Como se representa em pintura (num quadro) o salto de um guarda-redes?
Assim, como fez o Aleksandre Deineka em 1934 (Vratar / Guarda-redes, óleo/tela, 119 x 352 cm, Galeria Estatal Tretyakov, Moscovo) Foto: Fondación Juan March © Ferran Mateo - in Rusia hoy (ver outras imagens no mesmo local)
ou, completo (com 3,52 metros de largura), em duas grandes páginas do catálogo:
A pintura moderna existe, feita com assuntos modernos, mas mostra-se pouco, porque se foi tentando estabelecer uma história canónica da arte que relegava para as margens ou para a invisibildade total o que não fazia parte da corrente tida por principal e por certa, a figuração e os realismos, quanto às décadas de 20 a 50. Neste caso o Guarda-redes além de não ser "abstracto" devia ser condenado sob o anátema do realismo socialista, que à data se impunha oficialmente e de que o Deineka foi também, em muitas das suas obras, um praticante obrigado. Sobreviveu o pintor e fez sobreviver a pintura, o que é duplamente meritório. Após a Guerra Fria e postas em crise as leis do modernismo formalista e suas degenerescências (minimais, conceptuais, etc) passa a ver-se melhor a pintura moderna e contemporânea. Não é o "retorno ao real" vendido pelo Hal Foster no mercado fechado da arte sobre a arte, é a continuidade e a reinvenção do interesse pelo real e a vida.
O quadro via-se na Fundação Juan March, em Madrid, na grande exposição que lhe foi dedicada, relacionando-o com a arte dita de vanguarda na URSS, com a qual se formou e que também praticou, em especial na área do cartaz e da ilustração, nos anos 20 e 30. Mas essa ideia de vanguarda, na arte e na política, já deixou de ser credível enquanto oposição à não-vanguarda.
O culto do desporto e do corpo perfeito, atlético, foi um elemento das ideologias totalitárias da época (URSS e Alemanha nazi), mas isso não reduz as várias obras de A.D. com temas desportivos, que são em geral magníficas, à ilustração ou à dependência de imposições do totalitarismo estalinista. Aliás, Deineka era ele próprio um desportista, sabia do que pintava.
Embora ache as tuas conclusões sobre a questão do corpo ligeiramente redutoras, concordo com tudo o resto, e lembro uma magnífica exposição no Pompidou sobre os diferentes realismos entre as duas guerras (o catálogo, http://www.amazon.com/Realismes-1919-1939-exposition-Staatliche-Kunsthalle/dp/2858500738 é uma antologia incontornável). Tenho pena de não ter visto a exposição de Madrid. Tens mais imagens?
Posted by: Luísa | 01/19/2012 at 15:25
Mais fotos: segue a pista "Rusia hoy" na 1ª legenda acima - e tens + 10 imagens da exposição e outras pinturas. Vou ver se acrescento. E havia a tb. a óptima exp. paralela em La Casa Encendida.
Se calhar não abordei a questão do corpo... e não quis tirar conclusões. Só tentei defender o desporto como assunto de pintura (moderna, claro): além do futebol há mais desportos (ginástica, corrida, natação...), e há muitos mais corpos na pintura do Deineka. De trabalhadores/as (e heróis do trabalho), de crianças e outros só porque sim, porque é agradável vê-los, para além dos interditos religiosos e iconoclastas, ou "vanguardistas" (em geral também místicos e iconofóbicos - idealistas e/ou ascéticos).
Pois, o Jean Clair, um pioneiro que foi envelhecendo mal. Outros catálogos (os Anos 30 no MAM Paris, os Realismos do Tomàs Llorens no Thyssen, etc) foram actualizando a questão, que na minha opinião domina o início do novo século (por isso, e porque a Guerra Fria acabou, é que vão recuperando o Deineka e algum outro realismo socialista escolhido).
E obrigado pela atenção.
Posted by: AP | 01/19/2012 at 18:53