Editor, poeta, amigo e cúmplice de Fernando Lanhas desde os anos 40, Fernando Guedes (n. Porto, 1929 - 2016) foi também crítico de arte, e nesse papel assumiu uma importância que tem sido pouco reconhecida por razões ideológicas e em especial pelo inquistamento de posições dominantes neste meio.
Entre outras publicações, F.G. reuniu colaborações dispersas em "Pintura, Pintores, etc", ed. Panorama - SNI, 1952 (actividade e livro que mereceu menos do que uma menção de J. A. França na sua história do séc. XX - a oposição entre os dois permite situar uma linha de omissões e incorrecções da historiografia portuguesa). Depois, "Estudos sobre Artes Plásticas - Os anos 40 em Portugal e outros estudos", INCM, 1985, é uma justa resposta à exposição sobre os Anos 40 organizada sob a tutela do mesmo J.A.França na Fund. Gulbenkian. Em especial, o seu testemunho analítico é essencial para acompanhar a intervenção do grupo dos Independentes do Porto, activos de 1943 a 1950, e onde se integram os inícios das carreiras de Júlio Resende, Fernando Lanhas (o principal animador), Nadir Afonso, Júlio Pomar, Arlindo Rocha, Victor Palla e outros. E também, por consequência, os inícios da abstracção, no Porto, depois atrasada para 1952, em Lisboa, entre outros efeitos.
Escreveu textos de crítica e divulgação nas revistas Graal, Tempo Presente, Rumo e Panorama, e nos jornais Diário Ilustrado (nº 1 em 1956, vespertino de qualidade impresso na gráfica do Diário da Manhã, orgão oficial do regime), Diário de Notícias e Diário da Manhã, o que o situa desde logo como um autor da direita ideológica, mas que no seu caso não diminui a qualidade da observação crítica. Foi um crítico atento e isento, particularmente interessado no abstraccionismo (ver a "Tábua cronológica da pintura abstracta em Portugal", de 1952), escreveu também alguma coisa sobre arte infantil e apresentou no pós-guerra artistas ingleses como Wyndham Lewis, Paul Nash, Henry Moore e Sutherland
Tive há tempos a indicação de que Fernando Guedes organizou (ou foi só um dos participantes?) uma intervenção provocadora que ocorreu em 1960 contra a estreia no Teatro Capitólio, em Lisboa, da peça "A Alma Boa de Setsuan", de Bertold Brecht, apresentada pela Companhia de Maria della Costa, visando a sua interdição. O episódio motivaria algumas rupturas pessoais definitivas no meio ligado às artes. (Se não corresponde à realidade, desminta-se agora.) <Jorge Silva Melo já veio dizer que sempre ouviu "falar de Manuel Múrias como o organizador dos "eventos" anti-brecht-della costa; mas também de Goulart Nogueira">
Em termos pessoais, cabe referir a gentileza de me ter enviado, nos anos 90, fotocópias de todos os catálogos dos Independentes e alguns outros da época, num gesto raro de colaboração e reconhecimento mútuo.
(capas da ed. cartonada e corrente)