Pretende-se aqui reconsiderar uma parte da fotografia portuguesa dos anos que se seguiram à II Guerra à luz de uma classificação que até agora, ao que julgo, não foi usada neste domínio: neo-realismo. Não se trata, porém, de uma mera extensão à fotografia do movimento que a partir de 1945 (e só até 56?) se afirmou na área das artes plásticas, tal como este não é coincidente (na cronologia e em questões de fundo que não vêm agora ao caso) com o movimento literário que se iniciou por volta de 1937. Significativamente, as barreiras ou incompreensões que existiram entre artes plásticas e fotografia serão até mais poderosas do que entre qualquer destas e a literatura.
Por outro lado, é conveniente considerar que, apesar do relativo isolamento do país, e em parte por isso mesmo, não deixava de chegar rapidamente a Portugal informação sobre os acontecimentos artísticos internacionais (informação por vezes parcelar, indirecta ou livresca, é certo). Sucede até, pelo contrário - e esse dado é fundamental - que a repercussão ou influência desses acontecimentos exteriores é mais imediata e mais
nítida do que em países com sólidas tradições nacionais próprias.
A tese demasiado frequente do isolamento cultural (que em muitos casos apenas resulta da ignorância actual sobre as circunstâncias vividas em épocas anteriores) levou a entender, por exemplo, a produção fotográfica de Fernando Lemos exposta em 1952-53 - e as experiências recentemente descobertas de Victor Palla da mesma época ou pouco
posteriores - como surrealismo e sob a influência directa de Man Ray. No entanto, a Fotografia Subjectiva de Otto Steinert, promovida desde 1949-51, já era conhecida de Lemos, que viajara a Paris, e foi sumariamente divulgada em Portugal numa artigo de José-Augusto França do início de 1953 que explicitamente o associava a essa corrente ("Nota sobre "Fotografia Subjectiva"", "O Comércio do Porto", 10 de Março de 1953 - ver: 2008/05/palla-lemos-1953-2.html). Esse artigo foi depois truncado e citado sem título em catálogos posteriores, quando se quis recuperar a etiqueta surrealista por razões mediáticas e de rotação de gostos, apagando-se a referência ao movimento de Steinert.
Comments