O catálogo da exposição "Aparições" será lançado em breve, com dois ou mais textos de Jorge Calado, que aguardo com muita curiosidade. A inclusão de uma centena de provas vintage e, entre elas, de muitos inéditos escolhidos em vida pelo autor, como devem ser, é uma nova oportunidade de aproximação a uma obra que em grande parte se foi conhecendo de um modo retrospectivo (fotografias feitas de 1956 a 1963 que se conheceram a partir de 1982) ao mesmo tempo que um outro ciclo de produção se iniciava a partir da primeira exposição da Ether. Por outro lado, a montagem constrói em si mesmo um itinerário que é emocionante pelo seu carácter de homenagem prestada poucos meses depois da morte do autor, e pelo modo como faz aparecer um olhar fotográfico que é sempre o de alguém que se emociona com a realidade fotografada, e também com a passagem da realidade visível à estranheza do real, tornando a observação (a dele e a nossa) uma abertura à inquietação. Emocionante ainda pelo que se oferece como exemplo de um comissariado que é um diálogo entre obras autorais (o espólio e a retrospectiva) e, neste caso, entre olhares, o do autor-fotógrafo e o do comissário-autor, com uma constante demonstração de como mostrar uma obra é propiciar uma descoberta ou um reexame do que se já sabe, ou julga saber, fazendo coincidir o ver e o questionamento do visto. Ao contrário do que em geral sucede, esta exposição não pode ver-se de longe e de fora, nem durante um acto social de inauguração. Ela impõe, na sua só aparente disposição desordenada, que a observação não seja um hábito preguiçoso.
Jorge Calado propõe, aliás, uma nova abordagem da obra de Gerard e uma reconsideração do que o próprio explicava terem sido as suas duas fases e as suas respectivas motivações e diferenças. É um exercício com implicações e com riscos, que se justifica a si mesmo na montagem proposta e certamente se desenvolverá no catálogo que se anuncia, nos textos e na sequenciação das imagens, naturalmente diversa da ordenação espacial da exposição.
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