O Museu de Serralves abriu em Junho de 1999. Cronologia - da decisão de Helder Macedo em 1979 à inauguração, passando pelo Museu Soares dos Reis (o Centro de Arte Contemporânea, desde 1975-76) e pela Casa de Serralves, entre outros muitos episódios
"Serralves 79/99"
EXPRESSO/Cartaz de 5 Jun. 99
DEMOROU exactamente duas décadas a concretização do projecto do Museu de Arte Moderna-ou-Contemporânea do Porto. Mais anos ainda se, para lá das primeiras promessas oficiais, se situar o seu arranque efectivo no processo de renovação do programa do Museu Nacional Soares dos Reis, reivindicada pouco depois do 25 de Abril, já com a intervenção de Fernando Pernes.
1979 - O Museu Nacional de Arte Moderna (MNAM) é estabelecido no Porto (mais exactamente, no «Diário da República»), por um diploma do então secretário de Estado da Cultura Helder Macedo. A respectiva comissão organizadora era formada por Fernando Pernes, José-Augusto França, Fernando de Azevedo e a então directora do Museu Soares dos Reis, Maria Emília Amaral Teixeira. A localização do MNAM no Porto tinha em conta o projecto do Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian e, em especial, a actividade desenvolvida desde 1975-76 pelo Centro de Arte Contemporânea (CAC), dirigido por F. Pernes e instalado no Museu Soares dos Reis. Activo até 1980, o CAC realizou exposições de Alberto Carneiro, Ângelo de Sousa, Wolf Vostell, António Pedro, Augusto Gomes, Dórdio Gomes, Álvaro Lapa, Júlio Pomar, Júlio Resende, entre outras, e ainda projectos inéditos como «A Fotografia na Arte Moderna Portuguesa» e «A Fotografia como Arte/A Arte como Fotografia».
Os primeiros planos feitos pelo arquitecto Viana de Lima apontavam para a construção de um novo edifício nos jardins do Museu Soares dos Reis e depois para a reutilização do antigo Mercado das Frutas.
Ao futuro museu foram desde logo atribuídas as obras modernas da colecção da SEC e começaram a fazer-se as primeiras aquisições. Em Junho de 1980, no Museu Soares dos Reis, fez-se a apresentação do programa do MNAM e a exposição do seu acervo inicial.
1983 - É inaugurado em Lisboa o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian.
1985 - O projecto do MNAM foi retomado em 1981 por um novo secretário de Estado, Brás Teixeira, mas é Teresa Gouveia, por despacho de 25 de Novembro de 1985, quem relança o processo, nomeando uma nova comissão organizadora.
1986 - A 30 de Outubro, o Conselho de Ministros decide a compra da Casa e Parque de Serralves (Quinta do Conde de Vizela ou de Riba d'Ave), com uma área de 18 hectares, por 530 mil contos. Atribui-se ao MNAM a apresentação da «produção artística caracterizadamente moderna, realizada desde o início do séc. XX» e prevê-se que a Casa passe a acolher desde logo «um núcleo representativo do acervo disponível».
Realizara-se entretanto outro levantamento de obras pertencentes ao Estado e fizeram-se novas compras para o museu. É nomeada a 29 de Dezembro uma comissão de gestão da Casa e Parque, que se manterá em funções até à constituição da Fundação, em 89.
1987 - A Casa de Serralves entra em funcionamento em Maio, com direcção artística de Fernando Pernes, apresentando as aquisições recentes da SEC e também doações de particulares e obras colocadas em depósito.
Em Lisboa é encerrado o Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC) devido ao seu estado de degradação.
1988/89 - Não encontrando no Governo qualquer disponibilidade para dotar o projecto do museu dos meios financeiros necessários, Teresa Gouveia procura, com a colaboração da Fundação Luso-Americana (FLAD), uma solução sustentada na participação do mecenato, então encarado com grande optimismo. Na campanha de angariação dos fundadores são assegurados para o futuro museu, além da colecção da SEC, o núcleo de arte moderna do Museu Soares dos Reis (117 obras) e ainda todas as obras modernas da colecção do MNAC (mais de 600 peças).
A Fundação de Serralves é instituída por Decreto-Lei de 27 Junho de 1989, sendo desde então presidida por João Marques Pinto; Fernando Pernes é director artístico. Meia centena de mecenas contribuem com uma quota única de dez mil contos, perfazendo (com uma dotação de 50 mil contos da FLAD) um total também de 530 mil contos; o Estado compromete-se apenas a «assegurar, anualmente, para as despesas de funcionamento da Fundação, um subsídio equivalente ao dispendido no ano de 1988».
1990 - O projecto do museu, que conta com a possibilidade de atribuição de fundos comunitários, graças ao empenhamento de Luís Braga da Cruz, presidente da Comissão Coordenadora da Região Norte, e do ministro do Planeamento, Valente de Oliveira, passa a ser acompanhado pela ambição de um grande auditório para concertos, ópera, bailado e teatro. Fala-se de um centro cultural polivalente ou mesmo de um Centro de Congressos.
Da comissão de compras de Serralves fazem parte F. Pernes, Fernando Calhau e Fernando Azevedo.
Após o incêndio do Chiado, em 1988, foi decidido reabrir o antigo MNAC, modernizado com base num projecto de arquitectura oferecido pela França. A prevista cedência de obras modernas para Serralves dá origem a uma «guerra de quadros» entre os responsáveis pelos dois museus.
1991 - A 6 de Março, o Ministério do Planeamento assina com Álvaro Siza o contrato para o projecto do museu, prevendo-se um centro cultural com dois auditórios de 1000 e 300 lugares. O arquitecto apresenta um primeiro estudo em Agosto e voltará a apresentar outros anteprojectos em Janeiro de 92 e em Agosto de 93.
Da comissão de compras fazem parte Alexandre Melo, Bernardo Pinto de Almeida, arq. Nunes de Almeida e F. Pernes. Reorienta-se a colecção do futuro museu para um diferente limiar cronológico, com início nos anos 60, tornando-se mais acessível, por motivos financeiros, a inclusão de obras de artistas estrangeiros.
1992 - A Câmara do Porto promove as 1ªs Jornadas de Arte Contemporânea, com direcção de João Fernandes (repetem-se em 93 e 96).
1993 - Vêm a público em Janeiro as dificuldades de relacionamento de Serralves com o secretário de Estado Pedro Santana Lopes, devido à não actualização das verbas atribuídas anualmente pelo Estado para funcionamento da Fundação. A guerra vai durar até 1994, afectando gravemente a programação. Numa das fases mais aguda do conflito, que ganhou uma vasta dimensão pública, o Presidente da República, Mário Soares, disponibiliza a sua colecção pessoal para ser exposta em Serralves.
Santana Lopes defende a instalação do MNAM na Cadeia da Relação, privilegiando a construção do grande auditório («Eu queria que Serralves fosse uma espécie de Gulbenkian do Norte, uma grande fundação que gerisse o Museu e a Orquestra do Porto...», diz S.L.).
Cavaco Silva intervém no conflito e determina a alteração do projecto para dar prioridade ao museu, então previsto com uma área de 8 mil metros quadrados e apenas com o pequeno auditório.
É inaugurado em Lisboa o Centro Cultural de Belém.
Em Santiago de Compostela é inaugurado o Centro Galego de Arte Contemporânea, projectado por Álvaro Siza.
1994 - Santana Lopes impõe a alteração dos estatutos da FS, para que o Estado passe a estar representado por dois administradores, num total de nove.
O Museu é orçado em 4,7 milhões de contos (1,2 do Estado e 3,5 de fundos comunitários), comprometendo-se a Fundação a reunir mais 1,2 milhões de contos junto de antigos e novos fundadores destinados a aquisições de obras.
É inaugurado em Lisboa o Museu do Chiado, com a renovação profunda das instalações do antigo MNAC.
1995 - Cavaco Silva preside, a 27 de Julho, à assinatura do protocolo para a construção do museu, que então surge designado como Museu Nacional de Arte Contemporânea. É fixado o limiar dos anos 60 como programa de acção, em articulação com a periodização prevista para o Museu do Chiado.
1996 - Vicente Todolí assume o cargo de director do museu a 1 de Setembro, tendo João Fernandes como adjunto. Fernandes Pernes passa a ser consultor da administração. Todolí, nascido em Valência em 1958, pós-graduado em Nova Iorque, foi director cultural do Instituto Valenciano de Arte Moderna (IVAM) desde 1988, aí comissariando exposições de Julião Sarmento e Cabrita Reis.
A 27 de Novembro, António Guterres coloca a primeira pedra do futuro Museu de Arte Contemporânea (perde a designação de Nacional por se tratar de uma instituição de direito privado e não depender do Instituto Português de Museus). Prevê-se a conclusão para o 4º trimestre de 98.
1997 - O Ministério da Cultura, a Câmara do Porto e a Fundação de Serralves firmam um protocolo para aquisição de obras de arte no valor de um milhão de contos, faseado em cinco anos, de 1998 a 2002 (cem mil contos anuais do MC, 40 mil da CMP e 60 mil da FS). Nada está previsto para os anos seguintes.
Vicente Todolí fixa um novo programa cronológico para a colecção, que passa a ter por limiar o final da década de 60, de acordo com uma suposta «mudança de paradigma» que será exemplificada na exposição inaugural «Circa 1968». Através de novo protocolo com o MC, Serralves abdica das obras que lhe tinham sido antes atribuídas e não se enquadram nesse período, a favor dos Museus Soares dos Reis e do Chiado.
Inaugura-se a 17 de Maio de 1997 o Sintra Museu de Arte Moderna, primeiro museu de arte internacional do século XX em Portugal, onde se expõe a Colecção de José Berardo.
1999 - A FLAD deposita em Serralves a sua colecção de obras portuguesas (fora já atribuída, em 96, a uma prevista extensão do Museu do Chiado na Gare Marítima de Alcântara).
Inaugura-se hoje o Museu de Arte Contemporânea de Serralves num edifício de 12.670 metros quadrados de área total com 4.484 m2 de espaço de exposições, biblioteca, salas de programas educativos, livraria, restaurante, um auditório de 300 lugares e uma extensa área de reservas.
O custo total excedeu em 800 mil contos, pagos pelo Estado, o custo previsto de 4,7 milhões de contos. O número de fundadores subiu de 51 para 103, cumprindo-se o previsto acréscimo do capital inicial da FS em 1,2 milhões contos, destinados a aplicações financeiras (não a despesas de funcionamento nem aquisição de obras).
A exposição inaugural, «Circa 1968», onde estão representados 37 artistas portugueses e 70 estrangeiros, apresenta obras da colecção do museu e também «outras obras que a permitem contextualizar», «representando o contexto artístico e cultural das linguagens experimentais que transformaram num símbolo cultural no mundo ocidental o ano de 1968». O museu abre ao público no dia 8.
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