A surpresa (depois dos palpites toscos que os jornais puseram a circular para dizer alguma coisa) quer dizer neste caso expectativa. Gabriela Canavilhas é da área e de um dos seus sectores mais exigentes (porque a música não dispensou o talento e a aplicação, e não vive de auto-complacências e promoções cúmplices mas sim de trabalho e audiências). Tem experiência de administração, e mesmo de governo (Açores).
Se importa rever a concepção geral da intervenção ministerial esperada nesta área, apontando mais para a cultura e menos para os artistas, é na área dos museus que se acumularam os maiores equívocos e onde é imperioso parar para pensar, fazer as contas e cortar com o passado recente.
O nova garagem do Museu dos Coches, que teve um deficiente programa e tem um mau projecto (o IMC tem tentado corrigi-lo), é irreversível? O Museu de Arqueologia deve ir parar a instalações da Marinha (na Cordoaria), para que o Museu da Marinha cresça nos Jerónimos? E se parece assente que o possível Museu da Língua não deve aniquilar o Museu de Arte Popular, como se vai agora reabrir o edifício (em vias de classificação, com o seu notável conjunto de pinturas decorativas de 1947-48, esquecido mas sem paralelo ) e como se vai rever o seu programa, preservando o que havia e abrindo outras portas? E quem se lembra que se falou de um Museu da Viagem para o Pavilhão de Portugal? Quanto ao Africa.Cont - que não é um museu, mas uma extensão artístico-mundana das Docas - está-se muito a tempo de reconsiderar um projecto que é rejeitado por todos os agentes envolvidos nas artes contemporâneas, africanas ou não (convidem-nos a falar!). Para citar apenas grandes planos recentes.
Há que rever o mapa dos museus, regionalizando o que for regional, e é preciso romper com a absurda exigência de se ser funcionário público para dirigir um museu (aguarda-se, a propósito, um regime institucional inovador para o Museu do Coa, que não ficará refém do IMC). Importa concertar planos com a CML e outras câmaras, fazendo o ponto das promessas e das realidades de cada qual, e importa saber que será imprescindível regularizar a situação do Museu Viera da Silva e Arpad Szenes (certamente comprando algumas das pinturas aí depositadas por Jorge de Brito, e tornando-o financeiramente viável - com ou sem António Vitorino a presidente da Fundação, que tem mais em que pensar...). Aliás, se a instalação da Colecção Berardo no CCB veio assegurar o destino de um lugar antes à deriva (com a preciosa ajuda de Jean-François Chougnet) - num dos escassos casos de acerto político destes anos passados -, aí se aproxima a data de compra, que deveria trazer a tranquilidade futura a Belém.
Em geral, em várias outras áreas, é altura de restabelecer as condições mínimas de funcionamento de equipamentos indispensáveis e que foram sacrificados nos últimos tempos a levianos jogos de interesses corporativos e a imaginações imprudentes, antes de manter ou ampliar promessas de distribuição de cada vez mais apoios aos cada vez mais numerosos "criadores". Aliás, convém ter sempre presente que os artistas são produtores de bens transaccionáveis, e devem ser considerados como tal. (Alimentar o "pedinchising" carrilhista não é política, é uma facilidade suicida.)
As verbas ministeriais não vão poder subir muito e depressa para corrigir a suborçamentação herdada, e para isso será ainda preciso ir recuperarando alguma credibilidade perdida pela palavra Cultura, em vez de se falar outra vez na alegada meta do 1%. Para que se justifique (talvez) vir partilhar alguns dinheiros com temas mais sérios como a educação, a requalificação urbana, a ciência, a ecologia, os parques naturais, etc (a ordem é arbitrária) - sabendo-se que o que passa pelo MC é e deve ser uma parte pequena do que se investe em Cultura nas câmaras e nas regiões, e noutros ministérios de mais sustentabilidade pública.
(1) O júri do concurso era formado por Clara Camacho (sub-directora do IMP), Elísio Summavielle (director do Igespar) e Raquel Henriques da Silva (1ª directora do Museu do Chiado).
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Algumas reflexões recentes parecem continuar na agenda: "Políticas culturais, princípios e divergências" ( link ) e "Vitórias" ( aqui )
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