EXPRESSO Cartaz Actual de 27 Julho 1991
"Crime no Areeiro"
DAR o nome de Francisco Sá Carneiro à praça que é o emblema da cidade do Estado Novo já tinha sido a mais absurda exibição de ignorância dada pelos governantes que se enfeitam com a sua herança política. Se lessem o Professor França, mesmo em edição de bolso, eles saberiam que «depois da Praça do Comércio pombalina, da rotunda ter minal da Avenida da Liberdade fontista, esta nova praça (o Areeiro), com a monumentalidade dos seus edifícios habitacionais de grande 'standing', em parte sobre arcadas e com um torreão ao topo, ía ser a praça ordenativa e distributiva da nova ci dade salazarísta».
com a fotografia da Clara Azevedo
Sá Carneiro no Areeiro é urna traição ao seu ideário político, um erro histórico, topográfico e, por isso, toponímico. Mas com a inauguração da es tátua no centro da praça junta ram-se mais elementos a todo este sinistro equívoco. Não importa agora saber se a obra do político justificava a consagração estatuária, importa sim re cordar que ele era um homem de gosto e que não merecia o mamarracho que ali fica a des respeitar a sua memória e a desfeitear a praça. É péssima es cultura o retrato de bronze e a teoria de figuras recortadas em chapa metálica, tal como a ar quitectura do monumento é destituída de originalidade e está incorrectamente inserida no local.
Acresce ainda que a história desse monumento de pato bra vo (da autoria do arquitecto Eduardo Bairrada e do escultor Soares Branco) parece marca da por públicas irregularidades. De facto, depois de um primeiro concurso sem candidatu ras aprováveis, veio a ser esco lhido, em 1984, um projecto do arquitecto Sebastião Formozinho Sanches (com a colabora ção de Ribeiro Telles e Edgar Cardoso); mais tarde o então presidente da Câmara Nuno Abecasis permitiu-se rejeitar o projecto aprovado e encomen- dar o outro agora inaugurado.
Lamenta-se que a actual direcção camarária, enquanto en saiava novas atitudes estéticas em intervenções de escultura efémera, não tenha exercido os seus poderes fiscalizadores sobre uma aberração definitiva(?). Registe-se, por outro lado, a significativa ausência da família do homenageado. E quanto à presença oficial do actual responsável pela Cultura, deve dizer-se que a cobertu ra que quis dar a mais este atentado está conforme com o curso do seu mandato.Divergem as opiniões. sobre se a morte de Sá Carneiro resultou de um acidente ou de um crime. No caso da estátua que lhe prolonga a memória, não haja dúvidas. É crime - contra o homem e contra a cidade.
Frustrado. À parte da carga histórica da praça e da sua conotação com o estado novo. O monumento está muito bem conseguido. Ao mestre Soares foi-lhe requisitado um serviço que ele não só cumpriu como embelezou.
Posted by: joao veiga | 09/05/2012 at 00:20