Na ocasião da abertura do CGAC de Compostela, revisão do caso Serralves, onde o 1º projecto se encomendara em 199o e a inauguração ocorre em 1999.
Serralves em 1993
EXPRESSO/Revista de 02-10-1993, pág. 25
Álvaro Siza: “Arquitecto arquitecta…”
SANTIAGO de Compostela já tem o seu centro de arte contemporânea e o Porto é menos capital do norte.
O Parque de Serralves foi comprado em 1986, por iniciativa de Teresa
Patrício Gouveia, para aí ser construído o Museu Nacional de Arte
Moderna. Passaram-se sete anos. Não há Museu e o próprio centro de
exposições instalado na Casa de Serralves tem a sua sobrevivência em
risco.
O museu era nacional, por decreto, mas independente das estruturas do Estado competentes em matéria de museologia. Foi um primeiro equívoco. (Viria a provar-se que não, mas nesse altura estava tudo muito incerto.) Depois, criou-se uma fundação para o custear e gerir. Cada um dos 50 fundadores entregou dez mil contos, uma só vez mas com direito a nome inscrito na fachada, para sempre, e o Estado comprometeu-se a «assegurar anualmente um subsídio equivalente ao despendido em 1988». É um absurdo total, mas foi escrito no «Diário da República», também ao tempo de Teresa Gouveia. (Foi uma exigência do então 1º ministro, que assim (quase) lavava as mãos de Serralves, depois de comprado o Parque e a Casa – esse subsídio igual ao de 1988 estrangulou o projecto por uns anos, mas depois o papel dos fundadores (alguns dos iniciais e muitos outros) ganhou um inesperado dinamismo…)
Mais tarde, pensou-se em associar o museu a um centro de congressos, para que viessem de Bruxelas os dinheiros do desenvolvimento regional. Ampliou-se a área a construir dos 4000 para os 13 000 metros quadrados. Desejou-se um grande auditório.
Em 1990 encomendou-se o projecto a Álvaro Siza Vieira e o ministro Valente de Oliveira assegurou o acesso aos fundos comunitários. O início das obras esteve anunciado para 1991, depois para 1992. Mas, afinal, está-se ainda na fase dos estudos prévios.
Siza fala do seu trabalho, apenas:
«À partida havia um programa com determinadas características, o qual, numa perspectiva de obtenção do financiamento, foi modificado no sentido de ser um edifício com outras possibilidades - e fazia parte dessas possibilidades o ser maior. Portanto, fiz um primeiro estudo prévio com um programa já diferente do que inicialmente existia.
Nesse estudo, em linhas gerais, havia o museu com o seu programa, de museu e salas de exposição, e havia um auditório que deveria ter uma utilização múltipla, desde congressos até concertos. A primeira solução que fiz articulava todas as partes do programa num edifício único e por isso a utilização dos espaços de serviços e de distribuição era concentrada, dentro da medida do possível. Fiz esse estudo prévio e ele foi apresentado.Posteriormente, foi-me pedida uma solução que permitisse construir numa primeira fase o museu, mas de modo a não pôr em causa a construção do grande auditório numa segunda fase. Isso obrigou necessariamente a fazer outro estudo, o que não quer dizer que muito do primeiro não esteja presente neste segundo estudo prévio. Certas opções são as mesmas, mas a organização e a distribuição das partes do programa teve de ser revista porque o museu tem de funcionar bem com todos os seus espaços de recepção, de administração, etc., e quando se fizer o auditório, se se fizer, isso não pode pôr em perigo o funcionamento do museu.
Quer a implantação quer a articulação das duas zonas teve que ser estudada para que o tempo de construção, que é sempre significativo, não vá inviabilizar ou tornar extremamente incómoda a utilização do edifício. Isso é que deu o segundo estudo prévio, que eu entreguei há pouco tempo e que está a ser analisado pelo dono da obra.»
Foi o primeiro ministro que sugeriu, em Abril deste ano, o faseamento da construção, avançando-se primeiro com a ocupação de cerca de 8000 metros quadrados destinados ao museu e deixando o auditório para melhores dias.
Siza não conhece ainda a recente reviravolta de Santana Lopes que, afinal, quer pôr o auditório (apesar do Rivoli, apesar do São João...) à frente do museu.
«Julgo que toda a gente está de acordo, todos os políticos, todos os partidos estarão de acordo que há uma determinada estrutura que falta na cidade do Porto, e essa lacuna é indispensável preenchê-la. O que acontece é que há dúvidas e opiniões diferentes quanto ao programa, quanto às dimensões, enfim, em relação a tudo.
O problema maior que existe com o Museu de Serralves é um problema de financiamento. No fundo, está em aberto um debate sobre todos esses problemas a um nível que não é o meu. Arquitecto arquitecta... e o programa se mudar muda. A questão está em debate e, para já, dá-me uma pausa no desenvolvimento do projecto que me faz bastante jeito, porque tenho muito que fazer.»
A ideia de instalar o museu na Cadeia da Relação é, na melhor das hipóteses, apenas uma manobra de diversão para impor a renegociação da situação estatutária de Serralves e o compromisso efectivo dos responsáveis pela aurtarquia com todo projecto. É nesse campo que valeria a pena situar o debate, começando por redefenir o programa museológico inicialmente fixado e por rever o modelo de uma fundação cuja viabilidade financeira está à partida condenada.
Durante anos a SEC deixou apodrecer a situação de Serralves. Agora instalou a confusão.
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