Parte 2: No curso da história
EXPRESSO/Actual de 03-02-2007
- (Momentos e nomes grandes da história da fotografia a pretexto das engenharias e vários jovens artistas para descobrir)-
A fotografia é a última grande invenção da primeira Revolução Industrial. Divulgada em 1839, invade rapidamente todos os campos da actividade humana, documenta as grandes explorações e construções do século XIX e acompanha a dinâmica da diversificação e especialização das engenharias. No enorme cruzamento de temas desta exposição não cabem todas as vertentes da sua história, mas estão presentes várias direcções ou movimentos marcantes e muitos nomes de primeira linha.
Exibem-se provas de excepcional importância, como A Nave da Catedral de
Wells, de Roger Fenton (c. 1860), o Pôr-do-Sol no oceano Pacífico, de
Ansel Adams, com 1,70 metros de altura (c. 1953), o topo do Empire
State em construção, de Lewis Hine (1931), também numa raríssima prova
de exposição de grande formato, e mesmo ao lado outra prova «vintage»
do famoso The Maypole, de Edward Steichen (1932), com múltiplas
exposições. Ou a também célebre curiosidade fotográfica de George
Barker, Niagara no Verão, Visto de Baixo (c. 1888), de composição
ficcionada com vários negativos (o rochedo à esquerda é acrescentado).
Noutros casos trata-se de situar alguns momentos que ampliaram a
possibilidade de ver, com O Primeiro Raio-X Humano, do professor
Wilhelm Röntgen, 1896 (a mão enluvada da mulher e moeda numa caixa),
Adam Clark Vroman, o primeiro que conseguiu fotografar bem as nuvens
(Nuvens Perto da Enchanted Mesa, 1899), as já referidas proezas aéreas
de George R. Lawrence (1906) e uma das primeiras fotografias
radiotransmitidas, de René Barthélemy, o cianotipo Aeroplano Levantando
Voo Dum Barco, 1930.
É possível percorrer a história da fotografia e encontrar os amadores
que usaram o novo meio para fixar imagens artísticas de sítios e
monumentos, como os ingleses Fenton e Charles Clifford, este na Corte
espanhola de Isabel II, antes de se vulgarizarem os estúdios e a
produção do exotismo. Dos pioneiros das vistas topográficas que partem
para lugares distantes e instalam as primeiras empresas estão presentes
Felice e Antonio Beato, Francis Frith, Carleton Watkins, Giacomo Brogi.
Entrado o século XX, aparece o primeiro Stieglitz simbolista, chamando
A Mão do Homem, 1902-1911, à aproximação fumarenta do comboio, e Lewis
Hine a denunciar a exploração infantil em 1908. Edward Weston
instala-se no México (Pirâmide do Sol, 1923), onde influencia Alvarez
Bravo (Instrumental, 1931), enquanto o peruano Martín Chambi, indígena
quechua, fotografava Macchu Picchu (c. 1930). Deste lado do Atlântico,
Rodchenko alia vanguarda e propaganda nos anos 20, seguido pelos heróis
do realismo estalinista de Arkadi Shaikheit e Max Alpert, que mostra a
construção dos canais de Estaline (Fergana, 1939). Margareth
Bourke-White fotografa em Moscovo, 1930?, e faz a capa do n.º 1 da
«Life», em 1936 - veja-se outra foto da revista, de Nina Leen, 1947,
sobre o trabalho da dona de casa. Em 1956, Dan Weiner regista o Boicote
dos Autocarros, Alabama, no exacto início dos motins raciais.
E o percurso segue até hoje, com os mais jovens Harri Kallio e Mathieu
Pernot, com uma alegoria do índio norte-americano Victor Masayesva Jr
ou as extraordinárias imagens de Thomas Weinberger, que sobrepõem
digitalmente o dia e a noite. A história continua
Parte 3: "O estado do Planeta"
-(Uma viagem pelas vias da criação-destruição-renascimento que põe a tónica na ideia de reciclagem)-
«Mais do que uma exposição sobre engenharia, ‘INGenuidades’ é um
comentário sobre o estado do nosso planeta, transformado e mal gerido
pelos humanos», escreveu Jorge Calado. A sua perspectiva quanto à
relação do homem com o ambiente não parece ser, no entanto, a de uma
caminhada interminável para o abismo - e, aliás, o tema último da
conquista do Espaço pode entender-se como um final optimista (ou um
começo promissor, iniciando a visita em sentido inverso), num
itinerário que tem por objectivo didacticamente assumido mostrar o
progresso técnico da humanidade.
A degradação da paisagem e os desastres causados pelas transformações
climáticas (naturais e cíclicas ou provocadas pelo aquecimento global)
atravessam a mostra e devem ler-se como sérias ameaças a que o presente
tem de dar resposta. Mas o seu sentido não é ingénuo. De facto, a
dialéctica da construção-destruição que está presente nas imagens de
toda a exposição prolonga-se numa síntese que é expressa pela ideia de
reciclagem. Esta é um dos grandes desafios do século, explica o
comissário, definindo «INGenuidades» como «uma viagem pelas vias da
criação-destruição-renascimento».
As «Grandes Maravilhas» do engenho humano e da engenharia, reunidas no
início, não são um capítulo encerrado do passado.
A fotografia feita na Austrália tem uma posição destacada na exposição
e, não por acaso, é também neste país-continente que se têm sentido com
maior violência algumas das mais preocupantes alterações do clima. A
uma situação de seca muito pronunciada seguem-se incêndios de extrema
violência, que em 2003 atingiram Camberra, a capital federal,
fotografados por Nick Moir e Dean Sewell. São do segundo, no capítulo
Fogo, um canguru reduzido a estátua em terra queimada e, já perto do
final, na secção Electricidade, a árvore que espirra faúlhas e brasas
incandescentes em primeiro plano, enquanto ao longe os automobilistas
procuram fugir da cidade.
Sempre no capítulo das «Forças da Natureza», David Stephenson fotografa
as cicatrizes deixadas pelas minas de cobre do monte Lyell, Tasmânia,
2005 (Terra) - adiante, Edward Burtynsky mostra as minas do Utah nos
seus exactos grandes formatos. Robert Polidori faz o levantamento das
devastações do Katrina em Nova Orleães (Água) e volta depois com uma
impressionante Escola: Sala de Aula de Teoria Musical, Pripyat, 2001,
visitada sob pesadas condições de segurança 15 anos depois. Nick Moir
explora os céus onde se formam as tempestades e furacões (Ar).
No final da exposição, junto aos trabalhadores fotografados por
Wolfgang Sievers, está um tríptico do islandês Hrafnkell Sigurdsson,
Conversão Dois, 2006, que se abre numa imensa paisagem azul ou fecha
sob camadas de lixo. Fica o recado final de que é preciso fazer um
esforço.
Marcadores: photo
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