Paula Rego, "A Batalha de Alcácer Quibir", 197?, pormenor (bordado). Uma obra (inédita?) recentemente adquirida pela Câmara de Cascais a um particular, e agora exposta na Casa das Histórias:
O "Príncipe Porco" modelo de uma série de litografias, junto de uma delas (é o único "modelo" presente mas tem uma boa presença e é uma pista oportuna sobre o trabalho mais recente da pintora, onde observação e imaginação se conjugam de um modo inédito).
TODOS OS DIAS 10-22h, entrada gratuita
www.casadashistoriaspaularego.com
Ainda não tenho opinião formada sobre o edifício (falta luz natural?, há problemas com a iluminação fixa no tecto?, o circuito das galerias?, as torres-chaminés? - mas à partida não me desagrada). E trazer para Cascais um museu dedicado à artista que é também a maior pintora inglesa (além de muito ligada ao lugar por razões familiares e pessoais) é seguramente uma boa coisa. É aliás curiosa a semelhança de situações (relativa) com Vieira da Silva, a grande pintora francesa (nota A) - esperemos que as cidades e designadamente as respectivas câmaras não se comportem da mesma maneira: Cascais parece ser exemplar e Lisboa não quer saber do seu museu.
Na inauguração abre com uma magnífica quase retrospectiva de Paula Rego, que em grande medida recorda a que lhe dedicou o Rainha Sofia em 2007, comissariada por Marco Livingstone (aqui também envolvido). Além da permanência de muitas obras aí vistas, seguiu-se também a opção por uma montagem carregada, e a acumulação das obras agrada-me neste caso em que as peças nunca se repetem como variações de uma mesma ideia ou fórmula - circulamos não por um espaço decorado com pinturas (por um lugar "com" design) mas por dentro da obra e do mundo da pintora.
Também conta na comparação com Madrid o facto de a Marlborough ter cedido um número avultado de obras, de entre as 18 pinturas que adquiriu recentemente a Charles Saatchi, o grande coleccionador-vendedor-curador(?) e ex-publicitário que nos anos 80/90 reunira dezenas de obras de Paula Rego e teve um papel muito importante na sua projecção - ver "New British Art in the Saatchi Collection", de Alistair Hicks, Thames and Hudson, Londres 1989, onde aparece associada à Escola de Londres e a Frank Auerbach, Lucien Freud, Kitaj, Kossoff, Michael Andrews, etc. A propósito, uma das boas acções que a diligente directora Dalila Rodrigues poderia vir a fazer era trazer-nos uma amostra (não "amostragem") das obras desses artistas de primeira importância e que por cá quase se desconhecem. Sem insistir no sempre discutível tema da Escola de Londres, mas contrariando a intencional incultura especializada (é curioso que Auerbach e Freud viessem de Berlim, Kitaj do Ohio - e são todos muito diferentes entre si.)
E são 3 as edições que acompanham a inauguração (edições da Câmara de Cascais, com grande qualidade gráfica, impressão Punkte Art (1 e 2), Textype (3):
"OBRAS DE PAULA REGO", o catálogo da mostra temporária, com apresentação da directora da Casa das Histórias e comentários de Paula Rego sobre as principais obras reproduzidas (1986-2008). 60 pp. 18€
"CASA DAS HISTÓRIAS PAULA REGO - ARQUITECTURA", textos de Nuno Grande e Ana Vaz Milheiro, memória descritiva do projecto e croquis de Eduardo Souto de Moura, fotografias de Luís Ferreira Alves. 148 pp. 40€
"CASA DAS HISTÓRIAS PAULA REGO - COLECCÇÃO", textos de Marco Levingstone, Ruth Rosengarten, Dalila Rodrigues e de John McEwen sobre Victor Willing. Gravuras (nota B) e desenhos da colecção da Casa das Histórias e pinturas em depósito por dez anos. 376 pp 70€
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(A) Foram duas artistas que, no seu campo de actividade, se tornaram figuras de primeiro plano indiscutível nos países em que se estabeleceram. Chegaram ambas a fazer esquecer enquanto pintoras a nacionalidade de origem, sem que as suas obras perdessem as raízes ou referências culturais mais profundas, e sem nunca estabelecerem uma distância definitiva do País. Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) ficou plenamente associada à segunda Escola de Paris, com uma pintura abstracta e lírica onde os espaços inventados lembravam muitas vezes os azulejos e luz de Lisboa. Paula Rego (n. 1935) foi às vezes integrada na chamada Escola de Londes e disputa hoje o título de mais importante artista britânico, mas remete para a infância de Cascais e Ericeira as suas memórias decisivas. Têm em comum vários outros traços biográficos: foram apoiadas pelas respectivas famílias, socialmente bem instaladas, para partiram muito cedo de Portugal e estudarem noutras capitais; casaram também muito cedo com pintores muito dotados e também reconhecidos (Arpad Szenes e Vic Willing, ambos professores, de maneira diferente), que aceitaram lugares a seu lado de maior discrição. Também para ambas, que perderam a nacionalidade portuguesa por casamento, a rectaguarda nacional foi de grande importância para a respectiva carreira, ou para o seu mercado, em diferentes momentos da vida.
(B) Tal como sucedeu no Catálogo Raisonné da obra Gravada de P.R., as duas gravuras realizadas em Portugal em 1964-5, editadas pela cooperativa Gravura, aparecem legendadas como "Sem Título", na pág. 129. Trata-se de Quebra cabeças, à esquerda, e A Espada de cortiça, à direita (ed. 1965). Seria oportuno incluir a informação numa possível errata, numa edição seguinte e em especial nos dados do Inventário. Aliás, não há praticamente obras "sem título" em Paula Rego (a excepção serão as da série dedicada ao aborto) - há é títulos esquecidos ou ignorados. Por outro lado, as gravuras deverão ser identificadas com os seus números de série; não existindo este, por se tratar de provas de artista, convirá referir n/n (não numerado) - tb com a menção ass. ou não ass.
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