(REFLEXÃO A PROPÓSITO)
Goste-se ou desgoste-se, é o princípio de uma relação interessada, que se iniciou com a atenção a um objecto. Mas quem souber dizer o que é a arte tem prémio: todas as definições foram falhando e só restam aproximações; não é um exercício proveitoso, mas é um campo da filosofia - o pragmatismo depois de Dewey, a arte como experiência, limpou o terreno. O que é proposto e aceite como arte foi-se sempre alargando, felizmente; foi vacilando, a sua parte "erudita" ou elitista está ameaçada, e não está garantido que se perpetue como um tipo específico de produção humana (perguntem à IA).
Terminaram as Corporações e as Academias, que certificavam artistas e obras, e depois os Salões, mesmo livres e independentes, e não há lugar para a criação de uma Ordem (uma Ordem de Artistas com cartão só para sócios acreditados!! seria o maior absurdo) - hoje Bienais e Feiras só fazem a gestão crítico-financeira das existências, atestam e excluem, aceitam e ignoram, mas não fazem a lei. Também as Escolas foram sendo recusadas, dispensadas, desqualificadas, criticadas pelos artistas, e têm dificuldade em saber o que devem agora ensinar (conhecer muitos dos professores é assustador, e a extinção é garantida). A Vanguarda, outra entidade instável, força de invenção, desafio, distinção e pressão, já foi. Os Museus que sobrevivem (desde Dadá que quiseram encerrá-los, antes de entrar nas suas colecções) são um mercado, estão no Mercado, entre colecionadores e galerias, e são instituições de representação social, nacional, local, também de seita e nicho. Alguns são (ainda) excelentes, mas tem havido ofensivas perigosas.
Não é preciso ser especialista para reagir a uma obra, de arte ou não, de design, de consumo, um gadget (e há péssimos especialistas idiotas em arte).
Prestamos atenção e apreciamos ou não objectos que se pretendem de arte tal como fazemos com paisagens, pessoas, animais, cidades, comidas: começa por ser atenção e apreciação estéticas, o que está ao dispor de cada qual. Depois podemos tentar justificar, esclarecer, aprender, argumentar qualidades artísticas (sem chegar a um juízo final inquestionável), como fazemos mais facilmente com livros, filmes, músicas e comidas. A chamada Arte (a iarte) intimida. Porque é um instrumento de distinção social e porque em tantos casos não dá gozo ou prazer nenhum, não serve para nada, não “diz” nada, não tem justificação para além de ocupar um lugar ou um posto no espaço social da arte, na tradição da arte, o que é pouco.
Para se pensar nestas coisas está em Lisboa, no MAAT (central Tejo, Belém), uma exposição magnífica, dedicada ao universo alargado da arte, que muitos não reconhecem como tal: as “artes modestas” (Arquipélago), artes maiores e menores, artes espontâneas, periféricas, comerciais e “contemporâneas”. A não perder.
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