1 - Expresso/Cartaz de 17/11/2001
Uma feira ibérica
Invasão espanhola na próxima edição da feira Arte Lisboa
Lisboa também vai ter a sua feira de arte internacional, ou melhor, ibérica, a exemplo do êxito madrileno da Arco. Inaugura na quinta-feira às 17 horas e decorrerá durante cinco dias, na FIL. Dotou-se de um novo nome, Arte Lisboa, a anteceder a designação Feira de Arte Contemporânea, que tinha uma imprópria leitura em inglês, e abandonou a numeração que a identificaria como a 6ª edição, mas a mudança principal é a invasão espanhola.
De seis galerias vindas do outro lado da fronteira, há um ano, passou-se a 28, que ultrapassam as presenças portuguesas (agora 26, em vez de 34), a que se somam uma galeria de Praga (Jiri Svestka, com escritórios em Berlim e Londres) e outra de Belo Horizonte, Circo Bonfim, repetente da edição anterior em que o Brasil foi país convidado. A Espanha não precisou de ser convidada, inundou o júri de admissão com candidaturas. Muitas delas não passaram nas malhas de novos critérios selectivos mais apertados, sem que se estabelecessem quotas por país, mas também ficaram pelo caminho galerias nacionais que tinham antes presença certa. Algumas protestaram.
Com nova organização, que já não é da responsabilidade da Associação de Galerias, a FIL e a comissão consultiva nomeada por esta optaram por travar o crescimento da feira (que só passou de 47 a 56 galerias, sem ocupar todo o pavilhão), para não dispersar em excesso a procura, e impuseram novos critérios de qualidade (de improvável mensuração, é certo), com que se espera vir a atrair de futuro outras galerias internacionais mais distantes. E conta-se que com as galerias espanholas venham também coleccionadores, alguns institucionais, tanto mais que a circulação de artistas portugueses para lá da fronteira já não é só uma miragem. Talvez esse figurino restritivo abra espaço à feira do Porto, que decorreu em Setembro com escassa projecção.
De Portugal vai estar presente toda a primeira divisão das galerias, incluindo a Módulo, que se tem reservado a outros destinos, mas os novos critérios travaram as participações de fora de Lisboa e Porto, com excepção da Mário Sequeira, de Braga. De Espanha, a distribuição é alargada (Barcelona, Valência, Sevilha, Cáceres, Vitória, Vigo, para além de Madrid) e em geral qualificada, mesmo se faltam (ainda?) os nomes contemporâneos e históricos de maior prestígio. Entretanto, neste ano de viragem da Arte Lisboa, aguarda-se que o mercado de arte não acompanhe a recessão de outras áreas.
2 - 24/11/2001
A lógica do mercado
Ano de viragem para a feira de arte de Lisboa, a decorrer na FIL
Lisboa passará a ter a segunda feira ibérica de galerias, consolidando-se, logo atrás da Arco de Madrid, o projecto de um certame internacional com alguma projecção exterior? Assim começava a notícia da feira passada, sob o título «O ano decisivo». Ganha a aposta ibérica, com a presença de 26 galerias espanholas apoiadas pelo «ICEP» local (duas desistiram por motivos acidentais) a empatarem com as portuguesas, a pergunta repete-se perante as diferentes condições de mercado, menos favoráveis, embora sem razões para alarme.
O interesse espanhol, que os mais timoratos verão como mais uma invasão, permitiu elevar os critérios de selecção dos participantes, e o resultado imediato é fazer-se em Lisboa, mesmo se só com a prata ibérica, uma feira de arte com uma qualidade geral muito mais atraente. A FIL assumiu a responsabilidade pela feira, constituiu um júri de selecção, e foi possível definir novas regras que permitem distinguir entre galerias e lojas ou entre primeiro e segundo mercado, isto é, entre quem investe com continuidade na representação e defesa de artistas e quem usa a feira para um comércio avulso beneficiando da actividade dos primeiros (esclareça-se que o segundo mercado, dedicado a obras históricas, é uma actividade respeitável e necessária mas tem outras áreas de actuação). Haverá algumas exclusões periféricas dignas de atenção, que, aliás, se mantiveram silenciosas face à contestação surgida, mas tem-se usado argumentação falsa, já que não se eliminaram artistas, seleccionaram-se galerias, numa fase de crescimento do sector em que a indistinção de patamares de qualidade já não era mais aceitável. Talvez a polémica tenha por consequência trazer mais público à Arte Lisboa.
As feiras passaram a servir de palco à actividade do sector, substituindo-se ao ritmo lento das individuais nas galerias. A mudança não tem só sentido positivo, mas as feiras, e a Arte Lisboa em particular, são uma ocasião privilegiada para fazer o ponto do panorama criativo. Sem esquecer que a conjuntura económica menos favorável recomenda que se ofereçam produtos de uma gama de preços mais acessível e também que o «fast market» favorece a arte rápida, ou descartável.
Será por isso que o panorama espanhol não é exactamente a representação mais sólida, embora compareçam galerias com notoriedade. Como Carles Taché, de Barcelona, com uma litografia de Miró e pinturas de Saura e Broto, ou Scully e Morley, entre os poucos nomes não ibéricos presentes; ou Pepe Cobo e Rafael Ortiz, de Sevilha, Tomás March, de Valência, Miguel Marcos, de Barcelona, ou a Visor, de Valência, dedicada à fotografia. De fora da península, faltando a galeria brasileira anunciada, resta uma representação de Praga, com artistas históricos e actuais do país e também Dan Graham e Tony Cragg.
Às periferias espanholas responde o centralismo de Lisboa e Porto, com a excepção bracarense de Mário Sequeira e as suas apostas internacionais: uma imensa paisagem de Alex Katz (que só não será o recorde de preço da feira porque a Alvarez expõe uma boa tela de Vieira da Silva que se vende por 80 mil contos), mais Baselitz, Richard Long, Clemente e Tàpies. E faz-se notado o regresso da Módulo às feiras nacionais, com larga presença da fotografia (Duarte Amaral Netto em estreia) e a «transferência» de Sandra Quadros, que regressa com interessantes trabalhos sobre papel.
Na Quadrado Azul aparecem as fotografias de Paulo Nozolino do projecto «Solo», o qual vai expor em Janeiro na galeria do Porto e na Maison Européenne de Paris, e também os desenhos de Jorge Queiroz. Sem espaço para registar estabilidades (a 111 com Batarda, Graça Morais, Fátima Mendonça, etc.) ou recentes movimentações, como as das galerias Filomena Soares (com António Sena) e Cristina Guerra (com vídeos de João Onofre e Rui Toscano), não se deixam sem menção, na Pedro Cera, as pinturas da brasileira Beatriz Milhazes e de Cristina Robalo, numa escolha pessoal, como devem ser as que numa feira se fazem.
3 - 1/12/2001
À margem da crise
A AIP iniciou uma colecção de arte para apoiar a feira de Lisboa
Pairam nuvens negras sobre a economia, e outras recentes feiras de arte estrangeiras conheceram dificuldades. Em Lisboa, o mercado escapou à recessão e as vendas das galerias portuguesas atingiram montantes satisfatórios ou excelentes, conforme os informadores, enquanto as espanholas, em geral, se declaravam menos satisfeitas. Não há números oficiais, porque neste tipo de mercado a maioria dos compradores não sai com as obras debaixo do braço e muitos negócios concretizam-se discretamente. Não se vendem só as peças expostas, mas igualmente outras existentes em acervo e também se reservam produções futuras.
Algumas galerias confidenciaram dezenas de milhares de contos de vendas, outras ficaram-se por uma só dezena ou uma mais vaga apreciação positiva. Entretanto, investigando os níveis de preços, observa-se que são maioritariamente as obras de jovens artistas, com valores entre os 300 e os mil contos, aquelas que sustentam a agilidade do mercado. Peças de maior vulto foram transaccionadas, até aos 80 mil contos de uma tela de Vieira da Silva, mas é o segmento ocupado por artistas de recente revelação ou em fase de ascendente notoriedade, mesmo se com limitado impacto público, que faz movimentar um número crescente de coleccionadores compulsivos, presentes logo antes e durante a inauguração da Arte Lisboa.
Mais do que um público alargado, que dispunha de uma oferta de originais a partir de uns módicos 30 contos, e quase ausentes as instituições, que atravessam limitações orçamentais (entretanto, o Instituto de Arte Contemporânea deixou de financiar a feira), existe um número significativo de coleccionadores que segue atentamente a aparição de novidades e esgota as produções dos novos talentos. Como não se é jovem artista por muitos anos, esta dinâmica tem efeitos presumivelmente perversos, mas é uma das reconhecidas características de um mercado que agora se polariza em torno das feiras, em vez do ritmo lento e continuado que por muito tempo caracterizou a actividade das galerias.
Entretanto, Associação Industrial Portuguesa, responsável pela Arte Lisboa, deu início à formação de uma colecção, apoiando desse modo a própria feira, como acontece em Madrid com a Fundação Arco. Partindo da verba inicial de dez mil contos, aplicou-os na compra de uma peça histórica de Jorge Pinheiro, uma pintura recortada de inspiração Op (por cerca de 7 mil contos, na Gal. Palmira Suso), mais dois desenhos de Jorge Queiroz (Quadrado Azul), uma tela de José Loureiro (Cristina Guerra) e uma escultura, uma «boneca» articulada e móvel, de João Pedro Vale (Módulo). A selecção, feita por uma equipe de cinco pessoas (quatro ligadas à AIP e o director do Museu do Chiado), foi muito criticada pelos galeristas da comissão consultiva da feira, por ter concentrado o capital numa peça única e esquecer as galerias espanholas. Arranjaram-se mais 3500 contos para corrigir a segunda queixa, adquirindo-se nos últimos dias obras de Lluís Hortalà, Curro Gonzalez, Néstor Sanmiguel, Almudena Fariña e Xawery Wolsky, um artista polaco.
Para as galerias espanholas, de facto, a avaliação do êxito comercial da feira é, em geral, muito menos ou muito pouco positiva, como por muitos anos teria acontecido com as portuguesas em Madrid se não fossem seguidas por coleccionadores nacionais. O peso dos mercados locais, salvo algumas excepções pontuais, é outro dos dados a ter em conta. Se a qualidade da feira e a beleza da cidade eram reconhecidas por todos, a certeza de um regresso não era universal. Tomas March (Valência) e Alejandro Sales (Barcelona) declaravam-se desiludidos, Carlos Taché (Barcelona), que vendeu pinturas de Sean Scully e Broto, ficou agradado, a Vértice, de Oviedo, conheceu um grande sucesso com os seus artistas pouco mediatizados.
Quanto à afluência de público, 15.300 entradas representam um ligeiro decréscimo em relação ao ano anterior. As insuficiências da informação voltaram a ser notórias, mas, salvo o caso excepcional de Madrid, uma feira de arte não é um evento de grandes massas e, por exemplo, a FIAC de Paris, solidamente implantada, fica pelos 70 mil visitantes. Para a AIP, para quem o certame é um investimento estratégico e não imediatamente comercial, a Arte Lisboa tem um balanço positivo e a fórmula de uma feira selectiva e de pequena dimensão é para continuar. Alargar os convites a galerias de um maior número de países é o objectivo para 2002.
4 - 1/12/2001
À margem da crise
A AIP iniciou uma colecção de arte para apoiar a feira de Lisboa
Pairam nuvens negras sobre a economia, e outras recentes feiras de arte estrangeiras conheceram dificuldades. Em Lisboa, o mercado escapou à recessão e as vendas das galerias portuguesas atingiram montantes satisfatórios ou excelentes, conforme os informadores, enquanto as espanholas, em geral, se declaravam menos satisfeitas. Não há números oficiais, porque neste tipo de mercado a maioria dos compradores não sai com as obras debaixo do braço e muitos negócios concretizam-se discretamente. Não se vendem só as peças expostas, mas igualmente outras existentes em acervo e também se reservam produções futuras.
Algumas galerias confidenciaram dezenas de milhares de contos de vendas, outras ficaram-se por uma só dezena ou uma mais vaga apreciação positiva. Entretanto, investigando os níveis de preços, observa-se que são maioritariamente as obras de jovens artistas, com valores entre os 300 e os mil contos, aquelas que sustentam a agilidade do mercado. Peças de maior vulto foram transaccionadas, até aos 80 mil contos de uma tela de Vieira da Silva, mas é o segmento ocupado por artistas de recente revelação ou em fase de ascendente notoriedade, mesmo se com limitado impacto público, que faz movimentar um número crescente de coleccionadores compulsivos, presentes logo antes e durante a inauguração da Arte Lisboa.
Mais do que um público alargado, que dispunha de uma oferta de originais a partir de uns módicos 30 contos, e quase ausentes as instituições, que atravessam limitações orçamentais (entretanto, o Instituto de Arte Contemporânea deixou de financiar a feira), existe um número significativo de coleccionadores que segue atentamente a aparição de novidades e esgota as produções dos novos talentos. Como não se é jovem artista por muitos anos, esta dinâmica tem efeitos presumivelmente perversos, mas é uma das reconhecidas características de um mercado que agora se polariza em torno das feiras, em vez do ritmo lento e continuado que por muito tempo caracterizou a actividade das galerias.
Entretanto, Associação Industrial Portuguesa, responsável pela Arte Lisboa, deu início à formação de uma colecção, apoiando desse modo a própria feira, como acontece em Madrid com a Fundação Arco. Partindo da verba inicial de dez mil contos, aplicou-os na compra de uma peça histórica de Jorge Pinheiro, uma pintura recortada de inspiração Op (por cerca de 7 mil contos, na Gal. Palmira Suso), mais dois desenhos de Jorge Queiroz (Quadrado Azul), uma tela de José Loureiro (Cristina Guerra) e uma escultura, uma «boneca» articulada e móvel, de João Pedro Vale (Módulo). A selecção, feita por uma equipe de cinco pessoas (quatro ligadas à AIP e o director do Museu do Chiado), foi muito criticada pelos galeristas da comissão consultiva da feira, por ter concentrado o capital numa peça única e esquecer as galerias espanholas. Arranjaram-se mais 3500 contos para corrigir a segunda queixa, adquirindo-se nos últimos dias obras de Lluís Hortalà, Curro Gonzalez, Néstor Sanmiguel, Almudena Fariña e Xawery Wolsky, um artista polaco.
Para as galerias espanholas, de facto, a avaliação do êxito comercial da feira é, em geral, muito menos ou muito pouco positiva, como por muitos anos teria acontecido com as portuguesas em Madrid se não fossem seguidas por coleccionadores nacionais. O peso dos mercados locais, salvo algumas excepções pontuais, é outro dos dados a ter em conta. Se a qualidade da feira e a beleza da cidade eram reconhecidas por todos, a certeza de um regresso não era universal. Tomas March (Valência) e Alejandro Sales (Barcelona) declaravam-se desiludidos, Carlos Taché (Barcelona), que vendeu pinturas de Sean Scully e Broto, ficou agradado, a Vértice, de Oviedo, conheceu um grande sucesso com os seus artistas pouco mediatizados.
Quanto à afluência de público, 15.300 entradas representam um ligeiro decréscimo em relação ao ano anterior. As insuficiências da informação voltaram a ser notórias, mas, salvo o caso excepcional de Madrid, uma feira de arte não é um evento de grandes massas e, por exemplo, a FIAC de Paris, solidamente implantada, fica pelos 70 mil visitantes. Para a AIP, para quem o certame é um investimento estratégico e não imediatamente comercial, a Arte Lisboa tem um balanço positivo e a fórmula de uma feira selectiva e de pequena dimensão é para continuar. Alargar os convites a galerias de um maior número de países é o objectivo para 2002.
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