“A gestão do segredo”
EXPRESSO/ Actual, 1-11-96
Novos dados exigem que se actualize a informação e o comentário sobre a gestão do «Segredo fotográfico», questão abordada no «Cartaz» da anterior edição (EXPRESSO, 26/10/96).
Interrogado sobre a instalação do Centro Português de Fotografia (CPF) na Cadeia da Relação, no Porto, o porta-voz do ministro da Cultura afirmou no dia 17 de Outubro que «não há nada de definitivo». Dado o calendário de fecho do «Cartaz», foi sugerido um prazo até dia 22 para a
eventualidade de, entretanto, poderem ser fornecidas outras indicações sobre o assunto. Não se obteve resposta.
No entanto, no dia 23, aproveitando a circunstância de se inaugurar no edifício da Cadeia uma exposição dedicada ao arquitecto Viana de Lima, o ministro confirmou de viva voz o que até ao dia anterior não fora comunicado ao EXPRESSO, embora a data de publicação deste (a 26) não pudesse roubar impacto à «cacha» dos diários.
Segundo o «Público» do dia 24, Manuel Maria Carrilho «confirmou a
futura instalação do CPF na Cadeia da Relação» e «considerou ainda como
'pequena controvérsia' a discussão acerca da possibilidade de o Arquivo
Nacional de Fotografia (ANF) poder vir a ser albergado no monumento
portuense».
De acordo com a notícia publicada, o ministro disse ser já «certo que o
ANF irá ficar hierarquicamente dependente do CPF» e terá acrescentado:
«estando o espólio digitalizado, é possível ter acesso a ele a partir
de qualquer lugar». Por outro lado, o «Público» do dia 26 noticiava, a
respeito das verbas do PIDDAC, que entre «os investimentos mais
significativos» se contam «as obras para a instalação do CPF na Cadeia
da Relação (150 mil contos)». Embora o Orçamento não esteja aprovado, é
certamente difícil justificar a recusa da informação solicitada
alegando que «não há nada de definitivo».
Não valerá a pena prolongar a «pequena controvérsia» sobre o destino do
ANF, mas importa apontar algumas incoerências. A sua dependência
hierárquica do CPF é contrária à lógica que fez retirar o Instituto de
Arte Contemporânea do Instituto Português de Museus (IPM) e que mantém
a autonomia da Cinemateca e do Arquivo Nacional das Imagens em
Movimento em relação ao IPACA, ou seja, à separação entre o apoio à
produção contemporânea e a preservação do património histórico.
Por outro lado, a lei orgânica do IPM, ainda por publicar, deverá
consagrar a existência do ANF sob a forma de uma nova Divisão de
Serviços e esteve previsto, nesse mesmo âmbito, instituir legalmente,
como há muito se aguardava, o Arquivo-Museu Nacional de Fotografia. Uma
vez que essa Divisão de Serviços se irá manter no novo diploma, para
assegurar um serviço fotográfico que responda às necessidades dos
museus e conserve os seus espólios especializados, bem como para dar
continuidade a outra direcção de trabalho prosseguida pelo ANF, o
estudo técnico-científico das obras de arte através das novas
tecnologias da imagem, parece certo que se irá assistir a mais uma
situação de proliferação incontrolada de institutos e serviços
públicos, com sobreposição de competências e custos.
Quanto à digitalização dos espólios, mais vale esquecer o que, se não é
erro de transcrição, só pode justificar-se por desconhecimento do
assunto. (Quantos milhões de negativos e provas se vão digitalizar?
Quanto custa um disco óptico e que prazo de validade tem?)
Não há nada a acrescentar ao que se disse sobre o entendimento que o MC
tem do papel da informação, nem sobre a vontade sistemática de
inviabilizar qualquer debate alargado sobre quais as linhas de
orientação que presidem à remodelação do aparelho administrativo
central e à gestão da cultura. O anunciado Instituto de Arqueologia é
um doce oferecido à respectiva corporação, e não uma condição de
operacionalidade do IPPAR nem uma reivindicação dos investigadores; as
autonomizações do Institutos do Restauro e do Inventário, a separar do
IPM, são precipitações de uma tutela que enuncia vagas intenções antes
de estudar o sector e consultar especialistas. O aumento de peso da
estrutura administrativa da Cultura é apenas uma primeira
consequência...
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