Outras montagens quiseram fazer da colecção uma coisa árida e exígua. Agora, mostrada em extensão (até à Pop, anos 60), sem exclusões facciosas, na sua diversidade desigual, na sua lógica voluntarista de representar muitas direcções e muitos artistas, revisita-se a Colecção Berardo com uma recuperada frescura, com reencontros e encontros de obras menos vistas, às vezes antes afastadas por serem peças independentes de estilos colectivos, menos fáceis ou menos na moda, o que só joga a seu favor.
Não me lembro de ver antes o inclassificável Öyvind Fahlström (Babies for Africa, 1963), curiosamente mostrado entre os granulados do Alain Jacquet e o Sigmar Polke
pormenor de ver ao perto:
E gosto sempre de ver o grande estudo de Renato Guttuso (Estúdio e Paisagem, 1960)
que não é realismo socialista nem nova-figuração, nem "figuração existencialista" (e é erradamente sob esta etiqueta que se expõe ao lado de Bacon), súmula de retrato, natureza-morta, interior e exterior
Tal como uma grande velha senhora, a Louise Nevelson (Royal Tide - Down, 1960 / maré real - amanhecer? pq não traduzem os títulos como se faz em todo o mundo civilizado?)
Gosto da montagem em muitos casos acumulada, ganhando espaço para expor mais coisas - e mesmo assim ficam de fora obras como o grande (em tamanho) Riopelle de 1952, o excelente Tàpies de 62, o Pomodoro de 1961, que fica bem perto da escultura do Paolozzi. Já agora, o pequeno Moore de 1937 (Stringed Figure, figura de corda ou encordada) devia ser mostrado horizontalmente, porque não é uma peça de parede (tem sido sempre mal mostrado e publicado). E faltam outras coisas que aqui deviam estar, como o Peter Saul, o Hockney, o Arroyo...
Por vezes a montagem muda, suspende a (acertada) acumulação das peças e reserva toda uma parede para um pequeno quadro, no caso do Ad Reinhardt, Pintura Abstracta, 1962 - é a atracção pelo vazio, o limite conceptual do formalismo, ao lado do jogo formal da escultura do Anthony Caro.
Ou também na insólita associação de Albeers com Leger (mais Takis e Tinguely), que merecem um capítulo de texto (mas quem ilustra ou explica quem? - não será o citado Roger Garaudy!!)
Mas de facto problemática ou incompreensível é a junção de Cy Twombly (sem título, 1957) com o Larry Rivers (Partes do corpo: Lição de Vocabulário Francês III, 1964) - e se a ideia foi associar a escrita cursiva e o gatafunho à letra impressa, a opção é infeliz. Seria mais oportuno aproximar a senhora despida do casal nu de Pearlstein (que também vai bem, por contraposição, com o Nu de pé do Eugene Leroy, de 1958; na sala existencial do Bacon...), ou do casal vestido de Alex Katz...
Não sei se os critérios da montagem são do novo director, Pedro Lapa, mas o resultado global é positivo. Graças, em especial, à colecção, naturalmente, e também ao respeito que se teve pela sua saudável diversidade.
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