A certa altura, a "vanguarda" nacional da antropologia académico-museológica (perigosa acumulação de funções nos tempos de hoje) entendeu que o objectivo correcto era não expor, não mostrar as colecções, porque qualquer apresentação (e qualquer selecção de objectos feita por um olhar eurocêntrico, antropologicocentrico?) seria uma representação redutora, uma violação colonial ou centralista de outros povos, uma apropriação indevida das populações envolvidas, uma agressão. Haveria apenas reservas, apenas acessos condicionados para investigadores (alguns, os de confiança pessoal).
Era o tempo em que, no MNE e nos museus portugueses em geral, os directores andavam em "roda livre" por um errado juízo sobre a sua autonomia e as responsabilidades da tutela. Havia então muitos meios ao dispor, em confronto com os orçamentos actuais. Um museu realmente na vanguarda (?) do politicamente correcto, sem deixar de ser competentíssimo, é o Musée d'Ethnographie de Neuchâtel, que passou os últimos anos com uma extraordinária montagem (segundo o catálogo) intitulada "Retour d'Angola" (aqui)
Ensaio de publicidade para Ovomaltine (photo © Musée d'ethnographie de Neuchãtel, in dossier de presse: "Extraits de presse du 4 au 13 décembre 2007")
Depois de "O Voo do Arado" (1996), o director Joaquim Pais de Brito prescindiu
da colaboração de Benjamim Pereira e as galerias foram permanecendo
encerradas - essa situação de fechamento do museu sobre o seu director
foi objecto de críticas públicas nacionais e internacionais,
nomeadamente durante a iniciativa "Caminhos e diálogos da antropologia
portuguesa - Encontro de homenagem a Benjamim Pereira", em 2010, na
Fundação Gulbenkian ( e aqui). Obrigado a apresentar uma montagem da colecção pelo
Elísio Summavielle, ao tempo secretário de Estado e director-geral do
património cultural (o Museu do Chiado também vai ter a sua montagem permanente ou de longa duração - vantagens da crise e de haver tutela - , chega-se agora, muito demoradamente e de um modo
ainda muito ideossincrático, à respectiva inauguração.
Vamos lá ver hoje o que é a "coleccção permanente", sendo alguns dos seus núcleos certamente muito bem mostrados sob um título apatetado, "O Museu, muitas coisas" (o blog do MNE), que serve para tudo e todos e sempre, não dizendo nada. É mais um desafio.
Entretanto, o Museu acumula agora a tutela do Museu de Arte Popular, para o qual se aguardam soluções e a apresentação da colecção no seu lugar próprio - perderam-se anos desde que se travaram os desmandos e incompreensões de uma anterior ministra. Foi uma grande luta, ainda só parcialmente ganha. (dossier) O blog dessa luta continua aqui . O que pensará hoje o SE Cultura e quanto tempoi vamos esperar para que o diga - e para o que disser se discuta.
Sabe-se que o director do MNE deixará brevemente funções, tendo-se-lhe permitido continuar até completar 70 anos por atenção aos seus antigos bons tempos. A ver vamos.
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E agora que se expõe o trabalho do Franklim, lembre-se a recente exposição de Peralta, de que não saiu o catálogo prometido, nem em versão impressa nem em acesso digital, nem rico nem pobre. O que deveria ter sido um inventário das obras conhecidas de Peralta (um Outsider, um artista singular, e não um "popular"), continua a aguardar-se - mas não o foi que se prometeu aos beneméritos coleccionadores que emprestaram as peças expostas. (ver).
Não sei por que há-de o MNE considerar-se um museu de arte e segregar alguns artistas como "artistas populares", próprios de um gueto etnológico, mas adiante.
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