SOBRE O Museu Nacional de Etnologia e a exposição da sua colecção - a "exposição permanente" perversa e provocatoriamentemente intitulada "O Museu, muitas coisas". Foi a prosa apressada do Facebook, com a inclusão abaixo dos comentários de três, já quatro, antropólogos. Continua actual e acrescentou-se com comentários de especialistas.
Transcrevo
Não há novidades no Museu Nacional de Etnologia. A situação continua a ser opressiva, ou até demenciada - o que se vê à vista desarmada através de diversíssimos sinais. Aquilo, a montagem da "colecção permanente", é pior do que tudo o que se poderia imaginar. A recusa obsessiva do "high light" ou da obra prima levou a evitar as grandes peças e núcleos do património do museu; a recusa das narrativas interditou tudo o que seja mais do que a curiosidade, o apontamento, o pormenor, o acidente (mesmo que sejam núcleos fortes como as bonecas mwila ou as tampas de panela com "recados" ou provérbios de Cabinda - mas não há macondes ou tchokués: o melhor da colecção, o que justifica o interesse exterior, permanece oculto ).
Há ali uma chocante degradação da ideia de museu, uma resistência obstinada a ceder o lugar, depois de sucessivamente se terem destroçado equipas e afastado colaboradores qualificados. Mas há ainda uma rede de cumplicidades que vêm de trás que não sabem, não querem saber. A intervenção de Jorge Barreto Xavier pareceu vir de alguém que conhece a situação, mas a directora geral cedeu à praxe dos elogios deslocados... Quais serão os próximos capítulos de uma casa fechada sobre o seu director (no caso, um antigo "gajo porreiro", depois auto-suficiente ou autista)?
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Rui M. Pereira Trabalhei alguns anos naquela casa, ainda sob a direcção de Ernesto Veiga de Oliveira, com Benjamim E. Pereira e Margot Dias. Nos últimos anos voltei lá uma única vez, meses atrás, por obrigação institucional e não passei do auditório. Dói-me entrar ali. Tudo foi desvirtuado, o Museu fechou-se sobre si próprio, ignora a comunidade académica. A sobreexposição das colecções, com a abertura não criteriosa das reservas, a desvalorização ideológica dos núcleos mais significativos (Marconde, Tchokwe) e tantos outros sinais que têm vindo a ser expostos pelo Alexandre Pomar revelam, antes de tudo mais, uma total ausência de programa. Desleixo, preguiça, incompetência, a que se junta a pérfida obstinação do seu Director em, como aqui escreve o Alexandre, destroçar equipas e afastar colaboradores. E sim, confirmo, existe uma poderosa rede de cumplicidades, a mesma que suporta a "praxe dos elogios deslocados" da directora geral, a que se junta agora a hipócrita comiseração de não se afastar o homem por estar . . . à beira da reforma.
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Pedro Félix Rui M. Pereira, obrigado pelo seu comentário... acho que vamos ser todos precisos... não podemos abandonar aquele museu e a sua colecção aos desígnios transitórios das pessoas....
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Clara Saraiva escrevo a respeito do comentário certeiro do Alexandre Pomar sobre a inauguração da exposição permanente do MNE. Não cheguei a falhar com o Alexandre no dia da inauguração, mas identifico-me completamente com seus comentários. O MNE já não conta com a magia expositiva de um Benjamim Pereira nem de um Vítor Bandeira. Significativamente, todas as contribuições desses dois espíritos brilhantes, ao longo de décadas, na concepção e montagem de exposições maravilhosas foram completamente apagadas dos núcleos da exposição permanente agora aberta ao público. Os núcleos dizem respeito única e exclusivamente a pesquisas e exposições realizadas no reinado de Joaquim Pais de Brito, apagando toda a história anterior do museu. Não só lamentável, mas criminoso, até porque o MNE é detentor de colecções fabulosas, em que o esplendor de África surge de uma forma bem mais marcante que nas tampas de panela Cabinda ou nas bonecas dos Handa (sem dúvida ambas interessantes, mas que não chegam aos calcanhares de algumas peças Nalú, Senufo ou outros, das reservas do MNE). E o dinheiro gasto nos painéis tipo cabine telefónica dos anos 60 ou nos posters kitsch teria sido mais bem gasto na concepção de uma iluminação bem concebida...desde que o MNE rejeitou e maltratou vidas de dedicação a essa instituição (como as do Benjamim Pereira e do Vítor Bandeira), e a contribuição de equipas qualificadas, como muitas que passaram por essa casa e que foram sucessivamente apagadas pelo despotismo e a ignorância do seu director.
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Alexandre Pomar Esta é uma contribuição decisiva - não tinha entendido a razão da escolha destes núcleos, obrigado.
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Pedro Félix Muito obrigado Clara Saraiva pelo contributo, agora uma questão retórica: a equipa que montou esta exposição está ciente dessa política? é certo que todas as exposições são só uma forma de representar algo, um olhar, umas perspectiva, mas há indícios (nos discursos, ou na prática) que concretizem essa leitura que, julgo, ser correcta? e não havendo, não estariam os responsáveis conscientes da possível leitura? eu fico sempre espantado com a arrogância ignorante que simplesmente faz tábua rasa, em público, da história....
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Pedro Félix é que isto não se configura só como um problema de gestão pública de património nacional e gestão financeira despesista (porque não-produtiva intelectualmente), revela a total subversão dos preceitos que orientam a área científica (quer da antropologia e outras ciências sociais, quer da própria museologia....)
Entretanto, o blog do MNE parece tb surpreendido. Estacionou a 31 de Janeiro a anunciar o acto:
O Facebook do MNE está mais activo: MNE: fb