textos do arquivo - história da fotografia, Portugal
notas (a continuar)
Henrique Manuel Botelho, 2002
Jean Dieuzaide 1994
Jorge Henriques 2002
Nuno Teotónio Pereira 2004
Grupo Iris (LISBOA QUALQUER LUGAR) 1994
Livro de Viagem, de Teresa Siza 1998 1999
REVER LISBOA, de José Luis Madeira 1989
Henrique Manuel Botelho
Museu da Imagem, Braga
05-10-2002
Mais um fotógrafo resgatado do esquecimento: um salonista ignorado, que teve notoriedade no final dos anos 30 e continuou a imprimir (pelo menos) até 1954, autor de uma obra eclética e contraditória que é apresentada em mais de 60 provas de autor, também publicadas num catálogo prefaciado por Margarida Medeiros. Nascido em 1909 em Vila Pouca de Aguiar, onde residiu por muitos anos (antes de se dedicar com êxito ao ramo das antiguidades — morreu em 1990, em Braga), foi um transmontano cosmopolita, que fotografou Picasso nos anos 50 ao mesmo tempo que continuava a produzir, impressas a bromóleo, imagens ao mais acabado gosto tardopicturalista do ruralismo nacional; o facto de ter sido primo do comandante António José Martins (1882-1948), a quem algumas provas são dedicadas, é um adicional elemento que reforça a curiosidade sobre a sua obra. Fotografias de «costumes» em versões idealizadas, paisagens, naturezas mortas, estudos de nu, retratos de intenção simbólica, mas também de Laura Alves, Jorge Colaço, Craveiro Lopes, etc., preenchem uma sequência de imagens (todas as provas de época na posse da família) onde se passa sem transição cronológica inteligível dos bem sucedidos estereótipos salonistas para algumas notáveis fotografias de paisagens desabitadas e árvores solitárias, realizadas nos anos 30 e 50, algumas delas na Holanda. (Até 3 Nov.)
Jean Dieuzaide
Soc. Nac. Belas Artes
26.11.1994
Vinte fotografias de Jean Dieuzaide, realizadas em Lisboa em 1954, dominam o salão com a memória das fragatas no Tejo e dos carneiros no alto do Parque Eduadro VII. Uma cidade parada no tempo e alguns dos seus emplemas vistos por um francês (n. 1921) que foi uma das referências da fotografia «turística» dos anos 50 (Le Portugal, ed. Arthaud, 1956... Voyage en Ibérie, Contrejour, 1983) e que desde 1974 anima o Chateau d'Eau de Toulouse. Usando um formato quadrado reenquadrado no laboratório, é um observador humilde e sensual da realidade, sem a retórica humanista dos seus contemporâneos parisienses, que constroi imagens de grande solidez e também de um grande respeito pela epiderme das coisas — aqui algo dependente das conveniências de um itinerário controlado.(junta c/ Grupo Iris...)
Jorge Henriques
Centro Português de Fotografia, Porto
06-04-2002
Apresenta-se um fotógrafo amador portuense (1912-1988), activo entre inícios dos anos 50 e 1971, expositor nos Salões e dirigente da Associação Fotográfica do Porto. «Domingos de Manhã», o título da mostra, constituída por reimpressões do seu espólio, refere-se literalmente às deambulações semanais pela zona da Ribeira (prolongadas até ao fim da tarde, como se vê nas longas sombras projectadas por muitas figuras), surpreendendo crianças e grupos populares. É uma fotografia de ambição lírica, procurada nos efeitos de luz e na manipulação das poses, cuidadosamente composta nos formatos quadrados da Rolleiflex, onde o documentário humanista coexiste com a poesia «natural» de uma população pobre mas ordeira, sadia e feliz. O salonismo é um campo da prática social da fotografia pouco estudado, mas seria mais útil visitá-lo através das provas da época (J.H. revelava e ampliava as suas fotos num pequeno laboratório construído em casa) e das respectivas publicações, com os seus característicos títulos de origem. Entretanto, conviria que a informação disponível evitasse associar este populismo poetizado, herdeiro directo do naturalismo de Alvão, ao neo-realismo e ao fotojornalismo interventivo da agência Magnum, reservando também a caracterização pictorialista para outras formas específicas de manipulação das provas impressas. A mostra é completada por um álbum. (Até 21)
Nuno Teotónio Pereira
Diferença
16 Out. 2004
Foi um dos autores-fotógrafos do inquérito Arquitectura Popular em Portugal (1955-61) e, por ocasião da retrospectiva no CCB, dá agora a ver uma larga recolha de fotografias, com particular extensão quanto aos anos 40, cujo interesse ultrapassa a dimensão memorialista. Para além dos retratos de familiares e amigos, ou dos lugares e arquitecturas, algumas imagens revelam propósitos de experimentação fotográfica para além da visão documental, em estudos sobre sombras, perspectivas e valores plásticos (Porto, 1947; Ofir, 1948). Na série Carcavelos, 1946, <há> interessantes exercícios criativos com encenações de partes de corpos qusurgem da areia. Mais tarde, Sequência Janelas, 1977, retoma a ambição experimental com formas gráficas em alto contraste.
Grupo Iris (LISBOA QUALQUER LUGAR)
Soc. Nac. Belas Artes
26.11.1994
Esta é também a terceira exp. do Grupo Iris, que reedita, com sede na Diferença e com uma persistência invulgar, a antiga tradição dos agrupamentos de fotógrafos de arte. Agostinho Gonçalves, Américo Silva, Luís Azevedo, Fernando Curado Matos, Monteiro Gil e Pedro Mónica — com outro convidado, Lúcia Vasconcelos — fotografaram a cidade, as suas arquitecturas (em exercícios gráficos de fotomontagem, A.S.; ou em imagem distorcidas, A.G.); as noites populares do Sto António (F.C.M., com velocidades lentas); os cenários do Tejo (P.M.); os habitantes em trânsito (L.A.), a que Monteiro Gil acrescenta uma itinerância mais livre e sentimental. Foi editado um livro, Lisboa Qualquer Lugar. Lisboa Qual Lisboa, na sequência de Prata Negra e As Pedras e o Tempo, acompanhado com prosa de ocasião em versão trilingue de Alberto Pimenta.
REVER LISBOA
Monumento das Descobertas, Belém
5/8/1989
A Câmara de Lisboa assinala os 150 da fotografia, dá testemunho da importância do seu Arquivo Fotográfico e da sua reanimação recente a cargo de José Luis Madeira, e mostra imagens da cidade, da sua história e dos seus fotógrafos. A iniciativa é meritória, no sentido de bem intencionada e de dispertar a curiosidade do visitante, mas seguem-se no entanto demasiadas soluções de facilidade quanto ao tratamento dos antigos originais e quanto à fórmula utilizada na montagem: tratando-se da iniciativa de um Arquivo o rigor dos critérios museológicos é imprescindível.
desdobrável
"Livro de Viagens"
CCB
05-09-1998
Depois da operação Europália'91 (Charleroi e Gent, não vista em Portugal), a oportunidade da Feira de Frankfurt proporcionou um novo ensaio de reconsideração histórica da fotografia portuguesa (1854 -1997), que ganhou com os temas da viagem e do Império, adequados às celebrações em curso, a possibilidade de compensar as lacunas da investigação e das colecções nacionais. Com ausências menos explicáveis (Castello Lopes) e com algumas presenças demasiado excêntricas, o projecto de Teresa Siza é por vezes inconsequente, mas fica como mais uma etapa de um processo em aberto.
Livro de Viagem
Cadeia da Relação, Porto
20-03-1999
Organizada para Frankfurt 97 por Tereza Siza e já mostrada também no CCB, é uma antologia da fotografia portuguesa conduzida pelo tema da diáspora ultramarina e em geral pela ideia de viagem, tomando embora largas liberdades com tal programa de modo a incluir itinerários históricos cumpridos no interior do país (de Frederick Flower aos «pioneiros» dos anos 50/60 - mas sem Benoliel e Castello Lopes) e também autores contemporâneos alheados da observação do mundo e dos outros. A nova montagem, revista na sua sequência e algo ampliada, atribui toda uma enxovia da Cadeia à edição de Lisboa Cidade Triste e Alegre, trocando a ordem dos autores para Costa Martins/Victor Palla, sem razão compreensível, e reúne algumas páginas da maqueta original a provas oriundas de diversas colecções, mostradas sem as suas datas de reimpressão - o mesmo se passa com Fernando Lemos, embora já nos casos de Paz dos Reis e de Orlando Ribeiro se proceda à correcta datação e atribuição das novas tiragens. Entretanto, assinale-se a identificação de Agostiniano de Oliveira como autor da colecção do Museu do Dundo, antes anónima. Outra sala é atribuída a Carlos Calvet e a Paulo Nozolino, este com uma vasta selecção de 20 anos de trabalho, entrada na colecção do Centro Nacional de Fotografia sob o título «Los Angeles-Tokyo», e mais uma a Fernando Lemos e Jorge Molder, sob a epígrafe «Percursos em torno do objecto fotográfico». O gosto pelas classificações sem sentido prossegue no capítulo «Inventar um signo, revisitar uma ideia», que inclui José M. Rodrigues (portfolio «Viagem», 1997) ao lado de Helena Almeida e Valente Alves, enquanto outro espaço é intitulado «Viagens» e apresenta Aurélio Paz dos Reis, Domingos Alvão (com o trabalho no Douro para o Instituto do Vinho do Porto), Orlando Ribeiro e Albano Silva Pereira - estabelecendo também neste caso a amálgama entre projectos totalmente distintos. Do mesmo modo, «O Labirinto da Saudade» será uma designação improcedente para apresentar António Leitão Marques, António Júlio Duarte e Mariano Piçarra, com que se completa aqui a selecção contemporânea. Importa, aliás, notar o carácter sempre vago e arbitrário dos textos que acompanham os autores ou os tópicos em que se incluem, trocando a informação necessária por comentários supostamente literários (exemplo: «Inquieto e inquietante, Paulo Nozolino carrega, como aquele Fernão de Magalhães que não chegou a dar a volta ao mundo, o inconformismo com o país, a história, a claridade»). O levantamento das imagens coloniais, iniciada nos Encontros de Coimbra, é uma linha de trabalho que mereceria ser continuada. (Até 3 Abr.)
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