14º Encontros de Fotografia de Coimbra
"A meio caminho"
EXPRESSO/Revista de 19.11.94
«Itinerários de fronteira» — ou caminhos da sobrevivência — poderia ser um título global para a história dos Encontros de Coimbra e para cada uma das suas 14 edições. Apesar do «alto patrocínio da SEC» que se foi sucedendo à suspensão de 1990, apesar de Manuel Freches, na inauguração, os promover por lapso à condição de «encontros nacionais de fotografia», apesar da promessa de um subsídio recorde de 45 mil contos para 94, cada um dos seus programas é sempre uma aventura entre a continuidade e a desistência, uma viagem por um incerto «no man's land». As expectativas são grandes, como o confirmam o apoio benevolente da Imprensa e a afluência do público, mas, anualmente, os meios disponíveis são uma incógnita quase até às vésperas da abertura e, com altos e baixos de fortuna, em meios e interesse da programação, a análise de cada edição nunca pode ser separada da atensão às condições de produção dos Encontros.
«Itinerários de fronteira», colect.: George Krause, Pierre Devin e Jean Pierre Bonfort; Luis Asín, John Davies, José Manuel Rodrigues e Maçãs de Carvalho; Debbie Fleming Caffery, Bernard Plossu e Max Pam; Fréderic Bellay, Luís Palma, Álvaro Rosendo, Humberto Rivas, Nuno Cera e
Bruno Sequeira, Leitão Marques e
Albano Silva Pereira.
Orlando Ribeiro
No ano anterior < 93>, eles ocuparam-se de uma recente renovação de interesse pela fotografia de paisagem, com a exposição «Jardins do Paraíso» a traçar um possível panorama internacional, onde as poéticas dos lugares e da relação com a natureza, perdida ou reencontrada, se sobrepunham à lógica do inventário. Este ano, o mesmo tema — agora já tomado como género e envolvido na retórica do «registo documental fotográfico» — foi aplicado sobre a realidade geográfica de Coimbra e da região beirã, «nas suas componentes paisagística, sociológica e antropológica», ao mesmo tempo que se anuncia uma inflexão programática para o futuro dos Encontros, assente na produção própria e num programa de «levantamento fotográfico do país, a levar a cabo até ao final do século».
Não é fácil compreender se o que se propõe como «Razão de ser, hoje», num suplemento do «Público» que faz as vezes de jornal dos Encontros, é mais do que um exercício de justificação — ingénua ou falsamente ingénua? — para merecer os imprescindíveis e incertos apoios oficiais. Mas pretender-se-á certamente só encarecer os méritos da fotografia junto do poder (e para mais de um poder personificado e descricionário), quando se fala de um «projecto de levantamento que implica a paisagem, as populações, os traços da Natureza, dos homens e das máquinas. Também as relações materiais e simbólicas que ainda reúnem as comunidades no espaço mítico onde se confundem o sagrado e o profano. Rituais de permanência e tradição, que o tempo implacavelmente altera de sentido». É conversa de político, ou para político, convencendo-o a esportular a verba.
De facto, depois de se terem investido esperanças excessivas na entrada da fotografia no mercado das artes plásticas, privilegiando as contaminações de processos plásticos, é a mesma dependência da consideração tacticista da evolução das condições de produção da fotografia — no novo contexto da crise e da exploração da margem disponível para inicitivas culturais institucionalizadas — que parece determinar a reorientação dos Encontros. Trocando a lógica própria da divulgação da fotografia, na sua imensa diversidade histórica, disciplinar e autoral, por uma estratégia da gestão de projectos, em exposições de comissário que acompanham uma via também sensível no mercado da arte.
A passagem da prioridade atribuida à divulgação da fotografia, que permitiu ir conhecendo alguns dos nomes essenciais da sua história e do seu presente, para a produção fotográfica própria, agora afirmada como regra para o futuro, é provavelmente mais uma solução de recurso do que uma aposta amadurecida. É improvável que se aposte num fechamento de horizontes, até geográficos, e numa imobilidade programática que seria fatal a Coimbra.
É certo que as missões, projectos de levantamentos e documentações mais ou menos regionais constituem nos últimos anos um modelo de produção fotográfica de grande voga, a pretexto de centenários de cidades, capitais culturais e outras promoções institucionais ou mecenáticas, em que conta, muito mais que a «verdade» dos documentos, o prestígio assegurado pela notoriedade dos fotógrafos mobilizados (tendencialmente, sempre os mesmos). Luxuosas publicações de representação, que em geral não chegam às livrarias, acompanham essa vaga, num quadro institucional de apoio directo à criação fotográfica, de animação de «espaços», de acções de sensibilização local — urbanística, ecológica, social, etc — e ainda, no caso mais óbvio da França, de operações de afirmação e prestígio internacional. Nesta mesma edição dos Encontros, três missões fotográficas, «Figures du Littoral», «D'Est en Oest» e «Beyrouth» servem de exemplos de qualidade desse novo mercado da fotografia.
Se é conveniente convencer os possíveis encomendadores de tais produções quanto aos méritos das iniciativas, importa também vê-las como forma actual de viabilização de uma antiga prática da fotografia de viagem, enquanto descoberta do mundo e itinerário autobiográfico, de que resultarão, ou não, algumas imagens a integrar nas obras pessoais dos fotógrafos. Mas a uns Encontros de fotografia pedir-se-ía antes de mais uma lúcida problematização do que é a informação e a verdade fotográfica, o valor do documento, a sempre incerta adequação de uma lógica do inventário — maníaco ou «científico» —, ou de um estilo, à objectividade referencial que ao fotógrafo se pede em tais encomendas, ao mesmo tempo que se lhe assegura a liberdade do olhar pessoal.
Aliás, na relativa diversidade do programa deste ano fornecem-se pistas para aprofundar tais questões, desde logo através da consideração da qualidade fotográfica das «anotações» de campanha do geógrafo Orlando Ribeiro, que nunca expôs fotografia mas a usava no seu trabalho. Por outro lado, a própria apresentação individual dos quatro fotógrafos americanos permite acentuar, para lá dos possíveis géneros e programas, a importância das invenções e das rupturas introduzidas na prática fotográfica pela irredutibilidade das visões pessoais investidas nesses «levantamentos» solitários da paisagem social e topográfica.
UM TERRITÓRIO
A exposição «Itinerários de Fronteira», com o conjunto de mostras paralelas «tendo como tema englobante o território das Beiras», apresentaria «a primeira contribuição sistemática, em imagens, para um debate sobre o país finissecular». É prometer demais e condicionar expectativas que os Encontros não podem, e certamente não devem, cumprir.
O que se observa, para lá do interesse de alguns portfolios e de umas quantas fotografias isoladas — o que, apesar de tudo, já é bastante... —, é um trabalho de colagem e de amálmaga que tira partido de um capital acumulado em anteriores passagens de fotógrafos por Coimbra, de relações de boa vontade e de restos de projectos esboçados noutras edições, completado com a encomenda de mais alguns itinerários recentes, que certamente não contaram com tempo necessário para a realização prévia de «répérages» e a conceptualização dos projectos.
A publicação de um album cartonado, que eleva o nível das publicações dos Encontros, mas sem atingir um nível excelente de impressão, dá, entretanto, conta das contradições do projecto. E o facto da montagem da exposição ter seguido o livro, sem invenção de uma lógica própria, também não beneficiou a sua legibilidade. Alguns dos portfolios perdem coerência autoral para se subordinarem a uma arrumação por seis capítulos-regiões («Coimbra», «Caminhos», «Fronteiras de Montanha», «da Terra», «do Tempo» — a Bairrada —, «do Litoral»), mas essa prioridade documental é logo contrariada pelo carácter genérico da legendagem. A participação dos 17 autores, um número excessivo e desiquilibrado, que junta veteranos e jovens autores, presenças simbólicas e investimentos de fôlego, é também irregularmente distribuida, e por vezes sacrificada a um número insuficiente de imagens. Por outro lado, a vastidão do projecto, em termos de «cobertura» de uma região, está longe de ser sintetizada nos itinerários efectivamente concretizados.
De facto, é improvável que se possa atribuir a categoria de levantamento ao material reunido. Debbie Fleming Caffery (presente na exposição paralela dedicada só a Coimbra), Bernard Plossu e Max Pam mostram vestígios de passagens anteriores pelos Encontros. Noutros casos recuperam-se projectos antes iniciados, como o trabalho sobre a Linha de Caminho de Ferro da Beira Alta, que permanece inconclusivo. A Serra da Estrela, visitada por George Krause, Pierre Devin e Jean Pierre Bonfort, merecia ser o núcleo temático de uma produção autónoma, tal como a Bairrada de Luis Asín, John Davies, José Manuel Rodrigues e Maçãs de Carvalho. Esses são certamente exemplos de possíveis projectos monográficos, tal como o «Vale do Mondego», mostrado em 93 e com achegas complementares nesta edição, que talvez pudessem encontrar parceiros co-patrocinadores, por interesses económicos e turísticos, capazes de assegurar condições de trabalho propícias, edição própria e circulação posterior. Assim, fica-se pelo caminho e talvez se tenham queimado projectos verosímeis.
Do que se mostra é inevitável destacar algumas das fotografias de George Krause, o americano que foi a vedeta inesperada da edição anterior dos Encontros. Com mais duas deslocações a Portugal, reatou uma viagem pelo país que fizera em 1963, produzindo na Serra da Estrela imagens sensíveis à expressão da circulação de energias cósmicas e à vastidão dos espaços, enquanto em Coimbra fez fotografias de rua que observam de perto as pessoas (e é o único que o consegue).
John Davies, que já publicara fotografias do Porto, encontra na Bairrada uma oportunidade para fazer da paisagem um lugar de cruzamentos entre tempos e sinais contraditórios, e é também em torno do vinho que José Manuel Rodrigues produz quatro imagens que identificam uma dimensão doméstica do trabalho, até ao plano próximo de umas mãos que vindimam e recordam as de Georgia O'Keeffe bordando, vistas por Stieglitz.
Fréderic Bellay mostra três atraentes imagens nebulosas das falésias de S. Pedro de Muel e Luís Palma, com a série «De Westernland, aqui no Mondego», estabele um relação distanciadora com a paisagem local, reencontrando outros lugares num projecto que continua a ser uma visita aos exemplos americanos e uma procura de si mesmo — mas a qualidade das suas provas é prejudicado no album. Álvaro Rosendo construiu estruturas compósitas (a contrariar o excesso de compustura dominante) de imagens narrativas.
Outros nomes presentes: Humberto Rivas, Nuno Cera e Bruno Sequeira, ambos vindos da Associação Maumaus, Leitão Marques e Albano Silva Pereira, que além de se expor, o que talvez seja aceitável, se escolheu para a imagem do convite, do cartaz e da capa.
OUTROS LUGARES
Momento destacado dos Encontros é a descoberta das fotografias do geógrafo Orlando Ribeiro que se conservam no Centro de Estudos Geográficos da Faculdade de Letras de Lisboa. Realizadas entre 1947 a 1976, foram seleccionadas e reimpressas por Teresa Siza (por vezes a partir de positivos degradados, devendo já estar assinalada a diversidade da natureza dos materiais expostos), para além de algumas belíssimas provas originais com panorâmicas feitas por colagem, e foram publicadas pelos Encontros num segundo album, intitulado Finisterra, prefaciado por T. Siza, Jorge Gaspar e Suzanne Daveau.
Não se conhece em Orlando Ribeiro a ambição de expor, mas apenas o interesse por documentar fotograficamente, com a maior correcção técnica possível, seguindo uma prática que era habitual no seu universo profissional, as observações de viagem e de trabalho — e, mais em geral, a posse de uma grande cultura humanista e artística, naturalmente também atenta à importância estética da fotografia. No entanto, ao percorrer agora esta pequena selecção do seu espólio, é impossível não adivinhar que, por vezes, o que o olhar atento escolheu registar já não seria o material potencialmente informativo mas a presença de um irredutível desconhecido — estranheza inquietante ou experiência de uma falha — inscrita numa estrada que avança para o infinito, num rosto secreto que olha o fotógrafo, no rigor geométrico de uma distribuição vertiginosa de formas («Varandas na Ilha de Moçambique», 1965) ou no gesto de um negro que se esquiva (Guiné, 1946).
A prática do amador, o exercício metódico da anotação informativa e técnica, o olhar autoral interrogam-se nestas fotografias (ou no nosso olhar sobre elas), em que, sem efeitos de elegância artística ou redundância significante, à distância dos Salões, se cumpre uma aparente lógica institiva de confiança na objectividade fotográfica. Mas o essencial, também aqui, será da ordem do documento, ou do que resiste à confiança na razão?
«Figures du Littoral» é um projecto do Conservatoire de l'Espace Littoral et des Rivages Lacustres, desenvolvido entre 1986 e 1993, em doze zonas protegidas que foram distribuidas por outros tantos fotógrafos franceses, em vários casos ligados às regiões que fotografaram. Para além do «timing» da operação, notar-se-á que a ela está associado um mecenas, Gaz de France, através da respectiva fundação de empresa, e um editor. O projecto, de que se expõe em Coimbra apenas uma selecção, incluiu a publicação de 12 monografias, por autor e região, desde 1991, e de um livro de síntese, Littoral (vol. 1), já de 1994 (Editions Marval, 450 FF).
Do veterano John Batho, produzindo imagens compósitas de rochas batidas pelo mar ou pelo sol, ao projecto de Magdi Senadji sobre uma cabana à beira mar que foi refúgio de Le Corbusier, em Cap-Martin, do parque ornitologico fotografado por Frederic Schwalek aos banhistas nas dunas de Cap Ferret vistos por Vincent Monthiers, ou aos rochedos da Córsega de Marcello Fortini, o panorama é de uma grande diversidade de temas e de linguagens, mostrados em competentes provas de exposição. Testemunho de uma política de preservação do património natural, informação sobre algumas reservas naturais ou sítios classificados, manifesto ecológico, este projecto suporta a sua eficácia interventiva na qualificação e rigor dos ensaios fotográficos, ao mesmo tempo que lhes assegura as condições de liberdade criativa.
Thierry Girard e Frédéric Bellay (um dos fotógrafos que passaram por Coimbra), ambos com imagens a cores, Depardon e Plossu, são outros dos nomes implicados numa encomenda que prossegue a tradição francesa das missões fotográficas, depois ou a par dos projectos Datar e Transmanche. É um panorama que não se improvisa.
Igualmente significativo é a exposição «D'Est en Ouest, chemins de terre et d'Europe», encomenda do ministério francês da agricultura e das pescas, que encarregou seis fotógrafos de diferentes origens de fotografar aldeias e pequenas cidades no momento da transição política e económica, na sequência de um anterior projecto (já parcialmente apresentado em Coimbra, em 1992) sobre as zonas agrícolas da Europa comunitária.
Recentemente exposto na Biblioteca do Centre Pompidou, o projecto reuniu Anthony Suau, Klavdij Sluban (que em Outubro último expôs no Institut Franco-Portugais uma visão pessoal de Lisboa ), a mexicana Graciela Iturbide, Paulo Nozolino, Stéphane Duroy, Yvon Lambert. Parece justo destacar a qualidade das fotografias feitas na Polónia por Nozolino, onde se suspendem todas os efeitos de reconhecimento para propor a atenção ao que se passa nas imagens, acontecimentos luminosos, ou rituais, conjunções de sinais, irrupções de um negro invasor.
Já «Beyrouth, Centre Ville» é um projecto com características algo diferentes, uma mega-operação fotográfica promovida no final da guerra e na perspectiva de uma reconstrução do centro histórico de Beirute a que não faltavam suspeitas de especulação fundiária. A encomenda, suficientemente atraente para fazer Robert Frank retomar a máquina fotográfica, proveio de uma Fundação Hariri, tutelada pelo milionário chefe do governo libanês Rafic Hariri, e foi exposta no início de 1993 no Centre National de la Photographie, então no Palais de Tokyo, com uma dimensão muito mais monumental do que a versão abreviada que se vê no Edifício das Caldeiras (aliás, um local demasiado húmido para apresentar fotografias), acompanhada por um album luxuoso (ed. du Cyprès, 490 FF).
Neste caso, as próprias condições da reportagem, ou pseudo-reportagem, realizada durante 20 dias em cerca de um quilómetro quadrado de ruas destruídas e edifícios esventrados, mas habitados por uns quantos milhares de «skatters» que eram mantidos pela polícia à distância dos fotógrafos, abrem um largo campo de interrogações sobre a verdade do documento e as razões das encomendas. No entanto, René Burri, com um olhar de pintor, e Raymond Depardon, usando também a cor, Robert Frank, interrogando-se sobre o seu papel no projecto, Gabriele Basilico e o libanês Fouad Elkoury formam um elenco de luxo para o último registo de uma cidade martirizada, entre 1975 e 1990, por sucessivas guerras.
QUATRO AUTORES
Às três colectivas de importação somam-se ainda quatro exposições monográficas que sumariam a obra de quatro autores americanos importantes a diversos títulos na tradição da fotografia da cidade e da paisagem social.
De Paul Strand (1890-1976) apresenta-se na Torre de Almedina o Mexican Portfolio, uma preciosa edição litográfica de 1940. São fotografias realizadas num período de grande empenhamento social, indicativas da atracção que a revolução mexicana exercía na esquerda americana, como confirma o prefácio de Siqueiros; por outro lado, é uma oportunidade rara de contacto com a materialidade diferenciada dos processos de impressão, a qual acentua aqui, depois das pesquisas abstractas, o reencontro intencional com o exemplo pioneiro de Hill e Adamson.
Na Torre de Anto (é preciso subir muito para chegar aos dois pontos mais altos dos Encontros) vê-se uma óptima selecção de apenas 16 imagens de Walker Evans (1903-1975), datadas dos anos 28 a 46 e reunidas sob o título «Visões Urbanas». São retratos anónimos no Metropolitano de 38-41, feitos com uma câmara de 35 mm escondida debaixo do casaco, paredes de cartazes de cinema rasgados, garagens e torres metálicas, encontros de acaso onde a indiferença ou frieza da observação torna consciente o acto de ver e de enquadrar como parte do assunto, contra toda a «arte supérflua». A objectividade como acontecimento e «transcendência».
A Garry Winogrand (1928-1984) coube o espaço impróprio de um bar e um conjunto ocasional de provas oriundas da Pace MacGill Gallery, dois factores menos propícios ao conhecimento de um dos protagonistas da fotografia americana e da renovação da «social landscape» dos anos 60. Stephan Shore (n.1947), um dos fotógrafos das «New Topographics» (1973), a par de Lewis Baltz e Robert Adams, é mostrado em Montemor-o-Velho (mas o horário não foi cumprido no passado domingo). «Espaços Invulgares» não será talvez o título certo para as suas imagens a cores de cidades banais ou da paisagem do oeste invadida por estradas, letreiros e gasolineiras.
As quatro individuais podem ser vistas, afinal, como complemento crítico da ideia central desta edição dos Encontro, sinalizando quatro momentos-chave da história fotográfica americana contra os pretenciosismos retóricos de muitos projectos de «levantamento», suas ambições e rotinas.
Outras presenças portuguesas foram ainda acolhidas nos Encontros. À margem do núcleo temático local, Ana Carla Matos mostra em «Fragmentos Russos», de 1992-93, imagens de viagem e observações do quotidiano urbano. Duas outras exposições autonomizam mais itinerários pela região: «Figuras da Fé» reune duas reportagens sobre manifestações de religiosidade popular — Adriana Freire fotografou a romaria de Santa Helena de Tarouca e Luisa Ferreira as festas da Rainha Santa em Coimbra. Sob o título «Vestígios», com catálogo próprio, a Serra de Sicó e as ruínas de Conímbriga são mostradas no respectivo Museu Monográfico, em projectos de Jean-Pierre Bonfort e de José Francisco Azevedo que contrariam as intenções mais documentais para priveligiarem uma algo ensimesmada intimidade dos olhares.
E esta é também uma oportunidade para ver como as obras há quatro anos interrompidas na Casa dos Repuchos da cidade romana deixam os mosaicos mais importantes em risco de não sobreviverem ao mandato de Santana Lopes. Deles restarão, no entanto, fotografias.
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JARDINS DO PARAÍSO, no CCB (da edição de 93)
22 Jan. 1994
Chegou
ontem a Lisboa a exposição central dos últimos Encontros de Coimbra,
que foi coproduzida pelo CCB e comissariada por Gabriel Bauret e Albano
Silva Pereira, sob a égide do «espírito dos lugares», ou com o
propósito de sublinhar a existência alargada de um renovado interesse
pela fotografia da paisagem. Com Robert Frank (inéditos), Emmet Gowin,
Mark Klett, Lewis Baltz e Ruth Thorne-Thomsen, Chris Killip, John
Davies, Hamish Fulton e Boyd Webb, Luigi Ghirri, Mimmo Jodice e
Gabriele Basilico, Gilbert Fastenaekens, Hiroshi Sugimoto, Humberto
Rivas e Jorge Molder, aqui se reunem diversíssimas abordagens da
paisagem natural e urbana, da denúncia do impacto social da
desindustrialização inglesa por Chris Killip até às vistas aérias
apocalípticas de Mark Klett. Tomando por guia o minimalismo de Lewis
Baltz (ou a lição de Walker Evans revista no contexto dos anos 70), a
exposição é essencialmente a oportunidade de descoberta ou reencontro
de alguns grandes fotógrafos.
29 Jan. 1994
A exposição central
dos últimos Encontros de Coimbra foi objecto de uma notável remontagem
no CCB, feita por José Teixeira com a colaboração de Eduardo Souto
Moura, e veio inaugurar uma nova galeria que terá óptimas condições
para fotografia e desenho, quando forem corrigidos os sistemas de
iluminação e ar condicionado. O grande espaço longitudinal disponível
conduziu a um reordenamento da sequência dos autores, que se confrontam
agora em grupos de dois — com grande acerto de escolhas — e permitiu,
em especial, o alargamento da representação de Jorge Molder (o qual,
aliás, introduziu uma significativa alteração num dos seus trabalhos),
colocado diante das fotografias também urbanas do inglês Chris Killip.
Entretanto, Lewis Baltz deixou agora de «prefaciar» o discurso
expositivo e foi, pelo contrário, colocado no seu termo, diante dos
inéditos de Robert Frank. Coproduzida pelo CCB e comissariada por
Gabriel Bauret e Albano Silva Pereira, a exp. inclui ainda Emmet Gowin,
Mark Klett, Ruth Thorne-Thomsen, John Davies, Hamish Fulton, Boyd Webb,
Luigi Ghirri, Mimmo Jodice, Gabriele Basilico, Gilbert Fastenaekens,
Hiroshi Sugimoto e Humberto Rivas, e é não só a oportunidade de
apresentação de alguns grandes fotógrafos pouco divulgados como a
demonstração de uma situação actual de reconsideração da paisagem,
iluminada por uma nova atenção à degradação dos ambientes físicos e
sociais.
19-02- 1994
A exposição central dos Encontros de
Fotografia de Coimbra: uma importante colectiva internacional sobre a
fotografia de paisagem, marcada por uma nova consciência ecológica e
por renovadas atitudes documentais.
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