COLABORAÇÃO DE PEDRO REIS, EM NOVA IORQUE (2)
Desde há algum tempo que os Estados Unidos, e em particular Nova Iorque, passaram a integrar o roteiro de residências artísticas e exposições de artistas portugueses.
Para além de virem complementar os seus estudos, alguns conseguem atrair a atenção de curadores e de espaços de arte - galerias, museus ou simplesmente espaços culturais ou associações de artistas - quando da sua participação em residências artísticas (daí a necessidade da existência de prémios e bolsas, que pelo menos dêem essa oportunidade aos artistas de poderem estar aqui durante algum tempo e terem contacto com a realidade local).
Neste momento gostaria de destacar o trabalho de alguns artistas nacionais, nomeadamente de Catarina Leitao, Carlos Bunga e Miguel Palma.
"Portable Private Garden", de Catarina Leitao
Catarina Leitão, para além de ter tido uma exposição individual na galeria Number 35 ( link ), que abriu recentemente no Lower East Side, fez também parte da exposição "Human Resources" terminada no fim de semana passado, comissariada por Sara Reisman, que juntou vários artistas que fizeram residências no LMCC durante os últimos anos.
O trabalho que apresentou remete para o que foi também apresentado no espaço Wave Hill ( link ), há cerca de dois anos, intitulado Portable Private Garden. De mencionar que o espaço da exposição não era um espaço nada fácil (comparável talvez ao espaco do BES no numero 211 da Avenida da Liberdade, mas que ainda assim tem mais carisma) e que no meio do caos do que restou de uma loja na zona do Seaport, o "jardim portátil" da Catarina se destacou dos restantes trabalhos. Por acaso, quando vi a fotografia do trabalho do João Pedro Vale na Bienal de Sevilha lembrei-me deste trabalho, pois existem algumas semelhanças, talvez pela sua forma orgânica e uso de materiais semelhantes. (www.catarinaleitao.net )
Carlos Bunga durante a apresentação no New Museum (Foto Pedro Reis)
Carlos Bunga, que teve a oportunidade de vir para Nova Iorque com
apoio da Fundação Ilídio Pinho, tem vindo a ter uma enorme atenção por
parte do público e agentes de arte nova-iorquinos. Em primeiro lugar,
pela participação na exposição "Unmonumental" – a exposicao inaugural
no novo e controverso New Museum - que o colocou num
diálogo de igual para igual com artistas de outros países. De notar que
era o único português a participar nesta exposição. O convite partiu de
Massimiliano Gioni, o curador que organizou esta exposição e com quem
já trabalhara anos antes, durante a Manifesta 5.
Carlos Bunga teve
ainda a oportunidade de falar com alguns dos mecenas do New Museum (os
chamados producers). Nesta conversa aberta, inserida num programa orientado para os respectivos“financiadores”, com vista a aproximá-los
do trabalho dos artistas que de alguma forma estão integrados no programa actual do Museu, Carlos Bunga mostrou à audiência a evolução
do seu corpo de trabalho (usando documentação pessoal em video e
fotografia), até às peças presentes na exposição, desvendando ainda
alguns dos novos trabalhos com que irá participar no Arco.
"More space for another construction", de Carlos Bunga
De
notar que para além de os participantes terem ficado com uma maior
consciência do trabalho deste artista, tambem demonstraram um grande
interesse nos seus novos trabalhos de pintura, desenho e video (longe
do suporte que nos foi habituando).
Neste programa de um dia, incluiam-se ainda a visita aos estudios de Amy Grand (uma video-artista) e do pintor George Condo.
"Its up to all of us", Miguel Palma (Foto Pedro Reis
Miguel Palma encontra-se neste momento a fazer uma residência no programa ISCP para artistas, também com o apoio da Fundação Ilídio Pinho, e tem aproveitado o facto de estar em Nova Iorque para desenvolver novos trabalhos de desenho e instalação, tendo alguns convites garantidos para exposições aqui e ainda para uma bienal noutra cidade americana. Percebe-se que, apesar dos convites, o artista sofre pelo facto de ser português, não tendo sempre os apoios que seriam necessários para que lhe fosse possível ir ainda mais longe, em termos de participações neste pais. É nestas alturas que se sente a fragilidade de “acordos tripartidos” ou dos Institutos que deviam promover a arte e cultura portuguesas além fronteiras. Contudo, sente-se um enorme optimismo da sua parte.
Este artista, bem como Carlos Bunga e outros 18 artistas (José Carlos Teixeira, Rui Toscano, Pedro Valdez Cardoso, António Caramelo, André Cepeda, Teresa Furtado, João Leonardo, Dina Campos Lopes, Manuel Santos Maia, Eduardo Matos, Marta de Menezes, Rodrigo Oliveira, Nuno Pedrosa, Ana Perez-Quiroga, Pedro Portugal, Rui Valério, Filipa Rocha da Silva, António e Paula Raes Pinto), participa também na exposição organizada pela Galeria Faulconer, no Iowa, chamada "Where are you from? Contemporary Art from Portugal" ( www.grinnell.edu/faulconergallery e algumas imagens aqui ).
Segundo Miguel Palma, houve uma recepção muito favorável tanto por parte da comissária que
organizou a exposição, Lesley Wright, como dos alunos da Grinell
College que a visitaram, chegando a dizer que esta teria sido a
melhor exposição que viram em três anos naquele espaço. A Galeria
Faulconer e’ um espaço de exposição de artes pertencente ao Grinell College (que tem entre outros um curso de Artes), tendo a sua própria colecção assim como uma programação cuidada, que tem vindo a desenvolver desde 1999. Por este espaço já passaram, entre outros, William Kentridge e Susan Skoglund.
Esta exposição, sim, contou com o apoio de várias entidades portuguesas, como o Instituto Camões, Ministério da Cultura, Direcção Geral das Artes, Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação Luso-Americana. Apesar do impacto que tem ser algo relativo e discutível, visto que o Iowa não é propriamente um dos estados mais centrais dos Estados Unidos, é de notar tanto a recepção das pessoas que visitaram a exposição como o interesse da comissária que a organizou (ja’ agora ver o "statement" que escreveu sobre esta exposição).
É importante que se apoiem situações como estas, pois mais tarde ou mais cedo acabarão por ter consequências. Como e’ sabido, neste país premeia-se o bom trabalho e existe uma grande mobilidade para os centros económicos e culturais.
Ainda fora de Nova Iorque destaco também a participação de Margarida Correia em exposições, aproximadamente na mesma altura, mas em três diferentes cidades americanas – Woodstock (na exposição "Made In Woodstock IV", no Center for Photography de Woodstock, estado de NY - www.cpw.org / exp. ), Toledo (TFOP 2008 National Juried Photographic Exhibition, University of Toledo's Center for the Visual Arts/Toledo Museum of Art, no Ohio) e em Denton (Joyce Elaine Grant Exhibition na TWU School of the Arts, Texas)
Pormenor de "Dolan", 2006, five C-Prints, dimensions varied, de Margarida Correia
Saliento, mais uma vez, que é necessario que as entidades oficiais continuem a ajudar como têm vindo a ajudar (ou mais ainda) os artistas que escolhem os Estados Unidos ou outros países para desenvolver o seu trabalho. Também se sente a falta da presença de alguma entidade mais oficial nesta cidade. E’ bem sabido que o facto do Instituto Camões existir em conjunto com a Embaixada de Portugal e esta estar localizada em Washington cria um certo afastamento entre a dinâmica cultural de Nova Iorque e apoios mais directos que este Instituto poderia dar aos nossos artistas. Existem vários exemplos de países que entendem a necessidade de participar culturalmente na vida desta cidade, com destaque para o Instituto Suíço para Arte Contemporânea (talvez equivalente a uma FLAD, visto que não é dependente do Governo Suíco, embora receba uma contribuição financeira), no SoHo; o Consulado da Argentina, que tem um espaço contíguo e que funciona como galeria de arte; o Goethe Institute, que dispensa apresentações, assim como o Instituto Cervantes e outros.
Quanto aos artistas, a possibilidade de virem para esta cidade tem vindo a ter os seus frutos, e alguns deles, tendo a oportunidade de mostrar aqui o seu trabalho, são surpreendidos com a reacção que obtêm, quando em alguns casos o seu trabalho não se faz notar dentro de fronteiras (é mal recebido) ou vivem com imensas barreiras internas que os impedem de tornar o seu trabalho mais fecundo.
Colaboração de PEDRO REIS, em Nova Iorque
Caro Alexandre,
Pertinente esta entrada sobre os artistas portugueses e Nova Iorque (só não se percebe se o texto é seu, do Pedro Reis ou conjunto, mas pela escrita creio ser do Pedro Reis). De facto, tardava que as entidades e agentes portugueses notassem o dinamismo da comunidade artística portuguesa nesta cidade; afinal, já não é só em Berlim que alguns artistas portugueses fixaram residência na sequência da residência da Kunstlerhaus Bethanien financiada pela Fundação Gulbenkian. Gostaria de aproveitar esta oportunidade para fazer uns pequenos reparos ao texto - que em nada o beliscam mas que, já agora, vale a pena enunciar – e acrescentar alguns dados. A exposição inaugural do New Museum não foi comissariada apenas pelo Massimiliano Gioni, mas também pelos restantes membros principais do staff curatorial do museu: Richard Flood, Laura Hoptman e Lauren Cornell (esta apenas na componente sonora e “new media”). A visita ao atelier/apresentação do Carlos Bunga inseriu-se nas actividades para os “members” do New Museum, indivíduos que financiam o museu em troca de benefícios e programas especiais, como a visita a ateliers; neste caso concreto, este programa foi conduzido pela Laura Hoptman. O Carlos Bunga já trabalhou em vídeo, quando ainda estava na ESAD, e estas obras revelaram-se importantes na definição dos seus interesses, posteriormente desenvolvidos noutros meios de expressão. O Swiss Institute não pode, nem de longe nem de perto, ser comparado à FLAD; trata-se de um pequeno mas muito dinâmico centro de exposições, financiado pelo governo suíço mas com um programa apenas parcialmente sujeito a este vínculo, já que muitos dos artistas que por lá passam não têm esta nacionalidade; integra a rede de espaços alternativos às galerias comerciais composto por, entre outros, a Art in General, a White Columns e o Artists Space. Outros artistas actualmente a fazer residências artísticas em Nova Iorque: Pedro Barateiro e Mafalda Santos. Outros artistas a viver em Nova Iorque, em situação permanente (que vieram estudar ou fazer residências artísticas e ficaram na cidade): Alexandra do Carmo, Carlos Roque, Rita Sobral Campos, Ricardo Valentim, Susana Gaudêncio, Ana Cardoso, João Simões (espero não estar a esquecer-me de alguém); além, claro, dos já nova-iorquinos Rita Barros, Judite dos Santos e Jorge Colombo. Outros que viveram durante alguns anos mas que residem agora noutras cidades: Jorge Queiroz, Alexandre Estrela, Sancho Silva. Outros que virão em breve: Luís Nobre e, certamente, mais uns quantos...
Abraço,
Miguel
Posted by: Miguel Amado | 02/11/2008 at 21:14
Não percebo as dúvidas sobre a autoria do texto, uma vez que vem a mesma identificada três vezes (o que comecei por achar excessivo e afinal não bastou!): no título, no início e no fim. Mas ainda bem que você veio acrescentar alguns dados a uma colaboração que sublinhou acontecimentos recentes ou em curso, sem pretender esgotar os respectivos temas - espero que haja matéria e oportunidade para mais notícias e comentários próximos. E não se terá esquecido você do Pepe Diniz e do Martim Avillez? Obrigado pela sua disponibilidade e participação.
Posted by: ap | 02/12/2008 at 00:16
Olá Miguel,
Obrigado pelas correcções.
Relativamente à enumeração dos artistas, não quis fazer uma resenha histórica ou mostrar uma perspectiva global, mas sim de falar de algumas pessoas que na minha opinião estão a fazer um trabalho interessante e que merece ser destacado (como mencionei no início do texto, aliás) - não querendo dizer com isto que as outras não o estão.
Espero que todos estes artistas, e já agora curadores (como é o teu caso ou ainda, por exemplo, a nossa amiga Rita Palma, que passou por aqui ainda há bem pouco tempo), tenham enorme sucesso na sua estadia permanente ou passagem por esta cidade.
Ja' agora e porque mencionaste os nomes da maioria das pessoas que cá estão neste momento, gostava de acrescentar o Nuno de Campos e a Isabel Pavão, também.
Gostava também de te agradecer pelo feedback, pois entendi pelo teu comentário que talvez tenhas ficado com a impressão que me reduzi demasiadamente a apenas estes três artistas e à exposição do Iowa (da qual fizeste parte, se não estou enganado), quando muitas outras coisas aconteceram há tão pouco tempo, como o "Stream", por exemplo, mas achei que não seria aqui a altura de fazer um texto muito exaustivo, visto que a cidade é muito dinâmica, como bem sabes, e existirão sempre temas interessantes a abordar.
Pedro
Posted by: Pedro dos Reis | 02/12/2008 at 01:06
Caro Alexandre,
Talvez fosse melhor escrever "texto de Pedro Reis" em vez de "colaboração de Pedro Reis", pois esta última expressão pode, por exemplo, significar que o Pedro Reis lhe forneceu alguns elementos com os quais redigiria um texto da sua autoria, como aliás se espera na medida em que o "post" é seu e o texto do Pedro não aparece como um comentário. Adiante, porque se tratam apenas de detalhes e das condições fluidas de leitura e escrita de "blogs". Seguem algumas observações extra, que espero que enriqueçam o que já foi dito sobre este assunto. O meu comentário destinava-se não a colocar em causa o que o Pedro disse mas a complementar as suas observações. Pretendia, assim, salientar que os artistas que o Pedro destaca não constituem casos isolados, mas integram uma dinâmica que surgiu já há algum tempo e que certamente continuará. Tal deve-se ao facto de a Fundação Gulbenkian e a FLAD financiarem, todos os anos, duas residências artísticas de seis meses (e de outros artistas conseguirem diversos apoios para passarem temporadas em Nova Iorque, como aconteceu com o Carlos Bunga e o Miguel Palma e acontecerá com o Luís Nobre, que obtiveram fundos da Fundação Ilídio Pinho em troca de obras para a colecção que esta entidade desenvolve). Mas tal deve-se, sobretudo, ao facto de outros artistas, como a Catarina Leitão, os que mencionei e os que o Pedro acrescentou (eu bem disse que me esqueceria de alguém...) viverem na cidade, participando com maior ou menor intensidade na sua cena artística. Outros há ainda que trabalham parte do ano em Nova Iorque, como o Miguel Ângelo Rocha, que ainda agora expôs duas vezes seguidas na ATM Gallery (com direito a uma recensão na Artforum.com não escrita por mim, o que quer dizer que o seu trabalho, talvez mais do que o de qualquer outro artista, chamou bastante a atenção da comunidade artística local recentemente). E outros expuseram a solo recentemente, como o João Onofre, o Carlos Roque, o Ricardo Valentim, o Edgar Martins ou, antes, o Nuno de Campos (que entretanto saiu da LFL Gallery quando esta se transformou em Zach Feuer), isto para não falar do Julião Sarmento, há muito representado por uma galeria prestigiada. De um ponto de vista crítico, importaria portanto contextualizar mais a situação para não dar a impressão de que havia uns “heróis” a “safar-se” em Nova Iorque, por mais que o trabalho que cada um dos artistas referidos pelo Pedro seja super-meritório. Quanto à exposição no Grinnell College, apenas o reparo de que não participei no projecto, mas que apenas fui convidado a fazer uma visita guiada. Como ainda não a vi, não posso tecer mais comentários; porém, independentemente da boa-vontade de todos os envolvidos, não acredito que traga qualquer coisa de novo à parca visibilidade dos artistas portugueses em Nova Iorque, em particular, e nos EUA, em geral, porque como o Pedro disse – e bem – o Iowa é um estado totalmente periférico e, porque, na minha opinião, exposições do tipo “selecção nacional” são completamente desinteressantes em termos curatoriais e não geram mais do que indiferença – e mesmo desdém – por parte da comunidade artística internacional. O problema, como o Miguel Palma referia ao Pedro, assenta mesmo na infelicidade de se ter nascido em Portugal, não porque o país seja pequeno, mas porque pequenas são a mentalidade, o empenho e o sentido de risco dos portugueses. Infelizmente, para a maioria, o mundo ainda acaba em Vilar Formoso...
Um abraço,
Miguel
Posted by: Miguel Amado | 02/13/2008 at 00:46
Caro Alexandre, Pedro e todos os demais leitores,
Visito diariamente este blog, por todas a razões e mais umas quantas. Gosto do que aqui se lê. Neste momento não estou em Portugal por razões profissionais, mas interessa-me saber o que por lá se passa, pensa e, consequentemente, escreve. Acompanho os apontamentos que o Alexandre vem fazendo.
Confesso que achei uma boa aposta abrir as portas a palavras de outros fora do espaço traçado pela tradição blogueriana pelos comments. Simplesmente porque faz respirar o que ali se escreve e, como sabemos, ao contrário do inbreeding, diálogos saudáveis, que promovam outros contextos, só enriquecem.
Parece-me que o Alexandre tem a capacidade editorial para tomar decisões com qualidade e estou pasmada com este fuzz acerca da autoria do post. É óbvio desde o começo, e como o Alexandre já apontou, até de um modo excessivo, mas pelos vistos o | e v i d e n t e | não o é para todos.
Assim, colaboração é no blog, colaboração é na distância, colaboração é no ponto de vista, que é, de resto assumido como pessoal, colaboração é um texto/post pessoal e transmissível…
Seria bem mais profícuo para todos que em vez de "reparos" à boa moda escolástica se apontassem pistas, novas entradas. De resto, os detalhes são sempre bem vindos, mas fiquei com a sensação que o texto do Pedro Reis tinha como intenção dar uma visão pessoal e global daquilo que ele entendeu que merece ser destacado relativamente aos pontos de encontro entre a comunidade artística portuguesa em NY, a cidade e, consequentemente, o mundo.
Finalmente, gostava de referir que, sendo NY um dos principais centros criativos no domínio das artes visuais, talvez fosse interessante, abrir um espaço de discussão sobre o que está acontecer, como se processam esses pontos de comunicação, o que se faz, onde acontece.
Um abraço a todos,
Joana
Posted by: Joana | 02/13/2008 at 19:32
"[...] indivíduos que financiam o museu em troca de benefícios..." — É só hipocrisia. Onde está a autonomia da arte? Pois... os hippies transformam-se em yuppies!
Posted by: lj | 06/07/2013 at 09:57