Índice de um caso obscuro, o África.Cont, que nunca quis acreditar que viesse à luz do dia. Julgo que em mais de 25 anos de atenção a, ou intervenção em políticas culturais nunca vi uma história mais errada de todos os pontos de vistas:
- a segregação dos artistas africanos, das diásporas e das imigrações num elegante ghetto lisboeta;
- a substituição de uma agência capaz de actuar no terreno (em Bamako, Dakar, Luanda, Maputo, etc, numa dinâmica de intermediação e de trocas) por uma obra patrimonial de fachada, absorvendo e concentrando num espaço único a disponibilidade e os meios de múltiplos agentes públicos e privados descentralizados;
- a imediata dependência de intervenções urgentes e de resposta a necessidades locais, em África e nos bairros portugueses, em relação a um projecto de uma estrutura oficializada e central, cara e pesada;
- a inadequação do local apontado, de adaptação improvável (e caríssima) à instalação de um qualquer espaço público com ambições de dinamismo cultural;
- um provável entendimento restritivo da arte africana contemporânea a partir de uma lógica de cooptação pelos mercados dos países dominantes, ou de "um stablishment artístico etiquetado como poscolonial, composto por funcionários étnicos ou multiculturais" (como diz Jean-Loup Amselle em "L'Occident Décroché, Enquête sur les postcolonialismes", Stock, 2008;
- a sobreposição deste novo projecto faraónico - que excede tudo o que sonhou ser o voluntarismo carrilhista - a uma rede de museus muitíssimo carenciada, a outros organismos com interesses de programação na área da arte africana contemporânea e também ao Instituto Camões, que foi conseguindo, com poucos meios, estruturar políticas de trocas culturais.
(À hora do jantar oficial de lançamento da coisa, aonde não quis ir)
África.cont - I - 29 de Novembro, o projecto é "anunciado" em duas páginas do Público
Ruinas (fotos) II - 30 de Novembro. Visita às Tercenas do Marquês
A África pode esperar III - 30 Nov. Um projecto para a frente ribeirinha. Utilizações anteriores
Quais Áfricas? . IV - 30 Nov. As diferentes artes contemporâneas de África. As imagens das notícias
A agenda Africa.cont V - 1 Dezembro - Reunião marcada na CML. Debate público ou opiniões especializadas? Nada disso, como se verá adiante. "Lisboa encruzilhada de mundos"?
Back to Africa VI - 3 Dezembro. Lisboa não é um espaço euro-africano
Áfricas ocultas VII - 4 Dezembro. Pistas a seguir na CML e na Gulbenkian. Maiorias, cumplicidades e petróleos artísticos
Sequências camarárias - VIII - 5 Dezembro. Os acordos estabelecidos na CML. Outros projectos previstos nos planos ou em curso
Notícia com booklet - IX - 5 Dezembro. O programa e os esquissos divulgados pelo Expresso
Concorrência Norte/Sul - X - 7 de Dezembro. Já existe uma Fundação Portugal África
Reconhecimento, Tercenas do Marquês - XI 1 e 2 - 8 Dezembro. Nova e mais completa visita fotográfica aos lugares do crime
Antes do Africa.cont - XII - 9 Dezembro. Iniciativas interrompidas de cooperação. Início de uma revisão de histórias passadas
#
alguma repercussão (2009)
: http://www.lequotidien.sn LE QUOTIDIEN Senegal
CINEMA - 1ère édition du Festival Africa screens : Des écrans africains à Lisbonne
12-05-2009
"A Lisbonne, le festival Africa Screens (17 avril-17 mai) qui se tient chaque weekend au cinéma Saint Jorge de la capitale jette les bases du futur Centre culturel d’art contemporain Africain qui doit voir le jour en 2012. Africa Screens présente une programmation haut de gamme, signe d’un renouvellement sur les bords du Tage et d’une ambition culturelle et diplomatique.
(...)
Une démarche
politique
L’idée de ce centre est une conséquence du sommet UE-Afrique de décembre 2007, qui s’est tenu à Lisbonne au moment où le Portugal occupait la présidence tournante de l’Union européenne. Ce sommet a permis au Portugal de se tourner à nouveau vers le continent noir. Lisbonne souhaite non seulement consolider ses relations actuelles mais également en tisser d’autres avec des pays aussi différents que l’Algérie, la Namibie, le Sénégal, l’Afrique du Sud, le Kenya ou la République Démocratique du Congo.
«Nous avons très vite abandonné l’idée d’un musée pour nous recentrer sur cette idée d’un centre multidisciplinaire. Par ailleurs, pour nous, il est fondamental de nous inscrire dans le contexte européen. Nous avons ainsi établi des contacts avec les villes qui, en ce qui concerne l’Afrique, comptent culturellement : Berlin, Londres, Paris, et Barcelone», précise José Dias.
Le centre d’art contemporain dispose d’ores et déjà en plein cœur de la capitale de terrains et de bâtiments octroyés par la mairie de Lisbonne. C’est l’architecte Tanzanien David Adjaye qui a été choisi pour réaliser le centre. Quant au budget de fonctionnement et de programmation des premières années, il est garanti par l’Etat portugais.
Une ambition mesurée
É só para te dar os parabéns pela forma como persistentemente tens questionado este projecto. Pela forma como foi levantado, pelas suas implicações, pelas reacções que tem provocado, temos aqui um estudo de caso a partir do qual se pode questionar o modelo cultural dominante, e começar a lançar as bases de um projecto cultural capaz de estar no centro do desenvolvimento e da inovação, um projecto cultural que se quer capaz de afirmar Portugal como uma Plataforma de encontro e contaminação de culturas, de criação do novo. Não um espaço de trocas de favores, de subalternização, onde se afirma a internacionalização por aquilo que se traz de fora e não por aquilo que é cá criado e é capaz de se afirmar e circular internacionalmente.
Penso que seria importante que esta discussão se alargasse a outras expressões artísticas.
Um abraço. A discussão e o debate têm que continuar.
Posted by: Carlos Fragateiro | 12/09/2008 at 22:02
Obrigado pela colaboração. Toda a gente manda bocas tipo generalidades políticas (sempre contra), mas sobre questões concretas da agenda faz-se silêncio - um silêncio receoso ou de quem fica à espera duma oportunidade. Então na área da cultura é particularmente evidente a falta de vontade ou coragem de intervir ou a desorientação oportunista.
Mas, quanto ao que propões, haverá de facto um modelo cultural dominante? Ou só uma descosida manta de retalhos sem coerência nem credibilidade, que vai sobrevivendo com as mesmas caras e a mesma falta de decisões, do PS para o PSD e vice-versa?
Será de pensar num (em 1) projecto cultural (unificado, centralizado, estatal) ou de equacionar a pluralidade de dinâmicas, projectos, produções, gerações, interesses, etc, aprendendo a viver com essa diversidade, analisando-a e estimulando-a mesmo?
Porquê pensar a cultura (e em geral é em arte que se pensa) como o centro, em vez de tentar dialogar com credibilidade com outros centros (a educação, a ciência), o que agora quase não acontece?
Porquê pensar Portugal como plataforma (com maíuscula) de encontros, como se alguma coisa passasse por aqui (há apenas turistas, de facto), como se não fôssemos só uma franja, uma periferia - e ganharíamos em tomar consciência dessa posição de distância para equacionar as relações com os outros descentramentos do presente. Depois do tempo perdido, temos de ir à procura, apontar a outros eixos, criar antenas e relações lá fora.
Posted by: Alexandre Pomar | 12/10/2008 at 13:55
"a segregação dos artistas africanos, das diásporas e das imigrações num elegante ghetto lisboeta"
A Segregação dos artistas africanos, das diásporas, das imigrações e descendentes já existe dê-me exemplos de artistas destes (com nacionalidade portuguesa) que representem ou tenham sido selecionados para representar Portugal ou que tenham apoios do Ministério da Cultura.
Melhor sermos segregados num elegante ghetto lisboeta do que continuarem a fingir que não existimos.
Posted by: Portugal- a negação de algumas existências | 08/06/2009 at 02:15