Na exposição Povo (ver nota anterior), o Francisco Vidal fez-se instalar com visibilidade reduzida - é uma opção curiosa (ou que desperta curiosidade): o painel "fotográfico" dobra-se para um corredor não iluminado e prolonga-se num nascimento de Vénus onde a Rita grávida aparece sobre um avião em voo, certamente a caminho de Nova Iorque, tenho de ir ver melhor...
e na parede oposta está (escondida) uma pintura sobre tela, o retrato da mesma Rita, colocado de cabeça para baixo, com menos luz ainda.
A montagem "mal" iluminada parece ser assim mais um meio de distanciamento, a somar à digitalização do desenho e à impressão fotográfica em 150 folhas (Iemanjá, 2010, é o título, sem haver referência ao quadro no roteiro), interpondo-se sobre a presença directa da mão, que as escolas e as modas (as habituações) rejeitam sob a alegação de "expressionismo" (a expressão como mal, a expressão do mal, o interdito da imagem "expressiva", a iconofobia). Mas o suporte fraccionado das fotografias, que podem também sugerir que assim se enviam notícias de longe, por carta, tem um diferente sentido de distância. E ainda, tratar-se-á aqui de "nós" e não exactamente de todos, o Povo - outra diferença.
#
Quanto aos bonecos de Tom
gostava de conhecer a história desta produção de figuras, de que encontrei outros dois exemplos abaixo, certamente dos anos 40 (?):
( http://coleccionar-collectus.blogspot.com/2008/04/figuras-em-madeira-tom-thomaz-de-mello.html )
tenho de ver se os bonecos (outros bonecos) já estavam em Paris 1937, contando para o êxito do Pavilhão de Portugal, e outros ou os mesmos de 37 apareciam decerto na 1ª sala da secção etnográfica de Expo'40.
Boneco concebido por Tom (Thomaz de Mello) envergando miniatura de traje de pescador da Póvoa de Varzim [1937]. © IMC / MC : in http://museuartepopular.blogspot.com
Mas será especialmente curioso compará-los com os bonecos de madeira de Emmerico Nunes, que encontrei reproduzidos num cartaz publicado (?) na exposição (?) Viva a República, Cordoaria, que não parece uma exposição mas uma paginação encenada. Depois da exposição da CML "Histórias de Lisboa no Museu da Cidade" (10 Fevereiro - 31 de Março), depois da exp. do Museu da Presidência "A República e a I Guerra" (nos Museus da Politécnica) e de uma outra anterior mostra documental sobre emigrantes, não se percebe um tal critério expositivo e uma tal opção pela propaganda quando se trataria de recordar e, vá lá, comemorar. Tenho de voltar ao Emmerico para situar esta produção de bonecos na sua sequência modernista.
Ao lado dos bonecos de pau do Tom estão os de barro policromado de Joaquim Teixeira Lopes (1837-1918, Teixeira Lopes pai) de outro gosto mais tardo romântico-naturalista. E logo adiante aparece um Bordalo Pinheiro espectacular e monumental entre outras naturezas-mortas:
É mais uma demonstração da escolha muito pessoal e livro do João Pinharanda, que preferiu esta presença espectacular aos bonecos mais vulgares do Zé Povinho.
#
Por vezes a selecção pode surpreender ou chocar, pela ausência do que seria indispensável, mas essa é outra forma de dizer que não há duas escolhas pessoais idênticas, e que um comissariado é, ou pode ser, um discurso autoral. Por exemplo, na fotografia não aparecem os tipos populares de Carlos Relvas, nem o povo, as massas populares (republicanas), de Joshua Benoliel, nem as composições etno-romantizadas de Domingos Alvão, que seriam as presenças previsíveis e necessárias. É estranho que o grande fotógrafo da da Central Tejo, que tão bem fotografou a sua construção e os seus trabalhadores, o mal conhecido Kurt Pinto, não esteja ali na casa em que trabalhou, e talvez fosse possível incluir algumas das mulheres de Maria Lamas ou na sua falta algum Adelino Lyon de Castro, ou o Artur Pastor, e mais perto de nós os alentejanos de José M. Rodrigues ou alguma das série do António Júlio Duarte (que está representado no colectivo Kameraphoto). Mas trata-se de tornar claro que não se quis sumariar o que há de mais importante numa representação fotográfico-temática, mas apenas reunir o que se quis incluir, sem critério reconhecível para lá do acerto de muitas presenças. Por exemplo, bem, as três provas de um Fernando Lemos menos previsível, ou um desconhecido António Cézar Abrunhosa, com quatro documentos sobre trabalho rural (não datadas). E por via do tema da habitação as fichas do Inquérito da Arquitectura Regional, que assim dispostas parecem um trabalho dito conceptual. Ou uma fotografia de rua de Filipa César, ou outra de um desconhecido Jorge Brilhante.
Olá. Gosto muito desses bonecos do Tomás de Mello. Queria aqui deixar o endereço de outro sítio que sei que tem, foi apartir daí que os conheci. Aqui fica:
http://www.mdsleiloes.com/leiloes/2/?page=8#product_373
Posted by: Carolina | 06/22/2010 at 11:41
Mais uma prova que a abundancia de recursos não equivale necessariamente a uma exposição relevante.
Posted by: a | 06/22/2010 at 16:49