Não há referências no catálogo do Museu do Prado à pintura que se expõe no Museu das Janelas Verdes como sendo da autoria de Joachim Patinir (ca. 1480/85 -1524).
Paisagem com São Jerónimo, Museu do Prado
A coisa é mais grave por se tratar de um catálogo "raisonné" e porque entre as 29 obras que aí são referenciadas já existem várias atribuídas conjuntamente a Patinir e à sua oficina, e uma mesmo só ao seu "círculo".
A mostra do Prado, da responsabilidade de Alejandro Vergara, inclui uma primeira secção dedicada às "Origens da paisagem flamenga: antecedentes de Patinir", com 14 obras : óleos sobre madeira, gravuras a buril de Durer e livros de horas e de oração. Seguem-se 22 pinturas no núcleo das obras de Patinir, atelier e círculo. A última secção versa a influência de Patinir e inclui mais dez obras atribuídas aos seus "herdeiros", sempre sem referência à pintura do MNAA. Aí parecem as obras e os nomes de Simon Bening, Bernard van Orley, Quentin Massys, Joos van Cleve, Herri met de Bles, Jan van Amstel, Cornelis van Dalem e Lucas van Valckenborch, mais o ignorado Mestre das Meias Figuras. São pistas para próximas investigações.
A lista das obras expostas e a análise dos continuadores são publicadas apenas no Guía de la exposición: "Patinir y la Invención del Paisaje", de Alejandro Vergara.
A pintura do MNAA, que não deixa de ser uma boa pintura, apesar da desclassificação, será de um continuador ou seguidor de Patinir, ou de um imitador? A questão fica em aberto e tem alguma importância.
Numa referência recente à pintura do MNAA, no catálogo da mostra do Museu levada a Bona em 1999, Dagoberto Markl dizia que "a atribuição... não tem suscitado qualquer contestação", mas - "não obstante a concordância geral sobre a atribuição desta pintura" - afirma sentir "grandes dúvidas em incluí-la no contexto da obra de Patinir". Na opinião que aí formula o painel "afigura (se-lhe) cronologicamente mais avançado e atribuível a um paisagista seguidor deste mestre", propondo dois nomes de pintores não incluidos na lista acima. Um dos comentários que faz sobre a pintura parece ter importância na comparação com as obras de autoria reconhecida: "o esfumado que envolve a composição" distingue-se, de facto, da exacta precisão dos motivos que se encontra mesmo nos planos mais distanciados das obras de Patinir.
No catálogo existem apenas referências ao Museu de Lisboa a propósito de Bosch, de quem Patinir acusa claras influências, e também a respeito de Lucas Rem, comerciante e coleccionador de Patinir.
Museu do Prado 2007
Ainda nao consultei o catálogo e também já reparara que a pintura do mnaa nao saíra do mnaa, mas ainda estava esperançado que a mesma estivesse referida no catálogo. Mais uma vez se demostra que os investigadores estrangeiros ou andam mal informados, ou simplesmente fingem nao saber, porque tambem recentemente vi uma obra sobre Jos van Cleve que supostamente é raisoné exluir totalmente as pinturas atribuidas a esse pintor, que se encontram à guarda do museu de arte sacra do Funchal. Ainda mais interessante é que algumas delas até estiveram em expostas na Europália 1991!!!!
Posted by: Joâo Pereira | 09/30/2007 at 03:28
Julgo não se tratar de falta de informação por parte do comissário Alejandro Vergara (de quem não consegui obter esclarecimentos por email) ou de má vontade espanhola (apesar de um anterior desentendimento sobre um empréstimo do Durer).
De facto a pintura do MNAA atribuída a Patinir está insuficientemente estudada e já merecera fortes reservas quanto à atribuição de autoria por parte de Dagoberto Markl (conservador do museu) no catálogo da apresentação da colecção em Bona em 1999 - que transcrevi na nota acima. Desde 1999 tinha havido tempo para esclarecer a questão, mas não se terá tentado - é preciso lembrar que a falta de meios e as pressões para fazer subir de qq maneira o nº de visitantes teêm desviado energias e condições de trabalho da área da investigação.
Com a direcção Dalila (e a falta de interesse dos jornais e da tutela) o caso não teve a averiguação imediata que se impunha. O director seguinte já teve ocasião de fazer uma ligeira referência no Público de 21 de Setembro: "Temos o caso dramático do Patinir, que não está no "catálogo raisonné". Isso revela que não há divulgação da colecção no contexto internacional." Talvez seja o contrário: como a colecção foi divulgada em Bona, lá fora sabe-se que o quadro não é do Patinir. Cá dentro é que a informação não circulou.
Note-se que além do "catálogo crítico" (ou "raisonné") com os seus estudos e apêndices, onde há várias referências a Portugal, foi editado um pequeno "Guía da exposición" (56 pág.) que termina, acompanhando a mostra, com a secção Los Herederos de Patinir - tb aí não se refere o quadro de Lisboa.
Posted by: ap | 09/30/2007 at 10:45
Esta nota não tem intenção de corrigir nada nem acrescentar à discussão, nem sequer busca inclusão no blog. Tão somente pensei em mencionar-lhes que o poeta Jorge de Sena, meu pai, escreveu um poema sobre este quadro, o segundo de uma sequencia de tres "Primitivos", com o título "II-- (O Patinir das Janelas Verdes", incluido em "Pedra Filosofal" (1950, reeditado várias vezes desde então).
Posted by: Isabel de Sena | 08/03/2016 at 21:33