(Duvido que se deva recordar Fernando Lanhas principalmente como pintor - à data da sua morte em 4 de Fevereiro de 2012)
Sobre a exposição de 2001 em Serralves: no Expresso / Cartaz, 21 de Abril:
Sobre o museu que dirigiu de 1973 a 1993, então encerrado por ameaçar ruína:
Um certo museu
Publicado em 2006-11-23
"Noticiaram os jornais que, finalmente, o problema do Museu de S. João Novo ia ter solução, com a aquisição do edifício e a reactivação daquela instituição. E também que o Museu de Arte Popular, de Lisboa, seria extinto. Espantei-me. Quanto à segunda questão, os lisboetas que se havenham com ela, e esbracejem (ou não) como entenderem. A primeira, sim, interessa-me. E muito.
A situação do antigo Museu de Etnografia e História do Douro Litoral é não apenas um escândalo, mas uma indignidade cívica. E só num país que perdeu o sentido do verdadeiro progresso - que também passa pela existência de bons museus, onde se faça a instrução do público -, o que lhe sucedeu poderia acontecer. Se quiserem, só num país que perdeu o decoro uma herança como a consubstanciada no espólio daquele museu poderia ser menosprezada.
O Museu de S. João Novo foi fundado em 1940, sob o impulso do dr. Pedro Vitorino, quando a Junta da Província do Douro Litoral alugou aos descendentes do "opulento capitalista" Pedro da Costa Lima o belo palacete setecentista daquele largo. A partir daí, graças a personalidades como Augusto César Pires de Lima, Armando de Matos, Bertino Daciano, Eugênio da Cunha e Freitas, Fernando de Castro Pires de Lima e outros, o Museu recolheu uma notável colecção de objectos, equipamentos e documentos representativos das artes e ofícios, actividades do quotidiano e manifestações festivas - além de peças arqueológicas, litúrgicas e do que podemos definir, abreviando, por elementos do folclore - do chamado Douro Litoral (com relevância para a própria cidade do Porto).
Segundo os critérios (ou, como agora se diz, o paradigma) da época, o programa museográfico da instituição seria estabelecido a partir da distribuição das colecções por salas correspondentes às diferentes temáticas. Havia, assim, as salas dos teares, linho, trajo, mobiliário, brinquedos, rendas e bordados, habitação, jogos e cangas, barcos, medicina popular, religiões, arraial, e amor popular, reunindo milhares de peças da maior qualidade e algumas (estou a lembrar-me dos jugos e cangas) de valor hoje incalculável pela raridade. Além disso, o Museu publicou, ao longo dos anos 50, a revista "Douro Litoral", a que sucedeu, entre 1963 e 66, a "Revista de Etnografia", arquivos incomparáveis de uma escola portuense de etnografia e fontes preciosas para o conhecimento do país (e não só, pois nelas colaboraram investigadores de outros países). E, além do resto, os espaços pertencentes ao Palacete-Museu de S. João Novo guardam dos melhores panos conservados da Muralha (dita) Fernandina da cidade.
Tudo se encontrava exposto, arrumado, explicado, com critérios ultrapassados, é certo, mas, sobre isso, ponto final, parágrafo (o Museu do Quai Branly, recentemente inaugurado em Paris, reuniu as colecções oriundas do antigo Museu do Homem, recolhidas no período colonial puro e duro segundo a visão eurocentista de "artes primitivas" mais do que enterrada. Tal facto não impediu a adequação daquele fantástico repositório de objectos, rebaptizados segundo o conceito de "artes primeiras", ao mais moderno museu europeu). E, com a direcção do arquitecto Fernando Lanhas, o Museu de S. João Novo ganharia novos atributos no campo da história da evolução do Homem no Universo e da adequação de algumas colecções a perspectivas museológicas dirigidas para uma vocação didáctico-pedagógica.
No início dos anos 90, o Museu foi encerrado devido às precárias condições do edifício e aos riscos de deterioração dos objectos. E o problema não mais teve solução. Correram rumores da sua extinção, da dispersão das colecções ou da transferência para outro concelho. Desmantelou-se a rica biblioteca , armazenaram-se peças num local da cidade (em condições tão más quanto as do edifício). Dizem-me que a colecção de brinquedos já saiu do burgo.
Quinze anos depois, mantém-se o lento assassinato de uma instituição organizada com tanta dedicação por um punhado de homens devotados a uma causa que os burocratas-funcionários da cultura nem categoria têm para entender, quanto mais respeitar. O Museu de S. João Novo poderia constituir, com um programa moderno e novo fôlego, um pólo activo de conhecimento das tradições da cidade e sua região, um recurso educativo de primeiro plano, um motor dinâmico da regeneração do burgo. É possível, em pleno século XXI, na Euro pa, pensar-se que desenvolvimento, competitividade, produtividade, modernidade e outros tops não são, antes do mais, questões culturais num quadro civilizacional? E quanto tempo mais teremos de continuar a suportar vergonhas - que desmentem a civilização - como o desprezo e o abandono votado ao nosso Museu (que foi) de Etnografia e História?
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e esta coisa antiga em Área Metropolitana do Porto
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Museu de Etnologia do Porto |
Entidade
Instituto Português de Museus Descrição
O Museu de Etnologia do Porto foi criado em 1945, sob a designação de "Museu de Etnografia e História do Douro Litoral". Desde a O Museu de Etnologia do Porto foi criado em 1945, sob a designação de "Museu de Etnografia e História do Douro Litoral". Desde a sua fundação, o museu encontra-se instalado no Palácio de S. João Novo, datado do séc. XVIII, que estudos recentes apontam tratar-se de um projecto de arquitectura da autoria de António Pereira. O Palácio de S. João Novo sofreu uma degradação acentuada desde 1970, com reflexos particularmente negativos nas condições de conservação das colecções etnográficas. Em 1989, o museu transitou para a tutela do IPPC e, em 1991, para o IPM, vindo a ser encerrado ao público em 1992 dado o avançado estado de ruína do imóvel. Desde então, o IPM tem vindo a diligenciar pela salvaguarda do espólio do museu, traduzida, numa primeira fase, pelo depósito das suas colecções em diversos museus, com vista à sua protecção. Numa segunda fase foram efectuadas, com a colaboração da DGEMN, obras nas coberturas e na fachada do Palácio. Numa terceira fase, o IPM procederá à resolução da actual situação do Museu, o que ocorrerá posteriormente ao processo de sistematização do seu inventário. Localização
Porto
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O museólogo Fernando Lanhas (director entre 1973 e 1993) não devia ser esquecido, em particular pelo museólogo João Fernandes (director de Serralves, de ? a ? - já me esqueci). Mais do que "pioneiro do abstraccionismo", F.L. foi o continuador de Augusto César Pires de Lima (1888-1959), responsável pela criação do Museu de Etnografia e História do Douro Litoral, e do seu sobrinho Fernando Castro Pires de Lima (1908-1973), médico e etnógrafo, que lhe sucedeu.
Também foi o arquitecto e responsável pela montagem do Museu de Conímbriga (1982), e projectou e organizou a montagem do Museu Municipal da Figueira da Foz (1980), entre vários outros museus e exposições. Na sua cronologia do catálogo de Serralves tb se pode ler "Executa o projecto geral da recepção ao Papa João Paulo II na Diocese de Porto" (1983).
Foi arquitecto, pintor, etnógrafo e arqueólogo, "designer gráfico" e museólogo, etc. Duvido que se deva recordar Fernando Lanhas principalmente como pintor.
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