Museu Berardo, exposição de Vic Moniz (que alguma crítica em geral complacente resolveu condenar). Domingo, 25 de Setembro
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Eu levo a sério a crise financeira e a chamada austeridade ou correcção dos défices.
Eu sei que os cortes no Orçamento da Cultura (SEC) para 2012 só podem ser "cegos" porque está (quase) tudo em situação de penúria e mendicidade.
Eu sei que o desiquilíbrio de meios entre os museus do Estado e os que são sustentados por parcerias com privados por via de Fundações (Serralves e Berardo) é extremamente gravoso para os primeiros e para os seus responsáveis e funcionários.
Eu sei que um "capitalista" que gasta dinheiro em arte e a expõe ao público é mal visto pelos que têm outros vícios menos democráticos; sei que um self-made man é sempre alguém que muitos e por diferentes razões querem ver regressar à situação de origem, e sei que a operação BCP criou um estado de tesouraria e uma vulnerabilidade (a ele e a outros, de quem não se fala) muito complexo.
Sei também que o "meio da arte" não gosta de museus, porque a alguns repugna a ideia de que um museu escolhe os artistas que vão merecendo entrar no seu património (preferem "centros de arte"); porque gostam mais que os recursos se vão distribuindo pelos candidatos a artistas (num compra e deita fora que se traduz numa rede de favores e dependências à volta da "acção cultural", de institutos e direcções-gerais); e porque o "meio da arte" só valoriza aquilo que controla ou absorve, que o serve. Serralves faz parte do "meio da arte" e é defendido por ele. O Museu Berardo nunca esteve na dependência do "meio da arte", conseguiu não se vincular à sua lógica e às suas manobras, graças ao coleccionador e ao primeiro director, Jean François Chougnet. Com a sua gratuitidade e a sua programação plural tem sido um êxito, também de público - o que é mal visto por muitos.
Sei mais coisas (sei que a Imprensa publica o que lhe passam para a mão e é destituída de memória - em geral, também de escrúpulos), mas o que me interessa sublinhar agora é que o ataque ao Museu envolve muitas hostilidades de todo o tipo e tortuosas razões - políticas, financeiras, pessoais, culturais, etc. O projecto de um museu de arte moderna e contemporânea (desde o início do século XX, o que Serralves não é, nem nenhum outro) dotado de uma colecção internacional é neste caso a questão essencial, e é a nossa última oportunidade de tal coisa existir em Lisboa e em Portugal. Essa é uma questão nacional. O confronto com Madrid, mesmo sem Guernica, é de uma grande dignidade.
Sei também que o que foi o módulo de exposições antes de se instalar a colecção, então com as suas indefinições, os seus improvisos, os seus acidentes e escândalos internos, com algumas das suas opções estéticas apontadas a autismos estéticos e manobrismos críticos, etc.
Museu Berardo, obra de Vic Muniz (o mapa-mundo que se vê na produção fotográfica é feito de lixo...)
Alguns documentos fundadores, aqui:
http://alexandrepomar.typepad.com/alexandre_pomar/2007/06/acordo-ministri.html
Posted by: AP | 10/08/2011 at 10:44
Muito bem dito. Há dias em que custa mais recordar o mal que disseram de Eduarda Dionísio quando publicou em 1993 o livro "Títulos, acções e obrigações", retratando o (já então criticável, se é que alguma vez o não foi) desgoverno da cultura em Portugal, no caso entre 1974-1994. Como disse em certa ocasião Nuno Crato, ainda mal encaixado na fatiota de ministro, "vamos a ver no que isto dá". Por tudo o que vemos e sabemos, não vai dar grande coisa. Não me lembro de nenhuma Secretaria de Estado da Cultura que tenha atuado consistentemente na cultura nacional e a conjuntura económica não vai ajudar grande parte das estruturas culturais faraónicas criadas ao longo das duas últimas décadas e agora ameaçadas com minguado sustento.
Sérgio Reis
Posted by: Sérgio Reis | 10/12/2011 at 00:03