova abertura dos horizontes da programação, por exemplo com as excelentes mostras “Modernismo Brasileiro na Colecção da Fundação Edson Queiroz” e a mais recente “Quel Amour”.
O Museu lá está, indispensável e gratuito ao sábado. Convém que os comentadores o conheçam.
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Com projecto de arquitectura de Artur Andrade, o Cinema Batalha foi inaugurado em 29 de Maio de 1947, encontrando-se à data a pintura da parede maior, o 'hall', não concluída por o artista ter sido preso a 27 de Abril, por pertencer à Comissão Central do MUD Juvenil.
Em Setembro-Outubro, o fresco foi terminado pelo autor, já saído de Caxias, e que por essa altura realizava no Porto, na Galeria Portugália, a sua primeira exposição individual, de desenhos, alguns deles realizados na prisão (álbum "XVI Desenhos", com prefácio de Mário Dionísio, ed. dos autores, distribuição Vértice, não referida, 1948; reed. aumentada, Arte Mágica, 2004).
A edição do diário portuense «O Primeiro de Janeiro» de 28-5-1948, pág. 4, incluiu uma pequena notícia, « O Cinema Batalha é inaugurado amanhã », onde se refere que « foi decorado com motivos ligeiros de arte modernista. »
O grande fresco do 'hall' antes de concluído, ao tempo da inauguração (1947). O fresco do bar (a foto 2 é da autoria de ©Ernesto de Sousa), 1947-48
Em 1948 o governo impôs a eliminação das pinturas murais. Segundo uma carta enviada ao artista pela Empresa Neves & Pascaud, proprietária do Batalha, « uma determinação das autoridades » obrigava-a a « eliminar da decoração do seu Cinema Batalha as pinturas murais », fixando 25 de Junho como data limite para o efeito - mais de um ano depois da inauguração.
Ao que parece, tratou-se de uma retaliação do regime já no quadro da candidatura à Presidência do general Norton de Matos, sem que qualquer escândalo público ou o teor figurativo dos frescos (os festejos do São João no Porto) justificassem a ocultação. Um primeiro estudo conhecido para a pintura mural partia dos temas do Douro e do vinho. No ano seguinte, J. Pomar, cujo retrato do candidato tivera uma grande presença na campanha, foi demitido do lugar de professor de desenho do ensino técnico.
Pormenores do 'hall', fotos ©Ernesto de Sousa, 1948
1947. Manuel de AZEVEDO, "Um escândalo artístico - Está ameaçado de destruição o painel do Cinema Batalha, do Porto", "Mundo Literário", Lisboa, nº 37, 18 de Janeiro, p. 16. (inclui 2 fotografias das obras em execução).
A realização dos murais foi encomendada e iniciada em 1946 (tinha o artista apenas 20 anos). A revista "Horizonte, Jornal de Arte", Lisboa, nº 2, de Nov., informou: “A decoração mural (11 x 6 metros) que Júlio Pomar vai realizar para o 'hall' do cinema Batalha, do Porto, da autoria do arq. Artur Andrade, foi fixada pelo preço de 30.000$00."
Outra notícia, referente a uma polémica sobre os murais, que nada tem a ver com a posterior ocultação determinada pelas «autoridades», mas sim com movimentações de artistas concorrentes e divergências críticas, foi publicada por Manuel de AZEVEDO, "Um escândalo artístico - Está ameaçado de destruição o painel do Cinema Batalha, do Porto", no "Mundo Literário", Lisboa, nº 37, 18 de Janeiro 1947, p. 16 (inclui 2 fotografias das obras em execução).
1947. A Empresa do Cinema Batalha e o Arq. Artur Andrade (Empresa Forum) pedem à PIDE, em 2 de Maio, que autorize o artista, então preso em Caxias, a vir ao Porto concluir o seu trabalho antes da inauguração do Batalha.
1948. O Cinema Batalha, em 17 Junho, informa o artista da ordem de "eliminar" os frescos
Em 2005/06 foi feita uma tentativa de desocultação dos frescos, mal conduzida e sem êxito, por iniciativa da Associação dos Comerciantes do Porto. Encontraram-se apenas vestígios dos desenhos prévios (sinópias). Os frescos teriam sido mesmo eliminados com raspagem das paredes? O IPPAR viria a fiscalizar a intervenção e produziu um relatório confirmando a impossibilidade do restauro.
Em 2016, por ocasião de novo projecto de recuperação do Batalha considerou-se o uso de meios fotográficos, a partir das provas de época sobreviventes.
2006. Intervenção na parede antes ocupada pelo fresco, por iniciativa da Associação dos Comerciantes do Porto.
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A Metade do Céu. Museu Arpad Szenes e Vieira da Silva. A 1ª qualidade é ter incomodado algumas damas mais nervosas e ter posto a crítica (?) com dificuldades de visão. Esta exposição colectiva com 61 mulheres, maioritariamente artistas, tem uma característica decisiva: é esta exposição e não outra, tem um autor e não outro (um homem, um artista, o Pedro Cabrita Reis), tem uma selecção e não outra, tem uma excelente montagem e não outra.
Há que tomá-la como ela é: plural, diversa, maioritariamente com escolhas que agradam e por vezes surpreendem (fora da rotina ou do mais previsível nas carreiras individuais). Quem está, está bem, e não importa quem ficou ausente. Desde a opção por muitas pequenas obras dos 1ºs anos da Vieira, em geral ignoradas. A montagem acrescenta-se na grande galeria à apresentação habitual dos donos da casa, interrompendo-a com habilidade, desafiando-a. Há aproximações e oposições oportunas (Paula Rego e Fátima Mendonça, com Joana Rosa, Patrícia Garrido e Gabriela Albergaria; Maria José Aguiar, um "objecto" da Menez, uma natureza morta de Josefa de Óbidos e Ana Hatherly; Maria Isabel Miranda Rodrigues e Catarina Leitão; Sílvia Hestnes Ferreira e Marta Soares) e houve o acerto de colocar uma forte obra da Joana Vasconcelos à entrada. É uma exposição sem hierarquias, sem cronologia, sem vizinhanças formalistas ou ideologia historiográfica (mesmo que não seja certa a opinião do autor de que "a arte foi e será sempre avessa e imune à ideologia" (pelo contrário!). Como diz a folha de sala, "liberta de qualquer condicionalismo temático, desprovida de uma narrativa curatorial e que se quer alheia ao artifício discursivo". O Pedro Cabrita tem um grande talento para dispor objectos, os dele e os dos outros (das outras).
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Centro de Arte e Cultura, Fundação Eugénio de Almeida, Évora. "Studiolo XXI" (obras de Leda Catunda - desenho? porquê?). Esculturas de Maria Lino (e no fim bordados de mulheres da Beira).
José Alberto Ferreira, director, conseguiu pôr Évora no mapa com uma programação que não repete o habitual calendário institucional, não se reduz ao cinzento DS e não segue os interesses das galerias Filomena Guerra e Cristina Soares. Não é difícil acertar e ser original, é preciso não fazer o que os outros fazem e começar por não obedecer à pequena tutela instalada.
Agora o Centro apresenta uma muito grande escolha, por parte de Fátima Lambert, de obras de "desenho e afinidades", em que estas predominam e que se alarga com uma ambição, também internacional, por Brasil, Espanha, etc, que pareceria enciclopédica se não fosse aleatória e não houvesse numerosas presenças escusadas e faltas gritantes (casos esquecidos ou sem acesso?) como João Francisco e Joana BC ou Graça Morais, que me interessam pessoalmente. Com Resende, Nadir, Cutileiro, Lourdes Castro, Escada, Lapa, Jorge Martins e Batarda, com Calapez, Nuno Gil, Catarina Leitão, Fátima Mendonça, Alice Geirinhas, Suzanne Themlitz, Isabelle Faria entre os que notei. 187 nomes (!?).
Acima estão as galerias entregues a Maria Lino (n. 1944 - activa entre Hamburgo e Feital/Trancoso) e ao seu trabalho pouco visto, do qual se impõe escultura que usa a madeira (melhor, a árvore) com uma economia austera, rude, essencial, orgânica, à maneira de Brancusi (e há uma sala final com assemblages e objectos encontrados, com humor e magia, e também algumas obras alheias). Uma multidão encheu com gosto o Centro.
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Isabel Sabino no salão da SNBA. Uma grande exposição, não só pelo espaço que ocupa e pela dimensão das obras mais recentes, de 2018 e 2019. "Ela" é a realidade e a dimensão ficcional, é o visível factual e a possível condição imaginária e narrativa que as pinturas e desenhos propõem, num puzzle ou convergência de sugestões figurativas que aos poucos se apercebem e se associam numa imagem de leitura interminável. E é também a possibilidade de um trânsito ao mesmo tempo culto e comunicativo (erudito e acessível) por referências a géneros, a tradições, a contextos políticos e igualmente a outros pintores marcantes - trata-se de fazer ver e ensinar a ver, por parte de uma pintora que é também professora da FBAUL. A paisagem é um lugar aberto de histórias (lugares e tempos) e de situações de pintura (processos e meios de pintura).
Sem incluir nenhuma obra da excelente série recente "As Quatro Estações", o que é uma opção insólita e corajosa, até por ela ilustrar um importante lugar de passagem pessoal, a mostra recua a obras de tempos anteriores, desde 1989, com que se dá a ver um itinerário fragmentário e significativo.
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Jorge Guerra no Arquivo Fotográfico de Lisboa (09-04-2019). "Saudade de Pedra" (Lisboa, 1966 - mais precisamente, de 20/12/1966 a 5/01/1967 - 100 fotografias impressas pelo autor e adquiridas pelo AF em 1998). Exposição e livro, com texto de Jorge Calado.
Jorge Guerra com José Luís Neto (09/04/2019)
As fotografias de Jorge Guerra não foram divulgadas no seu tempo próprio, mas são um marco essencial dos anos 60 (1966), enquanto retrato da cidade no fim do regime de Salazar (seguir-se-ia ainda Caetano por mais alguns anos) e enquanto obra fotográfica - editada em livro em 1984, 1994 e 2019, agora em boas condições, sucede à Lisboa de Costa Martins e Victor Palla. Permanecendo secreta por muitos anos e discretamente divulgada (até esta exposição maior no Arquivo Fotográfico), Jorge Guerra ficou numa situação próxima - até hoje - de fotógrafo confidencial, como aos membros da tertúlia de Castello-Lopes, Sena da Silva, Carlos Calvet e Carlos Afonso Dias. Na história da fotografia em Portugal são muitos os autores secretos e alguns outros expuseram e/ou publicaram em vida mas ficaram numa espécie de limbo feito de ignorância e menosprezo, como Adelino Lyon de Castro e Maria Lamas, Artur Pastor, Augusto Cabrita, Gageiro. Ou os mais antigos Lacerda Nobre e Álvaro Colaço, Elmano da Cunha e Costa e os homens dos clubes 6x6 e Câmara.
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1994
“Mandados Oblíquos”, Casa Fernando Pessoa
Expresso Cartaz - 9 Out.
Jorge Guerra, 1966 (Col. Fundação Gulbenkian)
A. Um projecto fotográfico dos anos 60 reapresentado com extractos da «Ode Marítima» e editado num livro-catálogo. Usando a tele-objectiva e percorrendo em especial a zona ribeirinha, Jorge Guerra constrói um dos mais melancólicos retratos de Lisboa, fixando corpos e rostos por onde passa toda a inquietação dos anos da guerra e do exílio.
B. As fotografias de Jorge Guerra expõem-se associadas a extractos da «Ode Marítima», e também se editam num livro-catálogo sob o mesmo título: “Mandados Oblíquos”. Esta colagem temerária, que as imagens da Lisboa ribeirinha plenamente justificam, vem, aliás, renovar uma outra ligação poética que algumas destas mesmas fotografias já estabeleceram com a escrita de Ruy Belo e de João Miguel Fernandes Jorge num álbum quase desconhecido, “Os Poucos Poderes”, publicado pela Gulbenkian em 1984, embora planeado em 1972. Em qualquer dos casos ter-se-á tratado de assegurar assim a visibilidade de fotografias que têm, porém, em si mesmo inteira autonomia.
Realizadas em Lisboa durante a década de 60 (entre 66 e 68?) e ainda em grande parte inéditas — duas delas puderam ser vistas na exposição «Encontros com Narciso», em 1989, no CAM, e outras mais foram mostradas na Europália’91, por António Sena —, constituem mais um elo numa história só lentamente revelada e, em geral, depressa esquecida. Depois da “Lisboa…” de Victor Palla e Costa Martins, esta é uma outra viagem à procura da identidade de um país e também, através dele, de um destino pessoal, na demorada impossibilidade de uma plena existência colectiva.
É à beira rio, do Cais das Colunas ao Alto de Santa Catarina, diante da moldura aberta dos lençóis de água, mais rasgada ainda pelo uso permanente da tele-objectiva, que Jorge Guerra inquire os rostos e os corpos espectantes de uma cidade ao mesmo tempo íntima e absurda. Os anos eram então negros e os cais lugares de embarque para as Áfricas; Jorge Guerra, «cumprida» a sua guerra de Angola, voltava de Londres a uma Lisboa inabitável e assim se despedia para iniciar um longo exílio no Canadá, onde fez fotografia e cinema. <E onde dirigiu durante 15 anos, com Denise Guérin-Lajoie, a mais importante revista de fotografia do Canadá, a OVO.>
Algum «cinema novo» era vizinho deste mesmo olhar e, pela mesma época, o americano Neal Slavin (ver «Portugal 1968», edição Fotoporto 1990) traçava outro retrato implacável. Na breve história da fotografia moderna portuguesa, de que Jorge Guerra é uma das pedras definitivas (e um dos poucos que ultrapassaram a fase do amadorismo promissor), estas serão as mais pungentes imagens de nós mesmos. Mas se a melancolia domina estas imagens de gente solitária frente ao infinito, uma outra estranheza inquietante deve sentir-se perante a prolongada ocultação que as manteve até agora quase inéditas.
C. Edições e exposições com catálogo
Os Poucos Poderes, Fotografias de Jorge Guerra, Fund. Gulbenkian, 1984
Encontros com Narciso, Fotografias de Jorge Guerra, Fund. Gulbenkian, 1989.
Mandados Oblíquos, Fotografias de Jorge Guerra, Casa Fernando Pessoa, 1994
Jorge Guerra - Quarenta Anos de Fotografia, CCB 2000. (Ver entrevista de Celso Martins, Cartaz Expresso 12-02-2000)
1999
OVO Magazine, Montreal 1972-1988.
Expresso, Cartaz (Actual) 27-11-99
O FOTÓGRAFO Jorge Guerra faz hoje, no Arquivo Fotográfico de Lisboa, uma apresentação audiovisual do «Magazine Ovo», que dirigiu durante anos em Montreal, traçando também uma breve história das revistas internacionais de fotografia. Em exposição para consulta, uma colecção completa da revista, e alguns números, hoje raros, poderão ser adquiridos.
Editado e dirigido por Denyse Gérin-Lajoie e Jorge Guerra, o «Magazine Ovo» foi uma influente revista de fotografia que se publicou a partir de 1972 em Montreal ao longo de 15 anos, tendo desempenhado um papel relevante no desenvolvimento da cultura fotográfica do Quebeque, com efeitos na dinâmica cultural e política da região.
A revista seguiu um modelo original de publicação temática e documental que viria a ser vítima de fracturas resultantes da própria expansão das práticas fotográficas, até pôr termo, em 1988, às suas actividades e encerrar a galeria que fundara, em consequência de dificuldades económicas.
O seu último número contou com a colaboração de 70 fotógrafos internacionais, de Abbas a Joel-Peter Witkin, passando por Alvarez Bravo, Avedon, Boubat, Burri, Callahan, Cartier-Bresson, Larry Clark, Roy DeCarava, Sebastião Salgado, Jerry Uelsmann, Burk Uzzle, Joan van der Koiken, etc. A revista afirmava então defender «a fotografia como um médium essencialmente democrático que oferecia um meio simples e não sofisticado de registo, comunicação e expressão», colocando-se «em contra-corrente da política do 'savoir-do-dia' e de uma pretensa vanguarda que julga fazer avançar a história da arte mudando de estilo ao sabor dos ventos».
Também fotógrafo, Jorge Guerra publicou nomeadamente «Os Pequenos Poderes» em 1984, com fotografias de finais dos anos 60 e poemas de Ruy Belo e J.M. Fernandes Jorge (ed. Gulbenkian) e expôs «Encontros com Narciso» em 1989, também na Gulbenkian.
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A aventura da Gulbenkian no Iraque decorreu entre 1957 e 1973 e envolveu iniciativas e orçamentos de enorme dimensão, mas era um episódio esquecido, ou oculto. Certamente por não tido o êxito esperado - os petróleos foram nacionalizados e a Gulbenkian perdeu os respectivos rendimentos, os famosos 5 % de Calouste Gulbenkian.
Entretanto, os programas cumpridos em Bagdade foram de uma excepcional ambição, com destaque para a oferta (chaves na mão) de um grande Estádio do Povo projectado por Keil do Amaral e Carlos Ramos, e para a construção de um imponente Centro de Arte Moderna, a que se acrescenta a apresentação de uma exposição de arte moderna internacional, e em especial portuguesa, que implicou uma importante operação de compras de obras que integraram a colecção da Fundação.
O tema é agora tratado numa exposição no Museu Antigo (Colecção do Fundador) e num núcleo de obras exposto no Museu Moderno
É a + importante iniciativa da FG no capítulo da arte portuguesa entre a sua II Exposição de 1961 e a inauguração da Sede, que incluiu a "Exp. de Arte Portuguesa Contemporânea", mas é também a menos valorizada e mais desconhecida. Note-se, por exemplo, que não figura na cronologia do catálogo "50 anos de Arte Portuguesa", de 2007, nem aí é abordada.
O estudo de referência para o tema é a tese de Leonor da Conceição Silva Ribeiro e Alves de Oliveira "Fundação Calouste Gulbenkian: estratégias de apoio e internacionalização da arte portuguesa 1957-1969", FCSU-UN 2013, mas também aqui a informação é quase nula.
"Em novembro de 1966, a FCG organizou, em Bagdad, no Museu Nacional de Arte Moderna, cuja construção foi por si financiada, uma exposição de obras de arte contemporânea, integrando artistas portugueses e estrangeiros, o que constituiu a mostra mais alargada da sua coleção realizada até então (509). (Nota 509: «However, none of these exhibitions so far organised has assumed the significance attaching to that which is now being presented in Baghdad, and none of them, we would stress, has included such a large number of works from so many distinct countries and representing so many artistic tendencies». Esta exposição teve lugar no Museu Nacional de Arte Moderna do Iraque, cuja construção foi financiada pela FCG. Exhibition of works of contemporary art belonging to the Calouste Gulbenkian Foundation. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1966. (pag. 330-331)
19Dez. Nota do facebook: "Continuando a falar do Museu Gulbenkian, digo que tenho em grande consideração a exploração da colecção moderna que a directora Penelope Curtis tem vindo a fazer, subvertendo ou questionando hierarquias instaladas, propondo surpresas e interrogações. Começou por rever as aquisições da FG por efeito da Exp. de 1957, quando ela iniciou a sua programação e a Fundação começava a sua história, e agora põe em destaque a exp. levada ao Iraque em 1966, recordada em dois espaços: no piso inferior do Museu, no quadro da aventura da Gulbenkian em Bagdad - confusamente mostrada, é certo -, e no piso 2 do Museu Moderno em espaço próprio. Aqui com artistas relevantes à época e depois ± esquecidos: Nuno de Siqueira, com uma interessante paisagem abstracta em estratos sobrepostos que foi a sua imagem de marca, e Artur Bual e Luís Demée, com expressões do seu tempo (é bom rever as tendências que estiveram em voga e se julgaram definitivas). Também com uma poderosa tela de João Vieira gestualmente caligráfica. Depois no Museu, com Ângelo de Sousa e José Escada, René Bertholo e Júlio Pomar, e o influente brasileiro Waldemar da Costa (Composição em Azul, 1960) e outros. Por necessidade de representação a FG então fez compras, começou a pensar uma colecção: é uma data.
Mas aponte-se também como a Gulbenkian de hoje apaga o seu 1º presidente e criador, José de Azeredo Perdigão, não identificado na fotografia (uma legenda implica sempre nomear as pessoas representadas, quando não são anónimos elementos do povo). Aqui o anonimato é intencional ou incompetente? Seja como for, é escandaloso e põe em cheque a actual administração."
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