Maria Lamas ( 1893-1983 ) e o livro AS MULHERES DO MEU PAÍS - 1948-50
Foi fotógrafa por necessidade e só por brevíssimo tempo - 1948-50 - durante a preparação do seu livro As Mulheres do meu País, uma grande reportagem editada em fascículos e que é ilustrada (para além das fotografias que fez expressamente para esta edição) igualmente por uma vasta recolha de imagens documentais e de temática social de muitos fotógrafos da 1ª metade do século, de Alvão a alguns interessantes desconhecidos como José Loureiro Botas, Júlio Vidal e Firmino Santos.
É um leque muito vasto e variado que precisa de ser estudado por si mesmo, e que inclui, por exemplo, a Foto Beleza, Artur Pastor, um profissional activo como amador, Adelino Lyon de Castro com dez fotografias, e amadores e estúdios regionais como Álvaro Laborinho (Nazaré), Júlio Goes (Nazaré), Joel Mira (Caldas), Demóstenes Espanca (Évora), os Perestrelos da Madeira. Outros serão já de improvável identificação, só referidos como F. Rocha, A. de Sousa, M. Carneiro, A. Fidalgo. Muitas dessas imagens podem ser vistas como exemplos da fotografia romântico-naturalista, do populismo, do fotojornalismo objectivo, etc.
Mostram-se três fotografias de Maria Lamas em As Mulheres do meu País, 1948-1950, ed. Actuális, Distribuidores Gerais, Lisboa. Existe uma notável 2ª edição, da Caminho, 2003, em facsimile e usando as provas originais de ML, o que lhe assegurou uma qualidade de impressão incomparavelmente superior. A 1ª edição teve uma impressão tipográfica deficiente, o que em parte pode ter justificado a sua desvalorização enquanto objecto fotográfico.
. 7 – “Jovens trabalhadoras das minas de São Pedro da Cova”, pág. 372
. 8 – São Pedro da Cova, pág. 375
. 9 – “Na Gafanha. Condução do bacalhau, já seco, para os armazens onde será escolhido e enfardado. As mulheres passam, em fila, num vai-vem que não pára (...)", pág. 211
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Em 1947 ML, quando dá início às suas viagens pelo país, tem 53 anos, e fora antes directora de Modas e Bordados, jornalista, romancista, etc.
"Resolvi arranjar uma máquina e ser eu, também, fotógrafa". In "Ler - informação bibliográfica", Publicações Europa-América, Maio-Junho 1948, pág. 10.
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Os seus inúmeros retratos individuais e de grupo devem ser vistos como uma grande aventura fotográfica, com um sentido do documentário social, de denúncia e de esperança ou optimismo que têm ser associados ao N-R. Como uma contribuição fotográfica muito original, na sua intenção funcional precisa e no seu destino "invisível". Herdeiros de uma prática fotojornalística habitual ou rudimentar, o retrato frontal e directo de exterior (sem luzes acessórias), eles têm uma eficácia e uma energia contagiantes.
Nunca foram expostos, nem mesmo, ao que julgo, nas exposições documentais sobre ML (nem na mostra que lhe dedicou a BN quando aí foi depositado o espólio literário). Maria Antónia Fiadeiro, na biografia editada pela Quetzal, em 2003, aponta também Maria Lamas como uma repórter fotográfica pioneira.
As suas fotografias (provas positivas e certamente os negativos) conservam-se na propriedade da família. Aguardam pela exposição e o álbum que merecem, e que as projecte para outro destino na história da fotografia.
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Gosto de pensar (sem ter provas para isso) que foi na sequência e por efeito da publicação de As Mulheres do meu País, cujo último fascículo é de 15 de Abril de 1950, que a fotografia entrou na V EGAP, em Maio.
1950 é um ano decisivo para a fotografia em Portugal: a fundação do Foto Clube 6 x 6 (o Grupo Câmara, de Coimbra, é de 1949), a V EGAP, o 1º Salão do Barreiro – e San Payo mostra “30 anos de fotografia”, no SNI. Mas a mudança ocorrida na EGAP terá de ter uma motivação própria:
Na sequência da edição de Maria Lamas, Adelino Lyon de Castro seria o agente de ligação a Keil do Amaral, seria ele a incentivar Keil, com a sua reconhecida autoridade intelectual e cívica, a abrir a EGAP à fotografia? Pareciam criadas as condições para o reconhecimento da fotografia no espaço das práticas artísticas e, ao mesmo tempo, o entendimento do neo-realismo fotográfico. Nada disso aconteceu.
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