O segundo tema que muito me interessa em relação com o livro de Ana Vaz Milheiro tem como suporte essencial o extraordinário álbum fotográfico Exposição-Feira de Angola, 1938 / Álbum comemorativo da exposição-feira de Angola. Luanda XCMXXXVIII ( 6 e [144] p., 24 x 31 cm) Impressão "Offset" na Litografia Nacional do Porto
Os clichés são atribuídos a C. Duarte, mas são (todos?) de Firmino Marques da Costa (n. 1910-?), também o fotógrafo dos 5 volumes dedicados à visita às colónias de Carmona, o qual inaugurou a exp. de Luanda em 15 de Agosto de 1938. A edição não é atribuída mas será seguramente do Governo Geral, e terá sido destinada apenas a ofertas.
Notícia decisiva (na pág. 3 do álbum) é que "a chefia dos serviços técnicos foi confiada ao (então) funcionário aduaneiro Vasco Vieira da Costa, artista de elevado merecimento". Nascido em Aveiro em 1911, Vasco Vieira da Costa concluiu o curso de arquitectura no Porto em 1946 e fixou-se em Luanda em 1949 ou 50, notabilizando-se com a construção ndo Mercado de Quinaxixe, em Luanda, de 1950-52/53 (destruído em 2008).
Certamente o planeamento global é da sua autoria, tal como os projectos de muitos (ou de quase todos os ?) pavilhões. Muitos deles representam a melhor Art Déco portuguesa e outros estabelecem um extraordinário leque de estilos e referências, do suprematismo a expressões vernaculares.
Antecedendo de pouco a Exposição do Mundo Português, a Exposição-Feira de Angola foi uma iniciativa local e constituiu um empreendimento de escala comparável à de 1940, que traduz a força e a ambição dos interesses económicos e políticos próprios da colónia. Estranhamente, ou talvez não, foi quase sempre ignorada na literatura sobre as exposições coloniais. A dimensão do empreendimento, o seu significado local (político-económico, e talvez em parte associado a a ambições autonomistas), a qualidade do seu programa arquitectónico - e o facto de ele ter revelado o futuro arquitecto Vasco Vieira da Costa - bem como a importância editorial e fotográfica do álbum (um dos melhores photobooks portugueses) justificariam uma grande atenção ao evento.
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Exposição Feira de Angola (1938), Actividade Económica de Angola / Revista de Estudos Económicosde dedicado à — Propaganda e Informação. Ano III. Números 9 a 12 - Março a Dezembro de 1938 (publicação trimestral). Ed. Governo Geral de Angola, Repartição de Estudos Económicos.180 pp. + "gravuras" (isto é, muitas das fotografias do Marques da Costa publicadas no fabuloso Álbum com o mm título). (Ver sumário abaixo*)
Na página da revista em que nomeiam os responsáveis pela Exposição-Feira de Angola lê-se: Chefe da Secção Técnica, Vasco Vieira da Costa. Outros colaboradores: Fernando Batalha, arq. - autor do projecto do Pavilhão Principal, cuja construção dirigiu; João Eugénio de Morim, autor dos projectos dos pavilhões oficiais da provícia de Benguela, do bar-"dancing", e do monumento a Portugal colonizador. Artistas e desenhadores (...).
As publicações Exposição feira de Angola : guia da exposição. Luanda : Agência Técnica de Publicidade, 1938. - 5 p, e Exposição feira de Angola : catálogo geral oficial. - Luanda, 1939. - 25 p. (Sociedade de Geografia) não esclarecem mais sobre a autoria dos pavilhões.
É neste catálogo que o retrato de Vasco Vieira da Costa se publica, logo após os retratos oficiais do Dr. Frederico Bagorro Sequeira e Augusto de almeida Campos, director e director adjunto da Exp.-Feira, e formaram os três "uma comunidade de trabalho", segundo refere num discurso o 1º responsável (p. 60-63), no Boletim Geral das Colónias . XV - 163 [Número especial dedicado à viagem de S. Ex.ª o Presidente da República a S. Tomé e Príncipe e a Angola (II)] PORTUGAL. Agência Geral das Colónias. Nº 163 - Vol. XV, 1939, 628 pags. (ver em especial pp. 45-75) Disponível em formato digital.
A Exposição-Feira de 1938 é referida por José Manuel Fernandes, em "Arquitectura e urbanisno no espaço ultramarino português", História da Expansão Portuguesa, vol. 5, p. 353, apenas devido ao papel não esclarecido de Vasco Vieira da Costa. E de novo em Geração Africana, Arquitectura e cidades em Angola e Moçambique, 1925.1975, Livros Horizonte, Lisboa 2002, p.85.
Fernando Batalha (1908, Redondo - 2012), em África de 1938 a 1983 (JMF, GA 18), morreu recentemente em Lisboa com 104 anos, e com ele desapareceu uma testemunha central deste caso. É também conhecida a contribuição de Vasco Regaleira - Vasco de Morais Palmeiro Regaleira, 1897-1968 - na Exp. de 1938, Luanda, projectando o Pavilhão do Banco de Angola, que cointou com esculturas de Manuel de Oliveira (a obra foi referenciada nas revistas Arquitectos nº 9, ed. SNA, 4/6, 1939, p. 270; e Arquitectura nº 41, 1938, p. 18). Regaleira viria a ser o responsável pelo definitivo Banco de Angola, um pastiche setecentista concluído em 1956 que se tornou um ex-libris da cidade (enquanto o Mercado de Quinaxixe viria a ser demolido...).
No novo livro de Ana Vaz Milheiro refere-se o pavilhão o Banco de Angola da Exp. de Luanda descrito na revista Arquitectura (pág. 165), dando-se também notícia do Pavilhão de Arte Indígena, que "reproduz uma construção típica africana, fixando um tipo que se vulgariza nas sociedades metropolitana e colonial", a partir de imagem da revista Actividade Económica de Angola (pág. 320). Esta surge reproduzida na pág. 345, acompanhada pela atribuição interrogada a Fernando Barata, tal como sucede numa foto do respectivo interior (pp. 356-357). Mas certamente não se justifica essa atribuição, a não ser que surjam provas no seu espólio, depositado em Lisboa, enquanto em Luanda e na Escola de Arquitectura local, de que foi um principais fundadores, em 1979, e director até 1982, se encontram localizados alguns projectos de Vasco Vieira da Costa para a Exposição de 1938.
(*) Sumário do nº da revista Actividade Económica de Angola / Revista de Estudos Económicosde dedicado à Exposição Feira de Angola (1938):
Discurso do governador geral, cor. António Lopes Mateus, na sessão de abertura da Exposição-Feira de angola.
A situação económica de Angola, conf. pelo dr. Moura Carvalho
Angola e o seu destino, conf. pelo dr. Manuel Múrias
Plano de Fomento da Colónia de Angola (Relatório justificativo e bases de aplicação, apresentados ao Conselho do Governo pelo governador geral; Acta da sessão do Conselho de Governo, em que foram discutidos o Relatório e as Bases, Fevereiro e Março de 1936; etc)
A indústria piscatória do sul de A. e Economia da cultura do tabaco em A.
Índice das gravuras: aspectos da inauguração; diversos aspectos parciais; aspectos exteriores e interiores do Pavilhão Principal; aspectos exteriores e interiores de alguns pavilhões e "stands". (Páginas não numeradas) e em especial a página de créditos