10/8/2002
O mundo a cores
Retrospectivas em Londres de Ansel Adams e William Eggleston
(Hayward Gallery. Até 22 Set.)
A retrospectiva do centenário de Ansel Adams viajou para Londres e mostra-se até 22 de Setembro na Hayward Gallery. Na «Revista» de 6 de Abril, Jorge Calado já apresentou o fotógrafo e a revisão da sua obra proposta por John Szarkowski, primeiro inaugurada no Museu de Arte Contemporânea de São Francisco. O périplo continuará por Berlim, Los Angeles e Nova Iorque.
Em simultâneo, outra retrospectiva de um grande fotógrafo norte-americano, menos conhecido mas também seminal, ocupa as grandes salas do piso térreo da galeria do South Bank: a de William Eggleston, um dos principais responsáveis pela afirmação e reconhecimento da fotografia a cores. Por sinal, foi o mesmo Szarkowski, então director do departamento de fotografia do MoMA, quem incentivou as suas experiências com a cor, no final dos anos 60, e depois organizou, em 1976, a exposição individual no Museu de Nova Iorque onde expôs pela primeira vez as suas «dry-transfer prints».
A cor foi explorada desde meados do século XIX, entrou nos magazines nos anos 30, impôs-se em 1945 nos domínios da fotografia aplicada (publicidade, moda, fotojornalismo) e foi adoptada pelos amadores ao longo da década de 70. Apesar de o MoMA, sob a anterior direcção de Steichen, já ter exposto em 1962 Ernst Haas (Viena, 1921 – Nova Iorque, 1986; membro da Magnum e famosíssimo colaborador da «Life»), foi a mostra de Eggleston que ficou reconhecida como uma viragem na história da fotografia, consagrando a cor como forma de arte.
Para além do poder do director, esse é o momento em que a circulação da fotografia nos museus e nas galerias de arte ganha uma importância substancial para a respectiva prática. Eggleston não fizera carreira na imprensa antes de ser descoberto pelo MoMA e as suas imagens, que se divulgam em «portfolios» de edição restrita e em livros de autor, correspondem a uma nova condição de fotógrafo artista. Por outro lado, as suas fotografias estabelecem com a cor uma relação como que fundadora: na «banalidade» dos seus temas, não representam um embelezamento a cores do real, surgem de um mundo visto a cores e não existiriam sem elas.
No momento em que a fotografia inclui definitivamente o universo das «Belas Artes» (depois de o ter procurado alcançar antes inúmeras vezes), as imagens de Eggleston (cor)respondiam à estetização da fotografia pelo mercado de arte com uma iconografia do que há de mais trivial e vernacular na paisagem e no quotidiano do sul dos Estados Unidos. Por vezes, há pontos de vista inesperados (enquadramentos descentrados e cortados, alturas insólitas da câmara, ângulos estranhos), mas eles não surgem como artifício utilizado para desbanalizar o banal: uma banca de cozinha, um vestido pendurado, um triciclo abandonado, um velho anúncio na paisagem, o «close up» do interior de um congelador. Tudo «perfeitamente aborrecido», disse-se.
Nascido em 1939 em Memphis, Tennessee, onde ainda reside, admirou Robert Frank e Cartier-Bresson no início do seu trabalho, mas foi já influenciado pela geração do pós-guerra, em especial por Garry Winogrand e Lee Friedlander, e é contemporâneo dos fotógrafos da «Nova Topografia». Por sua vez, reconhece-se que inspirou David Lynch, Martin Parr e Nan Goldin (a qual o fotografa no catálogo, num quarto de hotel em Paris).
A retrospectiva de 250 provas é acompanhada por um catálogo editado pela Fondation Cartier de l'Art Contemporain e Thames & Hudson (£29.95), com mais de 150 fotografias a cor e, as mais antigas, também a preto e branco.
Comments