O que eles aspiram é a marcar a agenda. Querem ser citados e provocar polémica, porque são esses os golos do ranking a que concorrem, para se manterem à tona. Para isso precisam de cuspir cada vez mais longe, de bolsar sempre maiores impropérios. Chocar, sempre um pouco mais, para lá de todas as razões argumentativas comprováveis.
Não me interessa nada que o VGM tenha grande facilidade de esguichar poesia e/ou prosa noutras páginas, mais ainda desde que usa o portátil nos e entre os aeroportos. Nem esses recursos caucionam o cronismo político que exerce na imprensa, a par da mama parlamentar que lhe asseguraram para pagar casas novas e pensões - que a isso tenham descido alguns partidos fica entre as privadas imoralidades públicas da nossa confidencial democracia. A troco de que méritos?
"O povo português acaba de demonstrar a sua fatal propensão para viver num mundo às avessas. Não há nada a fazer senão respeitá-la. Mas nenhum respeito do quadro legal, institucional e político me impede de considerar absolutamente vergonhosa e delirante a opção que o eleitorado acaba de tomar e ainda menos me impede de falar dos resultados com o mais total desprezo. Só o mais profundo analfabetismo político, de braço dado com a mais torpe cobardia, explica esta vitória do Partido Socialista." (DN, 30 de Setembro)
"O resultado das legislativas não se limita a traduzir a profunda estupidez com que o eleitorado nacional se comportou. Levará o País aceleradamente na pior das sendas." (DN, 14 Outubro)
O escritor não se dá ao respeito. Esta escrita é repugnante. O autor é há muito inimputável, como o Jardim noutro posto. Trata-se de distribuir insultos - é a eles que reajo, para lá da parte que me cabe e sabendo que "o mais total desprezo" seria mais prudente. VGM não é fanático (como algumas responsabilidades editoriais antigas e algumas relações literárias mostram), é despudorado e chocarreiro para que o leiam, porque outras razões não haveria para tal. A política não lhe interessa, como não interessam ministérios, poderes - interessa a fama e o cheque, associados. É igual a vários outros comentadores que sobrevivem tentando ultrapassar todos os concorrentes na dimensão do dislate e fazendo ecoar o autismo com que distribuem a condenação geral. Vivem (VGM e VPV, em especial) imersos no "profundo analfabetismo", na "torpe cobardia", na "profunda estupidez" que apontam aos outros. Esse é o seu caldo de cultura - e sustenta a respectiva notoriedade saber-se que uma tão grande grosseria tem ou teve caução "cultural", e não política.
Descrentes da política, do país, de tudo, exercem a crónica deletéria ou assassina por motivos pessoalmente legítimos: não ambicionam a eficácia política, querem só cobrir os impostos, ter mesa no Gambrinus, custear uns meses por ano em Londres. Uns meros extras, que lhes devem assegurar a exterioridade face à mediania ambiente.
Alguém deveria investigar o que foi a imaginação crescentemente delirante de analistas, cronistas, editorialistas e comentadores investida - sem êxito - em fabricar a demolição de um governo e em especial de um primeiro ministro algo diferente do habitual e por isso mais odiado (vindo da província, licenciado à pressa, alheio às famílias antigas que foram sempre herdando os poderes instalados e partilhando as tradições muitas vezes cúmplices da Situação e da Oposição). Passou-se do estado de graça à permanência dos bons resultados nas sondagens. Depois, com a manobra deixada à vista, a um exercício conjugado de destruição pessoal e política que foi só uma montagem jornalística, a partir de algumas cumplicidades interessadas. Jornalistas (sempre) "do contra", especialistas do inquérito insidioso, cronistas que sabem que só o dislate conceptual e o excesso vocabular pagam, muitos estiveram aliados a construir e depois a apontar o que diziam ser o "descalabro" indesmentível de uma antiga popularidade - para surgirem como obreiros de uma próxima e correctora viagem. De facto mentiam; de facto, tentaram enganar-nos. De facto, o descrédito era de outros, deles mesmos. Da direcção do Público, que já anunciou que caia; da direcção da TVI, que já mudou, e de um persistente escândalo submediático ou clínico, usado à exaustão. De uma hierarquia de analistas e comentadores que, de repente, já quando as sondagens desmentiam as especulações que venderam como teses sociológicas, foram tentando recuperar uma compostura há muito perdida. Ficaram as campanhas despidas e isoladas, elas sim destroçadas, incluindo a fabricação de um esquerdismo de salão como o do Bloco de Esquerda, à medida das ilusões da direita. A agenda agora é outra.
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