Atrás destas discretas letras nas janelas está uma extraordinária exposição de fotografias onde se redescobre a obra de Gérard Castello-Lopes pela mão de Jorge Calado, quando se julgava que já tudo se conhecia. Desta vez o BES presta um serviço à fotografia, redimindo-se da grande trapalhada em que se tem metido nesta área (o marketing prefere o escândalo?) e em que, ao que se sabe, vai continuar a meter-se, com um desacreditado concurso.
Agora trata-se de uma retrospectiva que fica como referência não só quanto ao artista que é objecto de estudo e apresentação como quanto ao modo de reavaliar uma obra e de a expor na sua radical singularidade - desarrumando toda a cronologia, todos os temas, as possíveis séries e os lugares, e "desorientando" também o que podíamos ter conhecido em anteriores exposições e edições. Para ver melhor cada uma das imagens e, ao mesmo tempo, toda a obra na sua totalidade autoral. Certamente também para propor a oportunidade de pensar o que é a fotografia como prática, processo criativo, arte, com as suas condições específicas e originais.
Não existem fórmulas que traduzam em banalidades confortáveis, em aparências de saber, a diversidade destas imagens e as muitas pontas comuns que nelas se inscrevem (interesses sociais e formais, afinidades culturais e estilísticas, experiências e achados, etc). Não existem capítulos, secções, épocas ou géneros arrumados em prateleiras que permitam o habitual papaguear das visitas orientadas. Momento a momento o espectador é convidado a interrogar-se sobre as razões que levaram o comissário a escolher e a aproximar duas ou mais fotografias, sobre as circunstâncias e os motivos que levaram o autor a produzi-las (e a dar diferente dimensão às provas impressas), e, no fundo, sobre o que ele próprio vê nas imagens que olha. Nada está pronto a usar, esta não é uma "fast exhibition", a exemplo da "fast food". Por vezes há uma afinidade formal que se sinaliza, noutros casos existe um motivo ou tópico comum, noutros ainda trata-se da reiteração de um modo de ver (um ângulo particular, uma sucessão de planos), ou formam-se sequências temáticas, ou então aproximam-se imagens pela sua diversidade irredutível. Não se pretenderá que tudo (150 imagens) é de 1ª qualidade, mas a experiência, o material de trabalho ou lugar de passagem, o vestígio, contam aqui para aprender a ver e para aprofundar o encontro com as visões e ambições de Gérard Castello-Lopes.
Não é um "digest", mas antes uma revisão das existências de um espólio e de uma carreira (1956-2006) que nos devolve um olhar renovado sobre a obra e que permitará, a partir daí, propor outras antologias, equacionar outras leituras.
Algumas frases irregularmente distribuídas pelas paredes servem de faróis, sem marcarem capítulos: "Dois períodos, um único olhar" - "Espaços enviezados, vorticistas e cubistas" - "Espaços modulados por rectângulos, como uma folha de contactos" - "Escala: as dimensões da fotografia não são indiferentes à forma como é percebida" (neste caso, as cinco pedras de diferentes dimensões testam a validade da tese)
A exposição é comissariada por Jorge Calado. "BES Arte & Finança" (sic). Marquês de Pombal- Dias úteis 9-21h
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