ARQUIVO
EXPRESSO, Cartaz, 1 de Junho de 1991. pp. 38-39 (Actual / Opinião)
"A cultura do ressentimento"
Edite Estrela e António Reis apresentaram no passado sábado, num hotel de Lisboa, as propostas do Partido Socialista para o sector da cultura. A quatro meses das eleições, um extenso documento intitulado «A política cultural do PS em debate» foi oferecido à apreciação dos «agentes culturais»; a quatro meses das eleições, também, Edite Estrela e António Reis perfilaram-se como candidatos à pasta da cultura num possível governo socialista.
Acontece, entretanto, que as propostas formuladas se revelam absolutamente distanciadas da actual realidade do sector (por efeito do longo afastamento do Poder?, por sobrevivência de um quadro ideológico de referência que impede a compreensão das dinâmicas culturais que atravessam o quotidiano?). São todas as marcas da velha ideia da «mudança das mentalidades», do entendimento burocrático e livresco da cultura como o plano mais «nobre» de uma política de instrução pública de modelo oitocentista, que se reconhecem como inspiradoras do documento. O prazo parece ser curto para que, neste domínio e nesta direcção, a intervenção socialista venha a revelar-se mobilizadora, ou sequer positiva num contexto que é, por outro lado, o do caos generalizado no campo da política governamental da cultura.