Tenho uma grande admiração pela Isabelinha, que tem vindo a proceder a uma acumulação do capital altamente proveitosa para acrescentar sempre novos e diversificados investimentos, sem que os lucros dos diamantes e do petróleo se diluam em excessivas partilhas. Um dia, parte daquilo que não distribui em gorgetas reverterá tb a favor da população (um amigo de Paris a trabalhar num hotel contava-me como ela faz alinhar os criados quando deixa o andar - não é o quarto - e vai entregando notas de 500€...) Além de ter boa figura, é uma benemérita.
O marido* tb deve ser uma pessoa interessante pq é coleccionador de arte, embora tenha tido problemas bancários no Congo, país de origem. Quando comprou a representação de África na Bienal de Veneza houve um coro internacional de calúnias e aleivosias (artnet).
Assentes estas declarações pessoais de estima, que são sinceras, voltei a comprovar hoje que o Fernando Alvim é infrequentável - foi um esforço inglório para uma 2ª oportunidade que não resultou.
Há anos, quando veio anunciar a 1ª Trienal, julgo que já no CCB, não consegui fazer a notícia que tinha previsto para o Expresso: não podia distinguir no seu discurso e nos documentos (aliás, power point) o que era realidade e ficção, criação digital e mentira (à data, ele acusava um famoso artista português de se ter recusado a ceder obras para um país corrupto, e intimava o Estado português a retratar-se por ele e a forçar o empréstimo - era intolerável). Regressou agora ao CCB/Museu Colecção Berardo, a acompanhar a exp. Ni Fly Zone, e continua na mesma ou pior.
Quanto à exp., dois artistas em seis é uma boa média: refiro-me às representações
de Binelde Hyrcan e Paulo Capela, duas instalações apresentadas em "No Fly Zone -
Unlimited Mileage", ou como se diz em estrangeiro "Zona de exclusão
aérea - quilometragem ilimitada".
O marido* acima referido é o Sindika Dokolo (colecção, fundação, o que for preciso). O patrão do Alvim. Depois toda aquela corte de Luanda compra os mesmos artistas da colecção Sindika, por preços altíssimos. O estilo local chama-se o mimetismo, e é uma contribuição para a história de arte internacional. Não percebo é porque vêm agora expor a Lisboa... Estarão a faltar as vias de acesso a mercados mais a sério? Ou foi o Rendeiro que deu uma palavrinha ao Berardo para aceitarem cá a colecção Sindika e aquele combóio de três curadores 3 para 6 artistas 6? "No Fly Zone" quer dizer zona de exclusão aérea, mercado controlado, coutada privada?
A meia cara que o Fernando Alvim usava em Bruxelas no final dos anos 80 era assim (não fiz crop, é mm tal e qual o retrato). Era refugiado e pintor (eu tenho uma das 3000 cópias do catálogo apoiado pela Fund. Gulbenkian e publicado pelo Espace Sussuta Boé, Bruxelas). Com a outra meia cara o refugiado tornou-se a seguir o senhor da arte em Luanda.
Era um pintor muito fraquinho e igual a muitos
outros, ao tempo do "neo-expressionismo". Passou ao conceptual, que é
mais fácil. Arranja-se um tema, de preferência "social", prefacia-se argumentando que "reflecte sobre" e serve qualquer coisa apropriada, tipo ready made (o já feito). E o refugiado tornou-se empresário em Luanda, nos ramos do imobiliário e da
arte, ao serviço das forças do progresso (agora mais privado, o progresso).
O quadro chama-se
"Niu Ritimo", de 1989, e é muito grande, 190x120 cm. Não me parece que,
à data, as estrelas e as mamas fossem as da Comunidade Europeia - era só
bonecos.
Continuando com o tal Alvim agora de Luanda,
depois de ser de Bruxelas... A história antiga da 1ª Trienal
associava-se ao que parecia ser uma parte da cidade a urbanizar, onde se
arrendariam armazéns para colecções, galerias para expôr obras a vender
aos coleccionadores e ateliers para produzir obras para expor nas
galerias e a depositar nos armazéns, com serviços de consultoria,
comissariado, conservação, design e
arquitectura, e o resto necessário. Era uma fórmula mágica.
Agora não
percebi nada, mas será da deterioração. O Simon Njami,
comissário para todas as ocasiões, vindo da Revue Noire, de Bamako,
Africa Remix, Check List Luanda Pop, e quase tudo o resto, habilíssimo
exemplo promovido a meios cosmopolitas de uma tradicional sapiência oral africana,
ziguezagueante por entre temas da memória e da periferia, ou seja lugares comuns,
apresentou o Alvim como terrorista angolano. Serviu de introdução a uma
conversa incompreensível e imparável em que dizia estar acusado de
tráfico de armas e não só de influências, e ameaçou processar quem o
elogiasse ou denegrisse, não percebi nada. Havia adversários na sala,
pareceu-me que lhe parecia, gente que o menosprezava e que corria perigos
por isso. Talvez fosse uma performance, já que o Pedro Lapa lembrou que
acumulava com o papel de artista.
Como pode o meio artístico de Luanda,
de que se vão conhecendo alguns nomes (depois de António Ole), conviver com esta insólita
representação do poder, é a questão que gostaria de colocar aos artistas
presentes, mas seria seguramente inoportuna para eles. Dizem-me que a
audiência foi ficando esclarecida sobre a confusão do personagem, mas eu
preferi sair em andamento.
Não tentarei uma 3ª vez perceber para onde
vai o Alvim. Julgo que já não vai a parte nenhuma. Mais dia menos dia percebem em Luanda que está a prestar um péssimo serviço à Isabelinha. Será que vai voltar a pintar?