Alguma gente pós-colonial (Angola, no caso) revela-se mais inteligente e mais culta, além de ser mais rica - óptimo (é o curso ha história). Afirmam, por exemplo: "É tempo de nós, por cá, passarmos a refletir mais maduramente sobre conceitos que utilizamos no nosso quotidiano sem fazermos qualquer juízo de valor sobre os mesmos. O uso do termo “lusofonia” é, apenas, um dos exemplos " - Filipe Zau, in "A palavra "lusofonia" e os conceitos que utilizamos no nosso quotidiano".
Quando a Wikipedia define "Lusofonia (como) o
conjunto de identidades culturais existentes em países, regiões, estados
ou cidades falantes da língua portuguesa como Angola, Brasil, Cabo
Verde, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe,
Timor-Leste e por diversas pessoas e comunidades em todo o mundo",
está a dizer que não existe uma identidade cultural comum, uma
comunidade sentimental ou mítica comum, uma história comum. Existe um
conjunto de identidades culturais diferentes e associadas pelo uso
(oficial, nos seus respectivos países) da língua portuguesa. Não há (já)
apropriação de identidades alheias nem sobreposição de uma identidade
cultural sobre outras.
A questão (se existe, porque "luso" é
um palavra convencional menos feliz* que franco, anglo, germano, italo, hispano, ou sino, nipo, indo, etc - e
“portuguesofonia” é muito feia e comprida) não é fantasmática, mas
operacional:
Pode haver (...) "necessidade de epistemologicamente
se esclarecer, o que, nos dias de hoje, se entende por “lusofonia”. A
razão para tal reside no facto de a maioria das pessoas, mais a reboque
de influências do que de evidências, usarem-no como sinónimo de
Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) ou, simplesmente, de
falantes da língua portuguesa, independentemente dos diferentes
contextos (geográfico, político e sociocultural) dos falantes deste
mesmo idioma." (etc)
Ou seja, há algum mal estar face à palavra lusofonia, como os textos Filipe Zau expressam no JORNAL DE ANGOLA, 2011 e 2012, mas não exite uma condenação fatal do conceito, uma urgência de esconjurar o que sob a palavra se esconde ou manifesta. Lê-se o angolano Filipe Zau (Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Interculturais) sem encontrarmos os primarismos políticos e os confusionismos culturais do António Pinto Ribeiro no Ípsilon de hoje, já transcrito no Buala... A vanguarda do anti(pós)colonialismo está por cá, atentíssima.
*A lusos e lusitanos, termos usados sem preocupação de rigor, associa-se uma origem mítica da identidade portuguesa. No “Novo Dicionário Enciclopédico Luso-Brasileiro”, “luso” aparece como o “nome do suposto fundador da raça lusitânica”; sinónimo de “Português”, de “Lusíada” e de “Lusitano” (FZ, 2)
Filipe Zau, 1 O conceito de lusofonia e a concertação diplomática, 28 de Agosto, 2011 (com uma boa síntese das muitas línguas faladas nos antigos territórios coloniais)
Filipe Zau 2 A palavra "lusofonia" e os conceitos que utilizamos no nosso quotidiano, 13 de Julho, 2012.
Como em outras situações citar Eduardo Lourenço,o que faz FZ, 2, não ajuda a programar a acção: “Não sejamos hipócritas, nem sobretudo voluntariamente cegos: o sonho de uma Comunidade de Povos de Língua Portuguesa, bem ou mal sonhado, é por natureza – que é sobretudo história e mitologia – um sonho de raiz, de estrutura, de intenção e amplitude lusíada”. 1999, “Cultura e Lusofonia ou os Três Anéis, A Nau de Ícaro seguido de Imagem e Miragem da Lusofonia" (Quando se atribui a cultura a essencialidade da natureza, todos os sonhos ou devaneios são possíveis.) Cit. de Baptista, Maria Manuel, 2000, «O Conceito de Lusofonia em Eduardo Lourenço: Para Além do Multiculturalismo ‘pós-humanista’», in http://mariamanuelbaptista.com/publicacoes.htm
Buala, Ribeiro, António Pinto, "Para acabar de vez com a Lusofonia", Público Ipsilon 18-01-2013
"A lusofonia é a última marca de um império que já não existe. E o último impedimento a um trabalho adulto sobre as múltiplas identidades dos países que falam português" (sic)
É difícil conter a irritação quando um intelectual com responsailidades na área da comunicação intercultural no espaço lusófono e africano em geral, e que se afirma situado num lugar à esquerda, atenta contra o seu próprio espaço de intervenção. APR traz a Lisboa os Encontros de Fotografia de Bamako, em 2012 e 2013, mas não se lembraria de dizer, no Ipsilon ou nas publicações do Próximo Futuro, que a francofonia é uma marca persistente de um império que continua sob renovadas formas - esse seria, pelo menos, um discurso simplista, redutor e impróprio. O Insituto Camões e Instituto Franco-Moçambicano são instrumentos coloniais, imperiais?
continua
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