Prémio jovens pintores Fidelidade Mundial e Prémio União Latina
Culturgest, 20 Abril 2007
A junção dos dois prémios é-lhes desfavorável – ou melhor, ao visitante. Um deles, o de jovens pintores da Fidelidade Mundial, em nova fórmula, reúne nove que pintam, premiou Isabel Simões, distinguiu mais três, Inês Botelho, Rui Ferreira e Sónia Almeida, e os outros também sustentam simpatias ou preferências individuais: Ana Cardoso, por exemplo, ou Martinho Costa, Elsa Marques, Nuno Sousa e Patrícia Sousa. A diversidade é assinalável, da vontade de figurações exuberantes às variações monócromas. São seis mulheres e três homens.
O outro prémio é mais uma oportunidade de ver a burocracia artística ao espelho. Tem o nome da União Latina, uma entidade para-diplomática e mundana internacional, e são a Culturgest e a Gulbenkian que fazem o serviço institucional, com pouca convicção e vários episódios pouco interessantes.
O Prémio FM organizava-se antes por concurso aberto, desde 1990, oito vezes, com júris pouco sintonizados com os ares do tempo, o que afastava os jovens já mais orientados. Preservou-se o concurso (em vez de se aceitar o vulgarizado modelo por convites, tipo Turner, o preferido dos controladores), e credibilizou-se o júri, na proximidade das escolas (só da de Lisboa?), mas neste primeiro ano renovado alongou-se excessivamente o tempo de escolaridade admissível, seguindo a lógica das pós-graduações sucessivas. É mais seguro para o júri, que escolhe e premeia o que já conhece, mas conviria correr riscos e apoiar mais cedo os que começam a notar-se nas escolas (e, quase sempre, os artistas hoje conhecidos já se davam a conhecer nos primeiros anos académicos). Tratar-se-ía de actuar no universo escolar mais precoce (alguns nunca de lá saem…) e de propiciar descobertas – não só confirmações.
Só um não tem a licenciatura em pintura em Lisboa - é finalista. Quatro
indicam mestrados ou masters (Londres, Nova Iorque, duas vezes,
Madrid). Seis fizeram já individuais em galerias comerciais. Têm entre
cerca de 30 (Inês Botelho, Martinho Costa, Rui Ferreira e Nuno Sousa) e
23 (Elsa Marques, 1984). A existência de um prémio orientado para a
pintura é correcta e proveitosa (há outro mais recente, o do Banco
Rothchild, já com duas edições, apadrinhado por Julião Sarmento e
Todolí), sem desconsiderar outras opções disciplinares também legítimas
ou com tudo por junto. Ganhamos com a diversidade.
Para afinar o prémio, conviria manter um número alargado de admitidos
(dez-doze, se possível), ganhar atracção junto de outras escolas e
impôr critérios que afastem (ou separem, em dois níveis?) os que já têm
carreiras conhecidas. Por hipótese, impondo datas mais recentes de
licenciatura (aqui vêm desde 2001, três deles) e apontando de
preferência para ainda estudantes e finalistas. Em vez de ser um prémio
para jovens até aos 30 anos, que já saíram da escola há vários, ele
interviria com mais eficácia e audiência no universo ainda escolar.
Outra hipótese seria a de pôr como limite só uma primeira mostra
individual de galeria.
De qualquer forma, o Prémio Fidelidade Mundial Jovens Pintores terá
vencido a etapa de transição para uma fórmula mais credível - o júri
incluiu Isabel Carlos, João Queiroz, Manuel Botelho e Miguel
Wandschneider.
Isabel Simões é um prémio justo, com a sua curiosa variação entre
representações de espaços reconhecíveis ou não; a forte relação entre a
matéria e a cor; a escala.
Já o Prémio UL volta a confirmar que o gosto burocrático que administra a arte oficial cultiva a autocaricatura, mas torna tudo mais fúnebre que divertido (júri de nomeação: Isabel Carlos, Miguel von Hafe Pérez, Nuno Faria, Ricardo Nicolau e Sérgio Mah; artistas jovens até aos 35 anos, no caso nascidos entre 1971 e 79). É o caso da repartição de André Guedes, premiada com funcionários em exercício na inauguração mas deixada ao abandono depois; é o caso da “Merda” de Alexandre Estrela (fotos das paredes da Estrada de Benfica) – no EDP Revelação era uma história de urinas (João Leonardo), são gostos institucionais. Sancho Silva é um instalador de dispositivos que geram a invisibilidade – a carpintaria é sempre sugestiva, mas não ver estimula a cegueira. A dupla Paiva e Gusmão resiste mal ao já visto – a graça é curta e os processos tornam-se depressa uma rotina. É sintomático que se tenha preferido a obra mais irrelevante. Haver ou não pintores entre os nomeados é uma questão ociosa. Alguns pretenderão que aqui a arte (em geral?) se aproxima da sociologia ou da política, mas essa conversa já deu. Tudo isto é muito provinciano.
Em suma, a visita do UL é confrangedora e afecta a disponibilidade para percorrer a sequência de salinhas onde está o bem mais proveitoso Prémio FM (a troca de espaços teria sido preferível e valeria a pena voltar a experimentar o espaço Salão em vez da moda dos compartimentos). Até 13 de Maio na Culturgest.
O ridículo moi
Citações tiradas do Jornal de Notícias, fala um dos membros do júri de premiação (depois admirem-se que encerrem os suplementos!):
“A contemporaneidade da temática escolhida por André Guedes foi decisiva para o júri, afirmou à agência Lusa um dos seus membros, o director do Centro Galego de Arte Contemporânea, Manuel Olveira. O responsável destacou "a problemática da vida e da cultura de hoje através do trabalho de arquivista", presente na obra de André Guedes.
A instalação recria o ambiente de um escritório de arquivos, com as estantes, os papéis, os computadores, as secretárias e os próprios arquivistas. "Os arquivos representam a ideia de que são inúteis e que são colocados agora em salas de museus", afirmou Manuel Olveira, sublinhando uma ideia de política e da relação com o poder subjacente ao trabalho do artista português.”
Pois é, como são inúteis tornam-se artísticos e dão muito jeito para encher salas de museus. E estes servem para quê?
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