Retrato de Ricardo Rangel (Foto de Rogério, publ. no livro abaixo) (E quem é o fotógrafo à direita?)
este 3º capítulo vai até à "descoberta" internacional da fotografia moçambicana, ou seja, à integração de vários moçambicanos no processo de reconhecimento da fotografia africana, acelerado em 1994, no eixo Paris - Bamako. (revisto em 26VIII)
1990. 1992. 1993. 1994
.Karingana ua Karingana, Il Mozambico contemporaneo visto dai suoi fotografi, Bologgna - Milano 1990.
.Uma vida a reportar a vida, Maputo 1992 [?]
.CINCO OLHARES, António Valente, Joel Chiziane, José Cabral, Kok Nam, Naita Ussene, Lisboa 1993.
.AFRICA, AFRICA, Denmark 1993.
.Ricardo Rangel, Fotógrafo de Moçambique / Photographe du Mozambique, Paris/Maputo 1994.
.REVUE NOIRE, nº 15, Paris 1994.
1990
Karingana ua Karingana, Il Mozambico contemporaneo visto dai suoi fotografi
a cura di Gin Angri , introduzione di Mia Couto. [Milano] : Coop (Associazione Nazionale Cooperative di Consumatori, in collaborazione com la Lega, Comitato Nazionale per la Cooperazione allo Sviluppo - Conacs ), 1990. Dist. a cura de Edizioni Sipiel, Milano. Ed. bilingue, it. & port., 160 p. : 132 fotos b/n; 26 x 26 cm. (Catalogo della Mostra, Palazzo d'Accursio, Bologna)
capa sobre foto de José Cabral (Pastor, Moamba, província de Maputo, 1983). Poema de José Craveirinha; Mia Couto, "Moçambique: retratos da esperança"; Gin Angri, "Notas sobre a fotografia moçambicana". Biografias dos autores (25 fotóg. e o colectivo do CFF, Centro de Formação Fotográfica, dirigido desde 1983 por Rangel): Ricardo Rangel e Kok Nam; Rui Assubuji, José Cabral, Joel Chiziane, Fernando Martinho, Alfredo Paco, Sérgio Santimano, Luís Souto, Naita Usseme, etc.
#
É um dos marcos da fotografia feita em Moçambique (por via da cooperação italiana), depois do álbum de 1981-84 Moçambique a Terra e os Homens (afirmação da Associação Moçambicana de Fotografia, impresso em Roma) e antes de Imaginando Vidas de 2002, fruto da cooperação suíça, num ritmo de um grande álbum colectivo por década (1981/84, 1990, 2002). Para os anos 70 aponte-se Moçambique a preto e branco, ed Codam, Lourenço Marques, Dezembro 1972 ("edição limitada")
É um livro de guerra e de transição política, com as marcas da guerra civil somada à intervenção exterior da Rodésia e da África do Sul (ao longo de 16 anos,1976 a 1992 - data do tratado de paz entre a Frelimo e a Renamo, assinado em Roma), e com sinais já bem visíveis da viragem política (1986: a morte de Samora Machel; 1989, congresso da Frelimo e queda do muro de Berlim; 1990, nova constituição e libertação de Mandela). Livro de combate e também de recusa da guerra. No sentido da reconstrução o país.
A ordenação das imagens é temática, começando com os desalojados, depois a morte de Samora e as pragas da guerra; os grupos étnicos e as culturas regionais; escola e saúde; a agricultura de subsistência; a reconstrução económica; o quotidiano de Maputo.
Jaime Macamo, Mulheres e crianças com vestidos de casca, Zambezia, 1989
Rui Assubuji, Mina antipessoal, Inhambane, 1989
José Cabral, Vendedora, Maputo, 1989
Atravessando conjunturas políticas e programas ideológicos diferentes, em Moçambique, a fotografia está presente como testemunho e documentário, mas também como revelador, agente ou instrumento da mudança. A experiência e a lição de dois fotógrafos vindos do período colonial - Ricardo Rangel e Kok Nam - é apropriada e prosseguida por sucessivas vagas de discípulos ou continuadores: outros grandes fotógrafos que se afirmam (e alguns sobrevivem ou resistem) em situações ainda mais difíceis: Naita Ussene, Joel Chiziane, Fernando Martinho, Luís Souto, Sérgio Santimano, José Cabral, Rui Assubuji e outros. Neste livro reúne-se o trabalho dos fotógrafos do Instituto de Comunicação Social (ICS), da Agência de Informação Moçambicana (AIM), da cooperativa fotográfica Alpha e também dos professores e ex-alunos do Centro de Formação Fotográfica, criado em 1983.
Kok Nam, menos conhecido que Rangel, também um foto-jornalista de longa carreira (depois director do Savana) tem neste livro uma das presenças mais seguras e mais extensas, ocupando-se do exército da Frelimo à distância das linhas da frente, com uma clara vontade de humanização do que seria à data apenas um exército. José Cabral, autor da foto da capa, é o intérprete privilegiado desse tempo de mudança, já à distância do gosto pelo imediato ou acidental presente no discurso jornalístico em geral e substituindo a densidade suspensa das suas personagens à retórica das construções simbólicas. As suas 12 imagens (o mercado de Xipamanine, as ruas, os cafés ou bares) marcam o fim do volume e os tempos que se lhe seguem.
O título é tomado de um poema de José Craveirinha.
#
1992 >
Uma vida a reportar a vida, pref. de Leite de Vasconcelos, ed. ENACOMO, Empresa Nacional do Comércio, Maputo. (referido em Iluminando Vidas, 2002, nas biografias de Rangel, Kok, José Cabral, Naíta Ussene e Martinho Fernando.) [um livro que desconheço e de que ignoro outras referências]
1993 >
MOÇAMBIQUE. CINCO OLHARES. António Valente, Joel Chiziane, José Cabral, Kok Nam, Naita Ussene
Texto de Mia Couto ("As nossas imaginografias"). Biografias. Exp. no Forum Picoas, produção CIDAC, Centro de Informação e Documentação Amilcar Cabral, Lisboa , 23 Abril – 2 Maio. Cat. design At. H. Cayatte, 16 pág. (rep. 91 fotos PB em imagens de 30 mm)
Depois das guerras, com algumas das suas feridas, mas é em especial "a epopeia de um povo que se descobre em estado de adolescência" (Mia Couto) "O fotógrafo assume um trabalho pioneiro num país onde tudo corre o risco de ser novo (...) Há aqui um povo que inaugura a sua imagem"
#
AFRICA, AFRICA
Editors Olaf Gerlach Hansen and Vibeke Rosttup Bøyesen, ed. Images of Africa, Denmark, 80 pág. English, ilust. pb. Prefácio de Wahome Mitahi, Kenya, mais 12 tx de autores do Egipto, Nigéria, South Africa, Zimbabwe e Burkina Faso. Notas biográficas (excepto Moçambique)
Seydou Keita, Mama Casset, Peter Magubane, etc (Ghana, Mali, South Africa, Zimbabwe, Mozambique, Senegal, Camereoun, Tunisia, Morocco, Swaziland, 19 fotógrafos) incluindo Martinho Fernando, pp. 26-27, José Cabral, pag. 34, Naita Ussene, pag. 35. ( Colab. Atout Centre, Paris e Roger Aubry; Revue Noir, etc. Anuncia Bamako 1994)
Classifica-se como a primeira grande exp. de fotografia africana - "is the first joint presentation of so many African photographers" e refere quanto ao processo de organização: "has organized a competition for african photographers". Esta será também a 1ª presença internacional dos fotógrafos de Moçambique, para além da circulação portuguesa.
Fishermen outside Maputo / pescadores diante de Maputo. de NAITA USSENE
1994 >
Ricardo Rangel, Fotógrafo de Moçambique / Photographe du Mozambique
(Coédition) Centre Culturel Franco-Mozambicain, Maputo / Editions Findakly, Paris. Bilingue français/portugais. Ilust. pb, 24 x 24 cm, 120 pages. Imp. Paris, Maio. "Fotografias, Moçambique 1953-1993". Tx de José Craveirinha ("Carta para o Ricardo sobre as suas fotografias"), Mia Couto ("Os deuses espreitaram por seus olhos"), nota inicial do autor (agradecimentos, a Luís Bernardo Honwana e Folco Rozand, além dos anteriores), nota biográfica, lista ( imprecisa ) de exposições. Retrato por Rogério (ver acima).
"Album des photographies de Rangel, rescapées des destructions de la PIDE.", "Pendant toute une vie de photographe, Ricardo Rangel de combats en prisons, a traversé l’histoire du Mozambique, l’occupation portugaise, la guerre de libération, l’histoire de tout un peuple." (ed) (R.R. 1924-2009)
O livro inclui apenas duas fotos da série "Pão nosso de cada noite" (I e II, datadas de 1960), a qual dá nesse mesmo ano o título à sua mostra em Bamako, nos 1ºs Rencontres, e que é também apresentada na Revue Noire nº 15 (aí referida como dos anos 60). Os títulos das fotos desta edição foram atribuídos por José Craveirinha, segundo diz R., no filme de Licínio de Azevedo, 2006.
(Em 1985 ocorrera 1ª exp. individual de Ricardo Rangel em Maputo, na Organização Nacional de Jornalistas. Já depois de exp. em Itália e Suécia. Uma edição em livro de Pão nosso..., com textos de Craveirinha e Nogar é anunciada em 1991, mas será adiada até 2004. Ver LC Patraquim, "Recordações da Rua Araújo", Público 30.6.91)
REVUE NOIRE, nº 15, Moçambique / Photographies
Paris, dec. 94 – jan. fev. 95. Text fr./ engl. (e port. no dossier sobre Moçambique), 100 p. Dir. Jean Loup Pivin. (Capa, foto de Rémy Gastambide (negro américo-asiático, Vietnam)
O número é duplo, reunindo o núcleo temático sobre Moçambique (Pintura e Escultura; Literatura), coordenado por Jean-Jacques Mandel e Simon Njami, e o núcleo "Fotografia", coord. por Jean Loup Pivin e Pascal Martin Saint Léon: "Une nouvelle photographie" que procura ser a 1ª síntese geral da fotografia africana (pp. 42-83) - depois de uma antologia inicial de fotógrafos africanos no nº 3 da Revue Noir, Dezembro 1991 -, e anuncia os Premières Rencontres Photographiques de Bamako, Mali, 05-11 décembre 1994, org. Fondation Afrique en Créations.
I - Moçambique: tx de Jean Loup Pivin, Simon Njami ("A paz, a sério"), Aida Gomes da Silva. Pintura - Escultura (Máscaras Maconde, Alberto Chissano, Malangatana, Titos, Zandamela, Francisco Maria Conde, Reinata Sadimba Passema e um "Panorama"; Literatura: Craveirinha, Mia Couto e outros. Fotografias de Ale Junior (contracapa), Rui Assubuji (p. 1 e 12), Sérgio Santimano (p. 3, AIM e 8), Naita Ussene (5), José Cabral (p. 7), Kok Nam (28) e Alfredo Paco, ICS (11). Martinho Fernando, CFF (Fotos Chissano) e Fotos CFF.
E também, em "Une nouvelle photographie": Rangel e Moçambique, pag. 59-60 + 5 fotos de "Notre pain de chaque nuit", pp. 64-65; Sérgio Santimano (5 fotos, pp. 76-77), Rui Assubuji (2, pag. 78), Ale Junior (pag. 67).
II - "Une nouvelle photographie (1es Rencontres de Bamako)" - Em destaque: Mama Casset* (ed. R.N.), Meïssa Gaye, Seydou Keita (retrosp.)**, Rotimi Fani-Kayode* (ed. R.N.1995), Elise Fitte-Duval*, Rashid Lombard*, Touhami Ennadre, Malick Sibidé**, Syli-Photo Guinée, Samuel Fosso**, Cornélius Yao Augustt Azaglo, R. Rangel* - exp.: "Notre pain de chaque nuit, les nuits de la Rua Araújo (1960)" (sic), Yves Pitchen**, Pierrot Men**, Bouna Medoune Seye* (ed. R.N.), Dorris Haron Kasco* (ed. R.N.), Remy Gastambide*, John Liebenberg*, Santu Mofokeng**, Ingrid Hudson**, Santimano, Assubuji, Moctar Kane*, Mohammed Dib* (ed. R.N.)
(a bold mostras indiv. em Bamako / (*) 10 exp. monográficas apresentadas pela Revue Noire (no Espace Revue Noire), com a edição de 4/5 livros R.N., coll. Soleil + "La photographie en Côte-d'Ivoire", comis. Dorris Haron Kasco, e "Namibia of Today", com. John Liebenberg / (**) + 10 exp. org. por Françoise Huguier e Bernard Descamps + Alioune Bâ, Racine Keita et Django Cissé (Mali), Agence Malienne Amap et Onacig Guinée, Djibril Sy, Boubacar Touré-Mandemory, Moussa M'Baye, Jenny Gordon.
Note-se que são Françoise Huguier e Bernard Descamps quem está por trás da iniciativa dos Rencontres, a que se associa a Revue Noir com outros apoios e em concorrência directa. De facto, não tendo existido um catálogo, a publicação oficial apareceu sob a forma de um suplemento da revista Photographies Magazine ( ver aqui )
No final da Revue Noire publica-se "La lettre d'Afrique en Créations", 12, com o programa detalhado dos Rencontres
Revelação de Malick Sibidé, Samuel Fosso, etc. Retrospectiva de Seydou Keita. Não existindo catálogo dos Rencontres, a Revue Noir nº 15 assegurou a informação (fazendo ao mesmo tempo um imprevisto destaque de Moçambique).
(Outras edições: Revue Noire nº 8, Guinée Bissao; nº 10 - Cabo Verde, capa Tchalé Figueira; nº 29, Juin-juillet-aout, 1998, ANGOLA)
#
A registar noutra "secção",
THEODOSSIADIS, GEORGIOS, OS Pescadores. A story about man and the sea in Mozambique, Greece and Sweden.
With text by Luis Carlos Patraquim, Nikos Sidiropoulos and Ingemar Rhedin. Stockholm: Ox Eye, 1989. 92, (4) p. 23.5 x 28, 8 cm. Hardcover. Photo Illustrated in black and white. (Com o apoio da Cooperação Sueca)
#
A "descoberta" da arte africana pelo sistema artístico internacional ocorre em 1989 com Les Magiciens de la Terre, onde não se expõem fotografias. A descoberta e integração da fotografia nesse mesmo circuito verifica-se a partir de 1991 (Revue Noir e iniciativas paralelas), e consolida-se em 1994 com os 1ºs Rencontres de Bamako. Moçambique está quase desde o início nesse processo (desde 1993, Dinamarca; após o acordo de paz em 1992), em especial em torno de Ricardo Rangel (1994, monografia e exp. em Bamako), mas a integração no seu núcleo mais "dinâmico" não se verifica, e, aliás, o maior sucesso mediático internacional é obtido pelo exotismo dos retratistas.
Se esse é o ritmo internacional, há também um ritmo português de descoberta que é mais precoce mas esporádico e inconsequente, em parte dirigido pela atenção a autores portugueses (Rogério em 1981; José Henriques e Silva exposto em 1993, mas editado só em 1998), mais Moira Forjaz editada em 1983 e os "Cinco Olhares" de 1993. Sem qualquer ligação ao processo de reconhecimento internacional e sem nenhuma coordenação com os acontecimentos editoriais em Moçambique (1972, 1981/84, 1990)
A CONTINUAR
Comments