SESSÃO 01
09 de Abril de 2008 (4ª) – 21h00
Projecção do filme
“Olho de Vidro – Uma História da Fotografia”,
de Margarida Gil e António Sena, 1982 (90’)
Produção RTP - estreado em 16 e 17 de Abril de 1982
Conferencistas
Margarida Gil (realizadora), Margarida Medeiros, Tereza Siza
Ver aqui comunicado de apresentação do filme em 1982
APRESENTAÇÃO
O projecto Prata - Reflexões Periódicas Sobre Fotografia afirma-se como uma reflexão em torno da Fotografia Portuguesa das últimas décadas e o modo como, analisando alguns dos seus protagonistas, se podem desvendar alterações decisivas no modo de fazer e pensar a prática da fotografia em Portugal, quer pelo seu crescente cruzamento com o domínio das artes plásticas, como pela confirmação de um campo de investigação incontornável para a discussão da particularidade do meio fotográfico e do seu discurso próprio.
Um filme que corresponde a um dos sucessivos começos da animação-informação à volta da fotografia, cuja estreia coincidiu com o início das actividades da associação-galeria Ether. E um filme que é ainda um vestígio do "período revolucionário" pós-74, realizado a partir de 1978, com uma utilização de arquivos à margem das normas correntes sobre autorizações e direitos.
É a primeira história da fotografia do António Sena (uma história parcial e partidária) onde a relação livre e apaixonada com as imagens (disponíveis para todos os usos pessoais) é já a construção de um discurso de autor (autoral e autoritário) sobre a fotografia.
A 2ª sessão é sobre Aurélio Paz dos Reis
Um tema muito interessante e actual:
"...se podem desvendar alterações decisivas no modo de fazer e pensar a prática da fotografia em Portugal, quer pelo seu crescente cruzamento com o domínio das artes plásticas..."
Tenho pena de não poder assistir, pela distância. Mas sem dúvida que gostava de ver esta questão debatida. Estas alterações referidas são "naturais", uma tendência dos artistas ou, por outro lado, uma imposição de agentes menos culturais e mais comerciais? Estas alterações não conduzirão a outra forma de expressão que começa a escapar à definição de fotografia? E deve, por via desta tendência, a fotografia "tradicional" ser cada vez mais ignorada?
Cumprimentos!
Posted by: Mário Nogueira | 04/09/2008 at 09:12
Antes de falar nesse "crescente cruzamento" seria de conhecer o estado anterior da questão, porque ela foi sempre atravessando sucessivas situações diferentes, com momentos de maior e menor cruzamento reconhecido.
Há cruzamentos novos no campo do mercado das artes plásticas (e na sua montra museológica), uma entrada forte da fotografia nesses mercados, porque a dimensão, a dinâmica e as regras desses mercados se alteraram, com base no seu notório crescimento. Aí sim.
Mas há também crescimentos da prática da fotografia (e em especial da sua circulação ou comunicação) que não apontam para o cruzamento com o domínio das artes plásticas, nem para o seu mercado, tal como são habitualmente entendidos, correspondentes à utilização crescente das redes virtuais (Flickr, etc). Essa linha de evolução envolve muito mais produtores de imagens e um nº de imagens incomensuravelmente maior - por aí não há "crescente cruzamento", pelo contrário. Pelo contrário, o domínio tradicional das artes plásticas é contornado por muito diversas práticas, como as street art, as circulações não museologicamente reconhecidas, a fotografia "amadora", etc.
Ou então é o tal "domínio das artes plásticas" que se altera drasticamente incluindo inúmeros praticantes (da fotografia, ou não) que se entendem como artistas/não-artistas indiferentemente.
A fotografia e as artes plásticas foram desde o início contíguas e coincidentes, o que é claro se entendermos como artes (plásticas) muitas das suas áreas "menores", da gravura à tapeçaria, da "grande decoração" à ilustração, e se incluirmos no domínio da arte os artistas de domingo, amadores, outsiders, loucos, etc. Tal como a fotografia tem as suas áreas utilitárias, predominantes, também as artes plásticas as têm, da decoração arquitectónica à representação do poder e da religião.
É muito pouco viável e/ou produtivo pensar que existem fronteiras e alterações substanciais (de substância ou de essência). Como não há definições estáveis, as alterações não conduzem a um exterior da fotografia nem a "ignorâncias" irremediáveis.
Posted by: ap | 04/10/2008 at 02:36
Alexandre,
Mas nao serao alguns dos artistas que usam fotografia tambem eles "fotografos de Domingo", quando usam o meio, mas nao de uma forma que vai ao encontro dos principios teoricos, de composicao e tecnica da Fotografia?
A meu ver, e posso estar errado concerteza, e' a de que o fotografo-artista e' todo aquele que se expressa atraves de imagens fotograficas e que com elas consegue transmitir ideias ou principios esteticos de acordo com a sua mensagem e convinccoes.
Nao me parece que seja necessario que uma pessoa nestas condicoes nao consiga ter um trabalho que possa ser considerado Arte - se quando fotografa o faz conscientemente e tem presentes todas estas questoes que o ligam 'a practica fotografica.
E' que, felizmente, a questao das redes virtuais tem trazido detalhes que sao importantes para a propria fotografia - como sejam a partilha da informacao ao nivel da tecnica.
Desta forma, os "maneirismos" trazidos pela tecnica passam a nao ser uma forma de separacao em termos de arte. Sao quando muito, truques fotograficos ou de pos-producao (tal como antigamente eram realizados nos laboratorios e hoje tendo mais possibilidades com a pos-producao digital).
A acrescentar, penso que a grande dinamica que a Fotografia tem tido como practica (artistica ou nao) tem sido reconhecida pelas editoras e existe uma oferta consideravel de informacao (e com qualidade), sendo mais ou menos acessivel por qualquer um.
Destaco a edicao Vitamin Ph, da Phaidon em que sao mostrados trabalhos de novos fotografos-artistas ou as edicoes da Aperture Foundation.
Paralelamente existem ensaios teoricos e ate' criticos, de autores vistos agora como mais tradicionais, como Barthes, Susan Sontag ou outros que procuraram criar um discurso mais analitico da Imagem Fotografica enquanto uma Linguagem (dando-lhe alguns fundamentos academicos que a ajudaram a justificar como Arte).
Ao nivel das Artes Visuais, tanto o Cinema, como a Fotografia sempre foram contestadas enquanto artes. Porque sao passiveis de ser criadas atraves de meios opto-mecanicos e registados atraves de processos foto-quimicos (e agora digitais).
A questao do uso do Digital e' para mim, quase equiparado 'as divergencias de Rudolph Arhneim (em Film as Art, por exemplo) em relacao ao Cinema Sonoro e a Cores (relativamente ao preto e branco, mudo) ou todas as questoes que tambem estiveram em bases discordantes entre os apoiantes da fotografia a cores e a fotografia a preto e branco... com o tempo desvanecem-se, pois os padroes esteticos assumidos pelos seus utilizadores, "evoluem" na direccao da novidade.
Parece-me que isto sao tudo situacoes "normais" que fazem parte de padroes de evolucao humana ao nivel da percepcao.
Ha' e sempre houve uma tentativa de aproximacao e repulsao do "Real" e as Artes Visuais, nas suas variadas formas tem sido um bom exemplo isso. Umas vezes querendo ser o mais fieis possivel a situacoes que procuram retratar; e outras vezes querendo subverter totalmente essa realidade em conceitos expressados pelos seus executantes (queiram-se chamar artistas ou outra coisa).
Dai que a verdadeita pergunta seja, o que e' Arte afinal?
No presente momento, com uma ampla divulgacao dos meios e partilha dos mesmos por varios sectores sociais; pelo acesso a uma ampla base de aprendizagem tecnico-teorica destes, o que e' separa realmente um Artista de um "Fazedor de Arte"?
Os livros sao os mesmos... porventura as tecnicas do "hobbista"-artista ate' poderao ser mais desenvolvidas, pois como amador, ama a sua arte...
Parece-me a mim, que a diferenca e' a forma de legitimacao do trabalho - seja por criticos ou galerias, feiras...
A forma encontrada nos dias de hoje foi a de trazer para esses espacos ou atencao dessas pessoas, outras que vieram de escolas. No fundo, que tenham referencias que as legitimem enquanto artistas.
Mas isso, parece-me a mim, e' mais uma vontade e uma separacao artificial que culmina nesse processo de legitimacao que outra coisa...
Por acaso tenho ate' um curso de fotografia, mas reconheco que isso nao chega. Foi muito importante ter acesso a exposicoes de bons fotografos, consumir imagens na sua generalidade e ler bastante sobre toda a problematica, assim como a outras em que procuro procurar uma expressao.
E o mais importante - pensando nos textos que li de Walter Benjamin ou ate' Merleau-Ponty e' "treinar" o olho. Penso que este facto muda consideravelmente o que e' a Fotografia.
O saber olhar e saber capturar. O Fotografo e' tambem um cacador de momentos, que ficarao registados e posteriormente arquivados para seu bel-prazer.
Mas tal como um cacador (perdoem-me a falta de pontuacao) nao esta' satisfeito em apenas capturar uma presa. Ele captura ou pretende capturar todas. E' um ser compulsivo por natureza, porque nunca esta' satisfeito.
Isto podera' ir contra certos principios artisticos, ou nao.
Ha' um artista-fotografo que manifesta claramente esta preocupacao e que e' o Andre' Cepeda.
Dai que ele nao use uma maquina digital ou mesmo de filme convencional. Ele usa uma maquina de grande formato e isso significa menos hipoteses e mais consideracoes ao nivel da composicao.
Mas ao mesmo tempo, isso nao invalida que alguem que use uma maquina de 35mm descartavel, nao possa fazer Arte com ela.
No fundo a questao volta sempre ao mesmo ponto... o que e' a Arte, afinal?
Posted by: Pedro dos Reis | 04/14/2008 at 20:24