"O que é o “ALLGARVE”?
É um programa integrado de eventos de animação que pretende, através do life-style, glamour e espirito cosmopolita que estes imprimirão, proporcionar experiências que marquem todos os que nele participarem.
Este programa será promovido tanto em Portugal como no estrangeiro, junto dos turistas potencialmente interessados em aderir ao espírito dos eventos." www.allgarve.pt
Se eu percebesse alguma coisa de marketing, teria opinião sobre o bom senso promocio-cultural do All-garve. Se calhar é um bom achado publicitário, não sei. Mas a invenção do "Poortugal", que agora aparece associada ao tal Allgarve, essa parece-me um êxito seguro. Se não se assemelhasse demasiado a uma reacção provinciana à crise económica que é internacional, valia a pena adoptá-la.
Outro êxito, este do tal Allgarve, pese aos critérios de avaliação do Óscar Faria no Público de hoje, 27: "não foi inaugurado, entretanto <da 1ª para a 2ª edição>, nenhum centro de arte contemporânea na região": estão os seus autarcas no bom caminho. Afinal, os males do Allgarve não são fatais.
O O.F. acha que isso "revela um vazio que impossibilita o aparecimento de um massa crítica local". Pelo contrário. O Algarve precisa de centros de arte contemporâneos, e vai tendo, um em Lagos, outro em Tavira, um novo museu em Portimão, etc, que com uma adequada ideia de contemporâneo, isto é, de actual e de diverso, são capazes de corresponder a interesses variados (que podem incluir tanto a arte antiga como aquela que já se seguiu à pós-moderna (pressas ou nichos), ou o artesanato local, cartazes antigos de cinema ou arquitectura industrial, etc). A "arte contemporânea" é, pelo contário, entendida como um estilo, ou um género, e não precisa de "centros" ou de museus próprios: ficam-lhe melhor as fábricas em vias de demolição, uns armazéns perdidos que se sinalizam para o acto inaugural, as praias. Faz-me lembrar os pintores académicos dos salões do séc, XIX, anualmente adquiridos pelo imperador ou Estado e destinados ao museu, enquanto o que andava por fora da arte oficial se rejeitava. Um dia o contemporâneo deu lugar ao moderno.
Há outras coisas estranhas: se o Allgarve é um programa de muitos e diferentes eventos, com Julio Iglésias, world music, Marisa e tudo, porquê dar tantas páginas do Público às artes plásticas, ou à tal arte contemporânea, que não têm importância nenhuma e não mobiliza ninguém, depois do cortejo inaugural ido de Lisboa e Porto. Já é mania da perseguição.
Abre-se o site oficial allgarve.pt e temos as "Experiências que marcam", os "Eventos de Verão" e, em especial, a divertidíssima canção foleira de Rui Reininho sobre "o mar de cimento" a sul, "o seu a seu dono", etc - interrompida pelo provocatório "Algarve também se cultiva". Vale a pena ouvir. Temos "um programa oficial sujeito a objectivos políticos" - como deve ser -, mas o "marketing estatal" do ministro Manuel Pinho tem um saudável sentido de humor. Aquela cantoria até é arte subversiva, se alguém ainda acredita nisso.
"O orçamento para a edição deste ano do Allgarve é de seis milhões de euros. Faro 2005 custou 5,2 milhões." (Público)
Isto vem lá no meio das sete páginas (até devem ser umas contas trapalhonas, mas não importa) e pouco ou nada tem a ver com a tal arte contemporânea. A capital cultural durava um ano, o Allgarve é um programa de eventos de animação para a época balnear. Não sei se é por coisas destas que o ministro da Cultura dizia que queria fazer mais com menos, ou que o presidente de Serralves (o empresário Gomes de Pinho, mal agradecido) queria acabar com o inútil Ministério da Cultura. O certo é que quem patrocina toda esta animação, o life-style e o glamour é o ministro da Economia, e quem paga é o Turismo, dizem.
Fico com a ideia que o Público se flagela com o programa de artes plásticas para dizer nas entrelinhas que apesar das malfeitorias imperialistas de Serralves, o seu director artístico, João Fernandes, que é também o comissário geral para a arte-animação contemporânea, é "o único curador que tenta pensar criticamente a iniciativa Allgarve" (O.F.). É que, ao contário do que podia prever, tudo está acertadamente programado: Este não é, de facto, nem se esperava que fosse, um evento planeado para o "público especializado que frequenta mostras internacionais, como a Documenta de Kassel", mas sim para "o espectador (turista) ocasional". E ao preencher a programação com "elementos culturais baixos", o que se obtém em poucos anos "é que o 'alto' desaparece e apenas fica o 'o baixo'" (idem), e é isso que se quer. Se dermos uma volta pelas instituições artísticas de Lisboa vemos que o "alto" já é escasso - e em Serralves é raríssimo. Não vale a pena procurá-lo (o "alto") na Gulbenkian, que nos faz passar o Verão com as franjas insignificantes da colecção do Deutsche Bank (ah!, ainda lá está a educação do príncipe Aga Khan...), ou nas múltiplas secções da colecção do Ar.Co, ou nas galerias institucionais (CGD), ou pariculares-miméticas, que o solitário visitante percorre num dia de calor. É tudo assustadoramente baixo, ou mau, com mais ou menos life-style. Não é bem assim em Madrid, que é uma capital. Não de "Poortugal".
Quando comecei a ler o seu artigo não pude deixar de me lembrar de um certo estrangeirismo evidente adoptado pela "P4Photography" com quem, segundo entendi, colabora. A tal gallery que fica em Lisbon...
;)
Posted by: tomé | 06/28/2008 at 01:44