Ricard Terré, "La Bizca" (a vesga), Barcelona 1958
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A história do grupo e da revista Afal (1956-1963), com sede em Almería)
é muito importante (também) para perceber o que aconteceu e principalmente não aconteceu em Portugal pela mesma época, com a aparição fugaz de alguns interessados em fazer fotografia de modo diferente da produção dominante nas agremiações de amadores e nos salões oficiais.
As datas são as mesmas, os autores têm a mesma idade e as inquietações são paralelas, as condições de isolamento são semelhantes mas os itinerários têm origens diferentes, não se cruzam e vão depois divergir em absoluto: uns desaparecem, pelo menos durante 20/30 anos, e os outros passam a ser a direcção principal. Segundo parece, não sabiam sequer da respectiva existência. E alguns equívocos terá havido, pelo menos com as colaborações do muito premiado Carlos Santos e Silvae de Augusto Martins (Afal, nº 4, Julho-Agosto de 1956, nos primeiros tempos, portanto).
Em Espanha os novos fotógrafos "dos anos 50" nascem em grande parte nas associações fotográficas de Barcelona e Madrid, e afirmam-se em oposição às suas rotinas; associam-se em núcleos locais e em especial num grupo sediado em Alméria (onde a censura foi mais tolerante), e aí publicam uma revista e um anuário, e internacionalizam rapidamente o seu trabalho, em contacto com grupos idênticos de França, Itália, Bélgica, México. Em geral consolidam carreiras profissionais de longa duração, e a sua intervenção, mesmo se contestada nas décadas seguintes por novas afirmações geracionais (e a seguir consagrada com vários prémios nacionais e retrospectivas), teve o efeito de uma ruptura definitiva.
Os nomes são, em especial, os de Carlos Pérez Siquier (1930-) e José Maria Artero (1921-1991), directores da Afal, e de Joan Colom (1922-), Gabriel Qualladó (1925-2003), Ricard Terré (1928-), Ramón Masats (1931-), Xavier Miserachs (1937-1998), Oriol Maspons (1928-), Josep Maria Casademont (1928-1994), Francisco Gómez (1918-1998), Alberto Schommer (1928-). Vieram mais tarde a ser identificados, em conjunto com a chamada Escola de Madrid, ou La Palangana, e outros mais, com a fotografia neo-realista, sendo esta, agora, uma designação genérica e bastante informal, ou de sentido pouco restritivo.
Em Portugal (Lisboa), além de Victor Palla (1922- ) e Costa Martins (1922-1996), já depois de Fernando Lemos (1926-), que tiveram pontuais presenças públicas, contam-se as movimentações confidenciais e também episódicas de Sena da Silva (1926-2001), Gérard Castello-Lopes (1925-), Carlos Afonso Dias (1939-) e Carlos Calvet (1928-), para além de João Cutileiro (1937-) que iria expor fotografia em 1961. Os propósitos de dar testemunho sobre a realidade do país são aproximados e as referências fotográficas internacionais são idênticas (depois do cinema italiano e da Life) - a rejeição dos formalismos salonistas é paralela, mas faltaram em Portugal condições para experimentar a possível dinâmica de um salonismo renovador. Um aristocrático fechamento de grupo sobre as suas mais ou menos prósperas condições de classe terá igualmente contado - e por isso foram diferentes os caminhos de Augusto Cabrita (1923-1992) e de Eduardo Gageiro (1935-). Entretanto, numa história mais ampla, outras actividades fotográficas importará valorizar a par destas (Orlando Ribeiro, o inquérito à Arquitectura Popular, o inventário etnológico das equipas de Jorge Dias e Ernesto Veiga de Oliveira), mas a fotografia em Portugal continuaria até aos anos 80 sem condições de reconhecimento e de memória histórica.
Também existiram em Portugal revistas mais ou menos modernas de fotografia (e muito de cinema amador) - mais modernizadoras ou reformadoras, ou mais identificadas com o salonismo prevalecente, como a última abaixo citada, que segue um modelo idêntico à "Arte Fotografica" publicada em Madrid desde 1952. Nenhuma das revistas, porém, nasceu como publicação própria de um grupo de fotógrafos, e, aliás, nunca chegou a existir qualquer consolidada consciência e dinâmica de grupo. Não houve de facto grupos para além das agremiações de amadores de "arte fotográfica".
Publicaram-se
Objectiva, de 1937 a 1943, com um importante intervalo*: 1ª série, de 15 de Junho 1937 (Nº 1) a Fevereiro de 1939 (Nº 21), e 2ª série, de Abril de 1941 (Nºs 22 e 1) até Junho de 1943 (Nºs 48 e 27)
(*durante esse intervalo, em 39, ter-se-á editado a Foto, que nunca vi: é referida no início da 2ª série de Objectiva)
Foto-Revista, publicação técnica e artística de divulgação fotográfica. Dir., prop. e editor A.Cunha Macedo, Lisboa, 1937 (referida por Emília Tavares na monografia sobre João Martins)
Plano Focal, 1953 (4 nºs) de Fevereiro até Maio-Junho (Ernesto de Sousa foi redactor-chefe)
Fotografia, 1954/55 (10 nºs) de Fevereiro de 1954 a Outubro de 1955.
E tb os boletins dos agrupamentos criados depois de 1950,
boletim do Grupo Câmara, Coimbra, 1951-59 ?
Boletim do Foto Clube 6 x 6, Lisboa, 1956-59 ou 57-60?
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Por outro lado, será preciso elogiar a profundidade e a metodologia do livro de Laura Terré, que resulta de uma tese de doutoramento defendida em Barcelona em 1998. Não se fizeram por cá coisas assim, investigando a documentação toda, sumariando dados e datas em vez de seguirem devaneios ditos teóricos, e actuando ainda em vida dos protagonistas.
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a exp. que acompanhou o lançamento do livro em 2006, no CAAC, Sevilha:
http://www.caac.es/programa/afal00/frame.htm
apresentação do livro pelo editor: http://www.photovision.es : "Escrito por Laura Terré, historiadora de la fotografía, y editado por Photovision, AFAL 1956/1963 Historia del grupo fotográfico es un libro profusamente ilustrado y de interés general. El libro se acompaña de un DVD que contiene la totalidad de las revistas Afal en presentación digital interactiva, para facilitar la búsqueda de autores, de temas y de fotografías.
José María Artero (Almería 1928-1991) y Carlos Pérez Siquier (Almería 1930) lanzaron el primer número de la revista en 1956. Las siglas de Afal siempre recordarán su origen almeriense (contracción de Agrupación Fotográfica Almeriense), aunque su verdadero interés reside en haber vinculado las inquietudes de fotógrafos de toda España, unidos bajo el nombre de Grupo Afal. Se trata de un movimiento interregional -nombrándolo con la terminología del momento- que logra superar las dificultades de comunicación y transporte, para crear una red de autores y asociaciones, de ideas y de estéticas, por encima de los cauces legales y culturales, luchando con los impedimentos de orden superior que imponía la dictadura, con el fin de llevar a cabo un proyecto para la fotografía española. Afal, además de ser sinónimo de fotografía de calidad, nos ofrece una mirada profunda, crítica y humana de la España de aquella época."
"Written by the photography historian Laura Terré and published by Photovision, AFAL 1956/1963 Historia del grupo fotográfico (AFAl 1956/1963 History of the photographic group), is a profusely illustrated volume aimed at the general public. The DVD which comes with the book contains all the issues of Afal presented in interactive digital format, to facilitate searches for authors, subjects and individual photographs.
José María Artero (Almería, 1928-1991) and Carlos Pérez Siquier (Almería, 1930) launched the magazine in 1956. The title Afal (standing for Agrupación Fotográfica Almeriense) reminds us of the magazine’s origins in Almeria, but its real interest lies in the fact that it reflected the concerns of photographers from all over Spain, brought together under the name of Grupo Afal. This was an interregional movement –to use the terminology of the time- with the aim of projecting Spanish photography. Overcoming barriers of communication and transport, the group created a network of authors and associations, of ideas and aesthetics, which transcended the existing legal and cultural channels, despite all the obstacles placed in its way by the Francoist régime. Afal, as well as being a synonym for quality photography, provides us with a profound, critical and human view of the Spain of this period."
Acho que todo este trabalho mereceria um "suporte em papel", nao Alexandre?
Como referi num comentario acerca da exposicao de JM Rodrigues sente-se a falta desta base bibliografica, que poderia servir como ponto de partida para algumas interrogacoes dos fotografos nacionais.
Ainda que 'a partida esse facto possa ser entendido como uma liberdade na criacao, o certo e' que isso nao e' verdade.
Importam-se modelos de imagem constantemente (com todo o seu contexto). Se a Fotografia e' um olhar; se partilhamos um espaco por forca das condicoes naturais e humanas, entao seria desejavel que se criassem lacos entre geracoes que de alguma forma demonstrassem a cultura que geramos e adquirimos, enquanto seres em realimentacao constante.
A nossa experiencia sera' diferente da dos artistas americanos ou alemaes, mas igualmente valida.
Penso que as Artes e sobretudo as Visuais sao um elo cultural entre geracoes - quase a um nivel "genetico".
Posted by: Pedro dos Reis | 08/27/2008 at 13:39