Antes de CEM ANOS ANTES, na Gulbenkian (EXPRESSO Revista 08-07-2000), tinha saído
2 - EXPRESSO Actual 01-07-2000
"Fim de século"PORTUGAL 1900, Fundação Gulbenkian (Até 10 de Setembro)
OS PAÍSES próximos, Espanha, França, Grã-Bretanha..., dotaram-se de estruturas para organizar as celebrações do milénio, com festejos, inaugurações de equipamentos, exposições e congressos que repensam as marcas iniciais de uma era moderna que não se sabe se ainda continua ou não. Por cá, a data não escapou ao Museu Gulbenkian, que esta semana inaugurou uma exposição evocativa da anterior passagem do século em Portugal. É uma abordagem multidisciplinar que procura apresentar uma imagem abrangente e sintética do que eram a sociedade e arte em 1900, onde o panorama artístico aparece focado, na segunda metade do percurso, sobre a representação então enviada à Exposição Universal de Paris.
Aberta pelos retratos de D. Amélia e D. Carlos, a mostra ocupa-se de arquitectura e urbanismo, economia, teatro (que tinha lugar destacado na vida cultural e social), mobiliário, literatura (é o ano da morte de Eça de Queiroz), ao longo de uma sequência de pequenos núcleos, e tem uma presença muito forte da documentação fotográfica, em painéis ampliados - embora a fotografia, no que diz respeito a provas originais, esteja totalmente ausente. Rafael Bordalo Pinheiro é certamente a figura mais marcante, através da sátira política desenhada e da criação cerâmica. Um extenso catálogo completará a exposição, incluindo um grande número de sínteses sectoriais.
Em Londres e Paris, a data tem sido objecto de importantes iniciativas, que não se limitaram a assinalar a efeméride, reconsiderando um período histórico que é, afinal, mal ou erradamente conhecido. É o caso de «1900 - Art at the Crossroads», que já passou da Royal Academy para Nova Iorque (Museu Guggenheim, até 13 de Setembro); de «1900», que o Museu de Orsay apresentou no Grand Palais, e também da mostra do Victoria and Albert Museum dedicada à Arte Nova. Tal como sucedeu com «ModernStarts», no MoMA, num horizonte mais alargado (1880-1920), a perspectiva comum tem sido a redescoberta da pluralidade das direcções e contradições presentes numa época de grande efervescência, que viriam a ser depois em parte ocultadas pelas convulsões do século seguinte, sob a forma predominante de uma oposição entre decadentismo e «kitsch», por um lado, e os pioneiros de «uma história da arte moderna única e linear», como diz o catálogo de Londres.
O projecto anglo-americano centrou-se apenas nas artes plásticas e tomou também por referência, mas à escala internacional, o panorama organizado para a Exposição Universal de 1900, a «Décennale», onde a última década do século XIX foi vista através de 5000 obras oriundas de 29 países. Ao contrário da habitual ausência de representações portuguesas, quatro obras foram incluídas por iniciativa do comissários, que, em geral, também as destacaram na exposição e no catálogo. É o caso do famoso auto-retrato de Aurélia de Sousa, do tríptico A Vida de António Carneiro, do Perfume dos Campos de Luciano Freire, que seria uma denúncia precoce das ameaças da poluição industrial (em 1899), e A Chávena de Chá de Columbano. Na exposição de Paris tinham participado 50 artistas portugueses, o que dá a medida de um trânsito internacional que viria a extinguir-se com a I Guerra Mundial.
Já em «1900» Portugal não esteve representado e a introdução do catálogo situa-o numa «outra Europa que permanece miserável», ao lado da Espanha, Sérvia e Grécia. Dos museus nacionais só um pendente Arte Nova de René Lalique, que Calouste Gulbenkian lhe adquirira em 1901, aparece reproduzido no catálogo, embora não tenha de facto seguido para Paris. A mostra orientou-se pela investigação de algumas ideias fortes, como a busca insistente da síntese das artes, a orientação da pintura para a decoração mural e a procura de raízes e mitos nacionais, o interesse pela imagem da mulher e pelo mundo vegetal e aquático, tendo a fotografia uma presença alargada.
Em anos recentes, duas outras exposições tinham desbravado o caminho. «1893, l'Europe des Peintres», no Museu de Orsay, que assinalou, um século depois, a nova unidade europeia, alargava um horizonte selectivo que a influente historiografia francesa sempre tendeu a concentrar nas suas fronteiras. Também nesse caso a arte portuguesa brilhou pela ausência, embora tenham estado representados 18 países, incluindo, por exemplo, a Finlândia, a Grécia e a Checoslováquia. Os diversos simbolismos nacionais, a pintura de temas sociais e um naturalismo moderno que quase se substituía à tradição académica como arte oficial marcavam o panorama. E ainda mais determinante foi «Paradis Perdu: l'Europe Symboliste», a grande exposição concebida em 95 para o Museu de Belas Artes de Montréal (com catálogo co-editado pela Flammarion), já na perspectiva da aproximação do fim de século e referente ao período que vai de 1886 a 1905, ou seja, do «Manifesto» simbolista de Jean Moréas ao escândalo «fauve».
e 1 - 01-04-2000
"Portugal 1900"O MUSEU Gulbenkian vai dedicar uma exposição ao ano de 1900 em Portugal, a apresentar em Junho na galeria principal da sede da Fundação. Ao assinalar a presente mudança de século através da evocação da arte e da sociedade de há cem anos, a mostra apresentará obras que foram então enviadas à Exposição Universal de Paris e outras datadas desse ano, antecedidas por um panorama multidisciplinar que recordará a vida quotidiana de então.
Essa abordagem expositiva, que é coordenada por Rosa Figueiredo, prolonga-se num extenso catálogo que reunirá numerosas contribuições especializadas. Estão previstos textos sobre a sociedade portuguesa, de José Miguel Sardica; política e economia, Fernando Rosas; arquitectura e urbanismo, Raquel Henriques da Silva; ciência, Nunes dos Santos; ciências da educação, Rogério Fernandes; estudos femininos, Maria Antónia Fiadeiro; artes cénicas, Vítor Pavão dos Santos; cinema, João Bénard da Costa; exposições e comemorações, João Castel-Branco Pereira (director do Museu Gulbenkian) e Quintanilha Mantas; fotografia, António Pedro Vicente; literatura, Carlos Reis; música, Rui Vieira Nery; pintura, António Rodrigues; escultura, Teresa Lapa; traje, Madalena Brás Teixeira; mobiliário, Pedro Bebiano; cerâmica, Paulo Henriques; ourivesaria, Nuno Vassalo e Silva (subdirector do museu); caricatura, Osvaldo de Sousa; e saúde e assistência, João J. Cucio Frada.
A participação portuguesa na Exposição Universal contou com a presença de 50 artistas e 161 obras, incluídas na mostra antológica da produção da década de 90 intitulada «Décennale». Essa presença ficaria depois marcada pelo naufrágio de um dos barcos que traziam as obras expostas para Lisboa, o «Santo André», no qual se perdeu nomeadamente uma grande tela de Veloso Salgado, Jesus no Deserto, do qual o Museu do Chiado apresentou recentemente um estudo. Entretanto, outras obras da época - o auto-retrato de Aurélia de Souza (c. 1900); o tríptico A Vida, de António Carneiro (1899-1901); A Chávena de Chá, de Columbano (1898), e Perfume dos Campos, de Luciano Freire (1898) - estarão indisponíveis, uma vez que figuram na exposição sobre 1900 promovida pela Royal Academy de Londres e o Museu Guggenheim de Nova Iorque. Por outro lado, deverão ser expostas algumas obras da Colecção Gulbenkian que estiveram presentes na Exposição de Paris, da autoria de Lalique, Rodin e Dagnau-Bouveret.
A cenografia da exposição foi confiada a Paul Vanderbotermet, o mesmo autor da concepção plástica da recente mostra «A Arte do Retrato». Entretanto, inaugurou-se esta semana na sede da Fundação Gulbenkian um outro projecto do Museu, intitulado «A Imagem do Tempo» e dedicado à arte do livro, da Idade Média ao início do século XVI.
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